Após sofrerem sucessivas derrotas na Justiça, que impede a cobrança de contribuições "assistenciais" e "confederativas" de empregados não sindicalizados, os sindicatos profissionais, contando com a inoportuna ajuda dos sindicatos patronais, acabaram inventando um novo "tributo" para as empresas: a "taxa negocial" ou "taxa de assistência em negociações sindicais".
Essa taxa, que tem sido sutilmente inserida em Convenções Coletivas de Trabalho, com vistas a ganhar aparência oficial, impõe às empresas a obrigação de contribuir para o sindicato dos empregados, a expensas exclusivamente suas, segundo valores fixados em função da remuneração e da quantidade de empregados do estabelecimento.
No entanto, esse vergonhoso "tributo", que representa custo adicional para as empresas, carece de validade jurídica.
A estipulação da taxa negocial é, de fato, nula, seja por sua própria ilicitude, seja por não se referir a condições "para reger as relações individuais de trabalho", seja se efetuar, via de regra, por quem não detém poderes especiais para tanto, seja, ainda, por constituir enriquecimento sem causa do sindicato dos empregados.
O juiz Homero Batista Mateus da Silva, da 14ª Vara do Trabalho de São Paulo, em julgado recente1, levanta inclusive a falta de autorização constitucional para a adoção de outras fontes de custeio das entidades sindicais, já que, no seu entender, o art. 548 "e" da CLT não foi sequer recepcionado pela Constiuição Federal de 1988.
A primeira nulidade da estipulação da "taxa negocial" reside na sua própria existência.
1 Processo nº 02155.2005.014.02.00-5
A CLT, em seu art. 548, estabelece duas fontes de custeio das entidades sindicais: o imposto sindical (alínea "a") e as contribuições cobradas dos associados (alínea "b"), somente permitindo o estabelecimento de outras fontes de recursos sob o caráter eventual (alínea "e").
As entidades sindicais, embora sejam dotadas de personalidade jurídica de natureza privada, estão - dada a finalidade de sua existência – sujeitas também a normas de Direito Público (o art. 521 da CLT é emblemático nesse sentido), devendo, assim, observar o princípio da legalidade.
O custeio das entidades sindicais é definido em lei (art. 548 da CLT) e é fato que tal artigo não autoriza a cobrança de contribuições de pessoas estranhas aos associados ou aos integrantes da categoria profissional, nem a instituição de outras fontes de recursos, mesmo eventualmente, se adotada a tese da inconstitucionalidade superveniente da alínea "e" do citado artigo.
Todos os integrantes de categoria profissional ou econômica já contribuem para os sindicatos, mesmo não sendo sindicalizados, pela via do anacrônico "imposto sindical" (hoje contribuição sindical, de natureza tributária, instituída pela União e arrecadada pelos sindicatos), suficiente para o sustento dessas entidades.
Os sindicatos em geral, porém, parecem não se contentar com as vultosas importâncias que recebem e, volta e meia, resolvem estender seus tentáculos sobre o bolso alheio, sem prestar nenhum serviço ou desenvolver qualquer atividade em contrapartida que justifique o aumento de sua arrecadação.
As primeiras tentativas se deram na direção dos próprios integrantes das categorias, quando as convenções coletivas passaram a instituir contribuições "confederativas" ou "associativas" para todos, indistintamente, sindicalizados ou não.
Tão escandalosas eram essas cobranças, especialmente após o advento da Constituição de 1988, que o TST acabou por considerar nulas as estipulações que atingissem os trabalhadores não-sindicalizados (Orientação Jurisprudencial no. 17 da Seção de Dissídios Coletivos):
"17. Contribuições para entidades sindicais.
Inconstitucionalidade de sua extensão a não associados.
Inserido em 25.05.1998
As cláusulas coletivas que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical, a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, são ofensivas ao direito de livre associação e sindicalização, constitucionalmente assegurado, e, portanto, nulas, sendo passíveis de devolução, por via própria, os respectivos valores eventualmente descontados."
A criatividade arrecadatória não parou por aí, inventando-se a malfadada "Taxa Negocial", desta vez cobrada integralmente das empresas, que não têm qualquer relação com o sindicato profissional, em evidente afronta ao art. 548 da CLT, que não autoriza esse tipo de cobrança.
É curioso que mencionada taxa tem por finalidade "a participação em negociações coletivas", ou seja, remunerar a própria atividade sindical, o que, pela lei, é custeado pelo imposto sindical.
Se a cobrança de contribuições de pessoas não sindicalizadas é ilegal, o que se dirá, então, dessa cobrança em relação a pessoas estranhas à própria categoria?
Trata-se de escândalo que, felizmente, já vem sendo barrado pelo Judiciário.
Não havendo autorização do art. 548 da CLT para a cobrança desse tipo de contribuição, é ela ilícita e, assim, nula a sua instituição, nos termos do art. 166, inc. II, do Código Civil.
Ainda que a própria taxa, em si, não fosse ilícita, é fato que os sindicatos patronais, via de regra, não têm poderes para contratar o seu pagamento em nome dos empregadores.
As entidades sindicais têm por finalidade o "estudo, defesa e coordenação de interesses econômicos ou profissionais" (CLT, art. 511), para o que a lei lhes conferiu a prerrogativa de firmar contratos coletivos de trabalho (art. 513, "b").
Os contratos coletivos reconhecidos pelo nosso direito são o Acordo e a Convenção Coletiva de Trabalho, para cuja celebração a CLT impõe, também, certos requisitos, dentre eles, as "condições ajustadas para reger as relações individuais de trabalho durante sua vigência" (art. 613, inciso IV).
A leitura do mencionado inciso - único requisito legal relativo aos contratos coletivos de trabalho - leva a duas conclusões:
a) em primeiro lugar, os contratos coletivos de trabalho devem limitar seu conteúdo às condições ajustadas para reger as condições individuais de trabalho durante a sua vigência e
b) os poderes legalmente outorgados aos sindicatos convenentes são limitados à estipulação das mencionadas condições.
A "Taxa Negocial", nem de longe, configura condição para reger relações individuais de trabalho e sua estipulação, assim, está fora dos poderes legalmente estabelecidos para os sindicatos convenentes e do conteúdo legalmente estipulado para os instrumentos dessa natureza, sendo, igualmente, um objeto ilícito (CC, art. 166, II).
É fato que em nenhum momento a lei autoriza os sindicatos a avançarem sobre o bolso alheio, criando obrigações financeiras para quem não tem qualquer tipo de relação para com eles.
Sendo a Convenção Coletiva um contrato, firmado por representantes das partes, a estipulação de cláusula além dos poderes conferidos pela lei dependeria de poderes especiais (CC, art. 661, § 1o.), não se conhecendo empresa que tenha outorgado a seu sindicato poderes para lhe aumentar os custos, sendo ineficaz tais estipulações com relação às empresas, nos estritos termos do art. 662 do Código Civil.
Finalmente, ainda que não houvesse na cobrança atacada nenhum dos vícios apontados, é fato que a "taxa" pressupõe a prestação de certos serviços pelo sindicato à pessoa cobrada.
No entanto, a própria natureza da "taxa negocial" permite concluir que o sindicato profissional não presta nem prestará qualquer tipo de serviço ao empregador de quem pretende cobrar tal taxa, de maneira que, ainda que não sofresse das ilegalidades já mencionadas, dita taxa ainda assim seria ilegal, porque constituiria manifesto enriquecimento sem causa do sindicato profissional, receberia pagamento por serviço que não prestou, ao arrepio do art. 884 do Código Civil.
Cabe aos interessados nas atividades sindicais o sustento do sindicato, não a terceiros.
Em resumo, a estipulação da "Taxa Negocial", a cargo de quem nem sequer pertence a categoria profissional, não goza de autorização legal, sendo absolutamente nula (CC, art. 166-II). Além disso, ainda que não existisse a mencionada nulidade, dita taxa é indevida pelas empresas, seja por não constituir condição individual de trabalho, não podendo, assim, ser objeto de Convenção Coletiva (CC, art. 166, inc. II), seja por não ter o sindicato patronal poderes expressos para dita estipulação (CC, art. 662), seja pela ausência manifesta de qualquer serviço prestado pelo sindicato profissional ao empregador.