Reforma administrativa e a estabilidade do servidor público

11/03/2020 às 15:00
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“Se o governo acabar com o funcionalismo profissional terminando com a estabilidade – que é no Brasil tradicionalmente a forma de manter a pessoa no emprego enquanto bem servir – ele fará a sua maior oferta de clientelismo” – Raimundo Faoro, citado pelo Ministro Homero Santos, do Tribunal de Contas da União, quando da apreciação das Contas do Governo relativas ao exercício de 1990.


O fim da estabilidade do servidor público não é um tema novo no cenário jurídico. Em 1996, na proposta de Reforma Administrativa do governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), auge da implantação da gestão dita gerencial, a quebra da estabilidade foi levantada como bandeira a objetivar o enxugamento a máquina administrativa sob o escudo da imagem do baixo desempenho do servidor público.

A proposta foi muito criticada à época, vindo o governo a rever o seu posicionamento, conforme se pode vislumbrar por meio de notícia veiculada por jornais da época. Vale confirmar:

FHC desiste de quebra da estabilidade

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O relator da reforma administrativa, deputado Moreira Franco (PMDB-RJ), disse que o presidente Fernando Henrique Cardoso concordou em retirar da proposta a quebra de estabilidade do servidor público por excesso de quadros.

FHC havia afirmado que o governo não abriria mão desse item -que não tem apoio dos líderes governistas na Câmara.

"A estabilidade fica como está. Estamos introduzindo o princípio da qualidade do serviço", afirmou Moreira, após encontro com FHC.

"O problema não é cassar servidor a tapa, é fazer com que ele trabalhe melhor", disse o relator Moreira afirmou que a "insuficiência" de desempenho pode causar a demissão do funcionário. (Fonte: Folha de São Paulo, 3 de julho de 1996[1])

Sobre o tema, esta articulista escreveu, à época, o artigo A Estabilidade do Servidor Público sob a ótica do Clientelismo, publicado em diversas revistas jurídicas[2], por meio do qual se apresentava a preocupação com onda reformista, haja vista que a propaganda negativa não era muito diversa da que está sendo agora promovida.

Com efeito, em 1998, embora o governo federal não tenha conseguido romper com a estabilidade do servidor, trouxe mais uma forma possível de perda do cargo: a intitulada insuficiência de desempenho, que ainda se encontra pendente de regulamentação[3] e que se pretende, agora, sob o manto de diversas distorções, materializar. A retórica para a aprovação de mais um requisito para a perda do cargo[4] foi, como visto, fazer colar a imagem de um servidor público privilegiado, detentor de muitos direitos, que pouco trabalhava ou trabalhava sem compromisso. Daí a justificativa da necessidade de se utilizar mecanismos para fazer com que o servidor trabalhasse melhor, a dar um basta a um dos mais propagados efeitos da estabilidade: a acomodação.

Pois bem, em 2020 a nova onda de reformas vem, na verdade, acalentar igual visão em ambiente público, com o agravante de conferir ao servidor público alcunhas mais perversas[5]. É simplesmente estarrecedor a retomada de mais uma reforma administrativa a ter os direitos dos servidores públicos na berlinda, mormente o direito/dever de permanência, quando há muito se ultrapassou a visão da estabilidade como privilégio. Sim, porque a estabilidade não inviabiliza a demissão de servidores ou ocasiona a sua acomodação em nível de desempenho, erigida, muitas vezes, como responsável pela burocratização da prestação dos serviços públicos.

A publicidade negativa contra a estabilidade e, portanto, contra o servidor, é enganosa. Se a questão é econômica, a infinidade de mecanismos para enxugar a máquina estão postos nas normas jurídicas, inclusive de estirpe constitucional, assim como podem ser objeto de propostas que não teriam grandes impactos nas carreiras do funcionalismo público e, por corolário, para o serviço público, são elas: (a) extinção de cargos em comissão e funções de confiança (Art. 169, § 3º, I, da CRFB); (b) preenchimento de cargos e funções de confiança por servidores efetivos (Art. 37, V, da CRFB); (c) ampliação da vedação à contratação de servidores aposentados ou militares reformados ou da reserva para prestação de serviço público (incisos II e IX do Art. 37 e seu § 10, da CRFB), a albergar o exercício de cargo em comissão ou função de confiança; além da própria(d)redução de contratações excepcionais e temporárias.

Ademais, o Art. 169 da Constituição da República, com redação da Emenda nº19/98, seguido das normas relativas à responsabilidade da gestão fiscal constantes da Lei Complementar nº 101, de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), traz todo o roteiro a ser seguido quando verificado o excesso de despesa com pessoal. Importante reproduzir o dispositivo na íntegra, a saber:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

§ 2º Decorrido o prazo estabelecido na lei complementar referida neste artigo para a adaptação aos parâmetros ali previstos, serão imediatamente suspensos todos os repasses de verbas federais ou estaduais aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios que não observarem os referidos limites.

§ 3º Para o cumprimento dos limites estabelecidos com base neste artigo, durante o prazo fixado na lei complementar referida no caput, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adotarão as seguintes providências:

I - redução em pelo menos vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança;

II - exoneração dos servidores não estáveis.

§ 4º Se as medidas adotadas com base no parágrafo anterior não forem suficientes para assegurar o cumprimento da determinação da lei complementar referida neste artigo, o servidor estável poderá perder o cargo, desde que ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal.

§ 5º O servidor que perder o cargo na forma do parágrafo anterior fará jus a indenização correspondente a um mês de remuneração por ano de serviço.

§ 6º O cargo objeto da redução prevista nos parágrafos anteriores será considerado extinto, vedada a criação de cargo, emprego ou função com atribuições iguais ou assemelhadas pelo prazo de quatro anos.

§ 7º Lei federal disporá sobre as normas gerais a serem obedecidas na efetivação do disposto no § 4º. (Grifo nosso)

Fácil é vislumbrar que o servidor público, ainda que estável, pode perder o cargo em razão do extrapolamento dos limites da despesa com pessoal. Então por que extinguir, modificar ou dilatar o prazo para auferir a estabilidade se, efetivamente, tal medida não tem impacto na economia? Sim, porque, a estabilidade não é culpada pelo inchaço da máquina administrativa[6]; a estabilidade não veda demissões de servidores[7]; a estabilidade não é responsável pela burocracia[8] e, por fim, a estabilidade não garante indenização ao servidor demitido ou exonerado, salvo se tal ocorrer em razão do disposto no Art. 169, § 5º, da Constituição, acima transcrito, quando ultrapassadas todas as etapas para o retorno ao limite prudencial da despesa com pessoal(extinção de cargos em comissão e demissão dos não estáveis).

Nesse sentido, a Reforma Administrativa de 2020 parece que está a servir a outros fins, haja vista que o direito de permanência do servidor funciona, na verdade, como garantia do próprio Estado e não o contrário.

Senão vejamos.

A estabilidade se erigiu como condicionante da atuação estatal desde a evolução do entendimento do Art. 125, da Lei nº 2.925, de 1915, a vir, posteriormente, a fazer parte dos textos constitucionais a contar de 1934. A sua importância para o Estado está, portanto, materializada há mais de um século, a tornar visível a compreensão de que se trata de uma garantia de dupla face. A primeira, assentada como direito do servidor à permanência no cargo e, a segunda, como princípio de proteção do Estado, enquanto prestador de serviços, a vedar o chamado clientelismo.

Ora, não se pode esquecer que o Estado se corporifica por meio de seus servidores. São eles que dinamizam a máquina em todas as suas frentes: hospitais públicos, postos de saúde, SUS, escolas públicas, universidades públicas, prestação de serviços judiciais, arrecadação fiscal, saneamento básico, fiscalização e regulação de serviços de transportes, comunicação, energia elétrica e muitos outros. Nesse sentido, a estabilidade assegura a permanência do servidor profissional, a garantir que o Estado dinamize a sua máquina administrativa por meio da retenção de seu conhecimento, de sua expertise para a área de atuação, sempre em favor da sociedade.

Sob tal contexto, pode-se afirmar que a estabilidade, mais do que uma garantia de permanência do servidor, é um princípio que condiciona a liberdade do Estado em prol do próprio dinamismo da máquina administrativa, a impedir que o governo utilize dessa mão de obra para fins políticos e fisiológicos[9].

O que não se pode fazer é culpar o direito de permanência do servidor público pela inércia da Administração em adotar medidas para expulsar de seus quadros servidores que, efetivamente, estão a descumprir sua missão de bem servir. Se a Administração Pública, diante de um profissional que não presta serviço adequadamente, não adota as medidas sancionatórias cabíveis, a culpa não é da estabilidade, é da própria Administração que deixou de cumprir a sua legislação de regência[10].

Nesse patamar de funcionalidade, a pretensão da Reforma de 2020, pelas razões que vêm sendo veiculadas[11], é retórica e contraditória, mormente em face da demanda represada de servidores públicos para fazer face às necessidades da sociedade[12], tanto assim o é que a Medida Provisória nº 922, de 28 de fevereiro de 2020, publicada no dia 2 de março, traz imanente a pretensão de alavancar a seleção simplificada para fugir da garantia estatal da estabilidade e abrir as porteiras do serviço público para além do princípio da impessoalidade, a dar margem ao clientelismo. Vale conferir a inclusão das novas hipóteses de contratação temporária, muitas das quais têm pouca afinidade com a natureza excepcional sob o olhar da clínica jurídica, a saber:

Art. 1º A Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 2º ...

VI - ...

a) para atender a projetos temporários na área industrial ou a encargos temporários de obras e serviços de engenharia;

...

h) no âmbito de projetos de cooperação com prazo determinado, implementados por meio de acordos internacionais, desde que haja, em seu desempenho, subordinação do contratado ao órgão ou à entidade pública;

i) necessárias à implantação de órgãos ou entidades ou de novas atribuições definidas para organizações existentes ou aquelas decorrentes de aumento transitório no volume de trabalho que não possam ser atendidas por meio da aplicação do disposto no art. 74 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990;

j) de tecnologia da informação, de comunicação e de revisão de processos de trabalho, não alcançadas pelo disposto na alínea “i” e que caracterizem demanda temporária;

...

o) de pesquisa e desenvolvimento de produtos e serviços, no âmbito de projetos com prazo determinado, com admissão de pesquisador ou de técnico com formação em área tecnológica de nível intermediário ou superior, nacional ou estrangeiro;

p) necessárias à redução de passivos processuais ou de volume de trabalho acumulado, que não possam ser atendidas por meio da aplicação do disposto no art. 74 da Lei nº 8.112, de 1990;

q) que se tornarão obsoletas no curto ou médio prazo, em decorrência do contexto de transformação social, econômica ou tecnológica, que torne desvantajoso o provimento efetivo de cargos em relação às contratações de que trata esta Lei; e

r) preventivas temporárias com objetivo de conter situações de grave e iminente risco à sociedade que possam ocasionar incidentes de calamidade pública ou danos e crimes ambientais, humanitários ou à saúde pública;

...

XI - contratação de professor para suprir demandas excepcionais decorrentes de programas e projetos de aperfeiçoamento de médicos na área de Atenção Básica em saúde em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde, por meio da integração ensino-serviço, observados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministros de Estado da Economia, da Saúde e da Educação;

...

XIII - assistência a situações de emergência humanitária que ocasionem aumento súbito do ingresso de estrangeiros no País. (Grifo nosso)

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Embora a vedação de preenchimento de cargos públicos vagos em decorrência de aposentadorias pelas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO) tenha forçado esse panorama, não se pode perder de vista que muitos concursados estavam e ainda estão a esperar por sua convocação em face da vacância de inúmeros cargos, agora sem perspectiva de chamamento e consequente retorno do investimento despendido.

E não se diga que a convocação desses servidores, aprovados em concurso público, eleva gastos. A contratação temporária, nos moldes da MP 922/2020, acima transcrita, visa o ingresso imediato de mais de 8.000 servidores para o INSS[13], entre aposentados civis e militares, para suprir a demanda de pessoal, a revelar a patente inconstitucionalidade dessa Medida por violar o disposto no Art. 37, incisos II,IX e seu § 10, da Constituição da República[14], além de tornar visível que a pretensão do atual governo é enveredar pelo campo desse tipo de contratação para suprir a demanda de mão de obra permanente, dando azo à vulneração do sistema jurídico-administrativo que veda contratação temporária para serviços ordinários permanentes do Estado[15].

Por fim, é preciso enfatizar, ainda, que o servidor público, para adquirir a estabilidade, passa por avaliação especial de desempenho pelo prazo de três anos, fim do qual, pode ser exonerado, de ofício, se for considerado inabilitado ao exercício do cargo (Art. 41, § 4º, da CRFB c/c o Art. 34, parágrafo único, inciso I, da Lei nº 8.112/90). Dilatar esse prazo tem o condão de quebrantar a estabilidade enquanto garantia estatal, pois submeterá a permanência do servidor, igualmente, ao alvedrio do clientelismo em face de sua maior vulnerabilidade a pressões, a ferir, de toda sorte, o princípio da dignidade humana.

Servidor, está na hora de mostrar a sua cara[16]!


Notas

[1] Acesso por meio do link: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/7/03/brasil/29.html, em 4 de março de 2020.

[2] Uma das revistas de publicação foi o BDM - Boletim de Direito Municipal nº 1/1999, São Paulo, Editora NDJ, de publicação mensal, pp. 25/44. Na época, o tema ainda era muito debatido. Neste artigo se utilizou a ementa que se reproduziu no presente ensaio, de autoria do renomado jurista Raimundo Faoro.

[3] Atualmente, a regulamentação está sendo travada no Projeto de Lei do Senado n° 116, de 2017 (Complementar), de Autoria da Senadora Maria do Carmo Alves (DEM/SE). Mas existe pretensão do governo atual em apresentar a regulamentação do dispositivo constitucional (Art. 41, inciso III, da CRFB).

[4] Reza o Art. 41, § 1º, da CRFB, com redação da EC nº 19/98, in verbis: Art. 41. [...] § 1º O servidor público estável só perderá o cargo: I - em virtude de sentença judicial transitada em julgado; II - mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa; III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.”

[5] Os servidores públicos foram intitulados de parasitas pela Alta Administração Pública: Fonte: https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2020/02/07/paulo-guedes-compara-servidores-publicos-com-parasitas.ghtml.

[6] O servidor público ingressa no regime de cargo, ou mesmo de emprego, por meio de concurso público. Para provimento desse cargo faz-se imperiosa a existência de vaga, vaga que deve ter sido criada por lei e, portanto, com observância de prévia dotação orçamentária, haja vista que, como dita o Art. 169, da CRFB, somente poderão ser criadas despesas de pessoal: I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; e II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Grifo nosso)

[7] Como dito, o servidor está subordinado a um regime que lhe impõe o cumprimento de deveres e obrigações, dentre as quais a prestação de serviço eficiente. Existe previsão de demissão de servidor por desídia, ou seja, quando o servidor exerce a sua função com desleixo, com desatenção, com indiferença. Além da desídia (Art. 117, XV c/c Art. 132, XIII, da Lei nº 8.112/90), muitas outras situações são previstas como hipóteses de demissão (Art. 132). E não se diga que os servidores não são demitidos por conta dessas violações legais. No ano de 2018 foram demitidos 629 servidores públicos e, em 2019, o número caiu para 530 servidores demitidos (Fonte: Portal da Transparência - CEAF (Cadastro de Expulsões da Administração Federal).

[8] A burocracia é o modus operandi da prestação de serviço público. Diz respeito à forma de gestão, ao excesso de controle, ao formalismo criado por lei a ser observado pelo servidor por imperativo de ordem legal. Se a legislação requisita uma certidão de tempo de serviço impressa e não aceita uma digitalizada, ainda que emitida por órgão público da mesma esfera, o servidor não pode aceitar a última sob justificativa de eficiência ou celeridade do processo. Deve cumprir o que a lei determina e a forma imposta. Ademais, o vício da burocracia, que é o seu excesso, deve ser combatido por meio de legislação ou regulamentação interna. Então, não se pode culpar o servidor pelos excessos de burocracia.

[9] Jamais, portanto, pode ser tida como privilégio porque, nem ao menos, confere ao servidor direito à indenização pela ruptura do vínculo, a exemplo do que ocorre com o empregado regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que tem direito ao Fundo de Garantia pelo Tempo de Serviço (FGTS).

[10] Não é raro esta articulista se deparar com questões hipotéticas de determinado interlocutor a perguntar sobre casos de acumulação. Exemplo: caso de médicos ou professores da rede pública não irem trabalhar ou mandarem alguém no seu lugar, a deixar a sociedade à mercê da sorte. Por lógico que esses profissionais estão passíveis de demissão e devem merecer a devida sanção. Mas a estabilidade do servidor público não é culpada por esse tipo de comportamento. Longe disso, a sua inserção no mundo jurídico tem fim outro, ligada à retenção do profissionalismo e à vedação aos apadrinhados. E não se diga que o regime celetista é melhor porque o servidor não goza da estabilidade. Isso não existe. No regime de emprego (CLT), a demissão de servidores impõe motivação por parte da Administração (v. Lei nº. 9.962, de 22 de fevereiro de 2000). E isso ocorre porque a motivação do ato administrativo é regra inafastável diante da restrição ou limitação de direitos (Art. 50, da Lei nº 9.784/99 c/c o Art. 3º, da Lei nº 9.962/99).

[11] Fonte: https://folhadirigida.com.br/noticias/concurso/especial/reforma-administrativa-guedes-reduz-tempo-minimo-para-estabilidade; https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-03/guedes-diz-que-resposta-crise-sao-reformas e outros. Último acesso em 9/3/2020.

[12] Muitos órgãos públicos não estão a chamar candidatos aprovados em concurso público, apesar da existência de vagas, por conta de vedação imposta pela LDO (v. Artt. 99, da Lei nº 13.898/2019). Contudo, ainda assim, estão a prorrogar concursos (https://www.estrategiaconcursos.com.br/blog/concurso-trt-8/), por conta da existência de vagas. (último acesso em 9 de março de 2020)

[13] Fontes: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-03/mp-autoriza-contratacao-de-servidor-aposentado-para-inss; https://fdr.com.br/2020/03/08/salario-dos-novos-contratados-do-inss-2020-impressionam/. último acesso em 9 de março de 2020.

[14] O STF decidiu, em repercussão geral, a seguinte tese: RE 658026 – Tema 612: “Nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal, para que se considere válida a contratação temporária de servidores públicos, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a contratação seja indispensável, sendo vedada para os serviços ordinários permanentes do Estado que estejam sob o espectro das contingências normais da Administração.” Ademais, em se tratando de insuficiência de pessoal, admite-se excepcionalmente a contratação temporária, mas por prazo suficiente à formação de quadro de pessoal suficiente, a ocorrer mediante concurso público. Nos casos elencados pela MP, existem cargos vagos a aguardar provimento, que estão represados por conta dos ditames da LDO.

[15] Como dito: STF, RE 658026 – Tema 612.

[16] Além da quebra da estabilidade, o Pacote Brasil que alberga as PEC’s 186, 187 e 188, vai invadir direitos básicos dos servidores, como a sua remuneração.

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Maria Lucia Miranda Alvares

Advogada do Escritório ACG - Advogados, Pós-Graduada em Direito Administrativo/UFPA, autora do livro Regime Próprio de Previdência Social (Editora NDJ) e do Blog Direito Público em Rede, colaboradora de revistas jurídicas na área do Direito Administrativo. Palestrante, instrutora e conteudista de cursos na área do Direito Administrativo. Exerceu por mais de 15 anos o cargo de Assessora Jurídico-Administrativa da Presidência do TRT 8ª Região, onde também ocupou os cargos de Diretora do Serviço de Desenvolvimento de Recursos Humanos e Diretora da Secretaria de Auditoria e Controle Interno. Pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisa Eneida de Moraes (GEPEM).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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