Aplicabilidade da lei do feminicídio aos transexuais

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11/12/2019 às 06:41
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Através de estudos em bibliografias nacionais, analises de casos concretos de violência contra mulheres transexuais , para que pudesse chegar a uma conclusão de a Lei 13104/15 (Lei do Feminicido) possa tambem ser utilizada em defesa dessas mulheres .

Resumo: O feminicídio passou a ser uma circunstancias qualificadora do crime de homicídio a partir da entra em vigor da Lei. 13.104/2015, sendo incluído no rol dos crimes hediondos. Surgindo assim uma grande discussão quando se questiona quem poderá ser o sujeito passivo e ativo do referido delito. E uma grande polêmica entender se a mulher transexual poderá ser vítima do referido crime, devido a opiniões serem divergentes quanto ao sujeito passivo, como a de doutrinadores que discorrem que mulheres transexuais possam figurar no polo passivo definidas geneticamente como tal; afirmando então que não há possibilidade da mulher transexual figurar como vítima nestes casos. Porem outros mais contemporâneos com uma opinião voltada em preservar a dignidade da pessoa humana aceitam quando a pessoa se sente mulher, vive como uma e tenha seu nome e seu sexo alterado no Registro Civil sem que haja a necessidade cirurgia de mudança, podem e devem ser protegidas pela lei. Questionando esta polemica o presente trabalho tem por objetivo oferecer no campo da pesquisa, um estudo da violência contra a mulher, a questão do gênero, o fenômeno da transexualidade e como estas mulheres transexuais são inseridas no ordenamento jurídico. Uma abordagem sobre do feminicídio sua aplicação ou não nos casos em que a vítima foi uma mulher transexual.

Palavras-chave: Feminicídio. Lei 13.104/2015. Violência contra as mulheres. Gênero. Transexualidade. Mulheres transexuais. Discriminação

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. A EVOLUÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. 2. A PENÍNSULA JURIDICA NO FEMINICÍDIO. 2.1 O Que é Feminicídio? 2.2 Definição de feminicídio segundo o código penal brasileiro. 2.3 - O Panorama de Feminicídio no Brasil e no Mundo. 2.4 Um mapa da violência contra a mulher. 3. FEMINICÍDIO RELACIONADO À PESSOA TRANSEXUAL. 3.1 A bioética e o transexual, evolução histórica. 4. IDENTIDADE DE GÊNERO. 4.1 A cirurgia de transgenitalização. 4.2 As espécies de diferenciações sexuais. 4.3 Quem pode ser considerada mulher para efeitos da lei. 5. RELATOS DE VIOLÊNCIA A TRANSEXUAIS. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.


INTRODUÇÃO

Com a entrada em vigor da Lei 13.104/2015, criou-se mais uma circunstância qualificadora do crime de homicídio, o feminicídio. Bem como a incluiu no rol dos crimes hediondos. Vindo assim surgir grandes discussões doutrinárias acerca do sujeito passivo do feminicídio, já que o legislador apontou como sendo vítima a “mulher por razões da condição de sexo feminino”. Porem outros de cunho mais moderno, entendem que a mulher transexual pode ser protegida pela Lei do feminicídio, podendo, no entanto, ser apontada como vítima.

Para que possamos entender se a ou não possibilidade do transexual ser vítima é necessário analisar minuciosamente a violência sofrida por mulheres desde os primórdios da humanidade, sua situação na sociedade onde encontramos alguns avanços quando falamos sobre sua proteção porem ainda muito pouco se tem feito para que se encontre o ideal aquele onde não a vítimas.

Casos de violências são diários, principalmente quando analisado os números de vítimas de violências definidos por gênero, é um fato social um fenômeno da atualidade onde o menosprezo e as discriminações estão presentes, deixando de lado um dos princípios fundamentais a vida o bem jurídico maior. Devido ao fato de se ter tornado uma rotina a violência de gênero fez se necessário o surgimento de medidas de proteção onde essas vítimas passaram a ser amparadas e a primeira foi a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, Lei Maria da Penha onde mulheres vítimas de violência domesticas passaram a ser protegidas, porém não veio a diminuir os casos de violência sendo assim necessário medida mais severas e em 9 de março de 2015 com a promulgação da Lei n° 13104 Lei do Feminicídio tornando-se possível uma punição mais severa não dizendo que com isso se diminuiu o número de vítimas, porem o agressor passo a ser punido mais duramente.

A metodologia utilizada foi à revisão bibliográfica, através do método dedutivo, objetivando-se que, a partir da análise da lei de feminicídio e a constante violência, se chegue a uma conclusão, referente à (uma) possibilidade de aplicação da qualificadora de feminicídio às mulheres transexuais. Também foi utilizado o método dialético, realizando um diálogo entre os conceitos e a legislação vigente. Em um primeiro momento, será realizado um referencial teórico acerca da temática, caracterizando o campo a ser estudado e analisado, conceituando gênero.

Em um segundo momento será realizado uma análise da Lei n° 13.104/15. Neste sentido, importante destacar e analisar aspectos inovadores trazidos pela nova Lei, analisando o sujeito passivo da lei e o emprego do termo “das razões da condição do sexo feminino”.

O presente trabalho fará uma análise referente a este tema que tornou-se um fato social comum, será realizado ao longo do estudo um detalhamento sobre o que se tem feito para se evitar que números cada vez maiores de vítimas sejam noticiados, além disso será realizado uma busca em casos de vítimas que se identificam como mulheres, que sofrem com a discriminação e o menosprezo tanto quanto quem é nascida e definida geneticamente como mulher, quanto as que se consideram como tal. O presente trabalho se consagra em estudo profundo sobre a violência de gênero, e a busca no ordenamento jurídico de como a mulher transexual poderá encontrar amparo na Lei, se há necessidade de ter seu nome e seu sexo modificado no Registro Civil, analises de casos concretos de discriminação contra as mulheres transexuais, em diversos âmbitos sociais. Discriminação sofrida por elas e de como elas podem ser protegidas de forma especial e direta. Chegando por fim, a uma abordagem sobre a origem do feminicídio, a violência de gênero trazendo aspectos importantes para a temática, e a aplicação da Lei.


1. A EVOLUÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Relatos de violência contra a mulher estão presentes desde o início da história da humanidade infligindo uma gama ampla, tanto em seus direitos relacionados à sua liberdade bem como as disposições de seu corpo.

Se fizermos um resgate na evolução humana encontraremos relatos desde a idade inicial chamada de Idade da Pedra Lascada (1000 a 4000 a.C.) onde a mulher ficou prejudicada em sua evolução visto que o macho era o dominante e a mulher era o sujeito passivo focando sempre na fertilidade e aos cuidados com os filhos, era o ser submisso e dependente.

Realizando uma caminhada ao longo da história chegamos a relatos da Bíblia que embora de cunho religioso podemos encontrar várias fases onde as mulheres sofriam violência sexual. Várias vezes o estupro é mencionado, embora não tenha encontrado uma menção direta às crianças que eventualmente nascem de tal abuso.

Podemos começar citando alguns textos. É interessante notar que se buscado, com a ajuda das concordâncias, a palavra “estupro”, não encontramos nenhuma citação. Porém a violência sexual é mencionada, ainda que de forma subjetiva como vemos nos textos abaixo:

Aqui estão a minha filha virgem e a concubina do homem; fá-las-ei sair; humilhai-as a elas, e fazei delas o que parecer bem aos vossos olhos; porém a este homem não façais tal loucura. Mas esses homens não o quiseram ouvir; então aquele homem pegou da sua concubina, e lhe tirou para fora. Eles a conheceram e abusaram dela a noite toda até pela manhã; e ao subir da alva deixaram-na: Ao romper do dia veio a mulher e caiu à porta da casa do homem, onde estava seu senhor, e ficou ali até que se fez claro. Levantando-se pela manhã seu senhor, abriu as portas da casa, e ia sair para seguir o seu caminho; e eis que a mulher, sua concubina, jazia à porta da casa, com as mãos sobre o limiar. Ele lhe disse: Levanta-te, e vamo-nos; porém ela não respondeu. Juízes 19:22 (BIBLIA, 2018, Juízes 19:22).

Então disse a Tamar: Traze a comida a câmara, para que eu coma da Amnom tua mão. E Tamar, tomando os bolos que fizera, levou-os à câmara, ao seu irmão Amnom. Quando lhes chegou, para que ele comesse, Amnom pegou dela, e disse-lhe: Vem, deita-te comigo, minha irmã. Ela, porém, lhe respondeu: Não, meu irmão, não me forces, porque não se faz assim em Israel; não faças tal loucura. Quanto a mim, para onde levaria o meu opróbrio? E tu passarias por um dos insensatos em Israel. Rogo-te, pois, que fales ao rei, porque ele não me negará a ti. Todavia ele não quis dar ouvidos à sua voz; antes, sendo mais forte do que ela, forçou-a e se deitou com ela. Depois sentiu Amnom grande aversão por ela, pois maior era a aversão que se sentiu por ela do que o amor que lhe tivera. E disse-lhe Amnom: Levanta-te, e vaite. Então ela lhe respondeu: Não há razão de me despedires; maior seria este mal do que o outro já me tens feito. Porém ele não lhe quis dar ouvidos, mas, chamando o moço que o servia, disse-lhe: Deita fora a esta mulher, e fecha a porta após ela. Deuteronômio 22:1 (BIBLIA, 2018, Deuteronômio 22:1).

Estes trechos nos dão uma visão geral do que encontramos na Bíblia, um juízo que o texto sagrado dá sobre a violência sexual. Certamente, podemos afirmar que a ideia básica é uma crítica veemente à violência sexual contra as mulheres.

Partindo de relatos bíblicos e indo para o período do Primeiro Reinado no Brasil temos o surgimento do Código Penal de 1830, fase Imperial privilegiando a ideia que a mulher era impedida de expressar seu sentimento fossem eles em relacionamentos afetivos ou não mantendo-se assim até o final do século XX. Sendo muitas vezes obrigada a aceitar a infidelidade de seus companheiros como se fosse um direito do homem viver o adultério, mas quando havia infidelidade por parte da mulher era julgada e cumpria pena de prisão de um a três anos, com trabalhos forçados. Sendo vista esta infidelidade conjugal como uma afronta aos direitos do marido e um insulto ao cônjuge enganado.

Por longos anos o homicídio contra mulheres foi tratado apenas como um crime de paixão, ficando nas mãos dos tribunais a decisão de considerar aquele que cometeu o crime como a vítima, pois agiu em defesa de sua honra que se encontrava ferida devido ao fato da mulher tê-lo traído. Ao tomar decisões os tribunais analisavam apenas o estado emocional do agressor como sendo um momento de loucura, que ferido o transformava em vítima e não no homicida, tornando o inimputável. Ainda assim podemos atentar que no dias atuais encontramos advogados se utilizado destas fundamentos para incluir seus clientes entre os inimputáveis, buscando um parecer médico que ateste uma doença mental e desresponsabilize o sujeito, que realizou um crime passional que traído, ofendido em sua honra o definindo não como um criminoso mas sim como “um justiceiro que lavou sua honra com sangue”, assim justificando seu papel na sociedade e diminuindo sua culpa, crimes reforçados por valores de virtude, de ser dominante , preservando a frase de não levar desaforo pra casa .

A superioridade do homem tem se mantido presente a pelo menos 2500 anos com os seus pés enraizado na ideológica de superioridade em detrimento da mulher e consequentemente sua subordinação.

O Código Penal de 1940, que é o atual eliminou-se a licitude de crimes considerados como passionais onde o sujeito agia por perturbação dos sentidos e da inteligência, , surgindo a figura do homicídio privilegiado, pela qual o criminoso, mesmo tendo uma pena menor do que o homicídio simples (6 anos), não fica mais impune. Tendo como alegação do homicídio privilegiado ser praticado por relevante valor moral ou social, ou sob o domínio da violenta emoção, sendo este o fundamento mais utilizado hoje para a defesa do crime passional.

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Com a variação do tempo, surge a figura da legítima defesa da honra e da dignidade maneira encontrada por advogados para se chegar a um resultado favorável que fosse além do privilégio, nos casos passionais. Prevendo a lei que agressor agiu com excesso culposo em defesa de sua honra com uma redução da pena podendo ainda o juiz aplicar uma pena inferior a dois anos ou até livrar o criminoso de qualquer dívida com a justiça sendo este primário. E no caso de ser qualificado o homicídio, tornando o assim hediondo, a pena passa a ser de 12 anos. Passando a analisar o motivo do homicídio sua qualificação quais sejam; motivo torpe (quando os meios empregados extravasam a normalidade a ponto de se tornar repugnante à vingança diante de uma recusa da ex-mulher de reconciliação) e motivo fútil (irrelevante). Ocorrendo este dois fatos (fútil e torpe), o delito é considerado como qualificado. Motivos esse que levou o indivíduo a praticar o homicídio que vai qualificar o crime não afastando o delito se o sujeito se encontrar embriagado (CUNHA, 2017, p. 238).

Há uma grande divergência entre a doutrina e a jurisprudência quando se falam do homicídio privilegiado qualificado, no que se refere a questão da compatibilidade ou não de situações que simultaneamente, qualificam e privilegiam o homicídio. O que reflete as causas do privilégio é subjetivo, de modo que circunstâncias privilegiadas podem concorrer com as qualificativas. As razões qualificadoras de motivo fútil e torpe não podem disputar com as situações qualificativas de caráter subjetivo que logicamente as contradizem, mas admitem concurso com as qualificadoras objetivas. Caso o homicida passional for condenado por ter cometido um homicídio qualificado hediondo, sua punição será mais severa e sendo um homicídio privilegiado a pena é mais branda e o regime prisional é menos rigoroso. E caso o Conselho de Sentença entenda que ocorreu um homicídio privilegiado-qualificado, enquadrá-lo como hediondo, ou não, só irá depender do aplicador da pena, já que não existe uma posição universal com relação a este problema (CUNHA, P.239)

Sendo aplicado este fundamento até os dias atuais para que o agressor acabe culminado a uma pena mais branda cabendo ao conselho de sentença ser aquele ao qual irá decidir se o homicida é ou não o maior culpado.

Após a Lei 11.340 - “Lei Maria da Penha”, em 2006, várias estratégias foram criadas entre elas modificou a modalidade da pena, a competência para julgamento e a natureza jurídica da ação penal nos crimes de lesão corporal, caracterizados como violência doméstica. A pena de 1 ano passou para 3, sendo a criação dos juizados criminais uma medida da maior importância.

Não há distinção de classe social no Brasil quando referimos a violência contra a mulher. Sendo assim não pode ser classificado como crime de pobre ou rico, não podemos classificar esta forma de violência como sendo praticadas por pessoas tidas como normais ““ gente igual a gente” devemos compreender a lógica que envolve este tema e tratar o agressor como uma pessoa com problemas de saúde ,sujeito este capaz de praticar um crime tão menosprezível como este, alguém com distúrbios psicológicos necessitando de políticas públicas para definir critérios a normalidades e estratégias de combate a esse delito.

Devido aos elevados índices de violência que diariamente vivenciamos há uma necessidade de que estudiosos discutam maneiras de se criar políticas públicas de combate a estas modalidades de crime. Crimes estes que diariamente colocam mulheres em situações de riscos iminentes que se não chegam à consumação estão muito próximos dela, tornado às incapazes para o trabalho os estudos e a vida em sociedade. A vida de mulheres ameaçada é uma realidade que temos o dever de mortificar. Mulheres são atingidas pela violência não só física quanto pela violência psicológica, sofrendo graves danos.

A violência contra mulher não e só um produto de nossa história indo muito mais além de fenômenos culturais envolve toda uma sociedade moderna, e não se diminuíram com leis mais severas, pois ainda em nossa sociedade há a ideia machista de que a mulher é sua propriedade, há ideia de domínio e quando não aceito é punido com as mais diversas formas de violência e crueldade.


2. A PENÍNSULA JURIDICA NO FEMINICÍDIO

O homicídio contra as mulheres tem crescido gradativamente a cada dia e se tornado comum em manchetes de jornais. Todos os dias ouvimos falar sobre mulheres que estão sendo vítimas das mais diversas formas de violência revelando a letalidade, a barbárie e a brutalidade de que podem ser dirigidas as mulheres ferindo seus corpos e suas almas, e principalmente suas vidas.

Alguns estudiosos do tema alegam que o termo feminicídio se originou a partir da expressão "genocídio", que significa o assassinato massivo de um determinado tipo de gênero sexual. Conforme define abaixo.

O feminicídio é a instância última de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex parceiro; como subjugação da intimidade e da sexualidade da mulher, por meio da violência sexual associada ao assassinato; como destruição da identidade da mulher, pela mutilação ou desfiguração de seu corpo; como aviltamento da dignidade da mulher, submetendo-a a tortura ou a tratamento cruel ou degradante. (SECRETARIA DE POLÍTICA PARA MULHERES, 2011, p. 9)

A morte de mulheres no Brasil tem índices alarmantes. Para se enfrentar essa endemia de assassinatos é preciso fazer um bom diagnóstico do feminicídio, conhecer suas causas e consequências. Só assim as políticas públicas e processos criminais seriam capazes de evitar a morte ou a reiteração de condutas.

2.1 O Que é Feminicídio?

Compreendido como um fenômeno onde se há mortes violentas de mulheres, sendo a sua causa essencial para a ocorrência simplesmente é sua condição de gênero, ou seja, sua condição é ser mulher.

Incluindo neste tema não somente a mortes violentas, em razão do gênero mulher, mas sim aquelas decorrentes de aborto inseguro, práticas de mutilação genital, mortalidade materna, ou seja, toda e qualquer forma de violência onde o descaso e a omissão em razão do gênero sejam evidentes.

Algumas autoras ativistas de causas feministas definem a perspectiva específica onde se identifica que o sexismo foi a causa essencial da morte para além dos motivos aparentes.

Sendo assim é necessário entender e classificar para o feminicídio, fazendo uma análise minuciosa do tema. Quando falamos de feminicídio dizer que se está reivindicado do estado uma resposta jurídica, é um grande equívoco, na medida em que o conceito pode ser utilizado com a intencionalidade de mobilizar a força do discurso e da denúncia e não necessariamente para acionar o direito penal. Não se trata apenas de mostrar o que está oculto porque muitas vezes não está escondido

Há feminicídio quando o Estado não dá garantias para as mulheres e não cria condições de segurança para suas vidas na comunidade, em suas casas, nos espaços de trabalho e de lazer. Mais ainda quando as autoridades não realizam com eficiência suas funções. Por isso o feminicídio é um crime de Estado (LAGARDE 2004, P.6).

Ainda na mesma linha de pensamento:

Como bem adverte a Antropologia, é preciso também estar atento para a normatividade social que justifica os feminicídio e favorece sua reiteração. Para isso não podemos fixar a atenção apenas no patriarcado como gerador de discriminação, mas temos que incluir outras formas de opressão social que se entrecruzam com o gênero e contribuem para desenhar o contexto que favorece as agressões violentas a mulheres, como a classe, a etnia da vítima, a violência do entorno e o desenraizamento social (COPELLO, 2012, p. 13)

De modo geral, o feminicídio pode ser considerado uma forma extrema de misoginia, ou seja, ódio e repulsa as mulheres ou contra tudo o que seja ligado ao feminino.

2.2 Definição de feminicídio segundo o código penal brasileiro

A Lei nº 13.104/2015 definiu feminicídio como o homicídio praticado contra a mulher em razão de sua condição do seu sexo feminino (lê-se violência de gênero quanto ao sexo). A incidência da qualificadora declara a praticada contra a mulher, em caracterizado por relação de poder e submissão, praticada por homem ou mulher sobre mulher em situação de vulnerabilidade

Por se tratar de uma lei nova e de abordagem multidisciplinar, nos casos concretos nem sempre se reconhece a prática de feminicídio. Por esse motivo, para a pesquisa, foram analisadas todas as denúncias em que havia a morte violenta de mulher motivada por gênero, ainda que inexistente a referência expressa ao artigo de lei do feminicídio (CUNHA, 2016, p. 62).

Assim, detalhadamente pode se entender que a morte violenta de mulher por sua condição de mulher e não o tipo penal. Ademais, a referência a feminicídio compreende tanto os crimes tentados como consumados.

Observamos no art. 121. do Código Penal Brasileiro que o Feminicídio é um homicídio qualificado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino onde deve ser considerado as causas onde envolvem: Violência doméstica e familiar; Menosprezo ou discriminação à condição de mulher. E a pena do feminicídio é aumentada de 1/3 até a metade se o crime for praticado: Durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; Contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência; Na presença de descendente ou de ascendente da vítima.

Com a nova Lei nº 13104/15, o feminicídio passa a configurar a sexta forma qualificada do crime de homicídio punida com pena de reclusão de 12 a 30 anos, etiquetado como delito hediondo, sofrendo os consectários da Lei 8.072/90.

O § 2o-A foi acrescentado no artigo 121 do Código Penal Brasileiro para esclarecer quando a morte da mulher deve ser considerada em razão da condição do sexo feminino: I - violência doméstica e familiar; II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

O esclarecimento, no entanto, além de inútil causa confusão. Em 2011, quando a Lei foi redigida houve uma grande busca por parlamentares envolvidos em causas de proteção a mulher em tornar a redação do tipo na Lei com mais clareza, simplicidade e coerência com o próprio objeto do projeto, conectando seus termos com aqueles estampados na Lei Maria da Penha, berço, no nosso país, do conceito violência de gênero contra a mulher.

Vemos que o comportamento objeto da Lei em comento pressupõe violência baseada no gênero, agressões que tenham como motivação a opressão à mulher. É imprescindível que a conduta do agente esteja motivada pelo menosprezo ou discriminação à condição de mulher da vítima. A previsão deste parágrafo 2ª do artigo 121 do CP, além de repisar pressuposto inerente ao delito, fomenta a confusão entre feminicídio e femicídio. Matar mulher, na unidade doméstica, sem menosprezo ou discriminação à condição de mulher é denominado assim femicídio. Se a conduta do agente é movida pelo menosprezo ou discriminação à condição de mulher, aí sim temos o feminicídio (CUNHA, 2016).

2.3. O Panorama de Feminicídio no Brasil e no Mundo

No Brasil é muito grave a situação de mulheres assassinada e cada dia os índices tem só aumentado, encontramos noticiários diariamente, segundo o Fórum Brasileiro de Violência da Secretaria de Segurança Pública realizado em 2017, o Brasil tem a quinta maior taxa em números de mortes de mulheres por violência em razão de sua condição de mulher, ou seja, feminicídio e esses índices de aumento são ainda maiores ao se referir a mulher negra e de baixa renda chegado a um índice de 57%, elevando-se ainda mais quando verificado o número de mulheres transexuais, lésbicas, bissexuais. (DIRETRIZES, 2016 p.). “A violência contra mulheres é uma construção social, resultado da desigualdade de força nas relações de poder entre homens e mulheres. É criada nas relações sociais e reproduzida pela sociedade” (GASMAN, 2017).

Analisando a situação em outros países temos a seguinte definição

Em outros países ainda e um desafio grande criar leis capazes de tipificar o crime como no Brasil, apenas 15 países na América latina tem leis com diferences tipos de penalidades, alguns países nem se quer há penalidade contra crimes praticados contra mulheres analisando 193 países apenas 140 tem leis capazes de impedir à violência doméstica as regiões onde a punição e menor ou quase nenhuma estão na África Subsaariana, no Oriente Médio e Norte da África informações essas segundo o jornal El Pais (INFOGRAFIA, 2017).

2.4. Um mapa da violência contra a mulher

Com uma análise de dados coletados através do Ministério Público em 2017 podemos fazem um estudo referente ao número de mulheres vítimas de feminicídio identificando o dia da semana, horário, local e instrumentos usados para a prática desses crimes.

Com este levantamento conclui-se que na análise dos dias da semana a concentração de crimes se manifesta em índice alarmantes durante aos finais de semana cerca de 32 %, mas a maior incidência das mortes ocorre durante a semana totalizando 68%.

Gráfico 1 – Incidência de mortes durante a semana

Fonte: Fernandes; Smanio, 2018

Na análise dos horários os crimes de maior número são durante a manhã 20%, a tarde 19%, entre os maiores índices os números crescem durante o início da noite chegando a 35% como observado no gráfico ilustrativo.

Gráfico 2 - Horários dos feminicídios

Fonte: Fernandes; Smanio, 2018

Ainda um dos mais importantes dados é o local onde essas mulheres são atacadas pelo agressor. Os critérios pesquisados foram: a residência da vítima neste compreendidos os arredores da casa, a residência comum do casal e a casa parenta da vítima, casa onde a vítima estava no momento do fato, casa do réu, trajeto da vítima sendo o local de trabalho ou a caminho do trabalho, em estabelecimentos públicos como bares e outros, hotéis, motéis ou pousadas, dentro de um veículo, em local ermo ou em via pública.

Gráfico 3 – Locais do feminicídio

Fonte: Fernandes; Smanio, 2018

O feminicídio pode atingir distintas categorias de vítimas. E ocorrendo por diversas razões como um relacionamento íntimo, da convivência doméstica, familiar em razão da discriminação ou menosprezo relacionado à mulher. Quando identificamos o perfil das vítimas podemos observar que a maior incidência ocorre em entre pessoas que estavam mantendo união estável, seguindo as que eram casadas e por último as que mantinham a relação de namoro. Existe também uma porcentagem relacionada a relações extraconjugais e a profissionais do sexo.

É observado também crimes praticados a outros familiares que não mantinham relacionamentos sexuais com os agressores como, por exemplo, mães, filhas, sogras, cunhadas e irmãs. E também o estudo aponta atos de feminicídio em decorrência de atos de machismo ou desprezo e discriminação pela mulher.

Gráfico 4- Feminicídio: relação afetiva

Fonte: Fernandes; Smanio,2018

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Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação (ESAMC)como requisito para obtenção do título de bacharel em Direito.Orientadora: Prof.ª Dr.ª Agnez Foltran Moniz.

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