Prescreve o art. 23 do novo Estatuto da Advocacia e da OAB – Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, que "os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor", pondo, assim, um ponto final, de modo enfaticamente, à aguerrida discussão que até então se travava a respeito da destinação dos honorários da sucumbência.
Os Tribunais Superiores, interpretando esse dispositivo, têm sido unânimes em que, por se tratar de matéria de ordem pública e de cunho eminentemente processual, tal dispositivo é de aplicação imediata, excluídas quaisquer outras normas que disponham em contrário.
O legislador atuou com sensatez, sem qualquer dúvida, visto que a pessoa jurídica, fosse ela um Sindicato ou uma empresa, por mera ficção de direito, detinha a assistência ou representação, mas o ônus do trabalho intelectual, científico e doutrinário não lhe poderia ser atribuído, sob pena de se relegar a pessoa do advogado a um nada amorfo e disforme.
Lamentavelmente, no entanto, entre nós mortais há quem, desrespeitando a lei, fazendo pouco caso da manifestação dos Tribunais Superiores (STF e STJ) e da farta doutrina, ignorando o trabalho sério, dedicado, zeloso e ético do advogado, passe por cima da lei, relegue-a a plano secundário, e tacanhamente, como juiz, decida nos moldes do costume antigo, como se a lei vigente não tivesse operacionalidade. Admitir que o cidadão investido das funções de julgador ignore a lei, seria absurdo, mas a triste verdade é que isso existe, para vergonha da laboriosa classe dos operadores do direito que somos todos nós – juizes e advogados, iguais constitucionalmente, devendo-se, ambos, reciprocidade de tratamento.
Não podemos concordar com certas posições de determinados juízes, tão somente porque são juízes, se elas ofendem a lei, ferem a Constituição e desrespeitam os direitos líquidos e certos. O que lamenta-se é a caturrice de se ignorar a lei, como se ela não existisse, consabido que a ninguém é dado desconhecê-la, muito menos a quem tem o dever de, representando o Estado, aplicá-la aos casos concretos. Se ao homem comum não é dado desconhecer a lei, o que se dizer desse homem quando ele incorpora a figura do Juiz?
Dizíamos num outro trabalho que a essência do regime democrático repousa na existência de uma Justiça forte, independente e livre. Não há registro na história dos povos que diga o contrário. Sempre que os déspotas quiseram concentrar em si o poder de mando, escravizar o povo, locupletar-se do Erário e encarnar o Estado, destruíram o Poder Judiciário e fecharam o Legislativo. Mas, para isso, os próprios membros do Judiciário deram-lhes motivo. Daí nosso temor, pois quando um Juiz ignora a lei, pisoteia a Constituição, transfigura-se num autêntico déspota, é que se aproxima o instante do perigo iminente e não temos mais nenhum motivo para crer que o Poder Judiciário ou um dos seus órgãos esteja forte como deve ser para proteção do povo. O Judiciário deve ser o último bastião das liberdades, mas se alguns dos seus integrantes começa a dar sinais de despotismo, urge que esse integrante seja cortado da grande árvore, e para isso a lei criou o órgão especial.
Entre nós tivemos, há exatamente um ano, um triste exemplo de um Judiciário doente quando o TST, passando por cima da lei, pisoteando a Constituição, desrespeitando todos os princípios democráticos de direito, afastou do exercício todos os juizes do nosso TRT, sem o devido processo legal, manu militari como se vivessemos ainda sob o império do AI-5, instaurando entre nós, até os dias que correm, o império da ilegalidade e do absurdo, fazendo com que o Tribunal aprecie e julgue, em segunda instância, inconstitucionalmente constituído.
Esse péssimo exemplo do TST parece haver contaminado alguns dos membros dessa magistratura especializada, ainda que em pequeno número, mas o suficiente para enegrecer a história da Justiça do Trabalho na Paraíba, decidindo arbitrariamente, como se as leis existentes não servissem para nada e contrariando o vetusto princípio do "dá-me os fatos e te darei o direito" que deve imperar no mundo processual trabalhista.
Digo com o eminente Hélio Cavalcanti Barros no seu "Direito Alternativo" que "Se as leis são injustas, mudem-se as leis. Caso sejam inconstitucionais, que assim sejam declaradas. Não cabe ao juiz deixar de aplicá-las de acordo com sua ideologia, consciência e critério, apoiado em uma suposta justiça social. Deve caber ao legislador a tarefa de corrigir a injustiça através da derrogação da lei má, mas não ao juiz recusar-lhe aplicação em nome de uma justiça ideal."
Queiram ou não certos juizes neófitos, mas a imperatividade do art. 23 do Estatuto da Advocacia e da OAB, que destina os honorários da sucumbência ao advogado, está plenamente em vigor, e queiram ou não esses mesmos juizes (parecem até juizes de fandango, ainda que poucos, mas sem qualquer cerimônia de pisotear a lei, numa vergonha de fazer corar anjo de mausoléu), Corte haverá capaz de repor a verdade da lei em seu devido lugar, mesmo porque o juiz não detém poder nenhum. Poder quem detem é o Povo, soberano nas Nações democráticas. O juiz é um mero e acidental aplicador do direito. Poder quem detém é o povo, pois nele repousa o poder originário. Acima da vontade do juiz está a lei, e enquanto aceitarmos o tipo de Judiciário que temos, sem que ao povo seja dado escolher seus integrantes, nossa democracia estará aleijada, doente, enfeada, como no dizer do eminente jurista e caro amigo Antônio Álvares da Silva, juiz togado do TRT da 3ª Região, para quem "o poder permanente é a ditadura", e a ditadura do Poder Judiciário no Brasil há de acabar um dia, a fim de que, nesse dia, "o menos democrático dos Poderes" possa ser chamado realmente de Poder.