Inquérito policial:enfoque no uso da interceptação telefônica.

Direitos e garantias constitucionais do investigado

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07/11/2019 às 09:50
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O tema em estudo foi delimitado em um breve aspecto constitucional, passando por conceitos, e um estudo esquematizado acerca da interceptação telefônica os direitos dos investigados são ou não respeitados em uma diligência processual.

 

 

RESUMO

O tema em estudo foi delimitado em um breve aspecto constitucional, passando por conceitos, e um estudo esquematizado acerca da interceptação telefônica os direitos dos investigados são ou não respeitados em uma diligência processual. Assim no decorrer do projeto foi abordado os preceitos para a eficiência, eficácia e efetividade da interceptação telefônica, uma breve analise da atividade da polícia no curso da investigação criminal, identificação das situações que podem ser admitas a interceptação e analisar os métodos legais que são utilizados para gravar, escutar, sem atingir os direitos do investigado garantidos na Carta Magna de 88. Portanto, inconformado com os meios investigatórios e erros por parte do órgão que devia investigar, respeitando todos os direitos outorgados pela Carga Magna, vez que, nos dias de hoje a interceptação telefônica é utilizada com uma finalidade especifica, e por isso, somente isso foi autorizada pelo juiz, mas acabe sendo utilizada para outros fins.

Palavras-chave: Interceptação Telefônica. Direitos. Investigados.

CEREZA, Renan Oliosi. Inquérito Policial – enfoque no uso da interceptação telefônica: direitos e garantias constitucionais do investigado. 60fls: Monografia (Bacharelado em Direito). Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim-FDCI: Cachoeiro de Itapemirim, 2016.

ABSTRACT

The subject under study was defined in a brief constitutional aspect, through concepts, and a study outlined on the telephone interception rights of the investigated are not respected in a procedural step. So during the project was discussed the principles for efficiency, efficacy and effectiveness of telephone interception, a brief review of police activity in the course of criminal investigation, identification of situations that can be admitas intercepting and analyzing the legal methods that are used to record, listen, without affecting the rights guaranteed investigated the Charter of 88. Therefore, unhappy with the investigative means and errors by the body that should investigate, respecting all rights granted by the load Magna, as in the days of today the telephone interception is used with a specific purpose, and therefore, only it was authorized by a judge, but end up being used for other purposes.

Keywords: Trapping Telefonica. Rights. Investigated.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

 

CPC - Código de Processo Civil ....................................................................... xx

CPP - Código de Processo Penal ...................................................................... xx

CRFB/88 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 .................. xx

CCB - Código Civil Brasileiro ......................................................................... xx

CP - Código Penal ........................................................................................... xx

STJ - Superior Tribunal de Justiça .................................................................... xx

STF - Supremo Tribunal Federal ...................................................................... xx

Art. - Artigo .................................................................................................... xx

SUMÁRIO

Resumo

Abstract

INTRODUÇÃO................................................................................................10

1 DA PROVA....................................................................................................11

1.1 Aspectos constitucionais..............................................................................11

1.2 Conceito de Prova.........................................................................................14

1.2.1 Objeto da Prova.................................................................................15

1.2.2 Meios de Prova..................................................................................17

1.2.3 Ônus da Prova...................................................................................19

1.2.4 Sistema de apreciação das Provas.....................................................21

1.2.5 Direito e restrições a Prova...............................................................23

1.2.6 Inadmissibilidade das provas ilícitas.................................................23

1.2.7 Teoria dos frutos da árvore envenenada............................................25

1.2.8 Teoria do encontro fortuito de provas................................................28

2 INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA...........................................................29

2.1Conceito de interceptação telefônica.............................................................29

2.2 Diferenciações entre Interceptação Telefônica Escuta telefônica e Gravação Clandestina...30

2.2.1 Natureza jurídica da Interceptação telefônica...................................34

2.2.2 Requisitos para a Interceptação telefônica........................................35

3 DOS DIREITO DO INVESTIGADO..........................................................42

3.1 Da tutela Jurídica do Direito à intimidade....................................................42

3.1.1 (IN) admissibilidade da Interceptação telefônica como meio de prova....44

3.1.2 A admissibilidade da Interceptação telefônica pro reo.....................46

3.1.3 A admissibilidade da Interceptação telefônica pro societate............47

4 CONCLUSÃO................................................................................................51

REFERÊNCIAS................................................................................................53

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo a análise da lei 9.296/96, que trata das Interceptações Telefônicas, e consequentemente do inciso XII do artigo 5º da Carta Magna de 88, que deu origem a referida legislação supracitada.

Constituirão o desenvolvimento da pesquisa os aspectos doutrinários, jurisprudência e suas repercussões no processo penal. Já que o artigo 5º inciso XII trata do sigilo de correspondência e telecomunicações, direito a liberdade e privacidade preservada.

Para estabelecer a discussão acerca da interceptação que será desenvolvida no presente trabalho, é indispensável se estabelecer o conceito de prova. 

Nesse sentido, o doutrinador Vicente Greco Filho[1] entende que “A finalidade da prova é o convencimento do juiz, que é o seu destinatário”. No processo, a prova não tem um fim em si mesmo ou um fim moral ou filosófico: sua finalidade prática, qual seja, convencer o juiz. Não se busca a certeza absoluta, a qual, aliás, é sempre impossível Guimarães, expõe que prova é “todo meio legal, usado no processo, capaz de demonstrar a verdade dos fatos alegados em juízo”.

Portanto está inserida a discussão da interceptação telefônica, posto que se trata, de um importante meio de prova, que, no entanto, atinge o direito ao sigilo  das conversas telefônicas estabelecido no artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal (CF/88). 

CAPÍTULO 1

 

DA PROVA

 

1.1 Aspectos Constitucionais

Antes da Constituição de 88, a Carta Magna de 1967/69, ou seja, para uns, emenda de 69, assegurava o sigilo das comunicações de uma maneira integral, com exceções das hipóteses de estado de sítio e de estado ou medidas de emergência (art. 156, § 2º; art. 158, §1º, e art. 155).

Desta forma, estabelecia o art. 57 do Código Brasileiro de Telecomunicações, Lei n.º 4.117/62, que admitia a violação das comunicações telefônicas, para fins de investigação criminal ou instrução em processo penal, desde que previamente autorizada pela autoridade judicial competente, não configurando, assim, o crime de Violação de comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica disposto no Código Penal, senão vejamos:

Art. 151. “Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada, dirigida a outrem:

“Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa”.

§ 1º - Na mesma pena incorre:

(...)

II - quem indevidamente divulga, transmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telegráfica ou radioelétrica dirigida a terceiro, ou conversação telefônica entre outras pessoas; (grifo nosso)

III - quem impede a comunicação ou a conversação referidas no número anterior;

IV - quem instala ou utiliza estação ou aparelho radioelétrico, sem observância de disposição legal.

Desse contexto nota-se, que, existia um conflito aparente entre a CF/69 e a citada lei ordinária, sendo que o entendimento era no sentido de que não era recepcionada por aquela o disposto no Código Brasileiro de Telecomunicações.

A Lei nº 4.117/62, assim como outras normas legais que traziam exceção ao sigilo da correspondência e das comunicações, foram protestadas por grande parte da doutrina, em face das normas constitucionais então vigentes, entendidas como regras absolutas.

Variavelmente outra corrente doutrinária baseava-se na ideia de que nenhuma norma constitucional cria direito absoluto, sendo imprescindível sua interpretação em consonância com o conjunto normativo onde está inserida, de modo que, a inexistência de ressalva no texto constitucional não implicaria absoluta proibição de proceder-se à interceptação, a qual poderia efetivar-se, mediante requisição judicial, em casos excepcionais, resguardando-se, sempre, o direito protegido constitucionalmente.

Nessa mesma linha de entendimento, Ada Pellegrini Grinover, Antônio Scarance Fernandes e Antônio Magalhães Gomes Filho:

(...) as exceções legais não poderiam configurar aniquilação do princípio constitucional, devendo ser balizadas pelas regras atinentes à matéria: excepcionalidade da autorização judicial, em face da ocorrência de crimes particularmente graves; observância dos requisitos de periculum in mora e do fumus boni juris, motivação da ordem judicial etc. (GRINOVER, FERNANDES e GOMES FILHO, As Nulidades do Processo Penal, 2004, p. 213).

Destaca-se, um caso que ficou comentado na cidade de São Paulo, foi que um juiz federal concedeu a interceptação telefônica com base na Lei n.º 4.117/62, sob o argumento de que “as garantias constitucionais não eram absolutas”, ou seja, ainda que a CF/69 não apresentava exceção, a legislação ordinária poderia amparar tal ato, o que, data venia, era uma afronta ao texto da carta magna vigente à época.

A atual Constituição Federal de 1988 veio com a pretensão de superar a polêmica instaurada no texto constitucional de 69.  Contudo, o legislador no inciso XII do art. 5º da Carta Magna, de forma expressa assegura a inviolabilidade do sigilo das comunicações, assim o fez de maneira não absoluta, prevendo, no bojo da disposição em que assegurou o direito em questão, uma exceção que condicionada à apreciação judicial e aos fins de investigação criminal ou instrução processual penal, cuja disciplina legal foi designada à legislação infraconstitucional.

Desta forma, aparece uma nova polêmica, em relação ao artigo 57 do Código Brasileiro de Telecomunicações ter sido recepcionado ou não, ou então se haveria a necessidade de norma específica para regulamentação da matéria.

O Supremo colocou um fim na polêmica doutrinária e jurisprudencial que permanecia, manifestando no sentido da impossibilidade de pronunciamento judicial pela quebra do sigilo telefônico enquanto não fosse editada lei específica de regulamentação da matéria, sendo consideradas ilícitas as interceptações obtidas em desacordo com este entendimento - STF, HC n. 69.912-0 RS, Plenário, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, maioria (10x1), decisão de 30.6.93, anulada e depois substituída pela de 16.12.93, DJU: 25/03/1994, p. 6012, (GRINOVER, O Regime Brasileiro das Interceptações telefônicas, revista do Conselho da Justiça Federal, n.º 03, endereço eletrônico <www.cjf.gov.br/revista/numero3/artigo16.htm> Acesso em: 12 jun. 2009).

Enquanto não existia lei específica, formaram duas posições doutrinárias:

Corrente 1: (Ada Pelegrine Grinover) entendimento que prevaleceu no STF e no STJ, enquanto não havia lei específica, regulamentando a interceptação telefônica, esta não poderia ser concedida;

Corrente 2: (Damásio) entendia que a CF/88 havia recepcionado o artigo 57 do Código Brasileiro de Telecomunicações, e se o juiz autorizasse a interceptação telefônica, e neste caso, a interceptação telefônica somente poderia ser feita para o processo penal, jamais para investigação criminal.

Logo em seguida, a Lei n° 9.296, de 24 de julho de 1996 regulamentou o artigo 5°, XII, da CF/88 que trata da interceptação telefônica, desde que fosse previamente autorizada pelo juiz competente em duas hipóteses:

{C}I)               Para o processo penal;

{C}II)             Para as investigações criminais;

Unicamente com a entrada em vigor da Lei n.º 9.296, de 24 de julho de 1996, foi que ocorreu à regulamentação do inciso XII do art. 5º da Constituição Federal de 1988, disciplinando que mediante a concessão de ordem judicial autorizando a realização da interceptação telefônica, esta poderia ser executada e usada como elemento de prova no curso da instrução criminal.

Ao fazer um breve raciocínio acerca da expressão interceptar, pode-se dizer que é ouvir e ou gravar a conversa de duas ou mais pessoas, por um terceiro sem conhecimento das partes envolvidas no dialogo.

1.2 Conceito de Prova

A priore pode-se dizer que o conceito de prova não é único, uma vez que possui vários entendimentos ou sentidos, tanto na linguagem popular, no uso técnico, e dentre eles, destaca-se os conceitos dos juristas que seguem.

CASTRO{C}[2] que revela que o objetivo do processo penal é reconhecer a existência de uma verdade jurídica, sendo tal fim alcançado pelas provas que se assumem e valoram segundo as normas prescritas pela lei.

NUCCI{C}[3] explica que o termo prova origina-se do latim – “probatio” - que significa ensaio, verificação, inspeção, exame, argumento, razão, aprovação ou confirmação.  Dele deriva o verbo provar – “probare” -, significando ensaiar, verificar, examinar, reconhecer por experiência, aprovar, estar satisfeito com algo, persuadir alguém a alguma coisa ou demonstrar.

BONFIM{C}[4] exalta que, no plano jurídico o termo “prova” apresenta diversos sentidos podendo ser entendido como uma atividade exercida, em regra, pelas partes no processo penal, visando demonstrar a veracidade de suas alegações; os meios ou instrumentos empregados na demonstração de uma afirmação; e o resultado da atividade probatória, isto é, a certeza ou convicção que surge no espírito de seu destinatário.

Já na definição de CAPEZ[5], prova é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz e por terceiros, destinados a levar ao magistrado a convicção acerca da existência ou inexistência de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação, ou seja, todo e qualquer meio utilizado pelo homem com o intuito de comprovar a verdade de uma alegação.

CARVALHO{C}[6] comenta que a prova judiciária visa uma reconstrução dos fatos investigados na instrução criminal, objetivando fornecer ao julgador uma verdade judicial, senão absoluta, mas apta a fundamentar uma decisão final.

A prova constituída nos autos deve está intimamente vinculada á demonstração da verdade dos fatos, sendo essencial ao desempenho do direito de ação e de defesa, ou seja, o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Denota-se que o direito à prova alude, no plano conceitual, em uma vasta possibilidade de utilizar quaisquer meios probatórios disponíveis e desde que sejam lícitos. Tendo como regra a admissibilidade das provas, e as exceções precisam ser expressamente justificadas.

Segundo Barbosa Moreira{C}[7], não há rigor com a técnica da enumeração taxativa vez que permite que, além de documentos, depoimentos, perícia e outros meios tradicionais, em geral minuciosamente regulados em textos legais específicos, se recorram a expedientes não previstos em termos expressos, mas eventualmente idôneos para ministrar ao juiz informações úteis à reconstituição dos fatos.

1.2.1 Objeto da Prova

O Professor Fernando Capez[8] entende que: o objeto da prova é toda circunstância, fato ou alegação referente ao litígio sobre os quais incide uma incerteza, e que precisam ser demonstrados perante o juiz para o desfecho da causa. São, portanto, fatos capazes de influir na decisão do processo, na responsabilidade penal e na fixação da pena ou medida de segurança, necessitando, por essa razão, de adequada comprovação em juízo. 

Assim, alude que o objetivo da prova é o esclarecimento, confirmação e formação do convencimento do magistrado, destinando-a ao resultado final buscado, qual seja a resolução da lide.

Com isso devem ser dispensados do conteúdo probatório as situações e fatos que não são pertinentes para o andamento do processo, ou que não irão influenciar no convencimento do magistrado em sua posterior decisão em relação ao mérito da causa.

Para MARQUES{C}[9]{C}, o “objetivo da prova, ou thema probandum, é a coisa, fato, acontecimento ou circunstância que deva ser demonstrado no processo”.

 

Ao discorrer sobre o assunto MIRABETE[10] afirma que o objetivo da prova não abrange só o fato delituoso, mas também as circunstâncias que podem de alguma maneira influenciar na responsabilidade do sujeito investigado:

“Aquilo sobre o que o juiz deve adquirir o conhecimento necessário para resolver o litígio processual é o objetivo da prova, que abrange não só o fato delituoso, mas também todas suas circunstâncias objetivas e subjetivas que possam influir na responsabilidade penal e na fixação da pena ou imposição de medida de segurança.” (MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. 18. ed. Ver. e atual. São Paulo: Atlas, 2006. P. 250)

 

TOURINHO FILHO{C}[11], afirma que a verdade sabida, evidente, segura, não há que ser provada, só deve fazer prova dos fatos que são duvidosos:

“Somente os fatos que possam dar lugar a dúvida, isto é, que exijam uma comprovação, é que constituem objeto de prova. Desse modo, excluem-se os fatos notórios. Provar a notoriedade é tarefa de louco, já se disse. Tanto a evidência quanto a notoriedade não podem ser postas em dúvida. Notórios são os fatos que pertencem ao patrimônio estável de conhecimento do cidadão de cultura média, em uma determinada sociedade. Estes fatos devem considerar-se conhecidos do Juiz já que sua noção forma parte de sua ordinária cultura”. (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. P. 215)

Desta forma denota-se que os fatos inúteis não carecem de prova, pois são irrelevantes para a persecução penal, e as presunções legais, extraídas da própria lei, dispensam a produção de provas quando forem presunções absolutas “juris et de jure” ou invertem o  ônus da prova nos casos de presunções meramente relativas “juris tantum”.

Registra-se que objeto da prova são os fatos pertinentes ou relevantes, que devam ser provados através de elementos convincentes, que podem levar à certeza, não podendo ensejar a insegurança, e para o cumprimento desta atividade são disponibilizados meios ou métodos de prova, proporcionando que se chega mais próximo da realidade dos fatos.

1.2.2 Meios de Prova

 

A priore entende-se que meio de prova é tudo aquilo que possa comprovar o fato ou afirmação feita nos autos do processo em análise. É o instrumento utilizado para demonstração da existência ou não dos fatos alegados nos autos, para se buscar no final da instrução o convencimento do magistrado.

De acordo com Tourinho Filho{C}[12] meio de prova “é tudo quanto possa servir, direta ou indiretamente, à comprovação da verdade que se procura no processo”.

Meios de prova são segundo a lição Pontes de Miranda:

“as fontes probantes, os meios pelos quais o Juiz recebe os elementos ou motivos de prova, podendo ser os documentos, as testemunhas, os depoimentos das partes. Elementos de Prova são os informes sobre fatos ou julgamentos sobre eles, que derivam do emprego daqueles meios”. (PONTES DE MIRANDA, “comentários do Código de Processo civil”, 1947. vol. II, p.155 apud José Frederico Marques “Instituições” vol. III p. 336)

Conceitua Greco Filho{C}[13], que Meios de Prova, “são os instrumentos pessoais ou materiais aptos a trazer ao processo a convicção da existência ou inexistência de um fato”.

Nos ensinamentos de Paulo Rangel[14], os meios de prova “são todos aqueles que o juiz, direta ou indiretamente, utiliza para conhecer da verdade dos fatos, estejam eles previstos em lei ou não”.

O Código de Processo Penal menciona os seguintes meios de prova: as perícias em geral (artigos 158 a 184); o interrogatório do réu (artigos 185 a 196); a confissão (artigos 197 a 200); as perguntas ao ofendido (artigo 201); o depoimento testemunhal (artigos 202 a 225); o reconhecimento das pessoas e coisas (artigos 225 a 228); a acareação (artigos 229 a 230); os documentos (artigos 231 a 238); os indícios (artigo 239) e a busca e apreensão (artigos 240 a 250).

Os meios elencados acima são admissíveis, mas não são de forma taxativa, são apenas aqueles de utilização mais frequente, assim, tais meios de prova não concluem hipóteses de numerus clausus, sendo perfeitamente possível a produção de provas distintas das enumeradas acima pelo Código de Processo Penal.

MIRABETE, acerca do assunto, diz que:

Meios de prova são as coisas ou ações utilizadas para pesquisar ou demonstrar a verdade depoimentos, perícias, reconhecimentos etc. Como no processo penal brasileiro vige o principio da verdade real, não há limitação dos meios de prova. A busca da verdade material ou real, que preside a atividade probatória do juiz, exige que os requisitos da prova em sentido objetivo se reduzam ao mínimo, de modo que as partes possam utilizar-se dos meios de prova com ampla liberdade. (MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. P. 259.)

Devido ao princípio da verdade real, no Processo Penal brasileiro não há limitação aos meios de provas, permite-se a ampla liberdade de defesa, ou seja, permite a utilização de meios probatórios não disciplinados em lei, desde que moralmente legítimos e não afrontadores do próprio ordenamento jurídico pátrio. Mas este princípio não é absoluto, uma vez que há restrições aos meios de provas.

Desta vez encontram-se as provas ilícitas que contrariam as normas de direito material (artigo 5º, LVI, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988) e as ilegais que vão de encontro às normas de direito processual.

Não são admissíveis no processo os meios de prova que violem os direitos tutelados em lei e aqueles incompatíveis com o sistema processual em vigor.

1.2.3 Ônus da Prova

O sistema processual brasileiro é constituído pelo princípio constitucional do contraditório e pela igualdade das partes, e a distribuição do ônus probatório deveria seguir no mesmo sentido isonômico igualitário. Porém há de se observar que deve prevalecer durante a instrução probatória a exigência constitucional da inocência do réu, ou seja, in dubio pro réu, senão diga-se, na duvida absolve.

Pode ser considerado como ônus da prova o encargo ou a faculdade que possui a parte de provar aquele fato que alegou em seu favor dentro dos autos do processo. A prova não é uma obrigação, mais sim um ônus, a maior diferença está na obrigatoriedade. No ônus, caso a parte que o possua, não o fizer, não estará indo contra o direito, já que este é facultativo. Já na obrigação, caso a parte não o faça, estará indo contrariamente a lei.

Com relação ao ônus da prova, entende Capez (2003, p. 256):

A prova é induvidosamente um ônus processual, na medida em que as partes provam em seu benefício, visando dar ao juiz os meios próprios e idôneos para formar a sua convicção.

Ônus da prova é, pois, o encargo que têm os litigantes de provar, pelos meios admissíveis, a verdade dos fatos.

Entretanto, não é absoluta a regra que diz incumbir o ônus da prova a quem o fizer. Já que o Art. 156, 2º parte, do Código de Processo Penal, disciplina que o juiz tem a faculdade de determinar diligências para solucionar dúvidas sobre os pontos controvertidos, o juiz poderá fazê-lo de oficio, durante a instrução processual e, ou antes, de proferir a sentença.

Na decorrer da colheita de provas do respectivo Inquérito Policial ou de qualquer outra investigação a atuação jurisdicional não se justifica enquanto tutela dos respectivos procedimentos. O juiz, quando defere uma prisão cautelar, quando defere uma interceptação telefônica ou quebra de uma inviolabilidade pessoal, não está protegendo os interesses da investigação criminal, e sim exercendo o controle constitucional das restrições às inviolabilidades, nos moldes do princípio constitucional do devido processo legal.

O juiz tem a possibilidade de determinar a realização de diligências, que tem como objeto principal a busca da verdade real. Desse modo, nada impede que o magistrado processe a revelia das partes, a reprodução de provas e colher as que sejam úteis à instrução processual.

Ressalta-se que trata-se de mera faculdade que o juiz tem ao determinar as diligências. Assim, as partes devem realizar as provas para fundamentar a seu favor, ou caso não constituam essas, a sentença pode ser desfavorável.

A respeito das diligências, disciplina Mirabete (2001, p. 265):

Na ocasião própria (com o oferecimento da denúncia, na defesa prévia, na fase prevista pelo artigo 499 etc.), a parte deve requerer a prova a ser produzida. O indeferimento de requisição ou pedido de prova, sem demonstração de sua necessidade, é inapelável, por não constituir decisão definitiva ou com força definitiva. Entretanto, pode ser alegada a nulidade por cerceamento de defesa ou de acusação em eventual recurso da decisão de mérito.

Entende a doutrina que o juiz poderá ordenar diligências de oficio, para que possa suscitar dúvidas no processo sobre pontos relevantes. Poderá ainda determinar as diligências para sanar eventuais nulidades no processo ou ainda, para buscar o melhor esclarecimento da verdade dos fatos que levaram o Ministério Público realizar a denúncia em desfavor do réu.

Em relação a atuação concreta do juiz, este deve ser imparcial dentro do processo, de modo a impedir que adote postura tipicamente acusatória quando entender deficiente a atividade desenvolvida pelo presente ministerial. O juiz não poderá desigualar as forças produtoras da prova no processo, sob pena de violação dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, ambos reunidos na exigência de igualdade e isonomia de oportunidades e faculdades processuais. Nesse sentido também, a posição de Tourinho Filho (1992, v.3 p. 213).

1.2.4 Sistema de apreciação das Prova

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A fase de instrução processual devidamente concluída, o julgador fará uma análise e avaliação acerca das provas apresentadas nos autos para que formada a sua convicção, possa aplicar o direito no caso concreto, ou seja, prolatar sentença absolutória ou condenatória.

Deste modo, é ato pessoal do juiz, por meio do qual, analisando os elementos apresentados pelas partes no processo, chega a uma conclusão sobre a lide. Assim na apreciação judicial torna-se natural estimar-se um valor a cada uma das provas apresentadas, de forma a sopesar as mais importantes em detrimento das menos relevantes. A ponderação deste sopeso por parte do juiz far-se-á por meio de mecanismos totalmente flexíveis, parcialmente vinculados e completamente adstritos (NUCCI)[15].

A doutrina estabelece três sistemas como critérios para avaliação judicial dessas provas: a) o sistema de prova legal ou tarifado; b) o da livre convicção; e c) o da persuasão racional ou livre convencimento motivado.

O sistema de prova legal ou tarifado cada prova produzida no processo tem um valor preestabelecido em lei, inalterável, de forma que o juiz não tem liberdade na sua atividade de julgar, estando adstrito ao critério fixado pelo legislador. É chamado de tarifado, então, em razão de que as provas têm uma tabela de valoração da qual o juiz não pode se opor{C}[16].

O aludido sistema era desprovido, uma vez que para a obtenção da condenação, era necessário certo número de pontos, e quando não se chegava a esse número, a prova era obtida a partir da tortura, já que essa fazia prova plena.

No sistema da livre convicção, não há previsão legal acerca do valor das provas e a decisão funda-se exclusivamente na certeza moral do juiz, que de acordo com a sua livre convicção decide sobre a admissibilidade, avaliação e carreamentos das provas para os autos, não sendo necessária a motivação para as decisões[17]. Este sistema é o que prevalece no Tribunal do Júri, visto que os jurados não necessitam de motivar seus votos, seja ele condenando ou absolvendo.

Já no sistema de persuasão racional, ou seja, livre convencimento motivado, o juiz é livre na formação de seu convencimento, não estando comprometido por qualquer critério de valoração prévio da prova, porém deverá expor as razões que fizerem com que ele optasse por tal prova, fazendo-o com base em argumentação racional a fim de que as partes por ventura insatisfeitas possam confrontar a decisão nas mesmas bases argumentativas[18].

Este sistema da persuasão racional é o adotado pelo processo penal brasileiro, na literalidade do caput do art. 155: “O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova [...]”, que encontra fundamento no art. 93, IX da Constituição Federal.

Como se compreende, o livre convencimento motivado é a regra de julgamento, a ser utilizada por ocasião da decisão final, quando se fará a valoração de todo o material probatório levado aos autos.

A lei 11.690/08 impede que o magistrado ao fundamentar seu ato de decidir, fundamente somente no material colhido unicamente na fase inquisitorial, ou seja, fundamentar o decreto condenatório unicamente em provas produzidas no bojo do Inquérito Policial, ressalvando as provas antecipadas e não repetíveis.

1.2.5 Direito e restrições a Prova

 

Em consequência do princípio da ampla defesa o réu tem direito à prova, não devendo afirmar que tal direito assiste ao órgão ministerial, já que o direito do réu à prova tem como pressupostos a existência e o exercício do direito da acusação. E assim de nada adiantaria o reconhecimento do direito à produção de prova se não se reconhecesse também o direito a sua valoração, por ocasião da decisão final.

As provas ilícitas devem ser desentranhadas o quanto antes do conjunto probatório, nos termos do artigo 157 do Código de Processo Penal (Lei 11.690/08). A regra no processo penal é que as provas podem ser produzidas a qualquer tempo, incluindo a fase recursal, sempre havendo respeito ao contraditório e ampla defesa. Existindo uma exceção no rito do tribunal do júri, que as provas devem obedecer a uma antecedência mínima de três dias antes da instrução em plenário para a juntada de documentos, nos termos do artigo 479 do mesmo diploma legal.

1.2.6 Inadmissibilidade das provas ilícitas

 

A carta magna de 88, em seu artigo 5º, inciso LVI, impõe que: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. E também reproduz a mesma vedação o artigo 157, caput, do Código de Processo Penal.

O dispositivo acima citado veda as provas ilícitas que tem por destinatário imediato a proteção do direito à intimidade, à privacidade, à imagem, à inviolabilidade do domicílio, nesse contexto, CARVALHO{C}[19] ressalta que a busca pela verdade real para formação do convencimento do juiz, encontra limitações constitucionais e legais, as quais buscam concretizar valores ínsitos à dignidade da pessoa humana, cuja manifestação se expressa nas inúmeras garantias dos direitos fundamentais previstos pela Constituição Federal.

Assim o meio pelo qual se obtém a prova pode ser questionado, uma vez que, por exemplo, na confissão obtida mediante tortura, ou mediante hipnose, ou, ainda, pela ministração de substâncias químicas.  Por outro lado, a vedação das provas obtidas por meios fraudulentos e ilícitos pode oferecer repercussão no âmbito da igualdade processual, no ponto em que, ao impedir a produção probatória irregular pelos agentes do Estado, que normalmente são os responsáveis pela prova.

Nesse interim pode-se dizer que a vedação também pode ocorrer quanto aos resultados que podem ser obtidos com a utilização de determinado meio de prova. Por exemplo, uma interceptação telefônica, enquanto meio de prova, poderá ser lícita se autorizada judicialmente, mas ilícita quando não autorizada.

Dessa forma, na concepção de alguns doutrinadores, a prova obtida por meios ilícitos deve ser sempre repudiada pelos julgadores, por mais relevantes que sejam os fatos por elas reconstituídos, uma vez que aceita-las revestirá o processo de inconstitucionalidade[20].

Vez que, assim fica limitado o direito a prova, forma de garantia do contraditório e da ampla defesa, também um direito fundamental, e que nenhuma liberdade pública é absoluta e tanto a doutrina como a jurisprudência aceitam a prova ilícita em casos excepcionais, como quando em benefício do réu.

Por norma de direito material ou por norma processual, a prova pode ser vedada, podendo ser classificada, quanto a sua natureza, em prova ilícita ou ilegítima, sendo estas espécies do gênero prova proibida.

Na definição de ARANHA[21]:

Prova proibida, conceito genérico, é toda aquela que é defesa, impedida mediante uma sanção, impedida que se faça pelo Direito. A que deve ser conservada à distância pelo ordenamento jurídico. Por ser proibida, ofende, molesta, opõe-se ao direito.

AVENA{C}[22] explica as provas ilegais da seguinte forma:

A expressão prova ilegal corresponde a um gênero, o qual fazem parte três espécies distintas de provas: as provas ilícitas, que são as obtidas mediante violação direta ou indireta da Constituição Federal; as provas ilícitas por derivação, que correspondem a provas que, conquanto lícitas na própria essência, tornam-se viciadas por terem decorrido, exclusivamente, de uma prova ilícita anterior; e, por fim, as provas ilegítimas, assim entendidas as obtidas ou produzidas com ofensa a disposições legais, sem qualquer reflexo em nível constitucional.

Nos ensinamentos do professor MOUGENOT[23] explicam as espécies de provas:

São chamadas provas ilícitas aquelas cuja obtenção viola os princípios constitucionais ou preceitos legais de natureza material (exemplo: confissão obtida mediante tortura). Por outro lado, a prova será ilegítima se sua obtenção infringir norma processual (exemplo: quando a infração deixar vestígios e o laudo de exame de corpo de delito – direto ou indireto – for suprido pela confissão do acusado).

Devemos compreender que tanto a prova ilícita, como a ilegítima não são admitidas no processo, devendo o magistrado desconsiderá-las e desentranha-las se for o caso.

1.2.7 Teoria dos frutos da árvore envenenada

 

A teoria dos fruits of the poisonous tree, ou teoria dos frutos da árvore envenenada, cuja origem é atribuída á jurisprudência norte americana, nada mais é que simples consequência lógica da aplicação do princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas.

Os Tribunais norte americanos tem admitido a teoria acima citada. Já que considera inconstitucional e ilegal, os meios considerados ilícitos na busca das provas. Esses Tribunais americanos utilizam o fruit of the poisonous tree, “com a finalidade de reafirmar os fundamentos éticos e dissuasivos da ilegalidade estatal em que se baseia aquela regra”.

A doutrina brasileira também tem admitido a utilização da teoria dos “frutos da árvore envenenada”. O Ministro Sepúlvida Pertence, em Habeas, Corpus, Tourinho Filho (2002, p. 235) relatou:

Vedar que se possa trazer ao processo a própria “degravação” das conversas telefônicas, mas admitir que as informações nela colhidas possam ser aproveitadas pela autoridade, que agiu ilicitamente, para chegar a outras provas, que sem tais informações não colheria, evidentemente, é estimular, e não reprimir a atividade ilícita da escuta e da gravação clandestina e conversas privadas... E finalizando: ou se leva à últimas consequências a garantia constitucional ou ela será facilmente contornada pelos frutos da informação ilicitamente obtida.

Assim, aquelas provas obtidas licitamente, porém, para que chegassem a esta meios ilícitos foram usados, como por exemplo, um depoimento obtido mediante tortura, as autoridades encontram o criminoso, que por sua vez espontaneamente confessa o crime. A primeira confissão foi obtida de forma ilícita, já a segunda foi lícita.

Desse modo, a confissão do criminoso é considerada prestada com inteira liberdade, constituindo assim, fontes independentes. Não existindo mais provas, considerará a ilegalidade desta confissão. Porém, existindo outras provas, também consideradas autônomas, não invalidará o processo.

O supremo Tribunal Federal, em mais de uma ocasião, teve a oportunidade de reconhecer a pertinência dos fruits of the poisonous tree, conforme se vê no julgamento do HC nº 74.116/SP, DJU 14.3.1997, e HC nº 76.641/SP, DJU 5.2.1999.

A partir da Lei nº 11.690/08, que deu nova redação a diversos dispositivos do Código de Processo Penal, a teoria dos frutos da árvore envenenada passa a integrar a ordem processual penal brasileira de modo expresso, como está descrito no artigo 157, § 1º do Código de Processo Penal:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).

§ 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).

Com o citado dispositivo percebe-se que nem todas as provas derivadas das ilícitas são inadmissíveis no sistema jurídico brasileiro. Segundo GIACOMOLLI[24] em duas hipóteses são admissíveis as provas derivadas das ilícitas: a) inexistência da conexão entre a ilicitude e a licitude e, derivadas desta regra geral; e b)  reconhecimento da descoberta inevitável da prova.

Ocorre, todavia, que, prevalecendo esse entendimento, ou seja, no sentido de que todas as provas que forem obtidas a partir da notícia da existência de um crime são também ilícitas, será muito mais fácil ao agente do crime furtar-se à ação da persecução penal. Bastará ele mesmo produzir uma situação de ilicitude na obtenção da prova de seu crime, com violação a seu domicílio, por exemplo, para trancas todas e quaisquer iniciativas que tenham por objeto a apuração daquele delito então noticiado. Nesse sentido, GILMAR MENDES, Inocêncio Mártires COELHO e Paulo Gustavo Gonet BRANCO (Curso de direito constitucional. São Paulo/ Brasília: Saraiva – IDP, 2007, p. 605).

Assim, nem sempre que estivermos diante de uma prova obtida ilicitamente teremos como consequência a inadmissibilidade de todas aquelas outras provas a ela subsequentes. Será necessário realizar um exame cuidadoso de cada situação concreta, para avaliar a eventual derivação da ilicitude probatória.

1.2.8 Teoria do Encontro Fortuito de Provas

 

Em singelas palavras pode-se dizer encontro fortuito quando a prova de determinada infração penal é obtida a partir da busca regularmente autorizada para a investigação de outro crime diverso.

Eugênio Pacelli[25] diz que quando, na investigação de um crime contra a fauna, por exemplo:

“os agentes policiais, munidos de mandado judicial de busca e apreensão, adentram em determinada residência para o cumprimento da ordem, espera-se, e mesmo exige-se (art. 243, II, Código de Processo Penal), que a diligência se realize exclusivamente para a busca de animais silvestres. Assim, se os policiais passam a revirar as gavetas ou armários da residência, é de se ter por ilícitas as provas de infração penal que não estejam relacionadas com o mandado de busca e apreensão”.

Nas interceptações telefônicas, o entendimento majoritário é que a prova encontrada por acaso será perfeitamente válida, desde que o fato delitivo seja conexo com o investigado pela medida. E quando se descobre outra pessoa, distinta da anteriormente investigada, a descoberta vale como prova desde que haja continência entre eles.

O STF tem julgados no sentido de reconhecer a licitude da prova de outro crime, diverso daquele investigado, obtida por meio de interceptação telefônica autorizada, de início para apuração de crime punido com reclusão. Sob o argumento que a conexão entre os fatos e os crimes justificaria a licitude e o aproveitamento da prova (HC nº 83.515/RS, Rel. Min. Nelson Jobim, informativo nº 361 e HC 102. 394, Rel. Min. Carmen Lúcia).

O STJ quanto o Supremo Tribunal Federal estabeleceram a orientação de que, se o fato objeto do encontro fortuito tem conexão com o fato investigado, é válida a interceptação telefônica como meio de prova. Em alguns julgados mais recentes, tem sido admitida a colheita acidental de provas mesmo quando não há conexão entre os crimes. Um exemplo de encontro fortuito de provas aconteceu na APn 690, que inicialmente foi proposta para apurar uso de moeda falsa, mas a Justiça Federal no Tocantins percebeu que as escutas telefônicas revelavam possível negociação de decisões judiciais praticada por desembargadores.

CAPÍTULO 2

 INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

 2.1 Conceito de Interceptação Telefônica

 

Para adentrar ao tema, necessário se faz conceituar interceptação telefônica segundo a ótica de alguns autores.

Segundo CAPEZ[26] interceptação telefônica se define:

Interceptação provém de interceptar – intrometer, interromper, interferir, colocar-se entre duas pessoas, alcançando a conduta de terceiro que, estranho à conversa, se intromete a toma conhecimento do assunto tratado entre os interlocutores.

Assim, no aspecto jurídico PRADO[27] refere que a interceptação é “o ato de interferir nas comunicações telefônicas, de modo a impedi-las ou de forma a ter acesso ao seu conteúdo”.

Nas palavras de AVOLIO[28] o que se mostra essencial para a noção de interceptação é o fato de a operação telefônica ter sido efetuada por uma pessoa estranha à conversa, e que esse terceiro estivesse investido do intuito de tomar conhecimento de circunstâncias, que, de outra forma, lhe permaneceriam desconhecidas.

A interceptação telefônica é a capitação feita por terceira pessoa de comunicação entre dois ou mais interlocutores sem o conhecimento de qualquer deles, ou seja, ocorre quando, em momento algum, nenhum dos interlocutores tem ciência da invasão de privacidade.

2.2 Diferenciações entre Interceptação Telefônica Escuta Telefônica

e Gravação Clandestina.

As interceptações telefônicas, uma vez legalmente disciplinadas e efetuadas com obediência aos requisitos impostos no ordenamento jurídico, são aceitas como provas lícitas, sendo admissível seu resultado como fonte de prova na instrução processual.

Assim surge a necessidade de diferenciação entre os institutos da interceptação telefônica, da escuta telefônica, e da gravação clandestina, os quais, com frequência, são tratados na doutrina e na jurisprudência com enorme imprecisão, a despeito do fato de que, em virtude de suas diferenças substanciais, apresentam disciplinas legais diversas.

Qualquer interceptação pressupõe, necessariamente, três protagonistas: dois interlocutores e o interceptador, que capta a conversação sem o consentimento daqueles ou com o consentimento de um deles. Caso o meio utilizado for o “grampeamento” do telefone, dá-se a interceptação telefônica, diferentemente de quando a captação é feita pelo terceiro por meio de um gravador, caracterizando a interceptação entre presentes, também conhecida como interceptação ambiental.

Tratando-se de espécie do gênero interceptação telefônica, a escuta telefônica consiste na captação da conversa pelo interceptador quando um dos interlocutores tem conhecimento da interceptação. A doutrina em geral trata como interceptação “stricto sensu” a execução da captação à revelia de ambos os interlocutores, sendo que, no caso em que a interceptação é consentida por um deles faz-se menção à escuta telefônica.

Alguns doutrinadores como Ada Pellegrini Grinover, Antônio Scarance Fernandes e Antônio Magalhães Gomes Filho descrevem as modalidades de captação eletrônica de provas:

a) interceptação da conversa telefônica por terceiro, sem o conhecimento dos dois interlocutores; b) a interceptação da conversa telefônica por terceiro, com o conhecimento de um dos interlocutores; c) a interceptação da conversa entre presentes, por terceiro, sem o consentimento de nenhum dos interlocutores; d) a interceptação da conversa entre presentes por terceiro, com o conhecimento de um ou alguns dos interlocutores; e) a gravação clandestina da conversa telefônica por um dos sujeitos, sem o conhecimento do outro; f) a gravação clandestina da conversa pessoal e direta, entre presentes, por um dos interlocutores, sem o conhecimento do(s) outro(s). (grifos nossos). (GRINOVER; FERNANDES e GOMES FILHO, As Nulidades do Processo Penal, p. 208).

A gravação clandestina ou ilícita há só dois comunicadores, sendo que um deles grava a própria conversa com o outro, telefônica ou não, sem o conhecimento de seu interlocutor. Trata-se de gravação de conversa própria, que, embora não se enquadre na tutela do sigilo das comunicações (art. 5º, inciso XII, da CF), relaciona-se com a proteção à intimidade (art. 5º, inciso X, da CF).

O art.1º da Lei n.º 9.296/96, de 24 de julho de 1996, afirma que a lei aplica-se à “interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza”, frisando-se que, em razão da própria etimologia da palavra (interceptio+ar), interceptar quer dizer interromper no seu curso, reter ou deter o que era destinado a outrem (Dicionário Brasileiro Globo, 44ª ed. São Paulo: Globo, 1996, p.358.), ou ainda “(de “inter capio”), interceptar quer dizer colher durante a passagem a conversa de outros” (GRINOVER; FERNANDES e GOMES FILHO, As Nulidades do Processo Penal, 2004, p. 208).

Parte da doutrina aduz que a aplicação da Lei n.º 9.296/96 restringe-se à interceptação telefônica “stricto sensu”, ou seja, às interceptações executadas com desconhecimento de ambos os interlocutores. Argumenta-se que tanto a escuta telefônica quanto a gravação clandestina estariam desacobertadas pela previsão constitucional, sendo que no projeto original da lei previa-se a disciplina dessas situações (Art. 12 do Projeto de Lei n.º 3.514/89; o Projeto de Lei apresentado pelo Deputado Miro Teixeira cuidava expressamente das gravações clandestinas, asseverando a licitude da produção de prova obtida por este expediente, restringindo sua utilização para proteção do direito ameaçado ou violado de quem gravou a conversa.), o que restou superado na edição da norma.

 Vicente Greco Filho em sua monografia sobre o tema discorre que:

A lei não disciplina, também, a interceptação (realizada por terceiro), mas com o consentimento de um dos interlocutores. Em nosso entender, aliás, ambas as situações (gravação clandestina ou ambientar e interceptação consentida por um dos interlocutores) são irregulamentáveis porque fora do âmbito do inciso XII do art. 5º da Constituição e sua ilicitude, bem como a prova dela decorrente, dependerá do confronto do direito à intimidade (se existente) com a justa causa para a gravação ou a interceptação, como o estado de necessidade e a defesa de direito, nos moldes da disciplina da exibição da correspondência pelo destinatário (art.153 do Código Penal e art. 233 do Código de Processo Penal). (GRECO FILHO, Interceptação Telefônica-Considerações sobre a Lei 9296/1996, 2008, p. 7/8.)

Discordando do entendimento esposado acima, atualmente, a maioria da doutrina argumenta que: limitar as interceptações telefônicas às situações em que ambos os interlocutores desconhecem a captação realizada é restrição indevida à norma constitucional. Conforme discorrido, a escuta telefônica é espécie de interceptação, na qual, uma vez observados os fins constitucionais pertinentes à sua concessão, a normatização legal sobre o tema e, antes de tudo, a chancela do judiciário, não se justifica um tratamento diverso do concedido à interceptação “stricto sensu”. Leciona neste sentido Luiz Flávio Gomes, em excelente obra sobre a matéria, exemplificando o tema no sentido de que:

(...) tanto pode o Juiz autorizar uma “interceptação” para descobrir prova num caso de tráfico de entorpecentes (e nesse caso tornar-se-ão conhecidas às comunicações telefônicas seja do suspeito, seja do outro comunicador), como pode permitir uma “escuta” num caso de sequestro em que a família da vítima, obviamente, está sabendo da captação da comunicação. Não é porque um dos comunicadores sabe da ingerência Revista Eletrônica Direito, Justiça e Cidadania – Volume 1 – nº 1 – 2010 alheia autorizada judicialmente que a lei deixa de ter incidência. (GOMES e CERIRNI, Interceptação Telefônica-Lei 9.296/96, 1997, p. 97; v. no mesmo sentido; GRINOVER; FERNANDES e GOMES  FILHO,  As  Nulidades  do Processo Penal, 2004, p. 208)

Torna-se imprescindível delimitar o âmbito de atuação da Lei em questão, não somente em nome da segurança jurídica, mas também em função da previsão contida no bojo da Lei em questão, onde há a previsão da interceptação ilícita como crime, senão vejamos:

Art. 10 – Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, informática  ou  telemática,  ou  quebrar  segredo  de  justiça,  sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa.

Tipifica o tipo penal que criminaliza a conduta de “grampear” comunicações telefônicas alheias, trazendo, como consequência fundamental, a imperiosa necessidade de descobrir o real sentido do conceito de interceptação telefônica.

Analisando sinteticamente o assunto, conclui-se que somente a gravação feita por um dos interlocutores com o desconhecimento do outro, chamada, como já se disse, de gravação clandestina ou ambiental, não é considerada interceptação, nem esta disciplinada pela lei sobredita. Lado outro, vale ressaltar, que inexiste tipo penal que incrimine esta conduta, na ideia de que em um processo de comunicação, são titulares da mensagem tanto o emissor (remetente) quanto o receptor (destinatário), de modo que o sigilo só existe em relação  a  terceiros  e  não  entre  eles,  os  quais  estão  liberados  para  gravar  o conteúdo  da  mensagem. Todavia, a divulgação desta mensagem, sem justa causa, poderá ser considerada ilícita, subsumindo-se à conduta ao tipo previsto no art. 153 do Código Penal (Divulgação de segredo):

Art. 153 - Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º Somente se procede mediante representação.  (Parágrafo único renumerado pela Lei nº 9.983, de 2000).

§ 1º.  A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública:

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000).

§ 2º Quando resultar prejuízo para a Administração Pública, a ação penal será incondicionada.

2.2.1 Natureza jurídica da interceptação telefônica

Nos ensinamentos de GRINOVER, o provimento judicial que autoriza a execução das interceptações telefônicas tem natureza cautelar, tendo por objetivo assegurar as provas por meio da fixação dos fatos da forma como se apresentam no momento da conversa. Conforme nomenclatura utilizada por MENDES{C}[29], a interceptação é medida cautelar preparatória quando realizada na fase policial, e incidental quando realizada na Justiça durante instrução.

AVOLIO{C}[30] ainda acrescenta que a medida cautelar visa evitar a modificação da  situação existente ao tempo do crime durante a tramitação do processo principal.  A tutela cautelar torna-se necessária diante da impossibilidade de se fazer com rapidez e segurança jurídica o processo de conhecimento condenatório.

Verifica-se que a natureza acauteladora da interceptação telefônica reclama o desconhecimento por parte do seu sujeito passivo, sob pena de frustrar o sucesso da efetivação da medida. Conforme lição de MENDES[31]:

O deferimento da medida é inaudita altera pars, não tendo o investigado conhecimento de que sua conversa está sendo captada, mas, ao se  concluírem  as diligências, será levantado o sigilo, podendo o investigado valer-se de habeas corpus para impugnar a medida se tiver havido nulidade. Entende Gomes que se o pedido for indeferido o Ministério Público pode ingressar com mandado de segurança.

Ensina GRINOVER{C}[32] que para a concessão da interceptação telefônica exige-se a presença dos dois requisitos que justificam as medidas cautelares: o fumus boni juris e o periculum in mora. A apreciação acerca da existência do primeiro requisito pelo juiz é questão complexa, em razão de que o mesmo deve dispor de elementos seguros da existência de crime, de extrema gravidade, capazes de justificar o sacrifício da privacy. No que tange ao segundo requisito, deve ser analisado o risco ou prejuízo que a não concessão da medida cautelar possa resultar para investigação ou instrução processual (AVOLIO)[33].

Para ser caracterizada a existência de fumus boni iuris (aparência de bom direito) no processo penal, se faz necessária à concorrência de duas exigências: a probabilidade de autoria ou participação numa infração penal-relacionada ao  agente;  e  2)  a  probabilidade  de existência  de  uma  infração  penal-relacionada  à  infração  propriamente  dita,  à  sua materialidade (GOMES e CERVINI)[34].

2.2.2 Requisitos para a interceptação telefônica

 

Os requisitos necessários para a interceptação estão previstos no art. 2º da lei in fine:

Art. 2º da Lei n.º 9296/96 – Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

I – não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;

II – a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

III – o fato investigado constituir infração penal punida, no mínimo, com pena de detenção.

Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Como observado, o art. 2° dispõe as hipóteses legais em que a interceptação é admissível, podendo ser ordenada pelo juiz. Trata-se da reserva legal considerada indispensável pelo Supremo Tribunal Federal, que invalidou muitas operações técnicas autorizadas antes da promulgação da lei n° 9.296/96. A lei apresenta vícios técnicos, quando optou pela negativa, elencando os casos de não admissibilidade da interceptação, em vez de indicar taxativamente onde seria cabível.

Nesse mesmo sentido leciona Vicente Greco Filho:

O art. 2° da Lei 9.296 optou por duplamente lamentável redação negativa, enumerando os casos em que não será admitida a interceptação, em vez de indicar taxativamente os casos em que será ela possível.  Lamentável, porque a redação negativa sempre dificulta a intelecção da vontade da lei e mais lamentável ainda porque pode dar a entender que a interceptação seja a regra, ao passo que, na verdade, a regra é o sigilo e aquela, a exceção. (GRECO FILHO, Interceptação Telefônica-Considerações sobre  a  Lei 9.296/1996, 2008, p. 20/21).

A Lei 9.296/96 não define as hipóteses de cabimento da interceptação telefônica, mas os casos em que é excluída a possibilidade de decretação da medida[35], tratando-se assim de requisitos negativos. BADARÓ{C}[36] defende que se a regra é a liberdade de comunicação, o legislador deveria ter previsto estrita e expressamente as hipóteses em que seria cabível o afastamento do sigilo telefônico, a fim de evitar que, fora o campo de exclusão, em todas as demais hipóteses seja cabível a interpretação, com um alargamento da exceção.

CAPEZ{C}[37] destaca os principais requisitos legais para o deferimento da interceptação telefônica são: a) Ordem do juiz competente para o julgamento da ação principal; b) Indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal; c) Que a infração penal seja crime punido com reclusão; d) Que não exista outro meio de se produzir a prova; e) Que tenha por finalidade instruir investigação policial ou processo criminal.

{C}a)   Ordem do juiz competente para o julgamento da ação principal{C}[38].

Segundo CAPEZ[39] apenas o juiz competente para o julgamento da ação principal poderá determinar o afastamento do sigilo telefônico, excluindo assim, o Promotor de Justiça e o Delegado de Polícia.

 

STRECK{C}[40] afirma que juiz competente significa que, na hipótese de o investigado ter prerrogativa de foro, a autorização da interceptação telefônica apenas pode ser concedida pelo seu juiz natural. O autor exemplifica que no caso do investigado ser juiz, apenas o Presidente do Tribunal é que pode autorizar a medida cautelar, ocorrendo a mesma situação nos casos de membros do Ministério Público e deputados federais; já na hipótese de ser o investigado governador de Estado,  quem pode autorizar a interceptação telefônica é o Presidente  do Superior Tribunal de Justiça.

MENDES, COELHO e BRANCO{C}[41] sustentam que a verificação a posteriori de que se trata de crime para o qual o juiz seria incompetente, não deve ensejar a nulidade da prova colhida, em razão de que sendo o procedimento cautelar, basta que exista, ab initio, o fumus boni iuris.

{C}b)     Indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal.

 

GOMES e CERVINI{C}[42] afirmam que a medida cautelar será executada quando houver indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal[43], ressaltando a inadmissibilidade pela lei de medida de prospecção se “determinada pessoa estaria ou não envolvida em algum crime”- tampouco de medida que se possa solicitar na fase pré delitual, ou seja, preventiva. Os autores sustentam a necessidade da existência concretamente de um fato que vá além de mera suspeita.

 

{C}c)    Que a infração penal seja crime punido com reclusão[44].

 

O afastamento de sigilo telefônico será admissível apenas quando o fato investigado constituir infração penal punida com reclusão, excluindo assim os crimes punidos com detenção e as contravenções penais (CAPEZ)[45].

CAPEZ{C}[46] critica a extensão do critério legal, sustentando que ao elencar genericamente todas as infrações penais apenas com reclusão como objeto da interceptação estendeu demasiadamente o rol dos crimes passíveis de serem investigados por meio do afastamento do sigilo telefônico, crimes que muitas vezes, não apresentam maior gravidade, não justificando o sacrifício de um direito fundamental como o sigilo das comunicações telefônicas.

CAPEZ{C}[47] ainda defende neste caso a necessidade de incidência da proporcionalidade dos bens jurídicos envolvidos, afastando o sacrifício do sigilo telefônico em prol de um bem de menor valor.

De encontro, BADARÓ{C}[48] ressalta que o critério legal é restrito demais ao considerar apenas a gravidade do crime, argumentando que há infrações penais que embora não sejam graves, em função de particularidades da forma de seu conhecimento, apenas podem ser apuradas por meio de interceptação telefônica, como por exemplo, o crime de ameaça.

Contudo, NUCCI[49] afirma que a jurisprudência tem admitido que as infrações apenadas com detenção comportem a interceptação telefônica desde que sejam conexas aos crimes cuja pena seja de reclusão.

 

d) Que não exista outro meio de se produzir a prova[50].

Conforme BADARÓ[51] para que possa ser autorizada a interceptação telefônica deve haver a demonstração da impossibilidade de que a investigação seja feita por diferentes meios disponíveis como, por exemplo, a busca e apreensão, o reconhecimento pessoal, as provas testemunhais. É necessária a indicação concreta de que a reconstrução dos fatos é impossível sem a interceptação telefônica.

FERNANDES{C}[52] ressalta que só será admitida a interceptação telefônica se este for o único meio capaz de evidenciar a autoria e a materialidade do crime, sob pena de não ser colhido importante elemento de prova.

{C}e)                      Que tenha por finalidade instruir investigação policial ou processo criminal.

 

Conforme CAPEZ[53] não se admite o afastamento do sigilo telefônico com a finalidade de instruir processo cível, como por exemplo, em ação de separação por adultério, em que é comum detetives “grampeando” o telefone do  cônjuge  suspeito,  já  que  a  autorização  só  é cabível em matéria criminal.

Nestes termos, entende-se que a interceptação telefônica só é possível no âmbito penal, conforme previsão do art. 1º da Lei 9.296/96, nos casos de investigação criminal e instrução processual criminal.

ARANHA{C}[54] refere-se que para a validade do procedimento de interceptação telefônica, há necessidade da observância também dos seguintes aspectos previstos na Lei 9.296/96:

a) O pedido deverá ser formulado pela autoridade policial ou representante do Ministério Público, fundamentado com descrição sobre o que incidirá a investigação e por que se deduz sobre a autoria;

b) O pedido fundamentado deverá ser acompanhado dos meios investigatórios a serem utilizados;

c) Formulado o pedido, com ou sem manifestação do Ministério Público, o juiz decidirá também fundamentadamente;

d) O prazo da diligência é de 15 dias, com possibilidade de renovação  por  igual período, caso seja comprovada a necessidade;

e) A interceptação deve ser gravada e uma vez feita será procedida à transcrição, conhecida como de gravação.  Se necessária, a prova pericial poderá examinar e concluir sobre a autenticidade ou não da voz, por meios técnicos.

f) Realizada a diligência a autoridade requerente e autorizada fará um auto com resumo do que foi obtido, remetendo ao juízo a fita com a gravação que interesse e sua respectiva transcrição;

g) Em juízo será determinado o apensamento aos autos, com a determinação de serem destruídas as partes que não forem de interesse ao processo.

Em uma breve síntese, verifica-se que para ser válido o procedimento de interceptações telefônicas e consequentemente para que a prova possa ser admitida no processo, devem ser observados os referidos requisitos constantes da Lei 9.296/96.

CAPÍTULO 3

 

DOS DIREITOS DO INVESTIGADO

 

3.1 Da Tutela Jurídica do Direito à Intimidade

 

A Intimidade é o âmbito particular da vida de cada indivíduo, em cujo local físico não é permitido intromissão de quem quer que seja sem consentimento. É uma garantia que deve ser defendida pelo Estado sendo, inclusive, limitador da atuação do próprio Estado, que somente em casos excepcionais pode suprimir.

Nas palavras de FONTES JUNIOR[55] sobre a origem dessa garantia:

A primeira manifestação doutrinária do direito à intimidade resultou da tentativa de traçar os limites jurídicos às intromissões da imprensa americana na vida privada [...].

[...] o direito à intimidade deriva da proteção mais genérica da inviolabilidade da pessoa, ou seja, do direito da própria personalidade. O direito à intimidade está expresso no artigo 5º, inciso X, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que prescreve:

Art. 5º. [...]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

 CENEVIVA [56] define o direito à intimidade da seguinte forma:

Os conceitos de intimidade e vida privada são muito próximos e correspondem ao direito da pessoa de não ser incomodada, no espaço físico que escolher, de viver por si mesma, livre de qualquer forma de divulgação ou de publicidade que não deseja suportar.

Inicialmente é necessário distinguir o direito à intimidade do direito à privacidade.

De modo geral, o direito à intimidade é espécie do direito à privacidade, que seria mais amplo. O direito à privacidade tem por objeto os comportamentos e acontecimentos concernentes aos relacionamentos pessoais em geral, às relações comerciais e profissionais que o indivíduo não deseja que se tornem públicas. Já o objeto do direito à intimidade são as conversações e episódios mais restritos, os quais envolvem, inclusive, relações familiares e amizades mais próximas[57].

O direito à intimidade conduz à pretensão do indivíduo não ser foco da observação por terceiros em suas conversações, de não ter seus assuntos, informações pessoais e características particulares expostas a terceiros.

Intimidade consiste, assim, na esfera secreta da pessoa física, mantendo forte ligação com a inviolabilidade do domicílio, com o sigilo das comunicações telefônicas, sigilo das correspondências e com o segredo profissional.

TAVARES0{C}[58] nesse sentido ensina que “significa intimidade tudo quanto diga respeito única e exclusivamente à pessoa em si mesma, a seu modo de ser e de agir. Abrange a inviolabilidade do domicílio, o sigilo das comunicações e o segredo profissional”.

O direito à intimidade traduz-se, portanto, no direito de opor-se à invasão da curiosidade alheia, tendo sido invocado contra a utilização abusiva de aparatos de captação de sons, por exemplo.

Assim, o sigilo das comunicações telefônicas é uma das manifestações do direito à intimidade e é, portanto, uma garantia fundamental com previsão no artigo 5º, inciso XII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que dispõe:

Art. 5º. [...]

XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, neste último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Como acontece com relação a qualquer direito fundamental, o direito à intimidade, bem como a garantia ao sigilo das comunicações telefônicas, também encontra limitações, que resultam do próprio fato de se viver em comunidade. Nenhum direito pode ser considerado de forma absoluta, nem mesmo os fundamentais, uma vez que podem e devem ser relativizados de forma a permitir a consolidação harmônica de outros direitos e valores de ordem constitucional.

Entende SOARES[59], ao citar Pinho, que “somente o exame de cada caso concreto permitirá saber se determinado fato particular receberá ou não o manto, a  proteção  do  direito  à  privacidade,  desde  que  preservado  o  interesse público”.

Deste modo, o constituinte de 1988, à luz do direito à intimidade, explicitou a inviolabilidade das comunicações, mas, sopesando o princípio da  segurança  jurídica  e  sua função  de  tutela  de  bens  jurídicos  legítimos, entendeu por bem autorizar a interceptação das comunicações telefônicas para que restassem subsídios que pudessem apontar o fato delituoso, quando imprescindível.

Pelo exposto, nota-se que a interceptação telefônica constitui exceção  ao  direito  à  intimidade  e  sigilo,  previstos nos  incisos  X  e  XII,  ambos  do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

3.1.1 (in)admissibilidade da interceptação telefônica como meio de prova

Quando legalmente disciplinadas e rigorosamente efetuadas dentro dos ditames estabelecidos pelo ordenamento jurídico, as interceptações telefônicas são lícitas e seus resultados serão admitidos no processo.

Em contrário senso, a interceptação telefônica stricto sensu e a escuta telefônica, quando feitas fora do constituído pelo ordenamento jurídico, regra geral, não devem ser admitidas no processo, por violação ao direito à intimidade.

A admissibilidade ou não das interceptações telefônicas, portanto, repousa na sua licitude e, nesse sentido, ADA PELLEGRINI, ANTONIO SCARANCE e GOMES Filho [60]prescrevem:

Evidentemente, tanto as interceptações como as gravações poderão ser lícitas ou ilícitas: serão lícitas quando obedecerem às prescrições constitucionais e legais; ilícitas, quando efetuadas em violação a tais preceitos.  Neste último caso, como visto, seu resultado será processualmente inadmissível e ineficaz.

Logo, a transformação da licitude da interceptação poderá se dar quando constatada violação às normas ou princípios constitucionais, sendo que a principal ilicitude ocorre quando a medida é realizada sem ordem judicial.

A interceptação telefônica poderá, ainda, ser considerada ilegítima, quando violar regras processuais.  No entanto, sua consequência será a irregularidade ou nulidade, absoluta ou relativa, e não a inadmissibilidade.

Não obstante a regra constitucional seja a inadmissibilidade da utilização das provas obtidas ilicitamente, excepcionalmente a interceptação telefônica poderá ser aceita, em atenção ao princípio da proporcionalidade que, somente em casos extremamente graves, admite a prova ilícita pro reo e pro societate.

Essa sistemática vem sendo acolhida não apenas junto aos doutrinadores, como também à jurisprudência, em obediência ao direito de defesa.

Conforme examinado, essa posição diminui a severidade da não aceitação incondicional das provas ilícitas diante da aferição entre direitos fundamentais.

3.1.2 A admissibilidade da interceptação telefônica pro reo

 

Uma vez que, conforme já apontado, os direitos fundamentais não podem ser entendidos em sentido absoluto, o princípio que veda as provas obtidas por meios ilícitos não pode destinar-se a abster outros princípios e garantias dos cidadãos, perpetuando condenações injustas.

Prevalece, conforme o princípio da proporcionalidade, o direito fundamental do acusado de livrar-se de uma infração que não cometeu, vista como mais importante para o ordenamento jurídico em relação ao sigilo das comunicações dos criminosos.

Nesse sentido é o entendimento de FREGADOLLI[61]:

[...] as provas obtidas ilicitamente sequer poderão ingressar no devido processo, ainda que inadvertidamente o juiz as deixe ingressar, o efeito é a sua absoluta invalidade para fins de condenação.  Todavia, em razão dos princípios também constitucionais, da presunção da inocência, e da ampla defesa, admite-se, excepcionalmente, que a prova obtida ilicitamente sirva para uma absolvição.

Ainda, discorre CAPEZ{C}[62]:

Entre aceitar uma prova vedada, apresentada como único meio de comprovar a inocência de um acusado, e permitir que alguém, sem nenhuma responsabilidade pelo ato imputado, seja privado injustamente de sua liberdade, a primeira opção é, sem dúvida, a mais consentânea com o Estado Democrático de Direito e a proteção da dignidade da pessoa humana.

Por isso, os Tribunais Superiores têm entendido que, como única prova  passível  de se reconhecer a inocência, como verdadeiro  estado  de necessidade, a prova ilícita poderá ser admitida pro reo.

Assim pronunciou o Supremo Tribunal Federal[63] em caso em que a escuta telefônica havia sido autorizada por vítima de corrupção passiva ou concussão:

“Habeas Corpus”. Utilização de gravação de conversa telefônica por terceiro com autorização de um dos interlocutores sem o conhecimento do outro quando há, para essa utilização, excludente de  antijuridicidade.  Afastada  a  ilicitude  de  tal  conduta  –  a  de,  por legítima defesa, fazer gravar e divulgar conversa telefônica ainda que não haja o conhecimento do terceiro que está praticando o crime –, é ela,  por  via  de  consequência,  lícita  e,  também,  consequentemente, essa gravação não pode ser tida como prova ilícita, para invocar-se o artigo  5º,  LVI,  da  Constituição  com  fundamento  em  que  houve violação da intimidade (art. 5º, X, da Carta Magna).

Não obstante o legislador não tenha tomado posição acerca do princípio da proporcionalidade, o entendimento doutrinário e jurisprudencial vem se pautando a admitir a prova ilícita quando em favor do réu.

3.1.3 A admissibilidade da interceptação telefônica pro societate

 

Diante da necessidade de se proteger a sociedade contra a ameaça gerada pela expansão da criminalidade organizada, que se infiltra cada vez mais em todas as esferas do poder, criando uma verdadeira “sociedade do crime”, a possibilidade de flexibilizar a vedação constitucional às provas obtidas por meios ilícitos quando forem em benefício da sociedade e, como consequência, em desfavor do réu, é questão ainda delicada.

O entendimento predominante na doutrina é no sentido de que a prova ilícita somente poderia ser admitida em favor do réu, todavia, em casos isolados este entendimento pode ser ampliado.

A regra é que todo cidadão merece o amparo ou proteção constitucional dos seus direitos fundamentais, mas, a partir do momento em que faz mal uso  desses  direitos,  deixa  também  de  continuar  merecendo  proteção, principalmente quando se contrapõe ao interesse público.

Tal entendimento já foi proferido pelo Superior Tribunal de Justiça[64], em decisão cuja ementa se transcreve:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. “HABEAS CORPUS”.

ESCUTA TELEFÔNICA COM ORDEM JUDICIAL.  RÉU CONDENADO  POR  FORMAÇÃO  DE  QUADRILHA  ARMADA,  QUE SE  ACHA  CUMPRINDO  PENA  EM  PENITENCIÁRIA,  NÃO  TEM COMO  INVOCAR  DIREITOS  FUNDAMENTAIS  PRÓPRIOS  DO HOMEM  LIVRE  PARA  TRANCAR  A  AÇÃO  PENAL  (CORRUPÇÃO ATIVA)  OU  DESTRUIR  GRAVAÇÃO  FEITA  PELA  POLÍCIA.  O INCISO LVI DO ART. 5. DA CONSTITUIÇÃO, QUE FALA QUE “SÃO INADMISSÍVEIS AS PROVAS OBTIDAS POR MEIO ILÍCITO”,  NÃO TEM  CONOTAÇÃO  ABSOLUTA.  HÁ  SEMPRE  UM  SUBSTRATO ÉTICO  A  ORIENTAR  O  EXEGETA  NA  BUSCA  DE  VALORES MAIORES  NA  CONSTRUÇÃO  DA  SOCIEDADE.  A PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA, QUE É DIRIGENTE E PROGRAMÁTICA, OFERECE AO JUIZ, ATRAVÉS DA “ATUALIZAÇÃO CONSTITUCIONAL” (VERFASSUNGSAKTUALISIERUNG), BASE PARA O. ENTENDIMENTO DE  QUE  A  CLÁUSULA  CONSTITUCIONAL INVOCADA  É  RELATIVA.  A JURISPRUDÊNCIA NORTE AMERICANA, MENCIONADA EM PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEREAL, NÃO É TRANQUILA. SEMPRE É INVOCÁVEL O PRINCÍPIO DA “RAZOABILIDADE”  (REASONABLENESS).  O “PRINCÍPIO DA EXCLUSÃO DAS PROVAS ILICITAMENTE OBTIDAS” (EXCLUSIONARY RULE) TAMBÉM LÁ PEDE TEMPERAMENTOS. ORDEM DENEGADA.

Nesse sentido, quando o conflito se estabelecer entre a garantia do sigilo  do  acusado e  a  necessidade  de  se admitir uma  interceptação considerada ilícita, a fim de tutelar a vida, o patrimônio e a segurança da sociedade, o juiz deve avaliar o caso concreto e sopesar os valores contrastantes envolvidos.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal{C}[65] adotou a orientação de que é possível restringir um direito fundamental em benefício da sociedade, mutatis mutandis:

HABEAS CORPUS – ESTRUTURA FORMAL DA SENTENÇA E DO ACÓRDÃO– OSERVÂNCIA – ALEGAÇÃO DE INTERCEPTAÇÃO CRIMINOSA DE CARTA MISSIVA REMETIDA POR SENTENCIADO– UTILIZAÇÃO DE CÓPIAS XEROGRÁFICAS NÃO AUTENTICADAS – PRETENDIDA ANÁLISE DA PROVA – PEDIDO INDEFERIDO – [...] – A administração penitenciária, com fundamento em  razões  de  segurança  pública,  de  disciplina  prisional  ou  de preservação  da  ordem  jurídica,  pode,  sempre  excepcionalmente,  e desde que respeitada a norma inscrita no art. 41, parágrafo único, da Lei  n.  7.210/84,  proceder  a  interceptação  da  correspondência remetida  pelos  sentenciados,  eis  que  a  cláusula  tutelar  da inviolabilidade  do  sigilo  epistolar  não  pode  constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas. – O reexame da prova produzida  no  processo  penal  condenatório  não  tem  lugar  na ação sumaríssima de habeas corpus. (sem grifo no original)

Em face do exposto, no confronto entre o direito a provar a própria inocência e a vedação constitucional às provas ilícitas, aquele deve prevalecer. Já no que tange ao confronto entre a dita vedação e o interesse da sociedade em punir um criminoso, não há posicionamento absoluto.

          A doutrina e a jurisprudência, apesar de ainda minoritária, vêm pendendo no sentido de aceitar a prova ilícita pro societate, desde que presentes os requisitos da excepcionalidade e gravidade, porquanto os direitos fundamentais não podem ser considerados em sentido absoluto.

Por derradeiro, ao magistrado cabe o difícil papel de encontrar o verdadeiro ponto de equilíbrio entre a necessidade de se coibir o uso da prova ilícita na instrução probatória e a necessidade imposta pelo interesse público de assegurar ao processo um resultado justo, sem desprezar qualquer elemento que contribua para o descobrimento da verdade.

Assim, a interceptação telefônica, quando imprescindível, deve ser admitida, por adoção ao princípio da proporcionalidade, que deverá ser empregado pro reo e pro societate, considerando, principalmente, a evolução tecnológica empregada como meio de perpetuação da criminalidade organizada[66].

CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto neste trabalho, conclui-se que o artigo 5º da Constituição Federal, traz interpretações duvidosas sobre sua intenção. Resguardadas a norma do sigilo das comunicações em todas as suas formas, permitindo somente a quebra em caso de comunicação verbal para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, mediante autorização judicial.

Entende-se o constituinte, com essa restrição a quebra do sigilo, quis proteger a informações decorrentes de redes de computadores por vias telefonia ou similares.

Entretanto, com o avanço tecnológico, hoje é possível interligar computadores via rede telefônica, permitindo, assim, obter informações institucionais ou empresariais permanentemente atualizadas. Essa troca de dados entre os computadores foi um dos fatores que levaram o legislador a introduzir na redação do artigo 5º da Constituição Federal a inviolabilidade da comunicação de dados.

Sob o aspecto processual penal, quanto à licitude da prova, este tem como um de seus princípios norteadores o da verdade real, porem, observamos um encontro deste principio com o da inadmissibilidade da prova obtida por meios ilícitos. Uma vez que podem existir situações em que a verdade real é concretizada através de provas obtidas por meios ilícitos,  ou seja, os fins devem prevalecer em detrimento dos meios, é o que se pode concluir face a realidade em que vivemos.

Há que se considerar, conforme doutrina e a jurisprudência processual penal, que a prova obtida por meios de gravação de conversa telefônica só é ilícita se realizada por terceiro sem autorização judicial.

Em suma, dada à diversidade de opiniões a respeito do tema, e a inexistência de norma regulamentadora, cabe ao juiz, no seu prudente arbítrio, examinar caso a caso, as possibilidades em que possa considerar determinada prova obtida por meio de escuta telefônica ilícita ou não, temperando-se, quando necessário, com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, regras basilares para que se interprete harmoniosa e equilibradamente a Constituição Federal referendo, pois, o livre arbítrio que, muita vezes, caracteriza o Estado brasileiro, para que esse não destrua, ainda mais, a nossa tão frágil e devassada intimidade.

Não se pode deixa de reconhecer a importância da edição da lei 9.296/96 que, se bem utilizada, contribuíra, e muito, para apuração de delitos.

Deve ser respeitado o seu procedimento e há que se buscar o aperfeiçoamento de diploma legal, para o qual, com certeza, a jurisprudência e a doutrina pátrias saberão apontar os eventuais equívocos que só serão detectados com o passar do tempo.

É relevante, finalmente, salientar que, a despeito de tudo de que existe o interesse público na investigação de possíveis infrações, deve ser respeitado o direito das pessoas à intimidade e à vida privada conforme disposto no Artigo 5º da Constituição Federal.

Mas ao fazer uma simples analise deste, já temos a informação que não se trata de um direito absoluto, inviolável, já que tem casos em que é possível a violação dentro dos termos legais para ser utilizado como instrumento probatório, a ainda pode ser utilizado para prejudicar o réu.

Assim ao realizar o presente estudo, surgiu uma imprecisão, “todos são iguais perante a Lei” princípio da isonomia, igualdade, visto que não é o que acontece no âmbito de uma investigação criminal, seja no simples ato de desrespeito praticado pelo agente investigativo, bem com o uso de informações privilegiadas para se alcançar um fim específico, onde deveria haver encontrar o ponto de equilíbrio, com o objetivo de proteger os bens e preservar os direitos fundamentais.

 

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