Transitada em julgado no último dia 24 de abril, uma emblemática decisão da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho[1], de relatoria do Ministro Alexandre Luiz Ramos, reputou válida norma coletiva que previa um sistema de registro de jornada de trabalho por exceção. Decisão semelhante[2], de relatoria do Ministro Caputo Bastos, já havia sido proferida pela Quarta Turma do TST anteriormente, ao final de 2018.
O intitulado “ponto por exceção”, segundo definição do próprio órgão julgador, consiste em um controle de ponto no qual são anotadas apenas as exceções à jornada regular de trabalho, sendo dispensado um controle formal dos horários de entrada e saída. Ou seja, pela dinâmica do ponto por exceção os empregados não “batem o ponto” diariamente, apenas registram as situações excepcionais de trabalho, tais como horas extras, afastamentos, atrasos, saídas antecipadas e férias, entre outras. Como consequência, inexistindo anotações em folha de ponto, presume-se que o empregado apenas cumpriu a jornada padrão, contratualmente estabelecida.
Por esta razão, a corrente dominante nos tribunais pátrios sempre foi resistente à anotação de horas de trabalho por exceção, ao argumento de que, ainda que prevista em norma coletiva, tal dinâmica afrontaria normas de ordem pública, em especial o artigo 74, § 2º, da CLT, segundo o qual a anotação de jornada é obrigatória para as empresas com mais de 10 colaboradores. As decisões também pontuavam que, ao prever o reconhecimento das negociações coletivas, a Constituição da República[3] não teria chancelado a possibilidade de excluir direitos indisponíveis dos trabalhadores por meio de normas coletivas.
No entanto, ambos os argumentos foram rechaçados pelas recentes decisões da Quarta Turma do TST, que destacaram a importância de incentivar e garantir o cumprimento das decisões tomadas por autocomposição coletiva, eis que nela as partes fazem concessões mútuas para atingir um resultado geral benéfico para ambas. As decisões consideraram, ainda, que o artigo 611-A da CLT – introduzido pela Lei 13.467/2017 (“Reforma Trabalhista”) – estabelece, em seu inciso X, que as normas coletivas que versam sobre “modalidade de registro de jornada de trabalho” têm prevalência sobre a lei.
De fato, entre as diversas inovações da Reforma Trabalhista está a prevalência do “negociado sobre o legislado”, prevista no artigo 611-A da CLT. Por sua vez, o inciso X de referido dispositivo legal inclui no rol de matérias passíveis de negociação o modo de registro da jornada de trabalho, matéria esta que, por óbvio, não está inserida no rol de garantias inegociáveis do artigo 611-B da CLT.
Assim, em princípio, pode-se concluir que as normas coletivas têm respaldo para estabelecer diferentes formas de controle de jornada, inclusive o chamado ponto por exceção, lexibilizando assim a obrigação prevista no artigo 74, § 2º, da CLT.
Via de consequência, parece razoável que o entendimento até então dominante no TST, pela invalidade das normas coletivas que adotam este tipo de controle alternativo de jornada, seja aos poucos revisto, passando a prevalecer o entendimento recentemente de sua Quarta Turma, pela licitude da pactuação.
De toda sorte, muito embora os precedentes sejam valiosos para as empresas que buscam desburocratizar suas relações de trabalho, o tema é polêmico e o entendimento da Quarta Turma do TST ainda é minoritário, sendo recomendável que os empregadores acompanhem a evolução da jurisprudência neste particular.
NOTAS
[1] TST-RR-1001704-59.2016.5.02.0076
[2] TST-RR-2016-02.2011.5.03.0011
[3] Art. 7º, inciso XXVI.