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A Lei de Improbidade Administrativa vista pela doutrina e jurisprudência.

Comentários à Lei nº 8.429/92

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25/01/2006 às 00:00
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CAPÍTULO IV

DA DECLARAÇÃO DE BENS

Art. 13. A posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de declaração dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada no Serviço de Pessoal competente.

§ 1º. A declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações, e qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizados no País ou no exterior e, quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do cônjuge ou companheiro, dos filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do declarante, excluídos apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.

§ 2º. A declaração de bens será anualmente atualizada e na data em que o agente público deixar o exercício do mandato, cargo, emprego ou função.

§ 3º. Será punido com a pena de demissão, a bem do serviço público, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, o agente público que se recusar a prestar declaração dos bens, dentro do prazo determinado, ou que a prestar falsa.

§ 4º. O declarante, a seu critério, poderá entregar cópia da declaração anual de bens apresentada à Delegacia da Receita Federal na conformidade da legislação do Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza, com as necessárias atualizações, para suprir a exigência contida no caput e no § 2º deste artigo.


CAPÍTULO V

DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO E DO PROCESSO JUDICIAL

Art. 14. Qualquer pessoa poderá representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação destina a apurar a prática de ato de improbidade.

§ 1º. A representação, que será escrita ou reduzida a termo e assinada, conterá a qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de que tenha conhecimento [19].

19 Veda-se a denúncia anônima (art. 5.° , IV, da CF/88).

§ 2º. A autoridade administrativa rejeitará a representação, em despacho fundamentado, se esta não contiver as formalidades estabelecidas no § 1º deste artigo. A rejeição não impede a representação ao Ministério Público, nos termos do artigo 22 desta Lei.

§ 3º. Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma prevista nos artigos 148 a 182 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e, em se tratando de servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.

Art. 15. A comissão processante dará conhecimento ao Ministério Público e ao Tribunal ou Conselho de Contas da existência de procedimento administrativo para apurar a prática de ato de improbidade.

Parágrafo único. O Ministério Público ou Tribunal ou Conselho de Contas poderá, a requerimento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.

Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público.

§ 1º. O pedido de seqüestro [20] será processado de acordo com o disposto nos artigos 822 e 825 do Código de Processo Civil.

20 O termo correto seria arresto, pois não se trata de entrega de coisa certa.

§ 2º. Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens, contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da lei e dos tratados internacionais.

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada [21], dentro de 30 (trinta) dias da efetivação da medida cautelar.

221 Somente o Ministério Público e a pessoa jurídica atingida pelo ato é que têm legitimidade para figurar no pólo ativo. A pessoa jurídica poderá, ainda, se quiser, integrar a lide na condição de litisconsórcio facultativo. Se o Ministério Público não atuar como parte, deverá figurar no processo como custos legis, sob pena de nulidade. Nesse sentido: REsp. n.° 319009, j. 04.11.02.

§ 1º. É vedada [22] a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.

§ 2º. A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementação do ressarcimento do patrimônio público.

§ 3º. No caso da ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se no que couber, o disposto no § 3º do artigo 6º da Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965.

§ 4º. O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará, obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

§ 5º A propositura da ação prevenirá a jurisdição [23] do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.

23 Juarez Freitas critica a vedação de transação, pois está "na contramão das melhores técnicas contemporâneas de valorização do consenso e da persuasão. O Direito Público, em novas bases, reclama estratégias conciliatórias que não significam dispor indevidamente do interesse público, porém, ao contrário, realizá-lo de modo mais efetivo e justo". No entanto, a jurisprudência tem se orientado no sentido do texto legal (AI 700046669644, j. 25.09.02, TJRS; REsp. n.° 327408, j. 14.03.05).

§ 6º A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil.

§ 7º Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias [24].

24 Segundo o TRF4, sem notificação prévia, é causa de nulidade absoluta, independente de prejuízo (AI 2004.0401006097, DJ 11.08.04).

§ 8º Recebida a manifestação, o juiz, no prazo de trinta dias, em decisão fundamentada, rejeitará a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita.

§ 9º Recebida a petição inicial, será o réu citado para apresentar contestação.

§ 10. Da decisão que receber a petição inicial, caberá agravo de instrumento.

§ 11. Em qualquer fase do processo, reconhecida a inadequação da ação de improbidade, o juiz extinguirá o processo sem julgamento do mérito.

§ 12. Aplica-se aos depoimentos ou inquirições realizadas nos processos regidos por esta Lei o disposto no art. 221, caput e § 1º, do Código de Processo Penal.

Art. 18. A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano ou decretar a perda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento ou a reversão dos bens, conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.


CAPÍTULO VI

DAS DISPOSIÇÕES PENAIS

Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente público ou terceiro beneficiário quando o autor da denúncia o sabe inocente.

Pena - detenção de 6 (seis) a 10 (dez) meses e multa.

Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.

Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual [25].

25 Somente em situações excepcionais se têm admitido o afastamento provisório da função pública. Ou seja: quando comprovadamente indispensável à instrução do feito. Nesse sentido: REsp. n.° 550135, DJ 08.03.04.

Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta Lei independe:

I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público [26];

26 Maria Sylvia Zanella Di Pietro elucida: "Seria inconcebível punir-se uma pessoa se de seu ato não resultasse qualquer tipo de dano. Tem-se que entender que o dispositivo, ao dispensar o "dano ao patrimônio público" utilizou a expressão patrimônio público em seu sentido restrito de patrimônio econômico. (...) Assim, o que quis dizer o legislador, com a norma do artigo 21, I, é que as sanções podem ser aplicadas mesmo que não ocorra dano ao patrimônio econômico. (...) O mesmo pode ocorrer com as hipóteses do artigo 9º, em que a improbidade é caracterizada pelo enriquecimento ilícito; o fato de uma pessoa enriquecer ilicitamente no exercício de função pública pode não acarretar necessariamente dano ao patrimônio econômico-financeiro; por exemplo, se uma pessoa receber propina para praticar um ato que realmente é de sua competência".

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II - da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas.

Art. 22. Para apurar qualquer ilícito previsto nesta Lei, o Ministério Público, de ofício, a requerimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo com o disposto no artigo 14, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou procedimento administrativo.


CAPÍTULO VII

DA PRESCRIÇÃO

Art. 23. As ações destinadas a levar a efeito as sanções [27][28] previstas nesta Lei podem ser propostas:

27 Há divergência na doutrina e jurisprudência acerca da aplicabilidade do art. 37, 5.° , da CF/88, nos casos da ação civil pública por atos de improbidade administrativa.

Pela corrente minoritária, a expressão constitucional "ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento" é inaplicável às ações de improbidade administrativa, pois a causa petendi dessas ações está na aferição da improbidade, enquanto que nas vias normais de ressarcimento exigir-se-á: culpa, dano e nexo causal. E mais: o ressarcimento, pela lei da improbidade administrativa, é sanção, o que, segundo o texto constitucional, não está acobertada pela exceção do prazo de prescrição. Esse é o entendimento do AI n.° 70005302146, j. 13.06.03, abaixo transcrito:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO. DANO AO ERÁRIO. Encontrando-se prescrita a ação de improbidade administrativa, o que ocorre no prazo de cinco anos a contar do dia seguinte àquele em que o agente deixar o cargo público, não mais é viável utilizar esta via para ressarcimento do dano, que também representa, na Lei nº 8.429/92, uma sanção. Imprescritibilidade assegurada pela existência de vias adequadas. Correta inteligência do art. 37, § 5º da CF. AGRAVO DESPROVIDO.

No voto, é citado o ensinamento de José Armando da Costa.

Mas a orientação dominante é no sentido oposto: mesmo que a ação civil esteja pautada na lei de improbidade administrativa, não ocorrerá prescrição para a sanção que objetiva o ressarcimento do dano. Nesse sentido é a jurisprudência do STJ (REsp. n.° 403153, j. 09.09.03) e do TRF 4 (AI 200304010560192, j. 24.03.04), assim como da doutrina de Juarez Freitas, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Waldo Fazzio Junior, Marino Pazzaglio Filho, Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves.

28 Juarez Freitas sustenta que, como a dano moral é ressarcido pela aplicação da multa civil, está ele sujeito ao prazo de 5 anos, ao passo que o dano material é o único que se insere na previsão constitucional (art. 37, § 5.° , da CF/88) de imprescritibilidade. No citado dispositivo constitucional, consta que, ao legislador infraconstitucional, é vedado estabelecer prazo para as ações de ressarcimento. Como se deve interpretar restritivamente essa ausência de prazo, excluiu o ressarcimento por dano moral.

I - até 5 (cinco) anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança;

II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão à bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.


CAPÍTULO VIII

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 24. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 25. Ficam revogadas as Leis nºs 3.164, de 1º de junho de 1957, e 3.502, de 21 de dezembro de 1958, e demais disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 2 de junho de 1992; 171º da Independência e 104º da República.

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Sobre o autor
Juliano De Angelis

Procurador Federal. Responsável pela Procuradoria Seccional Federal em Canoas (RS). Ex-sócio da sociedade Bellini, Ferreira, Portal Advogados Associados. Pós-graduando em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp/REDE LFG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DE ANGELIS, Juliano. A Lei de Improbidade Administrativa vista pela doutrina e jurisprudência.: Comentários à Lei nº 8.429/92. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 936, 25 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7807. Acesso em: 24 abr. 2024.

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