O pluralismo jurídico: uma análise dos recursos das decisões dos tribunais comunitários para os tribunais judiciais no ordenamento jurídico moçambicano

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13/12/2019 às 15:52
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Nos casos de recurso, o juiz profissional a quem o processo tiver sido distribuído, observa os critérios e os princípios estabelecidos na Lei dos Tribunais Comunitários. Se estes julgam usando critérios distintos, como será possível a essa materialização?

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Resumo

O Estudo visa analisar os Recursos das Decisões dos Tribunais Comunitários para os Tribunais Judiciais. Os Tribunais Judicias no exercício das suas funções julgam de forma profissional, e apenas devem obediência a lei e a Constituição. Os Tribunais Comunitários julgam de acordo com o bom senso, e a equidade, de modo informal, desprofissionalizado, privilegiando a oralidade. se ressalta que estes tribunais julgam usando critérios completamente diferentes, por isso alguma estranheza se torna legítima ao no 2 do artigo 86 da Lei da Organização Judiciaria, ao estabelecer que, nos casos de recurso de uma decisão do tribunal comunitário para o tribunal judicial, na apreciação do mesmo, o juiz profissional a quem o processo tiver sido distribuído, observa os critérios e os princípios estabelecidos na Lei dos Tribunais Comunitários. Ora, se estes julgam usando critérios distintos, como será possível a materialização de tal exigência legal? A pesquisa é qualitativa com mais destaque no método hermenêutico, e, como técnicas de recolha de dados destaca-se a observação indirecta. Tendo em atenção que estes tribunais julgam usando critérios completamente diferentes, nos casos de recurso que se refere o artigo 86 da Lei supracitada, pode-se falar de remessa e não propriamente de recurso, e desta feita, no caso de recurso de uma decisão do tribunal não profissional para o profissional, o tribunal ad quem possa não obedecer os critérios usados no tribunal a quo.

 

Palavras-chave: Recurso, Remessa, Tribunais Judiciais, Tribunais Comunitários.

 

 

 

 

 

 

 

Abstract

The purpose of the Study is to analyze the appeals of the decisions of the Community Courts to the Judicial Courts. the Judicial Courts in the exercise of their functions judge in a professional manner, and should only obey the law and the Constitution. The Community Courts judge according to common sense, and fairness, informally, deprofessionalized, privileging orality. it is pointed out that these courts judge using completely different criteria, so some strangeness becomes legitimate to Article 86 (2) of the Law of the Judiciary Organization, when establishing that, in cases of appeal of a decision of the community court to the court, the professional judge to whom the case has been distributed, observes the criteria and principles laid down in the Community Courts Law. Now, if they judge using different criteria, how will it be possible to materialize such a legal requirement? The research is qualitative with more prominence in the hermeneutic method, and as indirect data collection techniques. Bearing in mind that these courts use completely different criteria, in cases of appeal referred to in Article 86 of the aforementioned Law, it is possible to speak of a referral and not an appeal, and this time, in the case of an appeal against a decision from the non-professional court to the professional, the court ad may not meet the criteria used in the court.

Key words: Appeal, Remittance, Judicial Courts, Community Courts.

 

 

 

 

 

 

 

SUMÁRIO:

INTRODUÇÃO; I. BREVE REFERÊNCIA AOS TRIBUNAIS COMUNITÁRIOS E OS RESPECTIVOS CRITÉRIOS DE JULGAMENTO; II. OS TRIBUNAIS JUDICIAIS E OS RESPECTIVOS CRITÉRIOS DE JULGAMENTO; III. DOS RECURSOS DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS COMUNITÁRIOS PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO MOÇAMBICANO; CONSIDERAÇÕES FINAIS; BIBLIOGRAFIA

 

INTRODUÇÃO

 

O Estudo visa analisar os Recursos das Decisões dos Tribunais Comunitários para os Tribunais Judiciais no ordenamento jurídico Moçambicano. De forma especifica o mesmo visa identificar os critérios usados nos processos para julgamento nos tribunais comunitários assim como os judiciais; verificar a possibilidade de recurso das decisões dos tribunais comunitários para os tribunais judiciais.

  A pertinência, relevância bem como a actualidade do estudo justifica-se pelo facto dos Tribunais Judicias no exercício das suas funções julgarem de forma profissional, e apenas devem obediência a lei e a Constituição, ao passo que os Tribunais Comunitários julgam de acordo com o bom senso, e a equidade, de modo informal, desprofissionalizado, privilegiando a oralidade. se ressalta que estes tribunais julgam usando critérios completamente diferentes, e em função de tal facto acresce a questão dos tribunais comunitários na verdade e em bom rigor não fazerem parte do leque das categorias dos tribunais judiciais.

Ademais, no que tange a lei de organização judiciaria Moçambicana[3], estabelece na sua alínea a) n ° 1 do artigo 86 a competência dos tribunais judiciais de distrito de julgarem os recursos das decisões dos tribunais comunitários, e acresce  ao facto  do no 2 do artigo 86 da referida lei estabelecer que, nos casos de recurso de uma decisão do tribunal comunitário para o tribunal judicial, na apreciação do mesmo, o juiz profissional a quem o processo tiver sido distribuído, deva observar os critérios e os princípios estabelecidos na Lei dos Tribunais Comunitários. Ora, se estes julgam usando critérios distintos, como será possível a materialização de tal exigência legal? A pesquisa é qualitativa com mais destaque no método hermenêutico, e, como técnicas de recolha de dados destaca-se a observação indirecta.

Como estrutura do presente artigo nos propusemos a discutir primeiro, a introdução onde fazemos menção aos aspectos introdutórios, no primeiro ponto reservamos a discutir alguns aspectos relevantes ligados aos tribunais comunitários, no segundo ponto nos propusemos a discutir aspectos ligados a organização, funcionamento e critérios usados nos tribunais judiciais, no terceiro ponto reservamos a discutir aspectos ligados ao recurso das decisões dos tribunais comunitários para os tribunais judiciais, e por fim temos as considerações finais do estudo.

 

I.                   BREVE REFERÊNCIA AOS TRIBUNAIS COMUNITÁRIOS E OS RESPECTIVOS CRITÉRIOS DE JULGAMENTO.

Os tribunais comunitários são instâncias institucionalizadas não judiciais de resolução de conflitos, independentes, que julgam de acordo com o bom senso e a equidade, de modo informal, desprofíssionalízado, privilegiando a oralidade e atendendo aos valores sociais e culturais existentes na sociedade moçambicana, com respeito pela Constituição[4].

Os tribunais comunitários foram criados pela lei n º4 /92, de 6 de Maio, Tratam-se, pois, de instâncias de resolução de litígios que aplicam direitos locais, comunitários, costumeiros, em suma, direito não oficial.

Compete-lhes deliberar sobre pequenos conflitos de natureza civil, questões emergentes de relações familiares que resultam de uniões constituídas segundo os usos e os costumes, tentando, sempre que possível, a reconciliação das partes conforme dita o nº 1.º do art. 3º da lei 4/92, e delitos de pequena gravidade que não sejam passíveis de penas privativas de liberdade e aos quais se ajustem as sanções previstas no n.º 2 do artigo 3.º da Lei dos tribunais comunitários.

            A jurisdição dos tribunais comunitários é sempre voluntária. A execução das suas decisões depende sempre da aceitação de todas as partes em conflito. Qualquer que seja a natureza do caso, a decisão só é exequível se não for contestada por qualquer das partes em conflito. No caso de discordância em relação à medida adoptada pelo tribunal comunitário, a lei dá a faculdade de qualquer das partes introduzir o assunto no tribunal judicial nos termos do n.º 1.º do art. 4 da lei 4/ 92. Deve, ainda, o tribunal, nos termos do mesmo preceito legal elaborar um auto e remete-lo ao competente tribunal judicial. É de notar que a lei não define a jurisdição territorial dos tribunais, mas pode-se constatar o entendimento tácito no sentido de que a jurisdição se circunscreve ao bairro ou localidade onde estão a funcionar. No que diz respeito ao processo de decisão, a lei prevê a mediação e a reconciliação como a primeira forma de resolução do conflito. O tribunal apenas julga o caso se aqueles meios falharem, devendo o julgamento ser feito de acordo com a equidade, o bom senso e a justiça[5].

            BUCHILLI entende que existem diferenças nas condições e no modo de funcionamento dos tribunais comunitários. Tratando-se de uma justiça comunitária, desprofissionalizada, informal e não sujeita a regras e procedimentos de uniformização predefinidas, como o são as leis de organização judiciária e os códigos de processo para a justiça formal, a diversidade de funcionamento é normal. No direito judiciário o formalismo processo constitui um dos pilares em que assenta a justiça formal e as garantias fundamentais dos que a ela recorrem. As regras de procedimento são uniformizadas e se pressupõe que elas são conhecidas e seguidas por todos os agentes de justiça. Diferentemente, a justiça comunitária uma justiça desprofissionalizada, assenta na oralidade, em procedimentos informalizados e naturalmente não uniformizados[6].

   II. OS TRIBUNAIS JUDICIAIS E OS RESPECTIVOS CRITÉRIOS DE JULGAMENTO

Os tribunais são órgãos de soberania que administram justiça em nome do povo.[7] Conjugando o disposto nos artigos 133.º, 212.º, 213.º, e 217.º nº1 da Constituição da República, parece-nos ser possível extrair da nossa lei fundamental a seguinte definição de tribunais: são os órgãos de soberania, dotados de independência, aos quais compete administrar a justiça em nome do povo.

Como nos ensina CURA, a análise do teor dessa definição permite-nos verificar que são quatro os elementos caracterizadores da noção de tribunais que resulta dos mencionados preceitos constitucionais: Em primeiro lugar, trata-se de órgãos de soberania, qualificação que pertence a todos e a cada um dos tribunais; Em segundo lugar, são órgãos estaduais dotados de independência, em face dos outros poderes do Estado que não podem interferir na administração da justiça, e entre si em virtude de cada um dos tribunais ser um órgão de soberania, salvo no que respeita às decisões proferidas em via de recurso para os tribunais superiores; Em terceiro lugar, têm a seu cargo, de forma exclusiva, a função jurisdicional Cfr. A epígrafe do art. 212.º CRM, e em quarto lugar, os tribunais administram a justiça em nome do povo[8].

Na república de moçambique a categoria dos tribunais judiciais encontramos prevista no número 1 do artigo 25 da lei de organização judiciaria onde podemos o Tribunal Supremo; Tribunais Superiores de Recurso; Tribunais Judiciais de Província; Tribunais Judiciais de Distrito.

            No topo da hierarquia da Organização Judiciária encontra-se o Tribunal Supremo, tendo jurisdição em todo o território do Estado moçambicano, garantido a aplicação uniforme da lei na esfera da sua jurisdição, ao serviço dos interesses do povo, e incumbindo ainda a direcção do aparelho judicial.

            Em seguida podemos ter os tribunais superiores de recurso. Em relação a estes tribunais trata-se na verdade de um terceiro nível na hierarquia judiciária. Nascem com o objectivo de responder à preocupação de tornar a justiça mais célere e eficiente, combatendo assim a passividade e a morosidade dos tribunais de superiores. No segundo patamar da hierarquia encontra-se os Tribunais Judiciais de Província, existindo um em cada província, e um na cidade de Maputo, sendo no total 11.

             Os Tribunais Judiciais de Distrito estão no primeiro patamar da organização judicial da República de Moçambique. Neste primeiro patamar da organização judicial, os distritos são de primeira e segunda instância, podendo os de primeira instância classificar-se em tribunais de primeira ou segunda classe. Em termos de funcionamento podem operar como tribunal singular ou colectivo. Os Tribunais Judicias de Distrito têm competência genérica, sendo composto por um juiz profissional, o qual deverá ser o Presidente, e por juízes leitos. Funcionando em colectivo, intervêm com o juiz profissional e quatro juízes eleitos, não podendo deliberar sem que se encontrem presentes o juiz presidente e dois juízes eleitos.

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III.             DOS RECURSOS DAS DECISÕES   DO TRIBUNAL COMUNITÁRIO PARA O JUDICIAL

Recurso é o pedido de reapreciação de uma decisão judicial, apresentado a um órgão judiciário superior[9]. Ou Recurso é o meio de obter a reforma da sentença injusta, de sentença inquinada de vício substancial ou de erro de julgamento[10]

É posição assenta na doutrina que a impugnação das decisões judiciais satisfaz um interesse da parte prejudicada, que por este meio pode obter a correcção de uma decisão que lhe é desfavorável. A impugnação também corresponde aos interesses gerais da comunidade, porque a eliminação de decisões erradas ou viciadas não só combate o sentimento de insegurança e injustiça, como favorece o prestígio dos tribunais e a uniformização jurisprudencial. Esta faculdade de impugnação é uma consequência da possibilidade de reacção dos particulares contra os actos públicos que ofendam os seus interesses e o conhecimento dessa impugnação pelos tribunais é uma imposição da sua independência[11]. A impugnação das decisões perante um tribunal de hierarquia superior assenta no pressuposto de que esse tribunal se encontra em melhores condições de apreciar o caso em crise do que o tribunal recorrido. As decisões judiciais podem ser impugnadas mediante recurso. O recurso ordinário é a forma normal de impugnação das decisões judiciais[12].

Os recursos podem ser ordinários ou extraordinário[13]. A diferença entre os recursos ordinários e extraordinários reside no critério formal ligado ao trânsito em julgado da decisão recorrida. O recurso ordinário é um pedido de reapreciação de uma decisão ainda não transitada, dirigida a um tribunal de hierarquia superior, fundamentado na ilegalidade da decisão e visando revoga-la ou substitui-la por uma outra mais favorável ao recorrente.

Em atenção a breve referencia aos recursos, alguma estranheza se pode retirar da alínea a) nº1 do artigo 86 da LoJ, onde atribui como competência dos tribunais judiciais de distrito de 1ª e 2ª classe, julgar os recursos das decisões dos tribunais comunitários. Dúvidas e estranhezas são acrescidas ao facto do  nº2 do artigo 86.º da LOJ, nos dar a entender que, no referido recurso, o juiz profissional deve julgar em obediência aso critérios usados pelos juízes do tribunal comunitário.

 Nos pontos que antecedem ao presente, se pode perceber os critérios legais no julgamento das questões controvertidas remetidas nos tribunais judiciais bem como nos tribunais comunitários, e em função disso se torna cristalino que os tribunais judiciais julgam de forma profissional ao passo que os comunitários de forma desprofissional usando critérios totalmente distinto, até porque, no leque das categorias dos tribunais judiciais não encontra espaço o tribunal comunitário. Por tanto, nos parece difícil compreender a ratio da norma contida no artigo 86 ao nos obrigar a seguir os critérios usados nos tribunais judiciais tendo em atenção que estes julgam usando critérios totalmente diversos.

 O dispositivo legal por nós chamado a colação nos parece que pretende que o almejado recurso na verdade seja uma simples remessa do processo do tribunal comunitário para o judicial e não propriamente um recurso como se pretende que seja.

Ora, propugna o nº1 do artigo 4 da lei que cria os tribunais comunitários que em caso de discordância entre as partes em qualquer decisão proferida pelo tribunal comunitário, podem as mesmas introduzir a questão no tribunal judicial competente. Por isso se deve ter em conta o esprito da norma quando se faz menção a introdução da questão ao tribunal competente, o que vai implicar que a questão vai ser discutida como se fosse nova e em função disso, se usarem critérios próprios e específicos do respectivo tribunal.

Por outra, o recurso propriamente dito é passível de vários requisitos, dentre os quais, os prazos e a intenção de se rever a decisão tomada pelo tribunal a quo por se entender que essa não foi tomada nos moldes que deveria ser. Desta feita, não se encontra cobertura legal que faça menção ao tipo de recurso bem como aos possíveis prazos para a interposição do recurso do tribunal comunitário para o tribunal judicial. Por outra, necessário se torna que, em relação aos critérios usados nos procedimentos para a tomada de decisão no tribunal comunitário, sejam os mesmos usados no tribunal judicial para se confirmar que não foram obedecidos os referidos critérios e se dar provimento ao caso, ou não provimento em situação inversa.

Remessa é a devolução da decisão do órgão "a quo", para revisão pelo órgão "ad quem". Somente após a confirmação por este, é que a sentença produzirá efeitos. Ou, remessa significa envio de uma decisão impugnada que efectivamente vai sair do tribunal comunitário para o tribunal judicial.

A remessa tem a virtude de suspender os efeitos da sentença até que sobre ela se pronuncie a instância superior. O que ela exprime, portanto, em sua configuração mais simples, é a devolução da causa ao Tribunal, a cujo conhecimento toca a obrigação de manter ou modificar a sentença impugnada.

E por sua vez recurso é um instrumento para pedir a mudança de uma decisão da mesma instância ou em instância superior, sobre o mesmo processo. Algumas decisões judicias dependem, obrigatoriamente, de revisão pelo órgão hierarquicamente superior para produzir efeitos e algumas não dependem. O recurso existe para dar efectividade á ampla defesa e ao duplo grau de jurisdição.    

Em qualquer ordem jurídica e em especial a Moçambicana, O legislador ao introduzir o instituto dos recursos pretendia ver resolvidas as inquietações que podem surgir entre os sujeitos: que vai implicar na reforma da decisão impugnada, que consistente na substituição da decisão recorrida por outra, favorável a parte recorrente, a ser proferida pelo órgão julgador do recurso; A invalidação ou anulação da decisão, a fim de que o órgão que a proferiu, profira nova decisão, sanando os vícios que geraram sua anulação; O esclarecimento ou a integração da decisão judicial impugnada, pelo mesmo órgão que a proferiu, para sanar-lhe omissão, contradição ou obscuridade.

 

Não restam dúvidas que o recurso vai consubstanciar num acto de inconformismo, destinado a reformar, aclarar ou anular uma decisão. Cada recurso possui um objectivo específico, isto é o tipo de recurso dependerá do vício a ser atacado na decisão judicial. O vício pode dizer respeito ao error in procedendo ou ao error in judicando[14].

O primeiro significa um erro de procedimento e o segundo e um erro de julgamento. Se há um erro de procedimento, por exemplo, o juiz da causa que proferiu a decisão era absolutamente incompetente, ou proferiu decisão de mérito, mas faltava uma condição da acção ou um pressuposto processual, não se quer que a decisão seja reformada, mas sim anulada. Já no erro de julgamento, o juiz julgou mal, apreciou mal as provas, por exemplo, neste caso, pede-se a reforma da decisão judicial. Por fim, o recurso se diferencia dos demais meios de impugnação, pois é um acto de inconformismo exercido dentro da mesma relação processual. Ou seja, não se instala uma nova relação jurídica processual.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

os critérios usados nos tribunais comunitários e tribunais judiciais são completamente diferentes, uma vez que o tribunal comunitário  usa como critérios, o bom senso e a equidade, de modo informal, desprofíssionalízado, privilegiando a oralidade e atendendo aos valores sociais e culturais existentes na sociedade moçambicana, com respeito pela Constituição ao passo que os tribunais Judiciais julgam segundo a constituição, a lei e a sua consciência, obedecendo um formalismo próprio, e de forma profissional.

Verdade se tira do artigo 86 da lei de organização judiciária que as decisões dos tribunais comunitários devem merecer recurso ao tribunal judicial e este vai receber e julgar de acordo com os critérios usados no tribunal a quo. A lei  dos tribunais comunitários no seu artigo 4 regula a articulação entre os tribunais comunitários e os tribunais judiciais dos distritos, isto porque quer por iniciativa das partes quando discordam com a medida adaptada pelo tribunal comunitário, quer por imposição da lei, o tribunal comunitário deve elaborar o auto e remete-lo ao competente tribunal judicial do distrito, sempre que verificar-se falta de concordância das partes com as medidas adoptadas pelo tribunal comunitário em caso de delitos de pequena gravidade.

Por aqueles factos, se pode concluir que, da decisão do tribunal comunitário para o tribunal judicial se trata de uma simples remessa e não de um recurso propiamente dito, uma vez que a referida decisão do tribunal comunitário não encontra alguma cobertura legal que a possa suporta-la como recurso, uma vez não conseguir preencher os requisitos desta. E como consequência o juiz profissional quando receber o processo remetido pelo tribunal comunitário ou remetido pelas próprias partes, deve julgar não com os critérios usados pelos tribunais comunitários mais sim usando critérios específicos dos tribunais judiciais.

Por esses factos, o ideal e o recomendável seria a compatibilização do regime traçado pela lei dos tribunais comunitários e a lei de organização judiciária, no sentido de se ter as decisões dos tribunais comunitários para o tribunal judicial como remessa, de modo a permitir que o juiz profissional não use os mesmos critérios usados pelo tribunal comunitário na apreciação da matéria controvertida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1.      REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE. Constituição (2004). Constituição da República de Moçambique, Imprensa Nacional Editora, Maputo, 2004.

2.      REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE. Decreto – Lei n.º 44.129, de 28 de Dezembro de 1961. Código de Processo Civil.

3.      REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE.  Lei  n.º24/2007  de 20 de Agosto. Lei da Organização Judiciaria.

4.      REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE. Lei nº4/92 de 6 de Maio. Lei dos Tribunais Comunitários.

  1. ANA, Prata. Dicionário Jurídico. 5a Edição Actualizada e Aumentada. Lisboa, 2008.
  2. MONDLANE, Pedro, Carlos. Código de Processo Civil Anotado e Comentado. 1a Edição, Moçambique, 2014.
  3. BUCHILLI, Beatriz, da Consolação Mateus. o Pluralismo Jurídico e a Realidade Sociocultural de Moçambique. Dissertação de Mestrado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul Faculdade de Direito. Porto Alegre, 2006. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/13147.
  4. CURA, António Alberto, Vieira. Organização Judiciária. Coimbra, 2010.
  5. NETO, Abílio. Código de Processo Civil Anotado. 1a Edição, Lisboa, 1970.
  6. TELLES, M. e FERREIRA, M. Código de Processo Civil Anotado, 2a Edição. Lisboa, 1997.
 
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Sobre o autor
Sezinho Pedro Luis Muachana

Advogado e Docente Universitário na Universidade Católica de Moçambique na Faculdade de Direito na Cidade de Nampula

Informações sobre o texto

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