Do conceito de empregador e a redação do artigo 2o § 2º da CLT
O artigo 2º da CLT dispõe que o empregador é a "empresa individual ou coletiva, que assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços". Maurício Godinho Delgado (2003, p. 386.) define empregador como "a pessoa física, jurídica ou ente despersonificado que contrata uma pessoa física a prestação de seus serviços, efetuados com pessoalidade, onerosidade, não-eventualidade e sob sua subordinação."
Délio Maranhão (2003, p. 294) explica que o legislador partiu da falsa premissa de que o empregador seja a empresa, e de que a atividade econômica suponha necessariamente lucro, daí a redação do § 1 que diz que "os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, equiparam-se ao empregador". Sabe-se que eles, ao admitirem empregados, são empregadores e não equiparados. Não é técnica a redação do artigo, uma vez que a empresa não se confunde com a sociedade, sendo que a personalidade jurídica pertence a esta.
Alguns autores, como João Casillo (1979, p. 40) e parte da jurisprudência aplica o artigo 2º, § 2º da CLT [01], para desconsiderar a personalidade jurídica. Tal entendimento é equivocado, como se demonstrará, haja vista não se confundir responsabilidade subsidiária com desconsideração [02]. Assim estabelece o citado artigo:
Art. 2 º (omissis)
§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.
Contudo, não se concorda com a utilização do art. 2º, § 2º da CLT [03] como forma de se desconsiderar a personalidade jurídica. O citado artigo somente dispõe que haverá desconsideração da personalidade jurídica no caso de várias sociedades que estejam sob direção, controle ou administração umas das outras e tiverem convergência de interesses, para fins de relação de emprego. Essa desconsideração tem sua importância ao evitar que se burlem os direitos dos empregados de cada uma dessas sociedades, que serão solidariamente responsáveis e não terão autonomia para os fins do dispositivo, como se um só grupo econômico fossem.
Octávio Bueno Magano (1979, p. 307), ao analisar os grupos de empresa no Direito do Trabalho, traz a tese do empregador único [04]. Referindo-se à desconsideração, entende que a mesma deva ser aplicada sempre que se demonstre a existência do grupo de empresas, sendo desnecessária a averiguação de fraude.
De fato, a lei é clara quanto a esta responsabilização, a qual não se confunde com a teoria da desconsideração. A responsabilização do grupo de empresas não está condicionada à insuficiência de patrimônio da sociedade empregadora e à dependência financeira de uma em relação à outra, nem a quaisquer outros parâmetros, bastando que se comprove a existência do grupo.
O próprio Rubens Requião (1979, p. 20), que introduziu a teoria no Brasil, entende que o artigo em discussão trata de desconsideração:
Quando a Consolidação das Leis do Trabalho, por exemplo, no art. 3º, concebe como uma única entidade econômica a união de empresas, ou entre a empresa "mater" e suas filiadas, para os efeitos do direito social, nada mais está admitindo senão aplicação da doutrina, pois despreza e penetra o "véu" que as encobre e individualiza, desconsiderando a personalidade independente de cada uma das subsidiárias.
Talvez a confusão ocorra em virtude do resultado prático da aplicação do dispositivo em questão. O art. 2º, § 2º da CLT, amplia o pólo passivo da responsabilização dos débitos existentes em relação ao empregado, com a responsabilização solidária das sociedades coligadas. Assim, neste caso, os sócios teriam uma responsabilidade subsidiária, não em função da desconsideração, mas porque o trabalho é protegido pelos princípios da intangibilidade, irredutibilidade e inalterabilidade.
Do princípio da proteção
O objetivo fundamental do Direito do Trabalho é proteger uma das partes, quando esta for hipossuficiente em relação à outra, com o propósito de alcançar uma igualdade substancial verdadeira entre as mesmas. [05] Em regra, a parte hipossuficiente é o empregado. Nesse sentido, Américo Plá Rodrigues (2000, p.26), comentando sobre a atuação do princípio protetor afirma que "orienta o Direito do Trabalho, pois este, ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo prefacial a uma das partes: o trabalhador."
Contudo apesar de ser uníssona a existência do princípio, deve-se questionar até que ponto a proteção ao trabalhador é realmente eficaz, ou seja, ao se atentar contra a livre iniciativa empresarial, contra a vontade de desenvolvimento do Estado, não se estaria prejudicando os trabalhadores em vez de protegê-los?
Thereza Cristina Nahas (2004, p. 18), na introdução de sua tese de doutoramento, salienta que o Estado se vê diante de duas grandezas a serem protegidas:
o interesse daqueles que acreditam nos entes cuja criação se permite para desenvolvimento de certa atividade em benefício de todos; e o interesse daqueles que se dispõem a investir no mercado e não logram alcançar o objeto idealizado, por motivos não queridos ou por situações para as quais ás vezes não contribuíram. [...] Não podemos partir de uma noção distorcida de que todo aquele que acaba por não ter êxito nos seus negócios estaria agindo de má-fé. Não podemos olvidar que o Brasil é um país de difícil economia.
Não se pretende culpar os trabalhadores pelos seus direitos tão arduamente conquistados, mas somente salientar que a proteção deve ser limitada em prol de um interesse maior, que é o pleno emprego.
José Pastore (2001,p.49), ao se referir ao protecionismo cambial, adverte que "as mudanças são essenciais para gerar empregos e atrair divisas". No sentido do presente estudo, mudanças de orientação na jurisprudência trabalhista são necessárias, uma vez que não basta verificar a insuficiência patrimonial da sociedade para a aplicação da teoria da desconsideração, posição defendida por ilustres doutrinadores
Na desconsideração da personalidade jurídica à luz do Direito do Trabalho, por se privilegiar o empregado, existe uma maior amplitude da incidência da desconsideração, já que se procura evitar situações de possíveis abusos, como uma sociedade com capital inexpressivo contratar empregados sem ter condições de pagá-los. Contudo, não se coaduna com os princípios gerais do Direito, tendo em vista que somente algumas condutas levam à desconsideração da personalidade jurídica.
Deve-se avocar uma análise casuística, com o fim de verificar se houve abuso no uso da personalidade jurídica e seus responsáveis. Verificando-se a ocorrência desse abuso, é lícito ao juiz aplicar tal medida também na esfera trabalhista, pois os créditos trabalhistas não podem ficar sem satisfação em razão de prática de ilícito por algum sócio. Ressalte-se, contudo, que os sócios isentos de posturas ilícitas ou abusivas não podem ser prejudicados pela desconsideração.
Em suma, o princípio protetor deve ser aplicado em concomitância com os demais institutos do direito, com a finalidade de se combater o mau uso da pessoa jurídica e se evitar que o empregado não encontre a satisfação de seu crédito.
Dos requisitos para aplicação da teoria da desconsideração
É freqüente o esquecimento de que a doutrina da desconsideração representa um aperfeiçoamento do instituto da pessoa jurídica e não a sua negação. Alguns requisitos são indispensáveis à utilização da teoria, como:
a)constituição regular da pessoa jurídica - não sendo inscrito o ato constitutivo no registro próprio, na forma do artigo 1145 do NCC, não há personalidade, não se podendo falar em desconsideração [06];
b)abuso ou fraude através da utilização da pessoa jurídica, causando prejuízo a terceiros;
c)impossibilidade de se atingir o patrimônio do sócio de maneira diversa - em havendo norma declarando a solidariedade ou subsidiariedade, ou em se tratando dos institutos da fraude a execução ou atos ultra vires, não há por que se desconsiderar a personalidade jurídica.
Portanto, a desconsideração deve ser aplicada com cautela, mediante provas inequívocas de fraude e/ou abuso de direito, e apenas excepcionalmente, sob pena de se deixar de incentivar a livre iniciativa e negar de plano o privilégio da autonomia patrimonial, principal atrativo da pessoa jurídica.
Por outro lado, não se deve esquecer que a aplicabilidade da teoria independe de norma específica. Contudo, é certo que a mesma fixa uma exceção e não uma regra à execução do crédito trabalhista, logo deve ser aplicada cautelosamente.
Em suma, pode-se distinguir duas teorias, a que se funda na comprovação do requisito subjetivo e a teoria objetiva, cujo precursor foi Fábio Comparato, já analisada. Segundo o requisito objetivo, a desconsideração da personalidade jurídica é condicionada à demonstração de desvio da pessoa jurídica, ou seja, em se utilizando o sócio de fins diversos dos pretendidos pela lei, há de ser desconsiderada a personalidade, ainda que não se demonstre a prova do abuso de direito. Por sua vez, utilizando-se do requisito subjetivo, o mau uso da personalidade há de ser demonstrado.
A correta aplicação da teoria do disregard of legal entity confere não apenas proteção ao crédito trabalhista - permitindo a execução de bens dos sócios -, como também institui garantia à propriedade de terceiros, ressalvando os bens de pessoas físicas que não integram o quadro societário da empresa.
Faz-se mister o estudo aprofundado do tema, uma vez que, ao se aplicar a teoria a todo e qualquer caso de insolvência, corre-se o risco de desestruturar toda uma legislação específica consagrada, causando, conseqüentemente, a insegurança das relações jurídicas. Assim posiciona-se Roberto Fragale Filho (2003, P. 287):
[...] se por um lado é inegável que se impõe a proteção dos direitos do trabalhador; por outro lado, não se pode suprimir toda e qualquer segurança jurídica. Ou seja, não se pode "reificar" a tutela do trabalhador, assumindo indiscriminadamente que todas as modificações na estrutura da personalidade jurídica foram (e são) efetuadas com o intuito de fraudar os direitos do empregado.
Questão complexa e que deve ser analisada com muito cuidado é a aplicação da teoria no Direito do Trabalho. Se, por um lado, o empregado não pode ficar desprotegido, por outro lado, a teoria não pode ser aplicada indiscriminadamente, sem qualquer requisito. Entender-se de forma contrária conduziria à insegurança das relações jurídicas e ao próprio desestímulo à livre iniciativa.
Concorda-se com as idéias de Priscila Mathias Rabelo Morais (2003, p. 55) no sentido da necessidade de se ponderar os interesses, conforme a autora explicita a seguir:
Da mesma forma que a segurança jurídica encontra limite no princípio protetor também há de ser limitado pela segurança jurídica. Insta, dessa forma, encontrar o ponto de equilíbrio desejável. Para tanto, mister se faz valer-se dos princípios informativos do ordenamento jurídico e das normas nele positivada.
Cabe ao juiz do trabalho, na análise do caso concreto, verificar a presença dos requisitos autorizadores da aplicação da teoria, sem deixar de lado a "proteção do hipossuficiente", na qual se baseia o Direito do Trabalho. Rubens Requião(op. Cit) assim se manifesta: "Ora, diante do abuso de direito e da fraude do uso da personalidade jurídica, o juiz brasileiro, tem o direito de indagar, em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude".
Atualmente, o artigo 50 do NCC que, por ser norma geral, justifica a sua aplicabilidade no Direito do Trabalho, fixa critérios objetivos para a aplicação da teoria, quais sejam: a confusão patrimonial e o desvio de finalidade.
Deve-se ressaltar que, ao se afastar a aplicabilidade do brocardo jurídico de que o "ordinário se presume e o extraordinário deve ser provado", verifica-se que na Justiça do Trabalho ocorre uma inversão dos fatos, ou seja, a fraude é presumida. Há de se ter cuidado com tal entendimento, pois traz o risco de se desestimular o crescimento econômico do país. Os sócios que têm seus bens atingidos muitas vezes são micro e pequenos empresários, frutos do insucesso e da concorrência desleal no mundo dos negócios. Na maioria das vezes, sequer contratam advogados para defendê-los, acabando por ter seus bens penhorados, e muitas vezes nem mesmo o bem de família é respeitado.
Fábio Ulhôa Coelho (2002, p.35) chega a afirmar que a desconsideração aplicada atualmente no Brasil apresenta duas teorias: "uma maior e uma menor". A maior tem base sólida e se trata da verdadeira desconsideração, vinculada à verificação do uso fraudulento da personalidade jurídica. A menor aplica a teoria a qualquer situação em que haja insolvência da sociedade. A fraude é presumida.
Na realidade, o que o autor chama de teoria menor é uma visão distanciada da teoria original, formulada por Rolf Serick, fundada na análise de casos e compatível com o sistema da civil law Na teoria menor, não há distinção entre a desconsideração e outros institutos, como fraude a credores, dissolução irregular da sociedade, atos ultra vires, responsabilidade subsidiária. Em que pese haver quem entenda se tratar de uma visão deturpada do instituto, na realidade é uma aplicação extensiva do mesmo.
Ao se proceder a uma análise mais profunda dos princípios informadores e se verificando a finalidade do Direito do Trabalho, justifica-se tal alargamento, na maioria das vezes. Em outros casos, não se faz necessário evocar-se a teoria, uma vez que a própria legislação já concede meios eficazes de proteção ao trabalhador.
É certo que o empregado não pode correr o risco de uma execução ineficaz, porém também é certo que o empregador não pode ter seu patrimônio atingido em qualquer hipótese. Tarefa difícil é encontrar-se o meio-termo. Tentar-se-á, ao final, após a análise da teoria em comento, bem como de institutos similares, chegar a uma conclusão, de como adequar-se a desconsideração à livre-iniciativa. Fábio Ulhôa Coelho (op.cit., p.38) discorre acerca do assunto da seguinte forma:
Se o direito não dispuser de instrumentos de garantia para os empreendedores, no sentido de preservá-los da possibilidade de perda total, eles tenderão a buscar maior remuneração para os investimentos nas empresas. Em outros termos, apenas aplicariam seus capitais em negócios que pudessem dar lucro suficiente para constituírem um patrimônio pessoal de tal grandeza que não poderiam perder-se inteiramente na hipótese de futura e eventual responsabilização. Ora, para gerar lucro assim, a sociedade deve reduzir custos e praticar preço elevado. O princípio da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, observado em relação às sociedades empresárias, socializa as perdas decorrentes do insucesso da empresa entre seus sócios e credores, propiciando o cálculo empresarial relativo ao retorno dos investimentos.
Na Justiça do Trabalho, a "socialização das perdas" reflete-se claramente no emprego dos trabalhadores.
Inúmeras vozes levantam-se contra a ampliação sem limites da responsabilidade dos sócios. Conforme se verifica, através do parecer abaixo transcrito, o entendimento de Ives Gandra Martins (2004) se coaduna in totum com o exposto no presente capítulo:
Assim, podemos concluir que a responsabilidade do sócio quotista pelas dívidas trabalhistas da empresa, em sociedade por quotas de responsabilidade limitada na qual tenha integralizado a sua parte das quotas (hipótese mais comum em que a controvérsia judicial se instala), só pode ocorrer quando demonstrada a fraude na constituição, administração ou desfazimento da sociedade e comprovada a insuficiência do patrimônio social.
Querer extrapolar tal responsabilidade, com base no caráter protetivo do Direito do Trabalho, é ir além do que a lei permite. Se, por um lado, o empregado não arca com os riscos da atividade econômica (CLT, art. 2º), por outro a legislação comercial é clara ao estabelecer os limites e as condições em que os bens pessoais dos sócios responderão pelas dívidas da sociedade. O simples insucesso da atividade econômica, por razões alheias à vontade do empresário, não pode importar na sua responsabilização ilimitada, pois, conforme diz o adágio latino: "summum jus, summa injuria".
Em que pese não se tratar o artigo 2º § 2º da CLT de desconsideração, é inquestionável que a teoria tem aplicação no âmbito trabalhista. Porém, desde que verificados os requisitos autorizadores, analisados no presente artigo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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FRAGALE FILHO, Roberto. A desconsideração da personalidade jurídica no novo Código Civil e sua repercussão nas relações trabalhistas. LTR, São Paulo, v. 67, n. 3, mar. 2003, p. 287.
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MAGANO, Octávio Bueno. Os grupos de empresa no Direito do Trabalho. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1979, p. 307-308.
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MORAIS, Priscila Mathias Rabelo. Da responsabilização dos sócios na execução trabalhista. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade de São Paulo. São Paulo, 2003. 237 f., p. 55
NAHAS, Thereza Cristina. Desconsideração da personalidade jurídica: reflexos civis e empresariais nas relações de trabalho. São Paulo: Atlas, 2004, p. 18.
PASTORE, José. A evolução do trabalho humano: leituras em relações do trabalho. São Paulo: Ltr, 2001, p. 49. Na apresentação do livro, que se consubstancia numa coletânea de diversos artigos em relação do mundo do trabalho, o autor esclarece que "o mundo do trabalho é, por natureza, entrelaçado. Mais do que isso, é um verdadeiro caleidoscópio, que se modifica a cada momento, seguindo a sua própria lógica - o que requer uma visão multifacetada do lado de quem investiga o terreno."
REQUIÃO, Rubens. Abuso de Direito e fraude através da personalidade jurídica. Revista dos Tribunais,São Paulo, v.410, p.12-24,dez.1969.
RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 2
SILVA, Alexandre Couto. Desconsideração da personalidade jurídica: limites para sua aplicação. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 780, out. 2000, p. 5
NOTAS
01
Execução trabalhista. Responsabilidade objetiva dos sócios. Despersonalização do empregador. No Processo do Trabalho, a responsabilidade dos sócios é objetiva, respondendo os mesmos com seus respectivos patrimônios no caso de descumprimento de obrigações trabalhistas, de forma a obstar o locupletamento indevido do trabalho alheio. É facultado ao Juiz, nesse caso, adotar a teoria da despersonalização do empregador, insculpida no "caput" do art. 2º da CLT, de modo que o crédito trabalhista persegue o patrimônio para onde quer que vá, como um direito de seqüela. Se o patrimônio da empresa desaparecer, pouco importando a causa, os sócios, diretores e dirigentes respondem com seus patrimônios particulares." (TRT/SP, 8ª Turma, Processo 029603117006, Ac. 02970004580, DOJ, 16-1-1997).02
Neste sentido, manifestou-se Alexandre Couto Silva (2000, p. 55): "Não é caso, pois de desconsideração, mas de responsabilidade das sociedades pertencentes ao mesmo grupo, na medida em que o simples fato da existência deste não justifica a desconsideração.".03
O artigo 3 § 2 da Lei nº 5889/73 aplica-se ao grupo de empresas no meio rural.04
Sumulado através do Enunciado 121 o qual se confrontava com o Enunciado 219 que, por sua vez, foi cancelado.05
"EXECUÇÃO TRABALHISTA - SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA – RESPONSABILIZAÇÃO DOS SÓCIOS – TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – NECESSIDADE DE SE FAZER, QUANTO À ANÁLISE DESTA TEORIA, UMA MITIGAÇÃO NA JUSTIÇA DO TRABALHO. Tendo em vista o princípio de proteção ao hipossuficiente nesta especializada e o fato de não poder o empregado ser responsabilizado pelos riscos do empreendimento, deve-se, abrandando a análise da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, responsabilizar os sócios da mesma pelos débitos trabalhistas. Ademais, quando o executado não indica bens livres e desembaraçados da sociedade (art. 596, § 1º, do CPC) e nem faz prova da inexistência dos pressupostos apontados nos arts. 10 do Dec. nº 3.708/19 e 28 do CDC – Lei nº 8.078/90. (TRT 20ª R. – AP 0623/01 – (1111/01) – Rel. Juiz Carlos Alberto Pedreira Cardoso – J. 29.05.2001)06
Em ALVES, Alexandre. A Desconsideração da Personalidade Jurídica à Luz do Direito Civil-Constituiconal, tese, 418 f.,UERJ,2003., p. 142 se esclarece o seguinte: "É pressuposto indispensável para a aplicação da teoria, a existência de uma pessoa de direito, e não irregular ou de fato, haja vista ser a personalidade um atributo conferido pelo direito positivo para certos grupos, não sendo uma decorrência meramente fática da união de pessoas ou da afetação de bens para determinados fins. Destarte, inaplicável a desestimação nas sociedades em comum e em conta de participação (sociedades não personificadas - art. 986 e 991 do Código Civil) em face da inexistência de autonomia subjetiva."De fato, nas sociedades em conta de participação, o Código Civil, artigo 993, dispõe que não haverá aquisição de personalidade jurídica, ainda que seus estatutos sejam registrados. Já as sociedades em comum, também denominadas, de fato, irregulares, regulamentadas pelos artigos 986 a 990 do Código Civil, caracterizam-se por serem agrupamento de pessoas que praticam atos inerentes às sociedades empresárias, sem que tenham cumprido a formalidade de registro de seus atos constitutivos. Os sócios são solidariamente responsáveis, não havendo personalidade jurídica a se desconsiderar.