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Litisconsórcio, assistência e intervenção de terceiros nas ações coletivas para tutela do consumidor

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31/01/2006 às 00:00
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3. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS

            Transitando em julgado a sentença, produz coisa julgada, tornando-se imutável e fazendo lei entre as partes. Como regra, a sentença atinge aos que foram partes na demanda e não terceiros. Entretanto, tendo em vista a complexidade da relação jurídica, é possível que os efeitos da sentença recaia indiretamente sobre terceiros. É o que chamamos de "extensão subjetiva da sentença".

            Com o objetivo de reduzir os perigos da extensão dos efeitos da sentença a terceiros não participantes da relação processual, o direito admite que terceiras pessoas, em razão do interesse que tenham na lide, nela intervenham em determinados casos, para que possam fazer a defesa de seus direitos, sujeitando-se, assim, à sentença proferida. É a chamada intervenção de terceiros.

            Os terceiros que intervêm não são partes na relação processual originária. São pessoas estranhas à relação processual de direito material deduzida em juízo e estranhas à relação processual já constituída. São sujeitos de uma outra relação de direito material que se liga intimamente àquela já constituída, ou seja, são os que não são partes no processo pendente [07].

            São modalidades de intervenção de terceiros a oposição, a nomeação à autoria, a denunciação da lide e o chamamento ao processo. São disciplinadas pelo CPC nos artigos 56 a 80. Entretanto, nos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95), face o disposto no art. 10, não se admite a intervenção de terceiros e a assistência, pois o procedimento adotado orienta-se pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando sempre que possível, a conciliação ou transação. Como conseqüência disto, as sanções impostas pelo Código de Processo Civil para os casos em que a parte se omita no dever de provocar a intervenção de terceiro no processo não se aplicam nesta hipótese.

            Da mesma forma o procedimento comum sumário não autoriza a intervenção de terceiro, salvo a assistência e o recurso de terceiro prejudicado por se tratar de um rito mais célere.

            3.1 Oposição

            3.1.1 Conceito

            A oposição tem origem germânica. Diversamente do direito romano, em que a sentença produzia efeitos apenas entre as partes, no processo germano barbárico, o juízo era universal, os litígios eram decididos pela assembléia do povo, em praça pública. Em razão desse procedimento é que se dizia que a sentença produzia efeitos em relação a todos que dela participavam e conheciam, e não só entre as partes. Se terceira pessoa pretendesse a coisa ou o direito sobre a qual litigavam as partes, deveria intervir no processo para exclui-las.

            O instituto acabou sendo incorporado pelo direito canônico e pelo direito italiano medieval com a denominação de intervenção no processo das partes. Pela influência do direito canônico, a oposição acabou se tornando ação autônoma. Com esta roupagem a oposição foi adotada pelo direito brasileiro, português e alemão.

            A França e a Itália seguem o modelo germânico primitivo, no qual a intervenção se dá no processo principal.

            Dessa forma, a oposição pode ser conceituada como sendo a intervenção de terceiro que pretende, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu.

            Moacyr Amaral Santos conceitua oposição "como a ação intentada por terceiro que se julgar, total ou parcialmente, senhor do direito ou da coisa disputada entre as partes numa demanda pendente, formulando pretensão excludente, total ou parcialmente, das de ambas. Ou, ainda, o pedido de tutela jurisdicional, ou ação, que terceiro formula na demanda entre as partes, deduzindo pretensão própria excludente, total ou parcialmente, das dos demais litigante" [08].

            3.1.2 Procedimento

            O procedimento da oposição encontra-se previsto nos artigos 56 a 61 do CPC.

            O opoente apresentará a petição inicial observando sempre os requisitos exigidos pelos artigos 282 e 283 do CPC, no mesmo juízo da causa principal. Serão réus em litisconsórcio necessário autor e o réu da ação principal [09].

            Nesta modalidade de intervenção de terceiros forma-se uma outra relação processual. De acordo com o momento em que ocorrer sua propositura, correrá em apenso aos autos principais ou em apartado como demanda autônoma.

            Se a oposição for oferecida antes da audiência de instrução e julgamento, esta será apensada aos autos principais, e correrá simultaneamente com a ação, sendo ambas julgadas pela mesma sentença, não se esquecendo que a oposição deve ser apreciada antes da principal.

            Os opostos serão citados na pessoa dos seus respectivos advogados para oferecer contestação no prazo comum de quinze dias. Trata-se de uma exceção à regra de que a citação deve ser pessoal [10][11]. Entretanto, se o processo principal correr à revelia do réu, este será citado por edital, na forma dos arts. 213 a 233 do CPC.

            Após a audiência de instrução e julgamento da lide pendente, a oposição somente poderá ser proposta em ação autônoma, seguindo o procedimento ordinário. Neste caso, embora o Código de Processo Civil não faça referência à questão, somos pelo entendimento de que a citação deve ser pessoal, com prazo de quinze dias para contestar. Sendo advogados diferentes, o prazo será contado em dobro, nos termos do art. 191 do referido diploma legal.

            A oposição em processo autônomo será julgada sem prejuízo da causa principal. Mas se o juiz entender necessário o sobrestamento do processo principal a fim de julgá-los conjuntamente, poderá fazê-lo por prazo nunca superior a noventa dias para que não retarde demasiadamente a marcha do processo principal.

            Se um dos opostos reconhecer o pedido, contra o outro prosseguirá o opoente.

            O limite temporal para o oferecimento da oposição é até a prolação da sentença (juízo de 1º grau) por ser uma questão prejudicial à ação principal. Se a sentença já foi proferida não é mais cabível a oposição, o interessado no objeto da lide entre o autor e o réu, deverá ajuizar demanda que entender necessária contra o autor ou o réu, ou ambos.

            Diversamente, Moacyr Amaral Santos entende que "a oposição, como demanda autônoma, pode ser proposta entre dois termos: desde já iniciada a audiência de instrução e julgamento da lide pendente (termo a quo), até o momento em que essa lide tiver sido decidida definitivamente (termo ad quem), isto é, até o momento em que a sentença nessa lide se torne irrecorrível. Transitada em julgado a sentença proferida na ação, não mais se admite a oposição. Assim, a oposição pode ser proposta mesmo quando a causa entre autor e réu estiver em segunda instância, em grau de recurso. Mas, ainda nesse caso, a oposição deverá ser oferecida e processada em primeira instância, sujeita às normas que disciplinam o duplo grau de jurisdição" [12].

            No mesmo sentido, Pontes de Miranda entende que a oposição pode ser ajuizada tanto antes da audiência, como depois dela e da prolação da sentença. Se o Código permite expressamente que a oposição tenha curso autônomo, e possa ser julgada "sem prejuízo da causa principal", nenhum óbice existe ao seu ajuizamento depois de proferida a sentença de primeiro grau de jurisdição, mas antes do seu trânsito em julgado [13].

            A sentença que julgar procedente a oposição será declaratória com relação ao autor da ação principal, pois declara não ter ele direito ao objeto da causa; e será condenatória com relação ao réu que possui a coisa, devendo entregá-la ao opoente ou responder perante ele.

            Da sentença que julgar a oposição, o recurso oponível será o de apelação, nos termos do art. 513 do CPC.

            A oposição não será cabível em processo de execução, nos Juizados Especiais e nas demandas sob procedimento sumário [14].

            3.2 Nomeação à autoria

            3.2.1 Conceito

            A nomeação à autoria consiste na correção da legitimação passiva, ou seja, substitui-se o réu parte ilegítima para a causa por um réu parte legítima. É, portanto, ato exclusivo do réu, visando livrar-se de demanda que lhe foi intentada.

            3.2.2 Procedimento

            O procedimento da nomeação à autoria encontra-se disciplinado nos arts. 62 a 69 do Código de Processo Civil.

            Duas são as situações em que deverá ocorrer a nomeação à autoria: a) quando aquele que detiver a coisa em nome alheio, for demandado em nome próprio, deverá proceder a nomeação à autoria o proprietário ou o possuidor; b) na ação de indenização, intentada pelo proprietário ou pelo titular de um direito sobre a coisa, toda vez que o responsável pelos prejuízos alegar que praticou o ato por ordem, ou em cumprimento de instruções de terceiro.

            A nomeação à autoria não é uma mera faculdade do réu, mas sim um dever. A sua inobservância resulta na responsabilidade por perdas e danos, pois estará dando prosseguimento a um processo inútil ao fim visado, acarretando dano ao autor e para a Justiça. Da mesma forma, se nomear pessoa diversa daquela em cujo nome detém a coisa demandada.

            A nomeação deve ser requerida no prazo para a defesa, e uma vez deferido o pedido, o juiz suspenderá o processo e mandará ouvir o autor no prazo de cinco dias.

            Aceita a nomeação pelo autor, a ele incumbirá a citação; se a recusar, ficará sem efeito a nomeação. Deixando o autor de se manifestar no prazo que lhe foi conferido, presumir-se-á aceita a nomeação [15].

            O Código nada fala de qual será o prazo para o nomeado falar sobre a nomeação. Dessa forma, se o juiz não estipular o prazo, deverá aplicar o prazo de cinco dias, conforme preceitua o art. 185 do CPC.

            Citado o nomeado, este poderá reconhecer a qualidade que lhe é atribuída, expressa ou tacitamente, correndo a demanda contra ele. O reconhecimento tácito se dá por presunção, tendo em vista que o nomeado não compareceu, ou se compareceu, nada alegou.

            Se o nomeado negar a condição, o processo continuará contra o nomeante. Neste caso, o autor terá duas opções: assumir o risco de continuar litigando com o nomeante, que se afirma parte ilegítima; ou desistir da ação contra o nomeante, observando a regra contida no art. 267, § 4º, para, posteriormente, propor nova demanda contra o terceiro indicado pelo nomeante.

            Assim, havendo recusa do autor com relação ao nomeado, ou se este negar a qualidade que lhe é atribuída, o nomeante terá novo prazo para contestar [16].

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            O nomeante poderá continuar na relação processual como assistente caso tenha interesse em que a sentença seja favorável ao nomeado.

            3.3 Denunciação da lide

            3.3.1 Conceito

            No direito romano, a palavra auctor assume várias acepções. É tanto aquele que propõe ação quanto o antecessor na sucessão da coisa, o transmitente do direito (o causam dans, em relação ao adquirente do direito, o causam habens). É neste último sentido que foi usada a palavra autoria, no chamamento à autoria instituído pelo Código de Processo Civil de 1939.

            O direito brasileiro, acompanhando o direito tradicional português, adotou a denominação "chamamento à autoria", utilizando-se do vocábulo latino. Já o direito francês e o italiano preferiram o vocábulo de origem germânica, denominando o instituto de exception de garantie, chiamata in garantia. No direito alemão e austríaco tem como correspondente a litisdenunciação.

            Mais tarde, o conceito de denunciação à autoria foi alargada, passando, então, a ser chamado de denunciação da lide.

            Denunciação da lide é o instituto pelo qual autor ou réu chamam a juízo terceira pessoa, que seja garante do seu direito, a fim de resguardá-lo no caso de ser vencido na demanda em que se encontram. É uma ação secundária, regressiva, sendo citado como denunciado o terceiro contra quem o denunciante terá pretensão indenizatória caso seja sucumbente na ação principal.

            Haverá duas lides que serão processadas simultaneamente, no mesmo processo, julgadas pela mesma sentença [17][18].

            O CPC traz em seu art. 70 os casos em que tem cabimento a denunciação da lide. São os seguintes:

            I – ao alienante, na ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo domínio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o direito que da evicção lhe resulta;

            II – ao proprietário ou ao possuidor indireto quando, por força de obrigação ou direito, em casos como o do usufrutuário, do credor pignoratício, do locatário, o réu, citado em nome próprio, exerça a posse direita da coisa demandada;

            III – àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda [19].

            Trata-se de ato obrigatório [20][21] apenas nos casos de evicção e transmissão de direitos, pois se não fizer a denunciação perderá o direito de regresso contra aquele que é o garante do seu direito discutido em juízo. Já na hipótese dos incisos II e III, art. 70, a parte que não promover a denunciação da lide perderá apenas as vantagens processuais dela decorrentes, mas não perde a pretensão de direito material, podendo ajuizar a ação regressiva em processo autônomo.

            3.3.2 Procedimento

            Como já foi dito alhures, a denunciação da lide pode ser feita tanto pelo autor quanto pelo réu.

            Quando o titular da eventual pretensão regressiva for o autor, este deve requerer a denunciação juntamente com a petição inicial, pedindo a citação do denunciado, a qual será feito primeiro, e do réu. Ordenada a citação, suspende-se o processo.

            A diligência para a citação do denunciado deve ser feita no prazo de dez dias para o residente na Comarca, e de trinta para o residente em outra Comarca, ou lugar incerto. Se a citação não ocorrer dentro do prazo estipulado pela lei, a ação prosseguirá unicamente em relação ao denunciante [22].

            Uma vez citado o denunciado, este poderá defender-se da denunciação negando a qualidade que lhe é atribuída. Neste caso, a demanda prosseguirá entre autor e réu. Da mesma forma se dará se o denunciado for revel. O denunciado também poderá aceitar a denunciação e assumir a posição de litisconsorte, podendo aditar a petição inicial no prazo de quinze dias (art. 241 c/c art. 297).

            Embora haja na doutrina divergência quanto ao aditamento da petição inicial pelo denunciado, não há dúvidas quanto a essa possibilidade já que a lei é expressa. Cabe ao denunciado coadjuvar o autor uma vez que tem interesse na procedência da ação. Entretanto, não pode argüir fato novo, contrariando a defesa do autor [23].

            Se o denunciado confessar os fatos alegados pelo autor, poderá o denunciante prosseguir ou não na defesa.

            A denunciação da lide feita pelo réu deve ser oferecida no mesmo prazo para a contestação da ação principal. Questão que surge é se o réu, uma vez citado, apresenta apenas a denunciação, deixando de contestar o pedido do autor. Neste caso, sendo o denunciado citado dentro do prazo para a contestação, ficando suspenso o processo, poderá o réu e denunciante apresentar contestação, depois de reiniciado o andamento da ação principal ? Isso não nos parece correto, pois o denunciado precisa conhecer o posicionamento do réu com a inicial para poder apresentar sua defesa [24].

            O prazo e as regras para a citação do denunciado serão as mesmas da denunciação feita pelo autor, como acima explicitado.

            Citado o denunciado, este poderá aceitar e contestar o pedido, prosseguindo o processo contra o denunciante e denunciado em litisconsórcio; comparecer apenas para negar a qualidade que lhe foi atribuída, sendo, considerado revel, cumprindo ao denunciante prosseguir na defesa até o final; ou confessar os fatos alegados pelo autor, podendo o denunciante prosseguir na defesa.

            A revelia do denunciado não desobriga o réu de sua defesa sob pena de perder o direito de regresso.

            A decisão de rejeição liminar da denunciação é decisão interlocutória, sendo sua impugnação feita por meio do recurso de agravo.

            O Código de Processo Civil também permite a chamada denunciação "sucessiva". Isto ocorre quando o denunciado tem com relação a outrem a mesma posição jurídica do denunciante perante ele. É o que dispõe o art. 73 : " Para os fins do disposto no art. 70, o denunciado, por sua vez, intimará do litígio o alienante, o proprietário, o possuidor indireto, ou o responsável pela indenização e, assim, sucessivamente, observando-se, quanto aos prazos, o disposto no artigo antecedente".

            Parte da doutrina tem entendido que a denunciação da lide sucessiva é cabível em todos os casos de ação regressiva. Isto porque constam do próprio texto legal as expressões "obrigação de indenizar em ação regressiva" (art. 70), "responsável pela indenização" (art. 72 e 73) e "responsabilidade por perdas e danos" (art. 75) [25].

            Outra parte posiciona-se no sentido de que a interpretação dos dispositivos deve ser restritiva. As hipóteses de intervenção são excepcionais face o princípio da singularidade da jurisdição e da ação, de modo que a denunciação somente será possível quando, por força de lei ou contrato, o denunciado está obrigado a garantir o resultado da demanda, acarretando a perda da ação [26].

            Todas essas discussões ocorrem principalmente no temor de que as denunciações sucessivas se eternizem no processo. Mas o próprio Código, já prevendo tal situação, determina a "intimação" e não a "citação". Dessa forma, o procedimento servirá apenas como forma de cientificar os eventuais denunciados, não se tornando réus na ação.

            Moniz de Aragão sustenta a possibilidade de denunciação da lide não somente ao alienante mas também de todos os antecessores na cadeia dominial, na mesma oportunidade [27].

            No mesmo sentido, posiciona-se Athos Gusmão Carneiro, em tese apresentada no Ciclo de Estudos de Processo Civil, realizado em Curitiba, (em agosto de 1983) : "As denunciações sucessivas, previstas no artigo 73 do CPC, poderão ser feitas ‘coletivamente’, ou seja, requeridas ‘em conjunto’ pelo denunciante, assim abreviando o processo e melhor se assegurando o êxito da demanda indenizatória de regresso, no caso de insolvência ou ausência de algum dos anteriores proprietários na cadeia dominial" [28].

            Assim, somente após a última denunciação é que o processo retornará ao seu curso, pondo fim à suspensão preconizada pelo art. 70.

            No que tange aos efeitos da sentença que julga a denunciação da lide, conforme o art. 76 do CPC, esta será declaratória. Entretanto, esta assertiva não coaduna com a parte final do artigo que diz "valendo como título executivo". Na verdade, o efeito da sentença é condenatório, pois, se assim não fosse, não haveria possibilidade de considerá-la como título executivo (584,I) [29][30].

            Da mesma forma, Arruda Alvim leciona : "Outra observação que cabe fazer é a de que, sem uma maior análise, pareceria que a segunda decisão do juiz seria meramente declaratória, o que não é coerente, todavia, com as últimas palavras da própria norma em exame: valendo como título executivo. A palavra declarar no texto foi usada em seu sentido estrito de definir, reconhecer, e quer dizer condenar. Por outro lado, se a sentença fosse tão somente declaratória, não ensejaria execução, dado que o art. 584, I, coloca como título judicial apenas a sentença condenatória. A possibilidade de execução é, aliás, a vantagem do instituto; em um só processo, resolverem-se, em definitivo, com força de coisa julgada material, duas lides conexas, possibilitando duplo título executivo" [31].

            A sentença que julga a denunciação da lide pode ser atacada por meio da apelação [32][33].

            A denunciação da lide não é cabível no procedimento sumário bem como nos Juizados Especiais por força da vedação do art. 280 do CPC e art. 10, Lei n. 9.099/95 respectivamente, tendo em vista ser um procedimento mais célere. A denunciação acabaria introduzindo fundamentos novos na relação processual acabando por procrastinar o feito [34]. Também não é cabível no processo de execução [35].

            3.4 Chamamento ao processo

            3.4.1 Conceito

            O chamamento ao processo é uma das modalidades de intervenção de terceiro no processo pelo qual o devedor demandado chama os demais coobrigados pela dívida para integrar o mesmo processo daquele que o autor poderia ter trazido como litisconsorte.

            Tem como finalidade alargar o campo de defesa dos fiadores e dos devedores solidários, possibilitando-lhes, diretamente no processo em que um ou alguns deles forem demandados, chamar o responsável principal, ou os co-responsáveis ou coobrigados, a virem responder pelas suas respectivas obrigações de modo a "favorecer o devedor que está sendo acionado, porque amplia a demanda, para permitir a condenação também dos demais devedores, além de lhe fornecer, no mesmo processo, título executivo judicial para cobrar deles aquilo que pagar" [36].

            O chamamento ao processo foi trazido ao Código de Processo Civil por influência do Código de Processo Civil de Portugal que possui essa forma de intervenção de terceiros, denominada de chamamento à demanda.

            É uma faculdade do réu em fazer o chamamento ao processo do terceiro e não uma obrigação, pois o texto legal diz que "é admissível".

            Aquele que chama terceiro ao processo não tem pretensão a fazer valer em relação ao chamado. Apenas entende que este tem a mesma obrigação de responder perante o autor. Ambos, chamante e chamado, ocupam a posição de litisconsórcio facultativo no pólo passivo.

            O chamamento ao processo é admitido nos seguintes casos:

            I – do devedor, na ação em que o fiador for réu – visa garantir a possibilidade de o fiador utilizar-se do chamado benefício de ordem consubstanciado no art. 827 do Código Civil [37]. Isto porque, face o art. 568,I do CPC, somente poderá ser executado o devedor reconhecido como tal no título executivo.

            Confere-se ao fiador o direito de não sofrer execução, decorrente de não pagamento de dívida pelo afiançado, até que exausto o patrimônio deste.

            Sendo a sentença procedente, o afiançado chamado ao processo será abrangido pelos efeitos da decisão, isto é, será condenado da mesma forma que o fiador, como responsável pela dívida. E, instaurado o processo de execução, sendo o caso, poderá valer-se do já referido benefício de ordem, nos termos do art. 595 do CPC.

            Mesmo que o fiador não tenha benefício de ordem a seu favor, poderá chamar ao processo o afiançado. Neste caso, o fiador também será principal devedor e, tendo satisfeito o credor, poderá exigi-la do afiançado, nos termos do art. 80 do CPC [38].

            II – dos outros fiadores, quando para a ação for citado apenas um deles – consiste na hipótese de haver vários fiadores garantes da dívida, tendo sido demandado apenas um deles, facultando ao demandado trazer os demais fiadores ao processo. O fiador chamado ao processo, uma vez citado, torna-se litisconsórcio.

            III – de todos os devedores, solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns deles, parcial ou totalmente, a dívida comum – esta é a hipótese de solidariedade passiva em que o credor esteja exigindo apenas de um dos devedores solidários a dívida comum. Dessa forma, serão trazidos ao processo os demais devedores solidários passando a figurar como litisconsortes no pólo passivo.

            3.4.2 Procedimento

            O procedimento do chamamento ao processo encontra-se disciplinado nos arts. 77 a 80 do Código de Processo Civil.

            O réu deverá requerer o chamamento ao processo na mesma oportunidade da contestação.

            Deferido o pedido do devedor e ordenada a citação, o processo será suspenso, observando as regras contidas nos arts. 72 e 74, quanto à citação e aos prazos [39].

            Após a citação do chamado, este terá prazo para resposta, tornando-se litisconsorte do chamante.

            O indeferimento do chamamento somente poderá ocorrer se o juiz verificar que o requerimento não se enquadra nas hipóteses elencadas pelo art. 77. Dessa decisão cabe agravo.

            A sentença de procedência proferida no processo de conhecimento condenará os devedores e valerá como título executivo, em favor daquele que satisfizer a dívida, para exigi-la por inteiro, do devedor principal, ou de cada um dos co-devedores a sua cota, na proporção que lhes tocar.

            O chamamento ao processo é cabível tanto em processo de conhecimento quanto no cautelar. Já no processo de execução não é possível o réu lançar mão do chamamento ao processo já que inexiste sentença sobre a pretensão executiva. Assim, para que o fiador se utilize do benefício de ordem é necessário que tenha requerido o chamamento ao processo do afiançado no processo de conhecimento.

            No procedimento sumário (art. 280, CPC) e nos Juizados Especiais (art. 10, Lei n. 9.099/95) não é cabível o chamamento do processo por se tratar de procedimentos mais céleres.

            3.5 Intervenção de terceiros nas ações coletivas

            As ações coletivas são aquelas destinadas a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.

            O termo difuso tem sua origem doutrinária romanística tendo como titular cada um dos integrantes da comunidade. O perfil histórico do processo civil romano menciona as actiones populares como instrumento de proteção a esses interesses.

            A construção doutrinária em torno da noção conceitual é recente em nossa legislação pátria. Os direitos metaindividuais têm a primeira referência na Lei da Ação Popular. Com a alteração dada pela Lei n.º 6.513/77 e com a Lei da Ação Civil Pública, Lei n.º 7.347/85 houve uma sistematização na defesa dos direitos difusos e coletivos ao meio ambiente e ao consumidor. A positivação dos direitos difusos e coletivos, chamados de direitos fundamentais de terceira geração, ocorreu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, consumando-se com o advento do Código de Defesa do Consumidor, Lei n.º 8.078/90.

            Os interesses metaindividuias têm sua origem em regras previstas como garantias do tecido social. Os sujeitos são, em geral, indeterminados, ainda que determináveis, e o seu objeto e a forma de tutela possuem uma mutabilidade no tempo e espaço como característica. Foi a Lei n.º 8.078/90 que trouxe o conceito, em noção tripartite dos interesses metaindividuais, consubstanciado no art. 81, parágrafo único e seus incisos. Dividem-se em interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.

            São difusos os direitos cujos titulares são indetermináveis. A ligação entre os titulares se dá por circunstâncias de fato e o objeto é indivisível. Não há entre eles relação jurídica base. A tutela jurisdicional dos interesses difusos deve ser feita em benefício de todos os consumidores atingidos, sendo suficiente uma única demanda, cuja sentença fará coisa julgada erga omnes face o disposto no art. 103, I do CDC.

            São coletivos quando os titulares são indeterminados, mas determináveis, ligados entre si, ou com a parte contrária, por relação jurídica base preexistente à lesão ou ameaça de lesão. Essa relação jurídica é diversa daquela que se origina da lesão. Seu objeto também é indivisível.

            Os individuais homogêneos são aqueles direitos individuais cujo titular é identificável e o objeto é divisível. Não é necessário que exista entre as pessoas uma relação jurídica base anterior. É caracterizado pela sua origem comum podendo ser defendidos coletivamente. A relação jurídica que nasce da lesão é individualizada na pessoa de cada prejudicado, acarretando ofensa diferente na esfera jurídica de cada um de modo a permitir a identificação das pessoas atingidas. A efetiva identificação se dá no momento em que o prejudicado exerce o seu direito, seja através de demanda individual, seja por meio de habilitação por ocasião da liquidação da sentença na demanda coletiva.

            Assim, em decorrência do desequilíbrio das forças econômicas e negocias nas relações de consumo, que acabou por deixar o consumidor em situação de vulnerabilidade e hipossuficiência, o legislador se deparou com a necessidade de criar regras de proteção para que os princípios constitucionais de igualdade, ampla defesa, entre outros, fossem garantidos. Desse modo, o Código de Defesa do Consumidor trouxe uma sistemática peculiar, buscando o equilíbrio processual entre as partes. Neste aspecto é que os institutos processuais devem ser analisados, sempre à luz da vulnerabilidade do consumidor, buscando a facilitação e a rápida entrega da prestação jurisdicional.

            O Código de Defesa do Consumidor deixou de tratar muitas questões processuais, de forma que, há necessidade de se fazer uma interpretação sistemática entre o CDC, o CPC e a LACP. Daí se conclui que em lides de consumo as figuras de intervenção de terceiros serão possíveis desde que não traga dificuldades na defesa e procrastinação no feito.

            Com esses princípios em mente é que o legislador trouxe a vedação da denunciação da lide no art. 88 do CDC. Por se tratar de ação condenatória em que se discute dolo e culpa acaba por afrontar o direito do consumidor de ser indenizado em face da responsabilidade objetiva. Nestes casos deve ser proposta ação autônoma para a discussão da questão.

            Neste sentido, Kzauo Watanabe entende que "a denunciação da lide, todavia, foi vedada para o direito de regresso de que trata o art. 13, parágrafo único, do Código, para evitar que a tutela jurídica processual dos consumidores pudesse ser retardada e também porque, por via de regra, a dedução dessa lide incidental será feita com a invocação de uma causa de pedir distinta. Com isso, entretanto, não ficará prejudicado o comerciante, que poderá, em seguida ao pagamento da indenização, propor ação autônoma de regresso nos mesmos autos da ação originária" [40].

            Outra questão polêmica é quanto ao cabimento do chamamento ao processo em sede de lide de consumo. O art. 101, II do CDC traz expressamente a possibilidade do chamamento ao processo da seguradora quando existir relação de seguro. Neste caso, não há violação aos princípios básicos do microssistema do CDC já que o chamamento da segurado só amplia as garantias para o consumidor [41]. Uma vez julgada procedente a demanda, a sentença condenará o réu nos termos do art. 80 do CPC.

            Esse chamamento deverá ocorrer no prazo para contestação, face o disposto no art. 78 do CPC. Nesta hipótese, tendo em vista que o segurador foi chamado como responsável em face do consumidor, em caso de procedência da ação, o juiz poderá julgá-la não só contra o réu, como também contra o seu segurador, face o art. 79 do CPC.

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Sobre a autora
Gláucia Kohlhase Marques

advogada, professora universitária, especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP, mestranda em Direitos Difusos e Coletivos pela PUC/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARQUES, Gláucia Kohlhase. Litisconsórcio, assistência e intervenção de terceiros nas ações coletivas para tutela do consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 942, 31 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7897. Acesso em: 24 abr. 2024.

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