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A prescrição da ação civil pública por dano causado ao erário

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4. Considerações finais

          A interpretação gramatical – e por conseguinte simplista – leva a indubitável conclusão de que as ações de indenização por danos causados ao erário são imprescritíveis.

          No entanto, ao cabo do exposto, forçoso concluir que essa não é a melhor hermenêutica. A Constituição dogmática não pode ser desvencilhada da realidade social e jurídica. A palavra final não é a do legislador – mesmo do constituinte -, mas a da ciência do direito. A "Constituição real" e a "Constituição jurídica" devem estar numa relação de coordenação. Neste passo, repugna aos princípios informadores do nosso sistema a prescrição indefinida.

          Como se viu, apenas as ações declaratórias são imprescritíveis, nunca as ações condenatórias. E no caso de uma ação para ressarcimento ao erário, tem-se, inegavelmente, um pleito condenatório. Logo, prescritível.

          Ademais, é da tradição do direito pátrio a regra da prescrição das ações condenatórias, sobretudo em face da exigência da segurança jurídica, que não pode dar guarida aos credores inertes. Não se conhece nenhuma situação em que a tutela condenatória pudesse se perenizar sem a atuação do interessado. E não poderia haver, neste momento, a quebra deste dogma secular – e, aliás, muito bem vindo.

          Por outro lado, a histórica jurídica brasileira mostra que, em regra, as ações contra o Poder Público, bem como aquelas que são promovidas em seu favor, prescrevem num prazo de 05 (cinco) anos.

          Sendo assim, tem-se que a melhor exegese do texto constitucional, consentânea com a tradição jurídica brasileira, é no desiderato de se considerar as ações indenizatórias de danos causados ao erário prescritíveis num prazo de 05 (cinco) anos.


          Notas

  1. Curso de direito civil, 39ª ed., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 331.
  2. Com essa afirmação não nos esquecemos que o tema da prescrição é tratado também pelo Direito Penal, pelo Direito Tributário etc.
  3. Esta fase corresponde à segunda época da evolução da processualística romana, denominada de período formulário. As formas processuais romanas não foram uniformes no tempo, pois houve basicamente 03 (três) estágios evolutivos, quais sejam: "o sistema da ação das leis", ou "legis actiones"; o "sistema formulário"; e o sistema da "cognitio extraordinária", cada um com características diferentes entre si.
  4. Neste trabalho nos preocuparemos apenas com a prescrição extintiva de direitos. Mas, sabe-se, há as denominas prescrições aquisitivas de direito, em que o decurso do prazo fixado em lei leva ao prescribente a aquisição de direitos, como, v.g., a usucapião. No entanto, Antônio Luiz da Câmara Leal (1939, p. 11-14) refuta a tese de que a usucapião seja prescrição. Leciona que no direito romano inicialmente fora criada a prescrição das ações reivindicatórias de propriedade, concedendo ao possuidor com justo título e boa fé, exceção obstativa da reivindicação do proprietário se sua posse datava dez anos entre presentes ou vinte anos entre ausentes. A isso se deu o nome de praescriptio, semelhante ao que sucedia com a exceção extintiva da ação temporária pelo decurso do prazo de sua duração. No entanto, a usucapião estava prevista autonomamente na Lei das XII Tábuas, conferindo aos cidadãos romanos a aquisição da propriedade pelo uso da coisa pelo prazo de dois anos, se imobiliária. Logo, vê-se que eram assuntos diversos. A usucapião, originariamente, não era praescriptio. Isso só se modificou com Justiniano, que unificou os institutos, concedendo à longa duração da posse extintiva da reivindicatória o mesmo efeito da usucapião, havendo confusão dos termos praescriptio e usucapiones. Para o citado autor, usucapião e prescrição não podem ser a mesma coisa. A primeira tem por objeto apenas a propriedade, na esfera estritamente civil, sem repercussão comercial, com elementos próprios como justo título e boa-fé. Já a prescrição tem objeto pretensões diversas, estendendo-se por isso a todos os departamentos do direito. Suas condições elementares são a inércia e o tempo, e seu principal objetivo é "extinguir as ações".
  5. Entre os adeptos da primeira corrente encontra-se Planch, Zachariae, Mackeldey, Barassi e, entre nós, Alves Moreira, Espínola e Clóvis Bevilácqua. Já entre os sectários da corrente ítalo-francesa tem-se Ruggiero, Colin e Capitant, e entre nós Carvalho Mendonça (apud LEAL, 1939/16).
  6. Salvo se se tratar de interesse de incapaz, nos termos do art. 194, do Código Civil brasileiro (Lei 10.406, de 10-01-2002): "O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz."
  7. Código Civil brasileiro, art. 882: "Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível."
  8. Lei 10.406, de 10-01-2002, art. 189.
  9. Por pretensão entenda-se o poder de exigir de outrem, coercitivamente, o cumprimento de um dever jurídico. Em outras palavras, pode-se dizer que pretensão é a possibilidade conferida ao credor de exigir do devedor o cumprimento da prestação. É o que os alemães chamam de Anspruch (STOLZE, 2002/478)
  10. Curso de direito civil brasileiro, 8ª ed., São Paulo: Saraiva, 1991, p. 202
  11. CCB, art. 197 e 198.
  12. CCB, art. 199.
  13. CCB, art. 202.
  14. Como, por exemplo, os prazos de garantia para aquisição de produtos.
  15. CCB, art. 194.
  16. CCB, art. 210.
  17. CCB, 197, I.
  18. CCB, 197, II.
  19. CCB, 198, I, cc 3º, I.
  20. CCB, 198, I, cc 3º, II.
  21. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência, in RT 300/8
  22. A decadência tem suas regras gerais previstas na Parte Geral do Código Civil (arts. 207 a 211, d), mas sem um rol de hipóteses de causas decadenciais, como ocorre com a prescrição e seu respectivo art. 206. Assim, os prazos decadenciais estão lançados a esmo no Código: para se anular o casamento se encontram no artigo 1560, já os prazos para redibição do contrato em razão do vício oculto se encontram no artigo 445. Cada prazo acompanha o instituto ao qual se refere. Conclui-se, que há apenas uma hipótese de decadência prevista na Parte Geral do Código Civil de 2002 (artigo 178) e que todas as demais vêm previstas nos livros da Parte Especial. No campo das obrigações, pode-se exemplificar, como hipótese de decadência, o prazo que o adquirente tem para reclamar pelos vícios redibitórios da coisa (artigo 445), bem como para anular um contrato que padeça do vício do dolo (artigo 178). Quanto ao direito de família, mencionam-se os prazos para anulação de casamento (art. 1560) e, no tocante às sucessões, os prazos para a ação de exclusão de herdeiro da sucessão em razão da indignidade (art. 1815, §4º) ou deserdação (art. 1965, § único).
  23. Os artigos citados por Pontes de Miranda são do antigo Código Civil brasileiro (Lei 3071, de 01-01-1916)
  24. Como, por exemplo, o direito de exigir a divisão de coisa comum ou pedir sua venda.
  25. No mesmo sentido Maria Helena Diniz, op. cit., que traz exatamente os mesmos exemplos, sendo acompanhada por Carlos Roberto Gonçalves (2003, v. I., p. 467)
  26. A prescrição é a perda da pretensão ao direito de ação, ao passo que a decadência é a perda do próprio direito.
  27. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência, in RT 300/8
  28. Essa lei disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e dá outras providências
  29. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências.
  30. Ap 153.528-5/0-00 - 3.ª Câm. - j. 19.12.2000 - rel. Des. Magalhães Coelho, in Revista dos Tribunais, V. 788, p. 245
  31. Fazemos aqui paráfrase do Ministro José Delgado, que no julgamento do STJ/AgREsp 443971/PR, 1ª T., J. 01.10.2002., do qual foi relator, decidiu: "repugna aos princípios informadores do nosso sistema tributário a prescrição indefinida".
  32. TJPR - Ag Instr 0144859-3 - (24351) - Maringá - 2ª C.Cív. - Rel. Des. Antonio Lopes de Noronha - DJPR 29.11.2004) JCCB.177 JCF.37 JCF.37.5 JCPC.177, in Porto Alegre: Síntese Publicações, 2005, CD-Rom n. 55. Produzida por Sonopress Rimo Indústria e Comércio Fonográfico Ltda.
  33. A imprescritibilidade das pretensões declaratórias está diretamente ligada à modalidade de direitos que tutela, geralmente irrenunciáveis, inalienáveis, não transacionáveis. A ação declaratória protege, v.g., a tutela da família, da vida, da dignidade da pessoa humana. Atributos de grande vulto e, com razão, imprescritíveis. Já a tutela condenatória visa diretamente o recebimento de um crédito, direito este que por razões de segurança das relações jurídicas, não podem se eternizar.
  34. In Jurisprudências. Porto Alegre: Síntese Publicações, 2002, CD-Rom n. 40. Produzida por Sonopress Rimo Indústria e Comércio Fonográfico Ltda.
  35. in Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, 21/101.
  36. Disponível em: http://www.tj.rs.gov.br/site_php/jprud/rpesq.php. Acesso em: 16 dez. 2003.
  37. Constituição Federal, art. 5º, LXXIII
  38. Direito administrativo, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2000.

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Sobre o autor
Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior

advogado sócio do escritório Zanoti e Almeida Advogados Associados; doutorando pela Universidade Del Museo Social, de Buenos Aires; mestre em Sistema Constitucional de Garantia de Direitos; pós-graduado em Direito Contratual;pós-graduado em Direito das Relações Sociais; professor de Direito Civil e coordenador da pós-graduação da Associação Educacional Toledo (Presidente Prudente/SP), professor da FEMA/IMESA (Assis/SP), do curso de pós-graduação da Universidade Estadual de Londrina – UEL, da PUC/PR, da Escola Superior da Advocacia, da Escola da Magistratura do Trabalho do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo Eduardo. A prescrição da ação civil pública por dano causado ao erário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 956, 14 fev. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7973. Acesso em: 23 dez. 2024.

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