3. A APLICAÇÃO DAS PRÁTICAS NO JURÍDICO
É certo que somente irão sobreviver no cenário competitivo mundial empresas que possuírem uma estrutura administrativa capaz de transmitir confiança, tanto no setor público como no privado. Assim, sua reputação, imagem e confiabilidade estarão cada vez mais ligadas a êxitos no controle interno, efetiva gestão de riscos e de um programa contínuo na área de políticas sociais.
O fato é que a corrupção é um fenômeno mundial e deve ser considerado por todas as empresas, as de âmbito nacional e que atuam em representação internacional, com atenção as culturas e legislações próprias34.
Neste toar, os programas de Compliance materializam o que se chama de boa governança corporativa, de caráter constitucional, necessário na luta contra o abuso de poder dentro das empresas, instituições, sociedades, etc.
Esta realidade se projeta diretamente na atuação dos advogados e escritórios de advocacia, pois aqueles que se dedicam aos estudos de normativos de uma forma geral devem estar atentos às exigências do mercado, à adaptação de normas ligadas ao Compliance, à organização de protocolos conectados com políticas de prevenção, aos compromissos dos órgãos diretivos, bem como as regras e adaptação de normas internacionais de Compliance nas filiais de empresas situadas no Brasil35.
Assim, o escritório que está em Compliance certamente gere seus riscos e atividades de forma segura e aceitável, o que reforça sua confiabilidade ao mercado interno e externo.
Igualmente, o advogado está sendo requisitado hoje para atuar como compliance officer dentro de empresas que lidam em diversos ramos, onde tem-se o dever de conhecer os fundamentos, funções, poderes e consequências de decisões dos gestores da empresa, seja na forma ativa ou omissiva, bem como os limites para delegações de poderes, atuando assim como peça fundamental no marco teórico da elaboração, orientação e revisão de programas de Compliance.
Desta forma, dentro do escritório ou fora dele, o advogado é chave essencial para que a empresa esteja em Compliance, já que essa atividade nada mais é do que estar em conformidade com as leis, sejam decretos federais, estaduais ou municipais, e as normas internas da organização.
Levando-se em conta que um escritório de advocacia, como qualquer pessoa jurídica, deve prezar pela minimização dos riscos referentes aos serviços oferecidos, o Compliance tem função principal de garantir a integridade de seu sistema de controle interno, ou seja, fazer com que ele esteja em conformidade com as leis e regulamentos.
Sendo implementado dentro de um escritório de advocacia, o programa permite que o advogado sócio tenha real controle acerca do funcionamento interno de seu escritório, assegurando a sua reputação, reduzindo riscos, delimitando até mesmo a responsabilidade jurídica dos administradores, advogados, funcionário e sócios quanto ao descumprimento de normativas.
Num aspecto externo, o Compliance ainda colocará o escritório em vantagem em relação aos demais, uma vez que conforme já citado, as empresas cada vez mais buscam ser representadas por patronos que possuam políticas de controle. Em um levantamento feito pelo escritório de advocacia Tozzini Freire com 130 executivos, no fim do ano passado, mostrou-se que as políticas de controle eram a segunda maior prioridade dos clientes para 2017 no âmbito jurídico e econômico (citadas por 74% dos ouvidos), atrás apenas de tributação (82%) e à frente até mesmo dos assuntos trabalhistas (71%). Assim, o Compliance passou a ser uma exigência de mercado, abrangendo a área de prestação de serviços jurídicos.
"É impensável, dentro de uma grande empresa, nas relações com os advogados, não se exigir um termo de compliance." Essa é a afirmação do advogado Luiz Carlos Bettiol, da Advocacia Bettiol S/C, em entrevista à TV Migalhas36. Bettiol destacou que as empresas hesitam ao contratar um advogado que tem algum tipo de relacionamento menos republicano com os tribunais.
Pode-se afirmar que as ferramentas de Compliance estudadas no tópico anterior são plenamente aplicáveis em um escritório de advocacia, agregado ao seu sistema de gestão e automação de processos, evitando assim despesas com contratação de pessoal.
A implantação, contudo, se dará de forma eficaz se todos conscientizarem-se que o Compliance é uma questão cultural, e não somente o cumprimento de determinadas regras ou sua auditoria, uma vez que envolve questões de ética, integridade e princípios que devem mover todos os processos internos dentro de um escritório, desde os serviços gerais até os mais altos negócios da alta administração.
Por outro lado, escritórios têm investido na especialização em Compliance para o fim de torná-la vendável como um tipo de prestação de serviço especifico, bem como para o fim prestar assessoria no assunto em empresas terceirizadas. Por tratar-se de um tema novo, muito espaço ainda há neste sentido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No mundo corporativo, seja ele ligado a qualquer tipo de prestação de serviço, a ética, os controles internos e o respeito à legislação, além de evitarem problemas ligados ao ambiente de trabalho, evitam riscos, auxiliando na manutenção do alto padrão de qualidade na prestação dos serviços. Por isso, o Compliance vem ganhando força nos últimos anos.
Situação idêntica ocorre na prestação de serviços advocatícios, pois o mercado, a cada dia torna-se mais exigente na contratação para representação jurídica, com o fito de evitar riscos que prejudiquem a sua imagem ou lhe tragam danos irreversíveis.
Assim, as ferramentas principais para a implementação da cultura de Compliance dentro de um escritório são as mesmas utilizadas nas empresas de forma geral, aplicadas especificamente as situações ali vivenciadas, após a análise de risco adequada e pormenorizado. É preciso identificar em quais áreas e processos internos o escritório está mais vulnerável no tocante aos riscos corporativos diretos e indiretos.
Com o relatório em mãos e traçado o perfil do escritório, o compromisso efetivo com a cultura da integridade, deve ser buscado, com o engajamento de todos os advogados que compõem a banca, bem como os demais colaboradores. Trata-se de um esforço que só mostrará resultados se todos estiverem na mesma toada, em todas as hierarquias. Após, é necessário que o escritório formule seu código de ética e conduta, com base em seus princípios, missão e valores, e pautado na legislação anticorrupção, no Estatuto e Código de Ética da OAB, bem como na legislação infra legal editada pela entidade. O ideal é que o código tenha regras claras e esteja disponível a todos, observando inclusive as regras dos clientes que se presta serviço.
Por conseguinte, será necessária a criação de um canal de denúncias para que possam ser recebidas informações relativas a eventuais inconformidades, pulverizando a fiscalização entre todos, tornando-a mais efetiva. Os treinamentos devem ser periódicos, que fazem com que todos os colaboradores do escritório conheçam as regras e atestem a importância com que o tema é tratado pela gestão.
Por fim, para que seja diagnosticada a efetividade da implementação das políticas de Compliance é necessário monitoramento e auditoria de todas as suas etapas, preferencialmente de forma automatizada, para que se facilite o manuseio das informações.
Assim, o escritório que assume de fato politicas de Compliance se destaca no mercado por estar em vantagem em relação ao controle dos riscos e organização.
REFERÊNCIAS
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Notas
1 Associação Brasileira de Normas Técnicas. ISO/TR10013: Diretrizes para a documentação de sistema de gestão da qualidade. Rio de Janeiro, 2002.
2 Wikipédia. Compliance. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Compliance>. Acesso em: 19 maio de 2018.
3 MAEDA, Bruno. Investigações Corporativas e Compliance: Tipos e Aplicações de Investigações Corporativas. São Paulo, 2017
4 NEVES, Edmo. Compliance Empresarial, o tom da liderança. Trevisan, 2018.
5 NEVES, Edmo. Compliance Empresarial, o tom da liderança. Trevisan, 2018.
6 PETRELLUZZI, Marco Vinício; RIZEK JUNIOR, Rubens Naman. Lei Anticorrupção: origens, comentários e análise da legislação correlata. São Paulo: Saraiva, 2014.
7 ASSI, Marcos. Gestão De Compliance e Seus Desafios. Saint Paul: São Paulo, 2017.
8 LEC Community. O acordo de leniência firmado entre o ministério público federal e a holding J&F respeita a razoabilidade?. Disponível em: <https://www.lecnews.com.br/blog/o-acordo-de-leniencia-firmado-entre-o-ministerio-publico-federal-e-a-holding-jf-respeita-a-razoabilidade/>. Acesso em: 19 maio de 2018
9 BRASIL. Decreto 9.203, de 22 de novembro de 2017: Dispõe sobre a política de governança da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, 2017. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/decreto/D9203.htm>. Acesso em: 19 maio de 2018.
10 Resolução Coaf 29, de 7 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os procedimentos a serem observados pelas pessoas reguladas pelo COAF, na forma do § 1° do artigo 14 da Lei n° 9.613, de 3 de março de 1998, relativamente a pessoas expostas politicamente. Disponível em: <https://www.coaf.fazenda.gov.br/menu/legislacao-e-normas/normas-do-coaf/resolucao-coaf-no-29-de-7-de-dezembro-de-2017>. Acesso em: 19 maio de 2018.
11 Projeto de Lei do Senado 429, de 2017. Altera a Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995, que dispõe sobre partidos políticos, regulamenta os arts. 14, § 3º, inciso V e 17, da Constituição Federal, a fim de aplicar aos partidos políticos as normas sobre programa de integridade. Relator: Randolfe Rodrigues. Brasília: 2018.
12 NEVES, Edmo. Compliance Empresarial, o tom da liderança. Trevisan, 2018.
13 ESPÍNDOLA, Harold. Compliance e Cooperativismo. Aspectos de Integridade e Regulação em Cooperativas. Rio Grande do Sul, 2018.
14 EL KALAY, Marcio. O Que É Compliance, tudo que você Precisa Saber. LEC Community São Paulo, 2018
15 Hui Chen foi consultora externa de compliance para o Departamento de Justiça dos Estados Unidos até 23 de junho de 2017. Chen era responsável por avaliar a existência e a efetividade de programas de compliance nas empresas investigadas pelo Departamento de Justiça norte-americano em casos de suspeitas envolvendo atos de corrupção e violação ao Foreign Corrupt Practices Act (FCPA). Ela avaliava também as medidas de remediação tomadas pelas companhias e, após a celebração de acordo, fiscalizava se a empresa cumpria com os compromissos de implantação ou aperfeiçoamento do programa de integridade, nos termos do acordo celebrado.
16 SIBBILE, Daniel. Os Pilares do Programa de Compliance. LEC Community São Paulo, 2018.
17 Idem.
18 Idem.
19 Associação Brasileira de Normas Técnicas. ISO/TR10013: Diretrizes para a documentação de sistema de gestão da qualidade. Rio de Janeiro, 2002.
20 ASSI, Marcos. Gestão De Compliance e Seus Desafios. Saint Paul: São Paulo, 2017.
21 MAEDA, Bruno. Investigações Corporativas e Compliance: Tipos e Aplicações de Investigações Corporativas. São Paulo, 2017.
22 ASSI, Marcos. Gestão De Compliance e Seus Desafios. Saint Paul: São Paulo, 2017.
23 Idem.
24 EL KALAY, Marcio. O Que É Compliance, tudo que você Precisa Saber. LEC Community São Paulo, 2018
25 Idem.
26 EL KALAY, Marcio. O Que É Compliance, tudo que você Precisa Saber. LEC Community São Paulo, 2018
27 SIBBILE, Daniel. Os Pilares do Programa de Compliance. LEC Community São Paulo, 2018.
28 Idem.
29 MAEDA, Bruno. Investigações Corporativas e Compliance: Tipos e Aplicações de Investigações Corporativas. São Paulo, 2017.
30 BRASIL. Decreto 8.420 de 18 de março de 2015 Regulamenta a Lei no 12.846, de 1o de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/decreto/D8420.htm> Acesso em: 19 maio de 2018.
31 COELHO, Idesio. O mapa da fraude nas organizações. Disponível em: https://www.ibracon.com.br/ibracon/Portugues/detNoticia.php?cod=3237. Acesso em: 21 maio de 2018.
32 IBBILE, Daniel. Os Pilares do Programa de Compliance. LEC Community São Paulo, 2018.
33 FEBRABAN. Função de Compliance. Disponível em: <https://www.abbi.com.br/download/funcaodecompliance_09.pdf>. Acesso em: 20 maio de 2018.
34 NEVES, Edmo. Compliance Empresarial, o tom da liderança. Trevisan, 2018.
35 MAEDA, Bruno. Investigações Corporativas e Compliance: Tipos e Aplicações de Investigações Corporativas. São Paulo, 2017
36 TV MIGALHAS. Bettiol destaca importância do compliance na contratação de advogados por empresas. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI280671,31047-Bettiol+destaca+importancia+do+compliance+na+contratacao+de+advogados>. Acesso em: 19 maio de 2018.