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Proposições para a reforma do título recursal do Código de Processo Civil

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31/10/2005 às 00:00
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Abordaremos alguns dos projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal que tratam de temas afetos ao sistema recursal cível, ou que nele tenham reflexos.

SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Recursos cabíveis segundo o artigo 496 do Código de Processo Civil: 2.1. Apelação - 2.2. Agravo de Instrumento - 2.2.1 Decisões impugnáveis por Agravo de Instrumento - 2.2.2 Proposta para o julgamento do Agravo de Instrumento pelo Tribunal – 2.3. Embargos Infringentes – 2.4 Embargos de Declaração – 2.5 Recurso Ordinário- 2.6 Recurso Especial e Recurso Extraordinário – 2.7 Embargos de Divergência – 2.8 Da Ordem dos Processos no Tribunal – 3. Processo Cautelar e Mandado de Segurança - 4. Julgamento do recurso por decisão singular do relator: Considerações de índole constitucional – 5. Propostas apresentadas pelo Ministério da Justiça - 6. Conclusão.


1) INTRODUÇÃO

            O artigo 496 do Código de Processo Civil admite a interposição de oito espécies de recurso: a apelação, o agravo, os embargos infringentes, os embargos de declaração, o recurso ordinário, o recurso especial, o recurso extraordinário e os embargos de divergência em recurso especial e em recurso extraordinário.

            O excessivo número de recursos, por certo, vem, há muito, prejudicando um célere desenlace das ações.

            Dispensam-se maiores considerações sobre as mazelas do processo civil brasileiro e a lentidão que dela advém; questão que não pode ser resolvida unicamente com a elevação do número de magistrados em atuação no País.

            A seguir, com o escopo de facilitar e acelerar a marcha processual, abordaremos os diversos recursos, com sugestões de modificações na legislação que resultem em um andamento processual mais rápido.

            Abordaremos também, no presente trabalho, alguns dos projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal que tratam de temas afetos, ou que tenham reflexos no sistema recursal cível.


2) RECURSOS CABÍVEIS SEGUNDO O ARTIGO 496 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

            2.1) APELAÇÃO.

            É o principal recurso contido na legislação processual. Quanto a ele não se propõe nenhuma alteração substancial, nem mesmo aquelas destinadas a dificultar o manejo do recurso, ou o seu recebimento no duplo efeito, posto que o duplo grau de jurisdição é salutar e não deve sofrer restrições.

            Assim, as proposições contidas no Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 140/ 2004, que acrescenta parágrafo ao artigo 518 do CPC, permitindo ao juiz que não receba a apelação quando a decisão recorrida estiver em acordo com decisão ou súmula de tribunais superiores, e no PLS 136/2004, que altera o artigo 520 do CPC, para que a apelação só tenha efeito devolutivo, atribuindo ao juiz a possibilidade de lhe conferir efeito suspensivo para evitar dano irreparável (no mesmo sentido o PL 3605 da Câmara), de fato, poderão retardar mais o deslinde da ação.

            Isto porque, contra a decisão que inadmitir o recurso ou lhe atribuir apenas o efeito devolutivo, caberá agravo de instrumento, inclusive na forma da nova redação proposta ao artigo 522 do CPC.

            Ora, com a habitual utilização desse recurso no direito brasileiro e, também, com a acolhida que ele costuma receber nos tribunais, a situação que se terá, costumeiramente, é a de, além de julgar a apelação, julgar também o tribunal o agravo de instrumento interposto contra a decisão que inadmitir a apelação ou restringir seus efeitos.

            Melhor seria, para atender àqueles que clamam pelas mudanças estampadas nas proposições indicadas, o acréscimo de artigo no Capítulo II, do Título X, do CPC, com o seguinte teor:

            "O tribunal, ao aferir os pressupostos recursais, não conhecerá o recurso de apelação, quando a decisão recorrida estiver de acordo com a súmula do respectivo Tribunal ou dos Tribunais Superiores em sentido igual à decisão recorrida".

            Desse modo, adota-se a observância à jurisprudência sólida dos Tribunais, sem que se tenha o risco da discussão repetitiva do tema, em agravo de instrumento, e depois, em recurso de apelação, além de se respeitar o princípio do duplo grau de jurisdição.

            Para Barbosa Moreira :

            "As notas típicas da apelação, e sobretudo a oportunidade que ela em regra abre – mais do que qualquer outro recurso – ao exercício de ampla atividade cognitiva pelo órgão ad quem, permitem considerá-la como o principal instrumento por meio do qual atua o princípio do duplo grau de jurisdição". Comentários ao Código de Processo Civil – Vol. V – 11ª edição – Editora Forense- Página 406.

            Sendo a apelação o principal recurso e aquele em que se manifesta o princípio do duplo grau de jurisdição, restrições ao seu recebimento devem ser rebatidas.

            Desse princípio, parte também conclusão inafastável, contrária ao Projeto de Lei do Senado nº 133/04. Essa proposição introduz quatro parágrafos ao artigo 293 do CPC, dispondo sobre a progressividade dos juros. Sugere-se, por exemplo, que o não recebimento ou o não provimento do recurso importe "na cobrança de juros em dobro a partir da data de sua interposição". Sugere-se também, o cômputo dos juros em triplo, em determinadas situações.

            Ora, essa proposição coíbe a justa e legítima interposição de um recurso, mesmo que ele não venha a ser provido ou conhecido e deve ser rejeitada.

            O combate a "recurso com intuito manifestamente protelatório" e a possibilidade de se penalizar sua utilização, já tem previsão no artigo 17, VII, do CPC, que cuida da litigância de má-fé, além de outros dispositivos.

            A questão não é coibir o duplo grau de jurisdição, mas sim criar mecanismos para que a grande maioria dos processos tenha solução, quando muito, na segunda instância.

            Nesse passo, oportuna a abordagem da matéria contida no Projeto de Lei do Senado nº 134/2004, ainda que a proposição não disponha sobre alteração em artigo do sistema recursal do CPC, que é o objeto primeiro desse estudo.

            A possibilidade de indeferimento da petição inicial, extinguindo o processo com julgamento de mérito, segundo o projeto, "quando o pedido estiver em confronto com súmula do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores ou do Tribunal a quem o recurso será interposto" parece-me inadequada, pela mesma motivação já exposta. Vale dizer, o Projeto de Lei possibilita a discussão não definitiva de enquadramento do caso a uma súmula. Indeferida a inicial com fulcro na norma proposta, o provimento de eventual recurso de apelação implicará o retorno dos autos para a instância de origem para prosseguimento e julgamento, em evidente retardamento do deslinde final da ação.

            Por outro lado, a situação comumente verificada não é de ingresso de ação com pedido contrário à orientação de súmula, mas, de contestação e postergação de ação, cujo pedido esteja em sintonia com súmula. De fato, pouco se vê requerimento contrário a ela, mas sim contestação a um direito por ela amparado.

            2.2) AGRAVO

            Talvez seja o recurso mais utilizado no direito brasileiro. Na forma atual, muito contribui para sobrecarregar a pauta de julgamento dos tribunais.

            A redação atual dos artigos 522 a 529 possibilita, diferentemente do que ocorria antes da Lei 9.139/95, a interposição do agravo diretamente no tribunal, com possibilidade de deferimento, pelo relator, de efeito suspensivo ou antecipação de tutela.

            Essas duas modificações foram decisivas para que o manejo do agravo de instrumento se desse contra uma infinidade de decisões de primeiro grau. Hoje, mesmo se a parte é agravada com prejuízo de pouca monta, até insignificante, vale-se usualmente do agravo de instrumento. O custo é pequeno e a possibilidade de êxito, mesmo remota, não costuma ser desprezada.

            Por isso, as modificações mais urgentes que se devem introduzir no sistema recursal, encontram abrigo no agravo de instrumento. A restrição à sua utilização e a adoção de uma sistemática célere para seu julgamento, importarão em maior velocidade no andamento do processo em primeira instância e na diminuição dos recursos que devam ser julgados, em colegiado, pelos tribunais.

            Se, na apelação, devem ser prestigiados o duplo grau de jurisdição e a decisão colegiada, nos agravos, que impugnam as decisões interlocutórias proferidas na condução do processo, a situação deve ser outra.

            O CPC, em seus artigos 522, 532, 544 e 545, admite a utilização do agravo, em quatro modalidades diversas. São elas: o agravo retido nos autos, o agravo de instrumento contra decisão proferida em primeiro grau, o agravo de instrumento contra decisão que inadmite recurso especial ou extraordinário e o agravo interno.

            Com mais ênfase, cuidaremos do agravo previsto no artigo 522 do CPC, grande responsável pela paralisação dos processos em primeira instância e elevação do número de recursos julgados pelos tribunais.

            Como praticamente todas as decisões são atacáveis por agravo de instrumento, com possibilidade de atribuição do efeito suspensivo de que cuida o artigo 527, III, do CPC, há uma inegável banalização em sua utilização em claro prejuízo ao andamento do processo, que por repetidas vezes, tem sua marcha retardada em razão do julgamento do recurso.

            Barbosa Moreira, enfatizando que as questões colocadas à apreciação do órgão judicial "não são resolvidas em bloco, mas pouco a pouco", destacou:

            "

Daí o problema delicado que se põe ao legislador, quanto à impugnação das decisões que vão sendo proferidas ao longo do feito. Há duas soluções radicais, diametralmente opostas: uma consiste em negar a possibilidade de impugnar-se qualquer interlocutória, reservada ao recurso que couber contra a decisão final a função de acumular em si todas as impugnações, seja qual for a matéria sobre que versem; outra, em tornar desde logo recorríveis as interlocutórias, cada uma per si, de modo que a revisão pelo juízo superior se faça também paulatinamente, questão por questão, à semelhança do que ocorre na primeira instância, e à proporção que o processo vai atravessando, nesta, as suas diferentes fases.

            Ambos os regimes têm suas vantagens e desvantagens. O primeiro decerto evita as perturbações, delongas e despesas que a reiterada interposição de recursos, com o conseqüente processamento, fatalmente acarreta para a marcha do feito; o segundo abre margem a esse grave inconveniente, mas, em compensação, enseja a correção rápida de erros suscetíveis, em certos casos, de causar danos que já não poderiam ser reparados, ou que dificilmente o seriam, se se tivesse de aguardar o término do procedimento de primeiro grau para denunciá-los. A via média consistiria em discriminar, dentre as numerosas decisões interlocutórias, aquelas que por seu objeto, reclamassem pronto exame, e aquelas que comportassem mais longa espera, criando para as duas classes regimes diversos". Comentários ao Código de Processo Civil – Vol. V – 11ª edição - Editora Forense - Páginas 484/485.

            É fato que na forma como está hoje o agravo de instrumento não se presta a conferir segurança e celeridade ao andamento processual.

            Uma sugestão radical para conferir celeridade ao processo seria simplesmente abolir a figura do agravo de instrumento, mantendo-se tão somente o agravo retido. É possível, todavia, uma solução que atenda à celeridade e à segurança.

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            2.2.1) DECISÕES IMPUGNÁVEIS POR AGRAVO DE INSTRUMENTO

            É desejável uma ampla restrição à utilização do agravo de instrumento. Porém, afigura-se difícil nomear e separar na legislação aquela situação específica em que caberia cada um dos agravos, de instrumento ou retido.

            Introduzindo modificações no Projeto de Lei do Senado 137/2004, de autoria do Senador Pedro Simon, em que já se busca restringir em caráter genérico a utilização do agravo de instrumento, pode-se encontrar a solução adequada para interposição e julgamento do recurso.

            O que se deve buscar não é só a restrição à utilização do recurso, mas também, e essencialmente, seu rápido julgamento.

            É esse o teor do Projeto de Lei a que aludimos:

            "

Art. 1º O art. 522 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, terá a seguinte redação":

            "Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo na forma retida, salvo quando se tratar de provimento jurisdicional de urgência ou houver perigo de lesão grave e de difícil ou incerta reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento."

            "Art. 2º Suprima-se o parágrafo 4º do art. 523 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil".

            "Art. 3º O inciso II do art. 527 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, terá a seguinte redação":

            "Art. 527.. ...................................................................

            I –. ..............................................................................;

            II – converterá o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de provimento jurisdicional de urgência ou houver perigo de lesão grave e de difícil ou incerta reparação, remetendo a respectiva petição ao juízo da causa, onde será juntada aos autos, desprezando-se as peças que formaram o instrumento, não cabendo recurso dessa decisão;".

            Com conteúdo semelhante, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 3578/2004, de autoria do Deputado Maurício Rands.

            O texto desses projetos ainda dá margem à interposição do recurso em larga escala, além de não dispor sobre a forma mais rápida para seu julgamento. Ademais, prestigia a decisão singular do relator, não impugnável por outro recurso, sem atentar para as conseqüências da proposta.

             Em virtude da dificuldade na nomeação taxativa das hipóteses em que caberia um ou outro agravo, a manutenção da redação conferida ao caput do artigo 522 pelo projeto é viável, incluindo, todavia, o prazo para interposição do recurso, de 10 (dez) dias, suprimido da redação atual e esquecido na nova proposta.

            Não se deve acolher, entretanto, as tímidas alterações que se propõe ao artigo 527 do CPC. Esse dispositivo deve ter sua redação totalmente remodelada, de modo criar o julgamento singular do agravo de instrumento no tribunal.

            2.2.2) PROPOSTA PARA O JULGAMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO PELO TRIBUNAL

            A sugestão adiante esboçada implica a adoção de uma sistemática em que o agravo de instrumento passa a ser julgado por decisão singular do relator.

            A proposição contida no PLS137/2004 e no Projeto de Lei 3578/2004, da Câmara dos Deputados, limita-se a autorizar a conversão do agravo de instrumento em agravo retido, em decisão que não poderá ser atacada por outro recurso. Nossa sugestão é a de que o agravo de instrumento seja julgado, em qualquer situação, por decisão singular.

            Há orientação na jurisprudência do STF e na doutrina de que a decisão singular do relator nos recursos é possível, desde que haja submissão dessa decisão ao colegiado. Essa linha mira mais a apelação, mas alcança o agravo de instrumento.

            Nas linhas seguintes, vamos dar forma e justificar a proposta. Ao final, trataremos da questão da constitucionalidade, propondo, para se afastar eventual vicio dessa grandeza, a modificação necessária na Constituição Federal.

            Indicamos, então, a seguinte redação ao artigo 527 do CPC:

            "Art. 527 – O julgamento do agravo de instrumento no tribunal dar-se-á por decisão monocrática do relator, observando-se o seguinte:

            I - o relator poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;

            II - se concluir que o recurso é manifestamente inadmissível ou improcedente, ou que o caso é de indeferimento do efeito suspensivo ou da antecipação da tutela, o relator negará seguimento ao recurso, liminarmente; ou o converterá em agravo retido, remetendo a respectiva petição ao juízo da causa, onde será juntada aos autos, desprezando-se as peças que formaram o instrumento;

            III– procedendo-se na forma do inciso I, e superadas as fases previstas nos incisos IV, V e VI, o relator julgará o recurso por decisão monocrática; se lhe der provimento poderá, em decisão sucinta, confirmar os termos do efeito suspensivo ou da antecipação da tutela e reformar a decisão; se lhe negar provimento revogará o efeito suspensivo ou a antecipação da tutela e determinara o arquivamento do recurso.

            Mantém-se a atual redação dos incisos IV, V e VI do artigo 527, acrescentando-lhe, todavia, um novo parágrafo, que confira definitividade ás decisões proferidas em agravo de instrumento. Assim, o atual § único passaria a ser o § 1º, introduzindo o § 2º, nesses termos:

            "§ 2º – Contra as decisões proferidas pelo relator em agravo de instrumento não cabe qualquer recurso ou outra medida judicial visando sustar seus efeitos".

            Esse dispositivo tem por propósito promover o julgamento definitivo da questão com a decisão do relator, de modo a não prolongar a solução final relativa à decisão interlocutória. Penso que, assim, estaremos diante da "via média" a que aludiu Barbosa Moreira, não quanto às decisões atacáveis pelo recurso, mas quanto à forma de julgá-lo. Se a decisão que julgar o agravo de instrumento não puder ser atacada por qualquer recurso, inclusive especial ou extraordinário, e não puder ter seus efeitos suspensos por medida cautelar, a definição quanto á questão interlocutória será mais célere.

            Para conferir maior segurança às decisões tomadas em virtude da redação proposta ao artigo 527 do CPC, penso que, nas peças obrigatórias que instruem o agravo de instrumento, mencionadas no artigo 525, I, do CPC, deverá ser acrescida a petição inicial e a contestação, ou outra defesa, se houver.

            Na abordagem ao recurso especial e ao recurso extraordinário novamente serão apontadas alterações no CPC para conferir eficácia definitiva a decisão singular do relator.

            2.3) EMBARGOS INFRINGENTES

            O presente estudo não propõe nenhuma alteração de relevo aos embargos infringentes. Mas, firme no propósito de que as decisões singulares do relator são meros trampolins que conduzem a outros recursos, quando impugnáveis, melhor seria deixar a questão da admissibilidade do recurso, de que cuida o artigo 531 do Código, diretamente para o colegiado apreciar, de modo a se evitar a decisão singular do relator e depois a decisão do colegiado.

            Ou então, que se confira eficácia plena á decisão do relator que inadmite os infringentes, impedindo sua impugnação por outro recurso.

            2.4) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

            Os embargos de declaração, na forma atual, cuja interposição é amplamente admitida, e por mais de uma vez, em muito retardam a solução definitiva do processo.

            Uma solução radical, mas atraente, seria abolir do Código de Processo Civil esse recurso (mantendo-o somente na Lei 9.868/99). O inconveniente da medida é o reflexo que teria no julgamento do recurso especial ou extraordinário.

            Afastado o manejo de embargos de declaração na segunda instância, com o propósito de criar condições ao recurso especial ou ao extraordinário, todaa sistemática do pré-questionamento e da admissibilidade dos recursos extremos haveria de ser revista.

            Extintos os embargos de declaração, as disposições do CPC que cuidam do recurso extraordinário e do especial precisariam ser adequadas à novidade, disciplinando como as matérias não abordadas pelo acórdão, ou aquelas que sofram abordagem diversa da conferida pelas partes, seriam apreciadas à luz do recurso especial ou extraordinário.

            Sugerimos a inclusão de artigo na Seção II, do Capítulo VI, do Título X do CPC com teor semelhante ao abaixo indicado:

            "Somente a matéria amplamente levantada pelas partes antes da decisão da ação no tribunal recorrido poderá ser objeto do recurso especial ou extraordinário, ainda que o acórdão não a tenha abordado".

            Afastado o manejo dos declaratórios, mesmo aquelas questões levantadas pelas partes, mas não apreciadas pelo acórdão, poderão ser objeto dos recursos extremos. Do contrário, teríamos duas situações que devem ser combatidas. Ou o prejuízo ao recorrente pela omissão do tribunal recorrido, ou a nulidade da decisão, que implicaria sua repetição.

            Abrindo a possibilidade de análise das questões discutidas nos autos pelo STJ ou pelo STF, mesmo que o tribunal de origem não as aprecie, ou lhes dê solução diversa daquela discutida, torna-se viável a extinção dos embargos declaratórios.

            Alternativamente à extinção dos embargos de declaração, propomos a redação abaixo indicada aos artigos que cuidam do recurso, introduzindo, ainda, no diploma processual, o artigo 535 A, de modo a que sua utilização se restrinja aos acórdãos que julguem recurso de apelação:

            "Art. 535:

            I – houver, no acórdão que julga recurso de apelação, obscuridade ou contradição;

            II – for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar o tribunal ao julgar o recurso de apelação".

            "Art. 535 A- Os embargos de declaração podem ser opostos uma única vez contra acórdão que julga recurso de apelação e não são cabíveis contra sentenças, decisões interlocutórias, outros acórdãos ou quaisquer outras decisões dos tribunais, ressalvada sua utilização nos termos do artigo 26, da Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999".

            Do artigo 536 deverá ser suprimida a palavra "juiz", mantendo-se somente "relator".

            A primeira parte do artigo 537, que confere prazo ao juiz para julgar os embargos, deve ser suprimida.

            Inovando ainda mais, pode-se adotar forma de julgamento mais rápida dos embargos de declaração, conferindo ao relator a possibilidade de rejeitar os embargos em decisão singular, dando ao artigo 537 a redação abaixo:

            "Art. 537 – O relator poderá negar provimento aos embargos em decisão monocrática, não impugnável por outro recurso, ou poderá apresentá-los, em mesa, na sessão subseqüente, proferindo seu voto".

            Sugere-se com esse dispositivo uma forma célere de julgamento dos embargos de declaração no tribunal, permitindo ao relator sua rejeição por decisão monocrática, posto que, nesse caso, nada seria aclarado ou alterado na decisão colegiada.

            Na hipótese de se prover os embargos, quem deverá se manifestar é a turma que julgou o recurso e proferiu o acórdão embargado.

            A sugestão alternativa restringe o manejo dos embargos aos acórdãos que julguem, em segunda instância, recursos de apelação, de modo a evitar a utilização excessiva ou a repetição dos embargos e é uma opção à extinção do recurso. Ela também implica na revogação do inciso II, do artigo 463, do CPC.

            Nas duas situações é preciso que se analise o cabimento dos embargos de declaração com apoio no artigo 26 da Lei 9.868/99, sendo recomendável sua permanência, já que nas ações de que cuida essa lei descabe qualquer outro recurso e os embargos se mostram úteis a corrigir eventual falha.

            2.5) RECURSO ORDINÁRIO

            O presente estudo não propõe nenhuma alteração relevante no recurso ordinário. Eventual proposição para modificá-lo será resultante de sugestão afeta a outro recurso e nas considerações sobre ele será abordada.

            2.6) RECURSO ESPECIAL E RECURSO EXTRAORDINÁRIO

            Para a boa celeridade processual, a utilização desses recursos deve ser restringida. Propõe-se, assim, a supressão da alínea c, do inciso III, do artigo 105 da CF, afastando a interposição de recurso especial por divergência de interpretação de lei federal. Se o próprio STJ tiver decidido de modo contrário à decisão recorrida, o recurso especial há de prosseguir por ofensa à legislação federal, sem que o recorrente tenha que se valer de dissídio jurisprudencial.

            Além disso, o recurso especial fincado na divergência já sofre hoje a limitação advinda da súmula 83 do STJ e, pelo seu caráter abrangente, deve ser afastado.

            No âmbito do CPC, cabe revogação do § único do artigo 541 que cuida de recurso amparado em dissídio jurisprudencial, a manutenção com a atual redação dos artigos 543 e 544 e alteração em seu artigo 545, cuja redação proposta é a seguinte:

            "Art. 545 – Da decisão do relator que não admitir o agravo de instrumento, interposto com amparo no artigo 544, ou negar-lhe provimento, não cabe qualquer recurso; da decisão do relator que reformar o acórdão recorrido, caberá agravo no prazo de 5 (cinco) dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso".

            O recurso especial e o recurso extraordinário são interpostos normalmente contra decisão proferida em segunda instância. O caso já passou pelo crivo da turma julgadora e da Presidência ou Vice-Presidência do tribunal de origem, que inadmitiu o recurso especial ou extraordinário. Portanto, a manutenção da decisão, pelo ministro relator, não deve ser atacada por qualquer outro recurso, porque, de certo modo, corrobora duas decisões anteriores sobre a questão.

            Do contrário, se o recurso for provido pelo ministro relator na apreciação de agravo de instrumento contra decisão que o inadmitiu, na forma do § 3º, do artigo 544, do CPC, continuará sendo possível o manejo do agravo de que cuida o artigo 545 do CPC.

            Tal qual na proposição que se fez ao artigo 527, cria-se na redação proposta ao artigo 545 a possibilidade de decisão singular do relator, não impugnável por recurso. Diferentemente da decisão no agravo de instrumento que julgará questão interlocutória, a decisão proferida com apoio na redação sugerida para o artigo 545 ultimará a causa. Assim, considerações sobre a constitucionalidade do tema serão articuladas nos tópicos seguintes.

            Outro enfoque que deve ser abordado é aquele afeto à possibilidade de interposição de recurso especial ou extraordinário contra decisão que julgar agravo de instrumento em segunda instância.

            A Constituição Federal, em seus artigos 102, III e 105, III, confere competência ao STF e ao STJ para julgarem, em recurso extraordinário ou especial, "as causas decididas em única ou última instância".

            Consoante definição de De Plácido e Silva em seu clássico Vocabulário Jurídico:

            "Causa. Na técnica processual, causa se confunde com a demanda. Empregam-se como vocábulos equivalentes. E esta acepção vem de que a causa é o fundamento legal do direito que se quer fazer valer perante a autoridade judiciária. Causa, a razão, extensivamente passou a designar o processo judicial que, por ele, a causa, a razão, o motivo, é intentado, sendo, pois, equivalente a litígio". 24ª edição - Editora Forense – Página 277.

            Causa, pois, já é a demanda. A redação atual da CF não é clara em autorizar os recursos extremos quando a causa ainda não for decidida, como ocorre com as decisões interlocutórias.

            Se se busca a extinção de qualquer dúvida, pode-se substituir a expressão "causas decididas", nos dois artigos, por "ações decididas", de modo a obstar os recursos extremos, contra as decisões dos tribunais, resultantes da apreciação de recurso oposto contra decisão interlocutória de instância inferior.

            Também pode ser evitado o manejo dos recursos nessa situação modificando o § 3º, do artigo 542, do CPC, cuja redação proposta seria :

            "§ 3º - Não cabe recurso extraordinário ou recurso especial contra decisão que, em grau de recurso, tenha apreciado decisão interlocutória de instância inferior; aquele que não se conformar com a decisão, sob pena de preclusão, peticionará de forma sucinta ao relator, expondo suas razões e requererá, por ocasião da interposição de recurso extraordinário ou especial, que a questão seja apreciada".

            Afasta-se o manejo do recurso especial e do extraordinário, mas cria-se um mecanismo para se evitar a preclusão, possibilitando a apreciação da questão nos tribunais superiores.

            A redação sugerida a esse parágrafo reforça a determinação contida no parágrafo segundo que propusemos ao artigo 527 e prevê uma formula em que a questão pode ser levada aos tribunais superiores, sem o formalismo da interposição de um recurso que fique retido, como é hoje, em virtude da atual redação do § 3º, do artigo 542, do CPC.

            Bastará, pela proposição, uma simples petição, para que, quando da interposição de um recurso especial ou extraordinário contra a decisão final, a questão interlocutória seja apreciada. Essa sugestão afasta a exigência de interposição e de processamento de dois recursos, como ocorre hoje em casos em que se ataca a decisão interlocutória e a final.

            2.7) EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA

            Os embargos de divergência são necessários e constituem importante instrumento para consolidação da jurisprudência. Por isso, sua manutenção afigura-se relevante.

            Se o acórdão que julgar os embargos de divergência não puder ser objeto de embargos de declaração, como propusemos em tópico anterior, já se terá dado grande passo para o encerramento do processo.

            2.8) DA ORDEM DOS PROCESSOS NO TRIBUNAL

            Adequando-se às modificações propostas nos tópicos antecedentes, os artigos abaixo indicados, do Capítulo VII, do Título X, do Livro I, do CPC, passariam a ter a seguinte redação:

            2.8.1) "Art. 555 – No julgamento de apelação ou de agravo retido, a decisão será tomada, na câmara ou turma, pelo voto de três juízes".

            No julgamento do agravo retido, seja daquele originariamente proposto como tal, ou do que foi convertido pelo relator, o julgamento continua afeto à turma julgadora e se dará juntamente com a apelação.

            2.8.2) "Art. 558 - O relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até que decida o recurso".

            2.8.3) "Art. 559 – A apelação não será incluída em pauta antes da decisão de agravo de instrumento interposto no mesmo processo".

            2.8.4) Ao artigo 560 do CPC, propõe-se o acréscimo de novo parágrafo, com a seguinte redação:

            "O tribunal poderá determinar, em diligência, a produção ou o esclarecimento de prova, ordenando a remessa dos autos ao juiz, devolvendo-os ao tribunal, após o cumprimento da diligência no prazo assinalado".

            A razão dessa sugestão é possibilitar que o tribunal suspenda o julgamento de apelação, acolhendo agravo retido (por origem ou de instrumento que o relator tenha convertido) interposto contra decisão que indeferiu a produção de determinada prova e ordene, em diligência, a produção dessa prova, retomando em seguida o julgamento da apelação. Evita-se, assim, que a sentença seja cassada e que se produza a prova, proferindo o juiz nova sentença, que por sua vez será objeto de novo recurso.

            Pela sugestão, o tribunal deverá conhecer diretamente a prova, caso determine a sua realização. A produção dessa prova terá importância para o deslinde da ação no tribunal. O juiz, ao indeferi-la, não a considerou relevante, o que justifica a adoção da regra.

            De certo modo, guarda alguma semelhança essa sugestão com aquela que se quer introduzir por meio do Projeto de Lei 1797/2003 da Câmara dos Deputados, que propõe a introdução do artigo 521 A, ao CPC.

            Esse projeto obteve parecer do relator pela rejeição, na forma em que foi proposto, por repisar disposição já contida na norma processual sobre nulidade.

            2.8.5) Artigo 557 do CPC

            Esse artigo merece destaque no sistema atual, pois permite que o relator negue seguimento ao recurso, por decisão monocrática, em casos específicos. Essa regra, com utilização mais apropriada ao agravo de instrumento e nos tribunais superiores, apesar da inegável intenção de conferir rapidez ao julgamento do recurso, não o fez, porque, ao mesmo tempo em que dotou o relator de poderes para negar seguimento ao recurso, sujeitou a decisão ao crivo da turma julgadora em seu parágrafo primeiro. Tal fato só se justifica para afastar a alegação de inconstitucionalidade no julgamento dos recursos, consoante jurisprudência do STF.

            Na proposta de alteração dos artigos 527, 537 e 545, faculta-se ao relator o julgamento singular. Portanto, adotadas as sugestões desse estudo o artigo 557 passa a ser desnecessário. No tocante à apelação, sua utilização já é reduzida e deve ser afastada, mantendo-se quanto a ela a forma atual de julgamento.

            Restam os recursos ao STF e ao STJ, em que, nos julgamentos, podem-se adotar os princípios do artigo 557, por força de outros dispositivos da legislação processual. Porém, com a acolhida das alterações ora propostas, de pouca utilidade passa a ser o dispositivo. Desse modo, a melhor solução seria a revogação do artigo 557 do CPC.

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Sobre o autor
Roney Oliveira Junior

procurador do Estado de Minas Gerais, advogado em Belo Horizonte (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA JUNIOR, Roney. Proposições para a reforma do título recursal do Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 850, 31 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7493. Acesso em: 19 abr. 2024.

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