Notas
01
Como exemplos deste estudo diversificado, podemos citar os seguintes trabalhos, todos interessantíssimos e baseados em dados estatísticos, fato raro em estudos estritamente jurídicos: SADEK, Maria Teresa (org.). Justiça e Cidadania no Brasil. São Paulo: Sumaré/Idesp, 2000; ARANTES, Rogério Bastos. Ministério Público e Política no Brasil. São Paulo: Sumaré/Educ, 2002; SILVA, Cátia. Justiça em Jogo: novas facetas da atuação dos Promotores de Justiça. São Paulo: Edusp, 2001. A propósito dessa carência de dados objetivos em estudos jurídicos, merece ser destacado o recente trabalho de Moniz de Aragão (que, com Barbosa Moreira, sempre alerta para a necessidade de um estudo com base em dados objetivos), exatamente acerca de uma das diversas pesquisas coordenadas pela já citada Maria Teresa Sadek: Estatística judiciária. Revista de Processo. São Paulo: RT, nº 110, abril/junho de 2003.02
Ovídio Baptista da Silva afirma que não existe outra figura de assistência que não seja a simples, sendo dispensável o adjetivo (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2000, p. 258. vol. 1). Entretanto, preferimos utilizar a expressão assistência simples, como de resto o fazem a doutrina e jurisprudência, a fim de evitar qualquer confusão terminológica, sendo que o próprio Ovídio Baptista da Silva utiliza o adjetivo durante toda a seqüência de seus Comentários e também em seu Curso.03
Estamos tratando de processos contra membros do Ministério Público, de modo que tudo que for dito sobre Promotores de Justiça durante todo o texto é plenamente aplicável a qualquer integrante da Instituição, no exercício de suas funções.04
Essa advertência deveria ser desnecessária, mas, lamentavelmente, no único julgado que conhecemos sobre o tema, houve esse desvio de perspectiva, como veremos oportunamente.05
Não estamos conferindo ao debate um enfoque maniqueísta ou corporativista, já que não se nega a possibilidade de atuação abusiva de determinado membro do Ministério Público, como de resto não se pode negar a possibilidade de abuso de qualquer profissional exercendo qualquer função. Contudo, também não se pode negar que o Ministério Público vem provocando reações mesmo quando atua na estrita observância de suas funções. O processo contra a pessoa dos Promotores de Justiça como meio de atingir a Instituição é uma realidade, surgindo, assim, o expediente técnico da intervenção em processos desse jaez, face o inegável prejuízo jurídico que pode daí resultar. Exatamente por ser da natureza do instituto da assistência a voluntariedade da intervenção, na hipótese de efetivamente ter sido abusiva a atuação do membro do Ministério Público, não haverá tal intervenção, até porque inexistirá interesse institucional na hipótese ou haverá desistência da intervenção porventura já iniciada.06
O parecer da assessoria, favorável à intervenção nos referidos processos, de autoria do Promotor de Justiça Emerson Garcia, está publicado na Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, nº 16.07
Expediente administrativo nº 10845-09.00/02-0, da lavra da Procuradora de Justiça Isabel Dias Almeida e aprovado em 26/12/2002 pelo Procurador-Geral de Justiça Cláudio Barros Silva, com a ratificação desse posicionamento no expediente administrativo nº 10845-09.00/02-0, de 20/03/2003.08
Trata-se da Lei Complementar Estadual nº 106, de 03/01/2003. Evidentemente, tal lei não pode veicular matéria processual e este dispositivo deve ser lido apenas como fixação de atribuição do Procurador-Geral de Justiça. Para os fins de nosso trabalho, essa previsão legislativa reforça a atualidade e a importância do tema.09
Como afirmou Cássio Scarpinella Bueno em seu recém publicado trabalho, as polêmicas acerca da intervenção de terceiros residem no próprio tema, estando in re ipsa (Partes e Terceiros no Processo Civil Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 2003, p. XX). Atílio Carlos González, por sua vez, assim se pronuncia: "[...]la intervención de los terceros em el proceso es uno de los temas más preocupantes de la doctrina, sin existir unidad de critério entre quienes han abordado su studio [...] esas dificuldades se vem acrecentadas por la falta de una doctrina orientadora y hasta por cierta prevención para admitir al tercero, considerado como un elemento perturbador en el proceso" (La legitimación de los terceros en el proceso civil. La Legitimación – Homenaje al Profesor Doctor Lino Herique Palacio. Augusto M. Morello (coord.). Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1996, p. 271).10
MAURÍCIO, Ubiratan de Couto. Assistência Simples no Direito Processual Civil. São Paulo: RT, 1983, p. 2311
Código de Processo Civil Anotado. Vol 1. 3a ed.-reimpressão. Coimbra: Coimbra Editora, 1982, p. 466.12
"[...] Um dos frutos mais comuns desse prejuízo é a mania de citação, as quais não só tornam pesados os nossos trabalhos senão também os deformam", apud, BORGES, José Souto Maior. O Contraditório do Processo Judicial. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 16.13
MAURÍCIO. Ob.cit., p. 49.14
A título de ilustração, seguem alguns dispositivos que cuidam do interesse na assistência, nos respectivos códigos de outros países: Argentina (art. 90): "Podrá intervenir en un juicio pendiente en calidad de parte, cualquiera fuere la etapa o la instancia en que éste se encontrare, quien: (1) Acredite sumariamente que la sentencia pudiere afectar su interés propio.[...]"; Peru (art. 97): "Quien tenga con una de las partes una relación jurídica substancial, a la que no deban extenderse los efectos de la sentencia que resuelva las pretensiones controvertidas en el proceso, pero que pueda ser afectada desfavorablemente si dicha parte es vencida, puede intervenir en el proceso como coadyuvante de ella.Esta intervención puede admitirse incluso durante el trámite en segunda instancia.El coadyuvante puede realizar los actos procesales que no estén en oposición a la parte que ayuda y no impliquen disposición del derecho discutido.(Art. 101): Los terceros deben invocar interés legítimo. [...]"; Chile (art. 23): "Los que, sin ser partes directas en el juicio, tengan interés actual en sus resultados, podrán en cualquier estado de él intervenir como coadyuvantes, y tendrán en tal caso los mismos derechos que concede el artículo 16 a cada una de las partes representadas por un procurador común, continuando el juicio en el estado en que se encuentre.Se entenderá que hay interés actual siempre que exista comprometido un derecho y no una mera expectativa, salvo que la ley autorice especialmente la intervención fuera de estos casos.Si el interés invocado por el tercero es independiente del que corresponde en el juicio a las dos partes, se observará lo dispuesto en el artículo anterior"; Portugal (art. 335º, 2): "para que haja interesse jurídico, capaz de legitimar a intervenção, basta que o assistente seja titular de uma relação jurídica cuja consistência prática ou econômica dependa da pretensão do assistido"; Itália (art. 105): "Ciascuno puó intervenire in un processo tra altre persone (267 s.) per far valere, in confronto di tutte le parti o alcune di esse, un diritto relativo all’oggeto o dipendente dal titolo dedotto nel processo medesino. Può altresi intervenire per sostenere le ragioni di alcuna delle parti, quando vi há un proprio interesse (100, 267 s., 344)"; Alemanha (§ 66, I): "Quien tiene un interés jurídico, en que en un procesoo pendiente entre otras personas venza una delas partes, puede asociarse a esta parte con la intención de apoyarle" (tradução de Emilio Eiranosa Encinas e Miguel Lourido Míguez. Código Procesal Civil Alemán. Madri: Marcial Pons, 2001).15
Da assistência litisconsorcial no Código brasileiro. Revista de Processo. São Paulo: RT, nº 11/12, julho/dezembro de 1978, pp. 45/46.16
Direito Processual de Estar em Juízo. São Paulo: RT, 1996, p. 207.17
Assistência. Revista de Processo: São Paulo: RT, nº 6, abril/junho de 1977, p. 229.18
Manual de Direito Processual Civil. Vol. 2. 7a ed. São Paulo: RT, 2001, p. 120. O mesmo entendimento foi adotado em estudo escrito com Teresa Arruda Alvim Wambier: Assistência-Litisconsórcio. Repertório de jurisprudência e doutrina. São Paulo: RT, 1986, p. 13.19
Assistente simples. Direito Processual Civil – 1 (Coleção Estudos e Pareceres). São Paulo: RT, 1995, pp. 95/106.20
A título de curiosidade, este conceito de Rosenberg era o que José Frederico Marques utilizava em suas Instituições. Também sob o Código de Processo Civil de 1939, merece ser transcrito o entendimento de Lopes da Costa, para quem "o interesse é jurídico quando o assistente seja parte de uma relação jurídica que tenha um laço de conexão com o objeto da causa em cujo processo intervém" (Direito Processual Civil Brasileiro. 2a ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 419. vol. I).21
Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 17a ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 51. 2o vol.22
Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 384. Vol. II.23
Comentários ao Código de Processo Civil. 9a ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 174. vol. I.24
Curso de Processo Civil. 4a ed. São Paulo: RT, 1998, p. 273. vol 1.25
Elementos de Direito Processual Civil. 2a ed. São Paulo: RT, 2003. vol. 2, p. 329;26
Curso Avançado de Processo Civil. 2a ed. São Paulo: RT, 1999, p. 253. vol. 1.27
Da Intervenção de Terceiros. São Paulo: Saraiva, 1986, p. 74.28
Ob. cit., p. 138.29
Assistência Litisconsorcial. São Paulo: RT, 1994, p. 27.30
A Intervenção de Terceiros no Processo Civil Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 37.31
Manual de Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1974, p. 271. vol 1.32
Curso de Direito Processual Civil. 31a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, pp. 124/125.33
Ob. cit. p. 467.34
Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 1974, p. 224. vol. I. Tornaghi, entretanto, entende que há interesse jurídico na hipótese em que um credor pretende ingressar em processo em face de seu devedor, a fim de ver preservado o patrimônio deste, com o que, acompanhando a doutrina majoritária, não concordamos.35
Código de Processo Civil Comentado. 7a ed. São Paulo: RT, 2003, p. 421.36
Sobre o assistente litisconsorcial. Revista de Processo. São Paulo: RT, n° 58, abril/junho de 1990.37
Ob. cit., pp. 59/60.38
Assistência no Processo Civil Brasileiro. Dissertação de mestrado. PUC-SP, 2001, p. 82. Inédito.39
MAURÍCIO. Ob. cit., p. 72.40
Rel. Ministro Oscar Corrêa. 1a Turma. A.I. 89.977, j. 24/03/83, apud ARRUDA ALVIM. Assistência-Litisconsórcio. Repertório de jurisprudência e doutrina. São Paulo: RT, 1986, p. 124.41
Pontes de Miranda: "estar presente para dar presença à entidade de que é órgão" (Comentários ao Código de Processo Civil. 5a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 288. tomo I). Ovídio Baptista da Silva expressamente aderiu a essa terminologia de Pontes de Miranda (Comentários.... cit. pp. 96/97).42
"A unidade do Ministério Público não significa que qualquer de seus membros poderá praticar qualquer ato em nome da instituição, mas sim, sendo um só organismo, os seus membros ‘presentam’ (não representam) a instituição sempre que atuarem, mas a legalidade de seus atos encontra limites no âmbito da divisão de atribuições e demais garantias e princípios impostos pela lei" e pela Constituição (CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. O Ministério Público no Processo Civil e Penal - Promotor Natural, Atribuição e Conflito. 5a ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 44). Aproveitamos a oportunidade para reafirmar que somente o processo que envolver um agente que tenha atuado regularmente é que poderá ensejar a assistência da Instituição. A atuação desviante, exatamente por desbordar da atuação institucionalmente desejada, não abre caminho para o ingresso da Instituição no processo.43
Discricionariedade administrativa e controle judicial da administração. Processo Civil e Interesse Público. Carlos Alberto de Salles (coord.). São Paulo: RT/APMP, 2003, p. 198. Em caso "sanha pessoal", evidentemente não haverá intervenção do Ministério Público em eventual processo contra o Promotor. Nesse caso, o interesse institucional será exatamente no sentido de punir, inclusive administrativamente, o desvio ocorrido no exercício anormal das funções. Sobre o sentido exato da noção do que se entende por "Promotor Natural", é imprescindível a leitura da obra de Paulo Cezar Pinheiro Carneiro citada na nota anterior (recentemente, houve reedição da obra).44
Como veremos logo adiante, há construção teórica que aproxima tal hipótese da figura do amicus curiae.45
São favoráveis: Ovídio Baptista da Silva (Comentários... cit. pp. 264/266), João Luís Macedo dos Santos (ob. cit. pp. 116/120, com algumas ressalvas em relação à assistência simples), Cássio Scarpinella Bueno (Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2002, pp. 150/151), José Antônio Remédio (Mandado de Segurança Individual e Coletivo. São Paulo: Saraiva, 2002, pp. 285/288), Paulo Roberto de Gouvêa Medina (Direito Processual Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 150), Hely Lopes Meirelles (Mandado de Segurança. 22a ed. São Paulo: Malheiros, 2000, pp. 62/62), Sérgio Ferraz (Mandado de Segurança. 3a ed. São Paulo: Malheiros, 1996, pp. 77/78), entre outros. A jurisprudência não é pacífica sobre o tema, como se vê na seguinte ementa do Superior Tribunal de Justiça, que bem demonstra a dimensão da controvérsia: "Processual Civil. Mandado de Segurança. Assistência. 1. A assistência não cabe em mandado de segurança, por: a) o art. 19, da Lei 1533, referir-se, exclusivamente, à admissão de litisconsórcio; b) o CPC, em face das dicções dos arts. 19 e 20, da Lei 1533, não é supletivo da lei que regula o procedimento do mandado de segurança; c) a lei prevê procedimento específico para o mandado de segurança, não cabendo ao intérprete ampliá-lo; d) a admissão de assistência em mandado de segurança cria obstáculo para a consecução da celeridade imposta para o seu curso. 2. Precedentes jurisprudenciais pela não admissão: RTJ 123/722/ STF-RT 626/242; RDA 170/132; RSTJ 85/364; STJ RT 732/186; TFR – MAS 106.842, DJU 19.12.85, AI 90.01.11636-1, DJU 24.9.90, P. 22.063, TRF – 1ª R; REO EM MS 8.851, DJU 12.9.95, P. 59.865 TRF 2ª R, AI 94.04. 10.202.4, DJU 29.6.94, TRF – 4ª R; AI 44.240, DJU 19.11.82, p. 16.182, TFR; AI 90.01.024378, DJU 1.10.90, P. 22.817, TRF, 1ª Reg. 3. Posição contrária de Sérgio Ferraz, Alfredo Buzaid e Hely Lopes, além dos precedentes seguintes: AI 43.009, DJU 14.10.82, P. 10361, TFR; MS 90.01.03405-5, P. 22.060, TRF, 1ª Região; AI 89.01.22703-7, DJU 12.2.90, P. 1726, TRF, 1ª Região; RE 78.620, RTJ 72/220; REsp 39.937-8, DJU 5.6.95, P. 16.635, STJ." (AGRMS 5690 / DF - DJ 24/09/2001, p.232 – Rel. Min. José Delgado).46
"Antes de mais nada, convém reiterar asserto que há muito vimos pondo como premissa de qualquer argumentação em torno de problemas do mandado de segurança: esse instituto não é um monstrum sem parentesco algum com o resto do universo, uma singular esquisitice legislativa, uma peça exótica, uma curiosidade a ser exibida em vitrine ou em jaula para assombro dos passantes; é uma ação, uma espécie do gênero bem conhecido e familiar, cujas peculiaridades, sem dúvida dignas de nota, não a desligam do convivo das outras espécies, não a retiram do contexto normal do ordenamento jurídico, não a condenam em degredo em ilha deserta. À semelhança do que acontece com as figuras congêneres, o mandado de segurança está contido no âmbito normativo do processo civil e submete-se aos respectivos princípios e normas, sem prejuízo da regulamentação especial constante das leis que a ele especificamente dizem respeito" (Recorribilidade das decisões interlocutórias no processo de mandado de segurança. Temas de Direito Processual. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 212. Sexta série. No mesmo volume, há outro trabalho primoroso sobre o tema: Mandado de segurança – uma apresentação. Há mais de trinta anos, Barbosa Moreira já se valia de sua corretíssima premissa, como se vê em seu Direito Processual Civil, Borsoi, 1971: Mandado de segurança e condenação em honorários de advogado).47
Mandado de Segurança. Assistência e amicus curiae. Revista de Direito Processual Civil, nº 27. Curitiba: Gênesis, janeiro/março de 2003, p. 195. Se acompanhássemos integralmente sua lição, o Ministério Público atuaria no mandado de segurança em que se debate questão institucional mais propriamente na condição de amicus curiae, tendo em vista o interesse público presente na questão. Entendemos, porém, que se trata mesmo de assistência, em razão do imediato interesse institucional e, portanto, jurídico, existente na causa.48
A natureza da atuação do amicus curiae, no direito brasileiro, é controvertida. Fredie Didier Jr., por exemplo, entende que se trata de um auxiliar do juízo em questões técnico-jurídicas, não podendo ser equiparado com uma intervenção de terceiro, pois "seria o mesmo que se comparar a intervenção de um perito com a de um assistente" (Recurso de Terceiro – Juízo de Admissibilidade. São Paulo: RT, 2003, pp. 77/78 e 157/158). Sobre o tema, conferir, ainda, os seguintes trabalhos: MACIEL, Adhemar Ferreira. Amicus curiae: um instituto democrático. Revista de Processo. São Paulo: RT, n° 106, abril/junho de 2002 e PEREIRA, Milton Luiz. Amicus curiae – intervenção de terceiros. Revista de Processo. São Paulo: RT, n° 109, janeiro/março de 2003. Carlos Gustavo Del Prá, em interessantíssimo trabalho, entende que se trata uma forma especial de intervenção de terceiro (O Amicus Curiae e a Assistência nas Ações Coletivas: a ampliação do debate como forma de participação democrática. Trabalho apresentado no curso de mestrado da PUC/São Paulo -conclusão da disciplina ministrada pela Professora Doutora Thereza Alvim, 2003, p. 28. Inédito).49
O Supremo Tribunal Federal assim vem se manifestando sobre a atividade do amicus curiae: "[...] cabe ter presente a regra inovadora constante do art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, que, em caráter excepcional, abrandou o sentido absoluto da vedação pertinente à intervenção assistencial, passando, agora, a permitir o ingresso de entidade dotada de representatividade adequada no processo de controle abstrato de constitucionalidade. A norma legal em questão, ao excepcionalmente admitir a possibilidade de ingresso formal de terceiros no processo de controle normativo abstrato [...] No estatuto que rege o sistema de controle normativo abstrato de constitucionalidade, o ordenamento positivo brasileiro processualizou, na regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, a figura do amicus curiae, permitindo, em conseqüência, que terceiros, investidos de representatividade adequada, sejam admitidos na relação processual, para efeito de manifestação sobre a questão de direito subjacente à própria controvérsia constitucional". ADI 2130 (MC) / SC - Min. Celso de Mello - DJ 02/02/2001, p. 145.50
Como afirma Carlos Gustavo Del Prá, "nada impede, entretanto, que havendo já a necessária intervenção do Ministério Público como custos legis, outro órgão do Ministério Público, seja de grau hierarquicamente inferior ou mesmo de diferente atribuição territorial (não se trata de divisão de competência, mas mera divisão administrativa) pretenda intervir como amicus curiae para prestar informações em auxílio da melhor solução" (ob.cit. p. 22).51
Também admitindo o ingresso do Ministério Público do Rio de Janeiro na condição de amicus curiae, confira-se a ADI 2735 / RJ - Min. Maurício Corrêa - DJ 05/03/2003, p. 025.52
Mandado de Segurança nº 5370 (registro nº 970058928-5), julgado em 12/11/1997 pela Primeira Seção, com decisão unânime favorável ao pleito do Ministério Público. O relator foi o Ministro Demócrito Reinaldo e o Procurador-Geral de Justiça que impetrou o mandado de segurança pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, inclusive fazendo uso de sustentação oral, foi Luiz Antônio Marrey. Íntegra do acórdão publicada na Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, nº 9.53
Ob. cit. p. 79.54
Ob, cit. p. 82. Sobre a intervenção da OAB, há que se ter em mente o disposto no art. 49, parágrafo único, da Lei 8906/94, de que trataremos oportunamente.55
Note-se que, intervindo o Ministério Público como assistente, no que se refere a eventuais despesas processuais, o art. 32 do Código de Processo Civil deverá ser aplicado em consonância com o que dispõe o art. 27 do mesmo Código.56
A redação final na Câmara dos Deputados da denominada "reforma do judiciário" (PEC nº 96/02) estabeleceu, no art. 95, § 3o da Constituição, unicamente a responsabilidade direta do Estado por ato do juiz, cabendo ação regressiva em caso de dolo, vedando-se, pois, a responsabilização direta do agente, o que se aplicará também ao Ministério Público. A título de ilustração, também é esta a disciplina em Portugal (art. 77 da Lei Orgânica da Magistratura e do Ministério Público, lei nº 60, de 28/08/98). Merece registro, até para que não seja esquecida a tentativa de intimidação oficial do Ministério Público, o dispositivo da medida provisória 2088/35 de 2000, que acrescentou um parágrafo 11 no artigo 17 da Lei 8429/92, que previa a condenação pessoal do agente ao pagamento de multa em caso de "imputação manifestamente improcedente", não tendo havido reedição desta regra (confiram-se, sobre essas interferências oficiais no processo coletivo, as seguintes obras: ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Processual Coletivo Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003; BUENO, Cássio Scarpinella. O Poder Público em Juízo, 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2003). Sobre a responsabilidade direta do Juiz – e, conseqüentemente do Promotor de Justiça -, amplamente e com farta indicação bibliográfica: CAPPELLETTI, Mauro. Juízes Irresponsáveis? Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989 (trad. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira); LASPRO, Oreste Nestor de Souza. A Responsabilidade Civil do Juiz. São Paulo: RT, 2000.57
Da responsabilidade civil do Estado por atos do Ministério Público. Estudos de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Del Rey, 1995. Ressalte-se que o eminente Professor não afirma a possibilidade ou impossibilidade de haver responsabilidade direta; apenas não registra nenhuma hipótese.58
Nelson Nery Junior, por exemplo, ao comentar o art. 85, afirma que a responsabilidade direta é do poder público, cabendo posterior direito de regresso; ao comentar o art. 133, entretanto, entende ser possível ajuizar a ação reparatória em face do poder público ou diretamente em face do magistrado (ob. cit. pp. 469 e 536).59
José Carlos Barbosa Moreira defende que "à semelhança do dolo, da fraude e da omissão ou do retardamento injustificável, previsto no art. 133, também o erro grosseiro na condução do feito deveria acarretar a responsabilidade do juiz pelas perdas e danos causados à parte" (Reformas processuais e poderes do juiz. Revista de Direito – TJ-RJ. Rio de Janeiro: Espaço Jurídico, nº 56, julho/setembro de 2003, p. 23).60
RE 228977/São Paulo - Min. Néri da Silveira - DJ 12/04/02, p. 066. Apesar de o julgado referir-se à responsabilidade por ato do Juiz, aplica-se integralmente à hipótese de responsabilidade por ato de membro do Ministério Público.61
Note-se que invariavelmente as iniciais não descrevem um agir doloso ou fraudulento, limitando-se a tecer considerações sobre supostos prejuízos sofridos pelo autor em razão de uma ação em tese "temerária". Tal fato deveria ensejar ou indeferimento da inicial por falta de interesse processual ou sua inépcia pela impossibilidade jurídica do pedido (ou impossibilidade jurídica da demanda, já que a causa de pedir é que é "impossível", para nos valermos da lição de Cândido Rangel Dinamarco. Ob. cit. pp. 298/299. Vale conferir a abordagem crítica sobre as denominadas "condições da ação" realizada por Fredie Didier Junior: Réquiem para as condições da ação: estudo analítico sobre a existência do instituto. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, nº 351, julho/setembro de 2000.). No entanto, as ações vêm sendo admitidas, sem que haja um rigoroso exame de seus termos.62
BARBI. Ob. cit. p. 182. Amplamente: MAURICIO. Ob. cit. pp. 129/134.63
No Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça condenou o Ministério Público ao pagamento das verbas de sucumbência em ação coletiva, esclarecendo que o Estado seria responsável pelo pagamento das despesas, em razão da ausência de personalidade jurídica da Instituição, mas a verba deveria ser descontada do orçamento destinado ao Ministério Público (Ap. 592.0668-8, j. 16/03/1993, rel. Dês. Araken de Assis. A íntegra do acórdão e os comentários de Luís Alberto Thompson Flores Lenz sobre a decisão estão na Revista de Processo nº 84. São Paulo: RT, outubro/dezembro de 1996). Vê-se que, a se acolher o raciocínio deste julgado, o Ministério Público poderá ser atingido diretamente por razões orçamentárias mesmo sem possuir personalidade jurídica.64
O jornal "O Estado de São Paulo", na edição do dia 19/04/99, atribuiu a seguinte frase à Deputada Zulaiê Cobra, relatora na Câmara da denominada "reforma do Judiciário": "O Ministério Público está acabando com as prefeituras, vamos acabar com ele" (apud ARANTES, Rogério Bastos. Ministério Público e Política no Brasil. São Paulo: Sumaré/Educ, 2002, p. 267, nota 23). O ex-Ministro de Estado Eduardo Jorge Caldas Pereira, que está processando dois Procuradores da República, vê o Ministério Público como integrante de um "esquadrão da morte moral" e considera que "não pode haver, sob nenhuma hipótese, uma instituição sem controle, como é hoje o Ministério Público no Brasil. Ali não há hierarquia, nem alguém com autoridade para dizer basta, para coibir o abuso. Alguns procuradores formam um grupo que se investiu no direito divino de fazer o bem ou o mal, de punir ou julgar sem o devido processo legal e sem se ater aos parâmetros da lei para definir o que é certo e o que é errado. Avaliam pelos seus preconceitos políticos ou ideológicos. Para sobreviver como instituição respeitada, o Ministério Público terá de ser reformulado. A sociedade brasileira tem que prestar atenção para não cair nisso de novo. Nunca é demais lembrar: os esquadrões da morte surgiram exatamente pelas mãos de policiais que todos achavam bem intencionados, que queriam apenas reprimir o crime" (apud ROSA, Mário. A Era do Escândalo. São Paulo: Geração Editorial, 2003, pp. 217/218). José Dirceu, o mais importante ministro da atualidade, afirmou o seguinte: "eu quero colocar os pingos nos is nesse negócio do Ministério Público no Brasil. Não vou deixar isso barato não. O Ministério Público vem fazendo violências legais a todo momento e continua" (coluna do jornalista Merval Pereira. Jornal O Globo, dia 23/03/04). Como contraponto, vale transcrever trechos de uma crônica do escritor Luís Fernando Veríssimo ("O Estado de São Paulo, dia 03/01/01): "O óbvio neste caso é que está em curso um processo de intimidação do Ministério Público, que querem amordaçar de um jeito ou de outro.[...] O Ministério Público está apenas fazendo seu trabalho. Estão se excedendo? Promotores de Justiça com vontade de aparecer são a melhor novidade da República nestes últimos anos. Contrapartida direta da proliferação de corruptos e corruptores com vontade de não aparecer". E ainda o seguinte texto do jornalista Marcos Sá Corrêa: "Será por coincidência que o país discute o controle do Ministério Público na hora em que ele apura, sozinho, o que o PT fazia em Santo André quando morreu Celso Daniel? O Governo se livrou de CPIs. Livrá-lo dos Promotores parece ser o sonho de qualquer ditadura" (nominimo.ibest.com.br – acesso em 15/04/04).65
Ministério Público: Organização, Atribuições e Regime Jurídico. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 446/449.66
Expedientes administrativos citados na nota 7.67
MAURÍCIO. Ob. cit. pp. 120/121.68
Ob. cit. p. 85.69
Sobre este ponto, assim se manifesta Carlos Gustavo Del Pra: "Assim, essa constatação, aliada à garantia constitucional do acesso à justiça (art. 5o, XXXV, da CF) e do devido processo legal (art. 5o, LIV, da CF), parece impor a seguinte conclusão: para aquelas ações que naturalmente dizem respeito a interesses que extrapolam a esfera individual e abarcam interesses de relevância pública ou social (ações para tutela de interesse público ou coletivo lato sensu, como, v.g., ação civil pública e ação direta de inconstitucionalidade) deve-se proceder a uma interpretação voltada para a admissibilidade da intervenção de terceiros propriamente dita. [...]Da mesma forma que a assistência, a intervenção do amicus curiae, admissível em ações de substrato público, demanda uma interpretação que lhe extraia o máximo de sua essência, sob pena de neutralizar uma inovação que declaradamente veio para aperfeiçoar a prestação jurisdicional. Antes, contudo, tratemos de sua origem e estrutura." (ob. cit. pp. 03 e 05).70
Cf. Processo Civil e Interesse Público. Carlos Alberto de Salles (coord.). São Paulo: RT/APMP, 2003. Apesar de a atuação penal do Ministério Público ser praticamente a mesma desde o Império, conforme afirmação feita por Diaulas Costa Ribeiro em sua tese de doutoramento (Ministério Público – dimensão constitucional e repercussão no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 1), também nesta área começa a se esboçar uma atuação diferente, principalmente nos casos em que há investigação a cargo de seus membros. Em todo caso, essa mudança ainda é extremamente incipiente e, como era de se esperar, vem encontrando forte resistência, inclusive do Supremo Tribunal Federal..71
É o que propõe Cândido Rangel Dinamarco em sua mais nova obra: Nova Era do Processo Civil. São Paulo: Malheiros, 2003.72
Trata-se do denso estudo de Gregório Assagra de Almeida, já citado na nota 56.73
Agravo de Instrumento 2002.002.17853 – 12a Câmara Cível – Rel. Des. Helena Belc Klausner, julgado em 30-10-02. Seguem alguns trechos, não sem antes assinalar que se tratou de decisão com base no art, 557, §1o, Código de Processo Civil, sendo que não há nenhuma jurisprudência dominante ou súmula sobre o tema, o que não deixa de ser curioso (de todo modo, a Câmara confirmou posteriormente a decisão, ao julgar embargos de declaração): "In casu a assistência é uma modalidade de intervenção espontânea direcionada aos feitos onde predomina o suporte patrimonial, pendendo causa entre pessoas, daí exsurgindo que não se justifica que um órgão institucional, constitucionalmente incumbido da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis possa intervir no feito, mesmo em se tratando o réu de membro do nosso nobre Parquet. não tem atribuição o Ministério Público para atuar de qualquer modo no caso enfocado por sua natureza institucional, posto que está legitimado tão somente a atuar como parte ou intervir como custos legis, jamais como assistente simples em pleito de natureza patrimonial, seja qual for o suporte da ação enviada em face de um de seus membros."74
"Não se interpreta o direito em tiras, aos pedaços [...] Um texto de direito isolado, destacado, desprendido do sistema jurídico, não expressa significado normativo algum". (GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 34).75
Cf. DIDIER JR., Fredie. Ob. cit. pp. 29 e 31, que, contudo, considera inconstitucional o disposto no art. 5o da Lei 9469/97 (p. 109).76
A OAB necessita dessa autorização legislativa por ser uma entidade de classe, não havendo, pois, como demonstrar algo equivalente ao que estamos denominando de interesse institucional, já que sempre o advogado estará agindo individualmente e no próprio nome, no que se refere à dimensão de seus atos.77
Embargos de Terceiro. Tese de doutoramento. PUC/SP, 1981, p. 26. Inédito.78
Por todos: BARBOSA MOREIRA: O processo, as partes e a sociedade. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, n° 5, agosto de 2003.79
Segundo Maria Tereza Sadek, "poucas vezes – se alguma – presenciou-se, em tão curto espaço de tempo, uma instituição sair da obscuridade alçando-se para o centro dos refletores. Quer atuando nos limites de suas atribuições legais, quer promovendo atividades fora do gabinete, os integrantes do Ministério Público vêm marcando presença e, conseqüentemente, provocando reações" (Cidadania e Ministério Público. Justiça e Cidadania no Brasil. São Paulo: Edesp/Sumaré, 2000, p. 11).80
"E o processo deve, sim, servir às partes; mas deve também servir à sociedade" (BARBOSA MOREIRA. O processo... cit. p. 40).81
Redações alternativas: A identificação de interesse institucional habilita o Ministério Público a ingressar em processo como assistente simples, a fim de evitar a ocorrência potencial de prejuízo em sua situação jurídica. / Pode o Ministério Público intervir como assistente simples em processos em que se discutam questões institucionais, inclusive ações de responsabilidade civil contra seus membros. / Havendo processo que possa causar prejuízo institucional, pode o Ministério Público intervir como assistente simples.NOTA DO AUTOR
Em sessão realizada em 10/05/05, a Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, julgando o agravo de instrumento nº 2005.002.01366, decidiu, por maioria, ser possível a intervenção do Ministério Público como assistente simples em processo instaurado contra seu membro, em razão do exercício de suas funções. Confira-se a ementa do acórdão:
Assistência simples – Ministério Público. Nas ações de responsabilidade civil propostas em face de membros do Ministério Público por atos que teriam sido praticados no exercício da função é cabível a integração na lide da Instituição, notadamente quando se pretende tutelar a relação funcional do agente e de possível ilícito praticado no exercício das funções institucionais. Deferimento da assistência. Recurso provido (D. O. 06/06/05, pp. 27/30. Rel. p./acórdão, Des. Paulo Gustva Horta).