Capa da publicação Medidas judiciais atípicas e a efetividade da execução
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O artigo 139, IV, do Código de Processo Civil, como garantia de efetividade da execução por quantia

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05/06/2019 às 11:15
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O art. 139, IV do CPC autoriza o juiz a adotar medidas atípicas para garantir a execução. Como equilibrar efetividade e direitos fundamentais do executado?

1. INTRODUÇÃO

A execução é fase mais importante do processo em virtude do momento da concretização do direito reconhecido na sentença ou no titulo extrajudicial. Mas, infelizmente nem sempre esse direito se materializa de forma efetiva, com a entrega do bem da vida pretendido. Mesmo com a existência de mecanismos de consecução, penhora e expropriação, este binômio não foi capaz de atender as expectativas do credor na execução por quantia certa. A partir dessa circunstância, vislumbra-se a necessidade da adoção do princípio da atipicidade, que desde o Código de Processo Civil de 1973 já era utilizado nas obrigações de fazer e não fazer e entregar coisa ser utilizado também na execução por quantia certa.

A execução por quantia, sempre foi fadada de maior ineficácia dentre os outros tipos de execução porque era exclusivamente estruturada em uma técnica casuística, engessada e principalmente previsível, fazendo com que o executado se antecipasse tornando a penhora e a expropriação ineficazes.

O Código de Processo Civil de 2015 inovou, outorgando poderes ao juiz, autorizado pelo artigo 139, IV, do CPC, que consagra o princípio da atipicidade, não só na ordem judicial como também nas prestações pecuniárias, podendo compelir o “devedor profissional” de maneira mais enérgica a cumprir a obrigação. Mas o referido dispositivo está causando controvérsias a respeito do seu cabimento, nas obrigações por quantia, pois as medidas restringem direitos fundamentais do executado.

A essa premissa, o presente trabalho objetiva estudar isoladamente o artigo 139, IV do CPC, demonstrando a sua constitucionalidade e efetividade no processo de execução e cumprimento de sentença por quantia certa, e sua forma de aplicação.

As esfinges acerca das polêmicas geradas pela aplicação do artigo 139, IV do CPC surgiram os seguintes questionamentos: Até que ponto o poder concedido ao magistrado pode ir? A partir de que fronteira se estaria ultrapassando os limites constitucionais? Qual o melhor entendimento do preceito normativo? Como deve ser aplicado no caso concreto?

O objetivo geral é abordar a compreensão doutrinária e jurisprudencial e demonstrar a importância da presença da atipicidade das medidas executórias na execução por quantia certa.

Com isso, teremos que compreender especificamente, de que forma o artigo 139, IV, do CPC pode garantir efetividade na execução por quantia certa; relacionando o mesmo com o diploma constitucional e analisaremos os aspectos gerais do cumprimento de sentença e o processo de execução sob a luz do artigo 139, IV, do CPC e por fim vamos avaliar as medidas atípicas que estão sendo adotadas e cogitadas atualmente, para o credor reaver o seu crédito.

Parte-se da hipótese de que o artigo 139, IV, do CPC é constitucional e que as medidas atípicas devem ser utilizadas e que o poder de efetivação confiado ao magistrado está limitado.

Assim, para viabilizar o teste da hipótese, realiza-se uma pesquisa de finalidade básica estratégica, objetivo descritivo e exploratório, sob o método hipotético-dedutivo, com abordagem baseada em procedimentos bibliográficos e documentais.

No primeiro capitulo, vamos tratar das causas que provocaram a crise da execução e o marco da inserção da atipicidade executória no ordenamento jurídico brasileiro. Além disso, iremos estudar a natureza jurídica e seu conceito a partir da ótica da jurisprudência e de doutrinadores consagrados.

No segundo capítulo, iremos iniciar uma breve reflexão do artigo 139, IV, do CPC, como cláusula geral, os seus influxos constitucionais e aos direitos e garantias que se revertem em prol do executado.

No terceiro capitulo, abordaremos a forma de aplicação do artigo 139, IV, do CPC, pontuando apenas os aspectos comuns entre o processo de execução e o cumprimento de sentença que se faz necessário para garantir a sua utilização, destinação, parâmetros e cessamento das medidas executórias.

No penúltimo capitulo, compreenderemos de forma prática as medidas atípicas em espécie, esmiunçando as que já foram adotadas pelos jurisdicionados e as que estão sendo estimadas pela doutrina.

No último capitulo faremos uma análise critica das perspectivas das medidas executórias atípicas e as possíveis consequências do artigo 139, IV, do CPC.

Ao final, conclui-se que os objetivos são atendidos e as perguntas restam respondidas, com a confirmação de duas das hipóteses, indicando que o artigo 139, IV, do CPC é uma nova garantia de efetividade na execução por quantia certa, e que se mostra necessário a sua utilização para equacionar o problema da desonestidade do devedor, que não paga por que não quer.


2. CONTEXTO HISTÓRICO DOS MEIOS EXECUTÓRIOS E ATIPICIDADE DAS MEDIDAS EXECUTÓRIAS.

A primeira positivação de direito processual à cerca de execução decorre da Lei das XII Tábuas, criada pelos romanos por volta de 450 a.C. Foi o primeiro instituto jurídico a prevê sanções de caráter executório.

O direito romano não utilizava o termo obrigação com o sentido moderno, mas, já empregava suas prerrogativas, surgindo à ideia de vinculo jurídico entre credor e devedor, pelo qual um poderia exigir coercitivamente do outro a prestação a que lhe é devida.

As medidas executórias utilizadas nesta época eram perversas e desumana o devedor respondia com o próprio corpo, caso não honrasse com determinado compromisso firmado, o credor também podia cobrar com a cota de sofrimento do devedor.

De acordo com a Lei das XII Tábuas o devedor tinha 30 dias para quitar suas dívidas, caso não o fizesse, o credor tinha direito de golpeá-los, mantê-lo em cárcere privado, vende-lo e até mata-lo. Além disso, existia uma espécie de acordo de garantia chamado pelos romanos de “nexum”, pelo qual o devedor se dava como garantia de um empréstimo a escravidão de si próprio ou de um membro da família sobre o qual ele tinha autoridade em troca da extinção da dívida.

Somente em 313 a.C. é que foi criada a lei Lex Poetelia Papiria que instituiu o vinculo pessoal em patrimonial mas esta lei não dava direito de autodefesa, depois foi elaborada a lei Lex Vallia que estruturou as bases legais para que o devedor só respondesse a dívida com os seus bens, criando as primeiras noções que hoje chamamos de responsabilidade patrimonial do devedor.

Séculos mais tarde os Estados passaram por diversas mudanças, com o fim da Idade Média, o absolutismo predominou o continente europeu, regime politico que concentrava os poderes nas mãos dos reis. Com importantes acontecimentos históricos houve a derrocada do Estado Absolutista, resultado de eventos históricos como a Revolução Gloriosa, o Iluminismo, a revolução Francesa. Deste modo, com a evolução do pensamento humanista, há o aparecimento do Estado Liberal, instituído pelos ideais da Revolução Francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

No Brasil, o Código de Processo Civil de 1973 adotou uma politica estatal liberal e, portanto, não intervencionista. E ao acolher o eixo liberal, o CPC de 1973 trouxe para si todas as características marcantes desse modelo estatal. Recorde-se que o Estado liberal foi construído em pilares ideologicamente contrário ao Estado precedente, para atender aos reclames da nova ordem social e econômica que pôs fim ao absolutismo. Impulsionados pela necessidade de valorizar a propriedade e a liberdade dos cidadãos, e a partir daí a igualdade e o acúmulo de riquezas, a característica mais marcante de um Estado liberal é justamente o papel não intervencionista do Estado. Como se disse, o temor de um retorno absolutista, da invasão da propriedade e do cerceamento da liberdade praticamente obrigou uma politica não intervencionista do Estado liberal.

Do ponto de vista da atividade jurisdicional executiva, as restrições à liberdade e ativismo judicial ainda eram mais visíveis, porque tal atividade significava, antes de tudo, uma permissão de invasão estatal no patrimônio das pessoas, e, por isso mesmo, toda cautela e rigidez deveriam ser tomadas para evitar o retorno do Estado absolutista e por isso foi adotado a tipicidade dos meios executórios.

Com o advento da Constituição Federal de 1988 a legislação processual civil brasileira passou a ter os influxos da nova ordem constitucional que trouxe à tona a necessidade de que a atividade jurisdicional assumisse a sua vinculação aos valores e preceitos processuais fundamentais, tais como a efetividade do acesso à justiça e a razoabilidade de duração do processo.

A primeira inserção do princípio da atipicidade no ordenamento jurídico brasileiro foi no seio da obrigação de fazer e não fazer relativas às matérias atinentes a direito da criança e adolescente e a do direito do consumidor no ano de 1990 (respectivamente nas Leis nº 8.069/1990 e 8.078/1990).

Mesmo com toda rigidez o CPC de 1973 operou satisfatoriamente durante quase vinte anos. Mas a partir de 1990 é que a comunidade jurídica e correspondente a queixas recorrentes dos jurisdicionados e dos operadores de Direito a respeito da ineficácia executiva, se instaurando a partir daí, “a crise da execução”.

Diversos são os fatores que contribuíram para prejudicarem a efetivação da tutela executiva como: o excesso de processos; o custo e morosidade da Justiça; a inadequação dos procedimentos executórios; a ineficácia das coações processuais e, além desse cenário, essas esfinges não se limitam apenas dentro do Judiciário, antes mesmo delas chegarem ao Judiciário, já carrega consigo as raízes do problema que são ocasionadas devidas a um novo ambiente econômico e sociológico e a progressiva volatilização dos bens1.

O fator principal que levava ao fracasso da execução é a ineficácia do procedimento executivo, segundo Marcelo Abelha era por conta:

Da defasagem das técnicas processuais criadas sob uma perspectiva de ultra valorização do formalismo, positivista e liberal, ultrapassado e inconveniente para o modelo sociopolítico econômico e cultural da atual sociedade e a crise de confiança. (ABELHA, 2015, p.29).

Somente em 1994, com a edição da Lei n° 8.972/1994, é que se passou a prever a atipicidade dos meios executivos no tocante às ações que tivessem por objeto a obrigação de fazer e não fazer (Artigo 461, § 5º, CPC/1973). Em 2002 estendeu-se a aplicação do regime atípico nas obrigações de entrega de coisa, dando o mesmo tratamento das tutelas de obrigação de fazer e não fazer e não abarcando as obrigações de pagar quantia.

Portanto, o Estado liberal que têm como escopo a liberdade politica e civil acabou inviabilizando o sistema processual brasileiro de 1973 para um regulamento engessado, a dicotomia de liberal e absolutismo tornou-se de modo indireto uma das causas do fracasso da execução civil, embora a intervenção do Estado representasse uma ofensa ao liberalismo, é essencial a atuação coercitiva para privilegiar os princípios constitucionais, superado todos os obstáculos propedêuticos, as reformas e inovações são essenciais para acompanhar o ritmo das relações comerciais e o crescimento da sociedade afinal, nunca é demais recordar as palavras de Chiovenda que Alfredo Buzaid adotou como epígrafe na Exposição de Motivos do Projeto que posteriormente se transformou no Código de Processo Civil de 1973: “Convém decidir-se a uma reforma fundamental ou renunciar à esperança de um sério progresso”.

2.1. Conceito de Atipicidade dos Meios Executórios

Podemos conceituar a atipicidade dos meios executórios como a possibilidade de o magistrado ser criativo o suficiente para criar modelos executivos que se mostrem idôneos para dar ao credor a satisfação que o inadimplemento do devedor lhe vedou. A doutrina define meios executórios, conforme Chiovenda apud Zavazcki (2004, p. 103), “as medidas que a lei permite aos órgãos jurisdicionados pôr em prática para o fim de obter que o credor logre praticamente o bem a que tem direito”.

É relevante também apontar a definição do princípio da atipicidade dos meios executórios, pois o mesmo consagrado no artigo 139, IV do CPC/ 2015 diz que o juiz poderá, em cada caso concreto, utilizar o meio executivo que lhe parecer mais adequado para dar, de forma justa e efetiva, a tutela jurisdicional executiva.

Em decisões monocráticas o Superior Tribunal de Justiça define que Atipicidade das medidas executória é a necessidade da medida do fundamento e o fim (o limite) estabelecido pelo legislador para delimitação da medida a ser imposta pelo juiz. Medida processual necessária deve-se entender aquela que seja adequada, proporcional e razoável para assegurar o cumprimento da ordem judicial.

2.2. Natureza Jurídica da Atipicidade dos Meios Executórios

A atipicidade é uma norma implícita que complementa fórmulas adotadas diretamente pelo legislador, um procedimento de integração do Direito para se atender a rigor o que uma norma fechada não contemplaria de modo a lograr êxito para efetivar a prestação devida. No dizer de Luís Roberto Barroso (1993, p. 79) refere-se à efetividade como, “simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever ser normativo e o ser da realidade social”.

No âmbito da atipicidade ser uma norma implícita que elastece os poderes do juiz, o civilista Clóvis Beviláqua defende que:

“ (…) existem regras latentes, cuja aplicação se faz, por assim dizer, inconscientemente, que completam os preceitos expressamente formulados”. (BEVILÁQUA; Apud NADER 2011, p. 92)

Para se entender a natureza jurídica da atipicidade se faz necessário conceituar uma tutela jurisdicional efetiva:

É aquela que não se limita a revelar uma norma jurídica concreta, mas também permite efetivamente que haja sua satisfação no mundo dos fatos, preferencialmente nas condições mais próximas possíveis daquela se teria caso não tivesse ocorrido à crise jurídica que teve de ser debelada no Poder Judiciário (RODRIGUES, 2015, p. 4).

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Por aí já se vê que a atipicidade trabalha na obtenção de resultado mais próximo possível por meio de coerção que se enquadre ao caso concreto, medidas essas que não estão positivadas no ordenamento especificamente ditando o passo a passo a ser seguida, pelo juiz e sim como cláusula geral como aludem a seguir:

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniárias. (BRASIL, 2015).

Muitos juristas e doutrinadores afirmam que medidas indutivas, coercitivas, mandamentais e sub- rogatória é a mesma coisa, sinônimos, é claro que a finalidade é a mesma, mas o tipo geral de procedimento é diferente e foi por isso que o legislador não deixou de mencioná-las para abarcar todas as possíveis possibilidades a critério do juiz diante do caso concreto. Por meio de medidas indutivas, segundo Meireles (2016, p. 202), se “busca oferecer ao obrigado uma vantagem um prêmio, como incentivo ao cumprimento da decisão jurídica”.

Medidas mandamentais são aquelas que veiculam uma ordem mandamental, cujo descumprimento pelo destinatário configura o crime de desobediência. Já a coercibilidade quer dizer a possibilidade de uso da coação, esta possui dois elementos: psicológico e material, a primeira exerce a intimidação, através das penalidades previstas para a hipótese de violação das normas jurídicas e o elemento material é a força propriamente, que é acionada quando o destinatário da regra não a cumpre espontaneamente. Os meios de sub- rogação são aqueles por meio dos quais

(…) o Estado-juiz desenvolve atividade que substitui a atuação do executado, dispensando-a, e que se revela capaz de produzir resultado prático equivalente ao que se teria se o próprio executado tivesse adimplido a prestação. (CÂMARA, 2015, p. 318)

A sub-rogação se divide em desapossamento, meio de transformação e meio de expropriação. A execução para pagamento de quantia deve observar, primeiramente, a tipicidade dos meios executivos sendo permitido, subsidiariamente. É preciso interpretar o artigo 139, IV do CPC em conformidade com o postulado do artigo 926, “os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”. (BRASIL, 2015).

Deste modo, a natureza intrínseca da atipicidade dos meios executórios sempre esteve atrelada à flexibilidade da norma, sem a margem de liberdade para uma contribuição que propicie uma atuação discricionária do juiz (este poder não é ilimitado), seria impossível favorecer a efetividade quando se exigir em um caso concreto. A segurança jurídica está resguardada nos standards da execução de acordo com a ordem de procedimento a ser adotado, verificação aos precedentes e princípios norteadores, todo esse conjunto para se aproximar o máximo possível a realidade social.


3. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO ART. 139, IV DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

O artigo 139, IV é uma garantia de efetividade da demanda executiva na obrigação de pagar quantia certa, que antes era marcada apenas pelo binômio penhora e expropriação. No Código de Processo Civil de 1973 não havia a possibilidade de o juiz lançar mão de medidas coercitivas, capazes de pressionar o executado a pagar. Para se entender a aplicação do artigo 139, IV do CPC, é necessário explicar a sua técnica, a sua consonância com a Constituição Federal e seus influxos com os direitos fundamentais do exequente e executado.

3.1. Cláusula Geral

A cláusula geral é uma técnica legislativa que permite a mobilidade do juiz, dentro da relação processual que visa estabelecer que o direito, deve ser uno e indivisível. É o método adotado que permite atender às especiais circunstâncias do caso concreto, admite a incompletude, a capacidade de evolução e a modificabilidade do sistema, impregnando-o de dinamicidade em desenvolvimento gradual e contínuo. Aqui, não há previsão rígida de previsões normativas, havendo, portanto, espaço para a ponderação de critérios. Desse modo, segundo Pereira Filho (2016, p. 53) “(...) o artigo 139, IV do NCPC, a nosso ver, confere ao juiz a possibilidade de agir a partir da emissão de ordens vocacionadas ao cumprimento da sua decisão”.

O art. 139, IV do Código de Processo Civil, norma aberta, dá poderes ao juiz para decidir de acordo com o caso concreto qual medida será imposta ao executado ou réu para forçar o cumprimento das suas próprias ordens, inclusive as de oficio. A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados aprovou um enunciado a respeito do respectivo dispositivo legal:

“O artigo 139, IV, do CPC/2015 traduz um poder geral de efetivação, permitindo a aplicação de medidas atípicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial, inclusive no âmbito do cumprimento de sentença e no processo de execução baseado em títulos executivos e extrajudiciais”.

(ENUNCIADO 48 APROVADO NO SEMINÁRIO – O PODER JUDICIARIO E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, ENFAM).

O professor Araken de Assis declarou2 ser totalmente contrário aos poderes que foi deliberado ao juiz, segundo ele o exercício dos poderes atípicos redunda em simples arbitrariedades, aponta ainda que os limites políticos devam ser respeitados (refere-se ao princípio da responsabilidade patrimonial do devedor).

Outros juristas que se posicionaram a respeito do tema foram os juristas Lenio Streck e Dierle Nunes3, segundo eles o artigo 139, IV do CPC é uma carta branca para o arbítrio pois, para eles a nova clausula geral impõe novos desafios interpretativos que podem conduzir a uma análise superficial e utilitarista, desprezando as balizas constitucionais.

O advogado Heitor Sica, sócio do escritório Engholm Cardoso & Sica também não concorda com a ampliação dos poderes ao juiz, nas palavras dele, o artigo 139, IV do CPC “É um cheque em branco para os juízes”4, reconhece que agora os magistrados têm mais poderes para forçar o cumprimento de suas decisões, mas, entende que existem limites a respeitar.

O referido professor Araken de Assis tem uma visão literal da lei, ignora completamente a doutrina e a qualificação do devedor pelo o qual essas medidas atípicas são destinadas, existem os limites estabelecidos pelo artigo 8º do Código de Processo Civil.

No ponto, é válido trazer a colocação de Carmona (2005), ao concluir sua análise sobre a reforma da execução em 2005. Ele sugeriu que:

O passo seguinte, ainda em sede de execução, será – assim espero – a ampliação dos poderes do juiz, com a progressiva mitigação dos rigores procedimentais: a desestruturação da execução. Estou certo, é o caminho adequado para atingir o tão almejado processo de resultados.

(CARMONA, 2005, p.78)

Por se tratar de artigo que se encontra na parte geral do Código de Processo Civil somente será utilizada em caráter subsidiário em detrimento do procedimento específico, a função da clausula geral gira em torno da efetividade da tutela executiva e não no executado. Esgotados todos os procedimentos típicos previstos para a obrigação de pagar quantia é que se fará necessário a utilização da atipicidade; seria uma espécie de “ultima ratio” a ser aplicada no processo executivo ou em casos excepcionais que será tratada no capitulo seguinte. Essa é a visão de processualistas consubstanciada no enunciado 12 do FPPC:

(Arts. 139, IV, 523, 536 e 771) A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II. (Grupo: Execução).

(ENUNCIADO 12 DO FÓRUM PERMANENTE DE PROCESSUALISTAS CIVIS).

Cabe destacar que essa visão de subsidiariedade é da jurisprudência.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. TITULO JUDICIAL. ADOÇÃO DE MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS FUNDADAS NO ART. 139, IV DO CPC/2015. NÃO CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE MEDIDAS EXECUTIVAS TÍPICAS. CARATER SUBSIDIÁRIO DAQUELAS EM RELAÇÃO A ESTAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. As medidas executivas fundadas no art. 139, IV, do CPC/2015, em razão de sua atipicidade, devem ser adotadas excepcionalmente, de forma subsidiária àquelas típicas já previstas no ordenamento jurídico. É dizer, só devem ser utilizadas após esgotados todos os meios tradicionais de execução, de forma subsidiária.”

(TJ /SP, Agravo de instrumento n. 2017511-84.2017.8.26.0000, 31ª Câmara de Direito Privado. Rel. Adilson de Araújo, j. 11.04.2017).

.A noção de trabalhar a realidade de forma atípica não significa ausência de parâmetros, os critérios a ser observados pelo juiz são vários, assim se garante a segurança jurídica tanto para o credor quanto para o executado. Os critérios a serem analisados pelo juiz são os seguintes parâmetros: a) a necessidade de realização da tutela devida; b) a observância ao contraditório; c) a necessidade de fundamentação da decisão que determinou a medida executiva e d) observância do postulado da proporcionalidade levando em consideração a necessidade de efetivação da tutela e o principio da menor onerosidade do devedor.

A cláusula geral ressalta a instrumentalidade do processo e não o mero meio técnico, importante instituto jurídico, a ser empregada em eventuais fracassos da tipicidade, pois, a única forma do ordenamento jurídico está sempre em conformidade à disposição da resolução dos conflitos. Então, o art. 139, IV do Código de Processo Civil é uma garantia de conferir efetividade nas tutelas executivas por tratar todas as observâncias em relação ao executado, o melhor meio de técnica executiva aberta de acordo com a conjuntura do caso concreto.

Como bem insiste Fachin (2003, p. 30), “a relação jurídica exprime menos um meio técnico para desenhar uma exposição e mais uma ordenação conceitual para dar conta de um modo de ver a vida e sua circunstância”.

Ainda que o legislativo continue a se valer de Códigos, deixa-se de utilizar apenas a técnica casuística, admitindo-se as cláusulas gerais, permitindo o juiz considerar circunstâncias não normatizadas, para dar uma solução adequada aos casos concretos. Cabe destacar, que no Código de Processo Civil de 1973 a execução por quantia certa era estruturada exclusivamente, pela técnica casuística, porém, com o passar do tempo, tornou-se necessário munir os litigantes e o juiz de uma maior amplitude de poder, para novas situações de direito material e com as realidades concretas, seja para dar ao juiz a efetiva possibilidade de tutelá-las.

3.2. A Constitucionalidade do Art. 139, IV, do Código de Processo Civil.

A exposição de motivos para o código de processo civil 2015 elencou todas as razões para a reforma total do código de 1973; mais o ponto central que levou a essa transição foi a primordialidade da constitucionalização do processo civil em face da efetividade como premissa básica do processo como garantia da satisfação e mais rente às necessidades sociais e muito menos complexo, para afastar os obstáculos para o acesso a Justiça, a que comumente se alude, isto é, a duração do processo, seu alto custo e excessiva formalidade.

O artigo 139, IV do Código de Processo Civil está causando controvérsias por parte da comunidade jurídica a respeito do seu cabimento, pois há aqueles que entendem que as medidas adotadas entram em confronto com os direitos fundamentais do executado e por isso o referido artigo seria inconstitucional. Só que mesmo na vigência do Código de Processo Civil de 1973, o autor Marcelo Lima Guerra já defendia o seguinte posicionamento:

Na obra “Os direitos fundamentais e o credor na execução” que, na ausência de uma norma constitucional que explicite o poder-dever do juiz adotar meios não previstos em lei, este poder existia como corolário do direito fundamental à tutela executiva, em qualquer caso de prestação de tutela executiva, o juiz já estava autorizado pela Constituição a adotar os meios executivos que se revelassem necessários, ainda que não previstos em lei, para proporcionar uma integral satisfação da tutela executiva.

(GUERRA, Op. cit. p. 104).

No entendimento de Marinoni; Arenhart e Mitidieiro (2016, p. 156), “o Estado constitucional inverteu os papeis da lei e da Constituição, deixando claro que a legislação deve ser compreendida a partir dos princípios constitucionais de justiça e dos direitos fundamentais”.

Antes de entrarmos no mérito se o mencionado artigo é ou não constitucional, precisamos explicar a interpretação correta do preceito normativo: Primeiramente não possui um viés punitivo pelo contrário, se opta se premia, se corrige de forma que ajude o executado a lidar com as consequências dos seus próprios atos; não dá brecha ao executado ocultar o seu patrimônio a fim de fraudar a execução e pode até mesmo ocorrer que em virtude do princípio da menor onerosidade do devedor seja preferível o juiz adotar uma medida atípica do que a típica de forma a “prima facie”.

Ora, as controvérsias mais calorosas sempre giram em torno dos direitos fundamentais do executado, mas não devemos esquecer que o processo de execução e a fase de cumprimento de sentença são do credor como informa o artigo:

“Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados.”

(BRASIL, 2015)

A constitucionalidade se dá pelos inúmeros preceitos espalhados pela carta magna que enfatizam a harmonia com o art. 139, IV do CPC, o artigo 5º, inciso LIV (Brasil, 1988) com a seguinte redação, “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Depois de passar por cognição exauriente e decretada sentença condenatória e iniciada a fase de cumprimento de sentença ou processo de execução e exauridos todos os mecanismos típicos do sistema processual é que se fará jus aos meios elencados do inciso IV do art. 139. e o principio do devido processo legal se coaduna completamente com a regra processual, dando ao executado todas as possibilidades de contraditório e ampla defesa e meios de impugnações.

Outro instituto constitucional está expresso no caput do art. 5º, CF/ 88 que menciona:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, e à propriedade, nos termos seguintes (...).”

(BRASIL, 1988)

Declara a igualdade de todos perante a lei, como também garante essa igualdade através de outros princípios esculpidos no próprio artigo, por exemplo, o princípio da motivação das decisões (CF, art. 93, IX) a atipicidade têm que está plenamente motivada e justificada pelo juízo; o princípio da isonomia processual reconhece que se é possível à atipicidade na obrigação de fazer e não fazer é inteiramente admissível na obrigação de pagar quantia certa, pois a fragilidade do credor perante o executado exige que em nome da isonomia das técnicas processuais e da satisfação da tutela se utilize o meio que mais tem capacidade de obter o resultado prático equivalente.

Já o principio da inafastabilidade da jurisdição na Constituição Federal não é só a simples acessibilidade à justiça. Em relação à constitucionalidade se deve ao fundamento de não deixar o credor na fase mais importante do processo se contentar com o “ganhou, mas não levou” nesse momento se fará imperiosa a atuação do Estado-juiz na satisfação do crédito.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

“XXXV- a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito.”

(BRASIL, 1988)

Como já mencionado a inafastabilidade da jurisdição é dupla facie se desdobra em o direito de ingressar em juízo e o direito de torna-la efetiva. O autor Kazuo Watanabe destacou que o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, inscrito no inciso XXXV do art. 5º da CF, não assegura apenas o acesso formal aos órgãos judiciários, mas sim o acesso à Justiça que propicie a efetiva e tempestiva proteção contra qualquer forma de denegação da justiça e também o acesso à ordem jurídica justa (WATANABE, 1996).

O princípio da razoabilidade do processo elencado no art. 5º, inciso LXXVIII está intimamente ligado ao preceito normativo do art. 8º do Código de Processo Civil que reitera o uso do bom senso e que seja perpendicularmente proporcional ao que se busca exigir. As medidas coercitivas devem está em congruência com os limites estabelecidos pelo principio da dignidade da pessoa humana, tudo que fira de modo absoluto deve ser rechaçado. Por isso, não há inconstitucionalidade material no art. 139, IV do CPC até porque o mesmo privilegia vários princípios constitucionais como o princípio da efetividade do processo; da economia processual e da celeridade.

A jurisprudência já tem se manifestado a favor das medidas atípicas e a maioria se orienta no sentido de adotar o art. 139, IV do CPC conjuntamente com o art. 8º do CPC que tem a seguinte redação:

“Art. 8º. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e as exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.”

(BRASIL, 2015)

Podemos destacar que o art. 8º do CPC contém todos os critérios a serem observados pelo juízo na hora elaborar uma medida que corresponda a todas as expectativas desse dispositivo legal. Acrescento mais um critério a ser analisado: o devedor tem que ser aparentemente solvente (sinais exteriores de riquezas), lembre-se da regra do art. 797, do CPC, há situações em que o devedor, tendo possibilidade de satisfazer o seu credor, não o faz ao bel-prazer e discricionariedade, como se o adimplemento de sua obrigação estivesse condicionado ao seu próprio senso subjetivo de oportunidade e conveniência.

Analisando o parágrafo anterior fica evidente a má-fé do executado perante a Justiça, isso demonstra ser mais um indicativo que a medida executória é constitucional ela coaduna com a boa fé e não o contrário, a Constituição condena ato atentatório à justiça, a conduta se configurando atinge, em cheio o princípio constitucional da fraternidade social.

Em posição contrária, parte da comunidade jurídica entende que o artigo 139, IV do CPC de 2015 poderá tornar o instrumento perfeito para coação, para credores colocarem em prática o livre exercício das próprias razões, e que confronta o Princípio da proporcionalidade.

Por exercer função essencial à justiça a Advocacia Geral da União defende no Supremo Tribunal Federal as medidas executórias sob o argumento que o objetivo das medidas executórias é buscar a concretização de um processo mais justo, célere o atento aos reclames da sociedade, sempre com respeito ao modelo constitucional de processo, no que tange a proporcionalidade da medida estabelecida, deve ocorrer à luz do caso concreto, via controle difuso, sempre ao respeito aos preceitos da constituição federal, e em vista a adoção da medida que melhor se compatibilize aos preceitos fundamentais concretamente colidentes.

A Procuradoria Geral da República no dia 18 de dezembro de Janeiro de 2019, também emitiu parecer5 a respeito da ADI 5.941/DF, se posicionou no sentido de que as medidas atípicas devem ser empregadas de forma subsidiaria, fundamentada, mas, de caráter estritamente patrimonial, que o juiz deve excluir as hipóteses que importem em restrições de liberdade. Diante disso, opinou pela procedência do pedido da ADI.

O Supremo Tribunal Federal ainda não se manifestou formalmente a respeito da constitucionalidade do art. 139, IV do CPC, como o Partido dos Trabalhadores ingressou com ação de inconstitucionalidade do preceito normativo e o ministro Luiz Fux, relator do processo determinou a adoção do rito sumário. Destarte o ministro Luiz Fux em comemoração a 30 anos da Constituição Federal declarou que “As decisões do Supremo Tribunal Federal têm de refletir os anseios da sociedade, ou seja, do povo” 6, então, se espera que a decisão seja livre de influências políticas e prevaleça a constitucionalidade do preceito normativo, pois, segundo Donizetti7, um dos membros da comissão alteradora do Código de Processo Civil 2015, afirma exatamente isso, que o dispositivo legal expressa a constitucionalização do Direito Processual Civil, sendo a positivação do “totalitarismo constitucional”.

Apesar do STF ainda não ter se posicionado sobre o caso, mas o art. 139, IV do CPC é constitucional além do mesmo privilegiar vários preceitos constitucionais já mencionados anteriormente, o STF terá que sopesar os direitos fundamentais do exequente e do executado, a Corte parte do pressuposto que o direito fundamental individual não é absoluto.

“OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM CARÁTER ABSOLUTO. Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros. ”

STF, Pleno, RMS 23.452/RJ, Relator Ministro Celso de Mello, DJ de 12.05.2000, p. 20

Com efeito, o direito absoluto, é uma discrepância em termos, eles podem ser relativizados. Até porque geram conflitos entre si, e no caso dos direitos entre o exequente e o executado não se pode estabelecer a priori qual direito vai ganhar o conflito, pois essa questão tem que ser analisado à luz do caso concreto. Além do mais, nenhum direito fundamental pode ser usado para a prática de ilícitos e se blindar do manto constitucional para não satisfazer uma obrigação.

De acordo com André Ramos de Tavares:

“Não existe nenhum direito humano consagrado pelas Constituições que se possa considerar absoluto, no sentido de sempre valer como máxima a ser aplicada nos casos concretos, independentemente da consideração de outras circunstâncias ou valores constitucionais. Nesse sentido, é correto afirmar que os direitos fundamentais não são absolutos. Existe uma ampla gama de hipóteses que acabam por restringir o alcance absoluto dos direitos fundamentais. Assim, tem-se de considerar que os direitos humanos consagrados e assegurados: 1º) não podem servir de escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas; 2º) não servem para respaldar irresponsabilidade civil; 3º) não podem anular os demais direitos igualmente consagrados pela Constituição; 4º) não podem anular igual direito das demais pessoas, devendo ser aplicados harmonicamente no âmbito material. Aplica-se, aqui, a máxima da cedência recíproca ou da relatividade, também chamada ‘princípio da convivência das liberdades’, quando aplicada a máxima ao campo dos direitos fundamentais.”

(TAVARES, 2017 p. 528).

Devido ao conflito de normas entre direitos fundamentais entre credor e devedor o próprio Código de Processo Civil regula esta questão no seu artigo 489,§ 2º, autorizando a ponderação, além disso, o juiz deve considerar todos os elementos do caso, in verbis:

Art. São elementos essenciais da sentença:

§ 2º. No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a decisão;

§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa fé.

(BRASIL, 2015).

Portanto, se os direitos fundamentais têm, em sua maioria, a natureza de princípios, e se os princípios8 “são mandamentos de otimização em face das possibilidades jurídica e fáticas9”, ou seja, os princípios não são excluídos e sim, se afasta a aplicação de um deles, dependendo da melhor situação a ser conferida pelo caso concreto. Assim prescreve Ronald Dworkin:

A técnica da ponderação augura, precisamente, esquadrinhar metodologicamente as condições jurídicas e fáticas que subjazem aos direitos em tensão visando a construir a regra do caso.

(DWORKIN, 2010. p. 42).

É por esse percurso que o juiz da execução conseguirá avaliar se o emprego de uma medida executiva atípica importa ou não restrição insuportável ao direito fundamental do devedor.

As medidas atípicas não são novidades no ordenamento jurídico brasileiro como já mencionado no Capitulo 2 deste trabalho monográfico, já eram utilizadas no Código de Processo Civil de 1973 nas obrigações de fazer e não fazer (Artigo 461, § 5º, CPC/1973). As divergências doutrinárias são no sentido de que o cumprimento de sentença e o processo de execução deve se ter o procedimento executório típico e sempre pautado na evidência eminentemente patrimonial, não se confundindo com os direitos constitucionais do devedor.

Só que analisando o procedimento típico verificamos duas medidas típicas que estão previstas no Código de Processo Civil de execução indireta que são utilizadas na obrigação de pagar quantia, para forçar o devedor a pagar que restringem os direitos constitucionais como, por exemplo: o artigo 782 § 3º do CPC que ressalta “a possibilidade de inclusão do nome do executado nos cadastros de inadimplentes”, pois essa medida não recai sobre o patrimônio e sim em um direito fundamental; o artigo 517, CPC, admite “o protesto da sentença durante o cumprimento de sentença”, perceba que ambos os dispositivos afetam o direito de personalidade do devedor. Também na obrigação de fazer e não fazer tem o artigo 536, § 1º que é a remoção de pessoas que recai sobre o corpo do devedor. Além desses exemplos temos várias leis infraconstitucionais que utilizam o princípio da atipicidade para efetivação das decisões.

As relativizações dos direitos fundamentais sempre foram feitas e estão espalhadas em várias leis infraconstitucionais e todas elas são utilizadas para efetivar as decisões, tomando como base o critério da ponderação, para satisfazer outros direitos em conflitos igualmente consagrados na Constituição. O que se discute atualmente, como se verá, não é sua existência, mas sua aplicação na execução por quantia e seus limites.

Como vimos, o Processo Civil de 2015 se estrutura nos moldes da Constituição Federal, proporcionando a sociedade um processo justo com vários mecanismos de garantias de satisfação graças ao art. 139, IV do CPC que protege a efetividade do processo sem desonrar os princípios constitucionais, fazendo as ponderações com a razoabilidade de acordo com o caso concreto, se reveste repercutindo positivamente em várias searas do processo como instituto moral, constitucional, processual e educativo. Ainda não temos uma resposta concreta sobre a constitucionalidade do referido artigo, pois dependemos do STF para dar a anuência final.

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