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A lei na filosofia, na teologia e no direito

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17/03/2006 às 00:00
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As Casas do Congresso

            Ao ouvir diariamente noticiário sobre assuntos ligados aos deputados e senadores, pensa-se que eles têm poderes absolutos, com possibilidades de decisão incontrolável.

            A concepção, porém, não é bem assim. As Casas do Congresso Nacional, ou seja, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, possuem órgãos internos destinados a ordenar seus trabalhos.

            A cada uma delas cabe elaborar seu regimento interno, dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços e fixação da respectiva remuneração, observados apenas os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias (arts. 51, III e IV, e 52, XII e XIII).

            Apesar de discreta a respeito do tema, a nossa Constituição insere disposições sobre a formação e competência básica de seus principais órgãos internos (art. 57, § 3º, II): Mesa, Comissões, Polícia e Serviços Administrativos.

            É assim que existem a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa do Senado Federal e a Mesa do Congresso Nacional, seus órgãos diretores. Sua composição é matéria regimental, e cada Casa a disciplina como melhor lhe parecer, tendo presidente, dois vice-presidentes, quatro secretários e quatro suplentes de secretários. A representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares, que participam da respectiva Casa, é uma imposição constitucional (art. 58, § 1º).

            O princípio geral da organização do Poder Legislativo afirma a exigência de que a autonomia das Casas Legislativas imponha sejam seus órgãos diretores compostos de membros pertencentes a seus quadros eleitos pelos seus pares (art. 57, § 4º).

            Com o texto constitucional em vigor, está claro que o presidente não pode pleitear sua recondução ao mesmo cargo, embora possa para vice-presidente, enquanto este pode pretender eleger-se presidente ou secretário e este a qualquer dos cargos anteriores.

            Isso só vale dentro da mesma legislatura, ou se aplica também na passagem de uma para outra? O texto proíbe recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente, o que significa igualmente proibir a reeleição de membros da última Mesa de uma legislatura para a primeira da seguinte.

            A Mesa do Congresso Nacional não existe por si, porque se constitui de membros das Mesas do Senado e da Câmara. Ela é presidida pelo presidente do Senado Federal, e os demais cargos são alternadamente exercidos pelos ocupantes de cargos equivalentes na Câmara dos Deputados e no Senado (art. 57, § 5º).

            Sua função é dirigir os trabalhos do Congresso Nacional, quando suas Casas se reúnem em sessão conjunta. Tem, no entanto, importante atribuição (art.140): a de designar Comissão para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas referentes ao estado de defesa e ao estado de sítio.

            Entre as atribuições das Mesas há algumas (arts. 50, 55, §§ 2º e 3º, 103, II e III, e 139, parágrafo único) referentes à convocação ou comparecimento de ministros, à perda de mandatos de congressistas, à propositura da ação direta de inconstitucionalidade, à liberação de pronunciamento de parlamentares durante o estado de sítio.


As Comissões do Congresso

            Permanentes, temporárias, temáticas, especiais ou técnicas, de inquérito, mistas e de recesso, as comissões são os organismos constituídos em cada Câmara encarregados de estudar e examinar as proposições legislativas e apresentar pareceres, conforme afirma Joseph-Barthélemy (Essai sur le travail parlementaire et les systèmes des comissions, Paris, 1934).

            A Constituição realçou o seu papel.

            As permanentes são organizadas em função da matéria de sua competência.

            Cabem-lhe (art. 58, § 2º): discutir e votar projetos de lei que dispensar... a competência do plenário... (inc. I); realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil (inc. II); convocar Ministros de Estado para prestar informações sobre assuntos inerentes a suas atribuições (inc. III); receber petições, reclamações, representações ou queixas de qualquer pessoa contra atos ou omissões de autoridades ou entidades públicas (inc. IV); solicitar depoimento de qualquer autoridade ou cidadão (inc. V); apreciar programas de obras, planos nacionais, regionais e setoriais de desenvolvimento e sobre elas emitir parecer (inc. VI).

            O ideal, às vezes, é inatingível, mas se as comissões usarem bem dessa última atribuição (inc. VI), já teremos aí relevante instrumento de controle da Administração.

            As temporárias extinguem-se com a terminação da legislatura ou, antes dela, quando constituídas para opinarem sobre determinada matéria, tenham preenchido os fins a que se destinam.

            As mistas, compostas de deputados e senadores, devem estudar assuntos expressamente fixados, especialmente os que devem ser decididos pelo Congresso Nacional, em sessão conjunta de suas Casas.

            À mais poderosa, a comissão mista permanente (art. 166, § 1º), cabe examinar e emitir parecer sobre os projetos de plano plurianual, de lei de diretrizes orçamentárias, de orçamento anual e de créditos adicionais; as contas apresentadas anualmente pelo presidente da República; os planos e programas nacionais, regionais e setoriais; solicitar às autoridades governamentais esclarecimentos necessários sobre despesas não autorizadas.

            Bingos, correios, mensalão etc. lembram-nos as comissões parlamentares de inquérito, CPIs. Bastante prestigiadas pela Constituição vigente, receberam poderes de investigação próprios das autoridades judiciárias (art. 58, § 3º). Sem limite para sua criação, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, em conjunto ou separadamente, poderão criar tantas comissões quantas julgarem necessárias.

            Seus requisitos constitucionais são: requerimento de pelo menos um terço de membros de cada Casa, para as respectivas comissões, ou de ambas, para as comissões em conjunto (comissões mistas); ter por objeto a apreciação de fato determinado e ter prazo certo de funcionamento.

            Um dos problemas mais sérios das CPIs consistiu sempre na ineficácia jurídica de suas conclusões, normalmente dependentes de apreciação de plenário da respectiva Casa ou do Congresso, que, não raro, as enterrava nos escaninhos das injunções políticas.

            O remédio constitucional para esse mal resolveu que "[...] suas conclusões, se for o caso, [sejam] encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores" (art. 58, § 3º).

            Resumindo, as conclusões das CPIs são decisões definitivas, cuja executoriedade independe de apreciação ou apuração de outro órgão.


Funcionamento do Congresso Nacional

            Legislaturas, sessões legislativas ordinárias e extraordinárias, sessões (reuniões) ordinárias e extraordinárias: é assim que o Congresso Nacional desenvolve suas atividades.

            A legislatura dura quatro anos. Vai do início do mandato dos membros da Câmara dos Deputados até o seu término (CF, art. 44, parágrafo único). Isso porque o Senado é contínuo por ser removível apenas parcialmente em cada período de quatro anos (art. 46, § 2º).

            Os trabalhos legislativos são realizados nas sessões legislativas ordinárias, cujos períodos vão de 15 de fevereiro a 30 de junho e de 1º de agosto a 15 de dezembro (art. 57), não se interrompendo sem a aprovação do projeto de lei de diretrizes orçamentárias (art. 57, § 2º).

            Os espaços de 16 de dezembro a 14 de fevereiro constituem o recesso parlamentar. Originariamente, os parlamentares se afastavam das reuniões durante certo tempo, para retornar aos seus distritos ou circunscrições eleitorais, a fim de confirmar seus mandatos, uma necessidade parlamentar.

            Para a sessão legislativa extraordinária, o Congresso Nacional é convocado pelo presidente do Senado Federal, em caso de decretação de estado de defesa ou de intervenção federal, e pelo presidente da República, em caso de urgência ou interesse público relevante (art. 57, § 6º, I e II).

            Nessa sessão legislativa extraordinária o Congresso Nacional só poderá deliberar sobre matéria para a qual foi convocado (art. 57, § 7º), vedado o pagamento de parcela indenizatória em valor superior ao subsídio mensal.

            Os regimentos internos das Casas do Congresso Nacional disciplinam as sessões ordinárias, divididas em pequeno expediente, grande expediente e ordem do dia, nas quais as Câmaras debatem, votam e deliberam.

            É nesse período que se realizam as sessões solenes de comemoração de datas históricas ou de recepções de personalidades estrangeiras em visita ao país.

            O princípio do bicameralismo é que as Câmaras do Congresso Nacional funcionam e deliberam cada qual para si, separadamente. Mas a Constituição prevê hipóteses em que se reunirão em sessão conjunta (art. 57, § 3º). Isso se dará para a inauguração da sessão legislativa, elaborar o regimento comum e regular a criação de serviços comuns, receber o compromisso do presidente e do vice-presidente da República (art. 78), conhecer do veto e sobre ele deliberar (art. 66, § 4º).

            A Constituição em vigor afastou a sistemática anterior de discussão e votação de projetos de leis orçamentárias em sessão conjunta do Congresso Nacional.

            O próprio art. 66 estabelece que tais leis serão apreciadas pelas duas Casas do Congresso Nacional. Igualmente, as emendas a elas oferecidas serão apreciadas pelo plenário das duas Casas do Congresso Nacional. Assim, a legislação de urgência é discutida e votada pelas duas Casas separadamente (arts. 62 e 64, §§ 1º e 4º), bem como as emendas constitucionais (art. 60, § 2º).

            Quorum é o número mínimo exigido para reunião e votação em órgãos colegiados. Sem ele não há sequer a possibilidade de instalação da reunião. As deliberações de cada Casa ou do Congresso serão tomadas por maioria de votos, presente a maioria de seus membros (art. 47). E a Constituição contempla hipóteses de deliberação por maioria absoluta (arts. 55, § 2º, 66, § 4º, e 69), por três quintos (art. 60, § 2º) e por dois terços (arts. 51, I, e 52, parágrafo único) dos membros da Casa.


Atribuições do Congresso Nacional

            A função típica do Congresso Nacional é legislar, elaborar, discutir e aprovar projetos de leis, sujeitas à sanção ou veto do presidente da República, em todas as matérias de competência legislativa da União (CF, art. 48).

            Há outras, não sujeitas à sanção ou veto do presidente da República (arts. 49, 51 e 52), deliberativas, de caráter concreto, feitas por resoluções ou decreto legislativo.

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            Merecem destaque a fiscalização e controle dos atos do Poder Executivo (art. 49, X), incluídos os da administração indireta. São eles: a) pedidos de informação aos ministros, importando em crime de responsabilidade a recusa (art. 50, § 2º); b) instalação de CPI, com poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, para apuração de fato certo por prazo determinado (art. 58, § 3º); c) controle externo dos recursos públicos, com o auxílio do Tribunal de Contas da União (art. 71) e de uma comissão mista permanente de orçamento (arts. 166, § 1º, e 72); d) tomada de contas pela Câmara dos Deputados, quando o presidente não as apresentar no prazo assinalado (arts. 51, II, e 84, XXIV).

            No julgamento de crime de responsabilidade, a Câmara dos Deputados funciona como órgão de admissibilidade do processo e o Senado Federal, como tribunal político, sob a presidência do presidente do Supremo Tribunal Federal (arts. 51, I, 52, I, e 86).

            Mediante a elaboração de emendas constitucionais (art. 60), o Congresso Nacional assume o poder constituinte de reforma que lhe foi atribuído pelo poder constituinte originário.

            Exclusivas são certas atribuições de cada Casa Legislativa do Congresso Nacional, não precisando ser aprovadas pela outra, para que se tornem válidas. É o caso da autorização da instauração de processo contra o presidente, o vice-presidente, os ministros de Estado (art. 51, I); o julgamento no processo de impeachment de altas autoridades federais pela prática de crimes de responsabilidade (art. 52, I e II); a aprovação prévia, por voto secreto, de ministros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas e de outras autoridades (art. 52, III e IV).

            As atribuições da Câmara dos Deputados são exclusivas porque insuscetíveis de delegação, e ela as exerce sozinha. É assim que elabora seu regimento interno, dispõe sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção de cargos e, nos termos do art. 89, VII, elege dois dos membros (cidadãos) do Conselho da República (art. 51).

            O Senado Federal tem atribuições privativas mais numerosas, como processar e julgar o presidente e o vice-presidente da República nos crimes de responsabilidade; processar e julgar os ministros do STF, os membros do Conselho Nacional de Justiça e os do Conselho Nacional do Ministério Público, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União, também nos crimes de responsabilidade (art. 52, I e II).

            Como nem tudo é perfeito, foi incluído no art. 52, XV, a avaliação periódica do funcionamento do sistema tributário nacional em sua estrutura e componentes e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. Trata-se de uma interferência inconstitucional na autonomia das entidades federativas por via de emenda constitucional. Avaliar com que finalidade? Para quê? Certamente não é avaliar apenas pela avaliação em si.

            Desde 1934, os ministros de Estado poderão ser convocados para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, perante órgãos legislativos.

            Agora, podem ser convocados quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República (art. 50). Providência muito pertinente, pois muitos de seus titulares ficavam imunes àquela convocação congressional.

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Sobre o autor
Máriton Silva Lima

Advogado militante no Rio de Janeiro, constitucionalista, filósofo, professor de Português e de Latim. Cursou, de janeiro a maio de 2014, Constitutional Law na plataforma de ensino Coursera, ministrado por Akhil Reed Amar, possuidor do título magno de Sterling Professor of Law and Political Science na Universidade de Yale.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Máriton Silva. A lei na filosofia, na teologia e no direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 989, 17 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8107. Acesso em: 5 mai. 2024.

Mais informações

Texto baseado em série originalmente publicada no "Jornal da Cidade", de Caxias (MA), entre 15/05/2005 e 20/11/2005.

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