O direito dos idosos

10/04/2020 às 09:52
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Ora, não cabe apenas às famílias o cuidado com os idosos. Cabe ao Estado também!

O presidente Jair Bolsonaro mantém o entendimento de que as medidas de isolamento social deveriam ser flexibilizadas para permitir que o setor produtivo do país siga funcionando em meio à pandemia de Covid-19. Para o mandatário, apenas idosos deveriam respeitar protocolos de distanciamento como forma de se prevenir contra o novo coronavírus e caberia às famílias zelar pelo bem-estar dos mais velhos. 

“Quem tem abaixo de 40 anos, tem que se preocupar pra não transmitir o vírus pros outros. Mas pra ele, pra sua vida, é quase zero esse risco. Devemos, sim, cada família cuidar dos mais idosos. Não pode deixar na conta do estado. Cada família tem que botar o vovô e a vovó lá no canto e é isso. Evitar o contato com eles a menos de dois metros. E o resto tem que trabalhar, porque tá havendo uma destruição de empregos no Brasil”, disse Bolsonaro nesta quarta-feira (8/4), em entrevista ao programa Brasil Urgente, do apresentador José Luiz Datena.

Ora, não cabe apenas às famílias o cuidado com os idosos. Cabe ao Estado também.

Há o direito social dos idosos.

Uma dimensão integra o direito previdenciário (artigo 201, I), como forma protetiva da velhice, incluindo a garantia de pagamento de um salário mínimo mensal, quando ele não possuir meios de prover à própria subsistência, conforme vier a ser disposto na lei. Mas o amparo à velhice vai mais longe, como se lê do artigo 230, segundo o qual a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida, bem como gratuidade dos transportes coletivos urbanos e, tanto quanto possível, a convivência em seu lar.

Constituição da Republica Federativa do Brasil, de 1988 (artigo 203, inciso V), determina, que a assistência social será prestada a quem necessita de auxílio, independentemente de contribuição à seguridade social.

Essa determinação da Constituição Federal previa a regulamentação por outra norma, o que aconteceu com as regras trazidas pela Lei n.º 8.742, de 7.12.1993 (Lei Orgânica da Assistência Social) e no Decreto n.º 6.214, de 26.9.2007.

As normas acima foram modificadas em 2011 pelas Leis n.º 12.435 e 12.470 e pelo Decreto n.º 7.617.

As condições para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) no valor de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso carentes estão disciplinadas nos artigos 20 e 21 da LOAS.

– Requisitos legais para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC)

Os requisitos definidos na Lei Orgânica da Assistência Social e no seu decreto regulamentador são os seguintes:

Pessoa Idosa deverá comprovar, de forma cumulativa, que:

a) possui 65 anos de idade ou mais;

b) a condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade; e

c) não possui outro benefício no âmbito da Seguridade Social ou de outro regime, inclusive o seguro-desemprego, salvo o de assistência médica e a pensão especial de natureza indenizatória.

Portanto, a questão do idoso não envolve apenas as suas famílias.

Para tanto, há o estatuto do idoso, vigente desde janeiro de 2004, e que veio ampliar direitos que já estavam previstos em outra Lei Federal, de nº 8842, de 04 janeiro de 1994, regulamentando dispositivos apontados na Constituição Federal de 1988 e, dessa forma, se consolida como instrumento poderoso na defesa da cidadania dos cidadãos e cidadãs daquela faixa etária, dando-lhes ampla proteção jurídica para usufruir direitos sem depender de favores, amargurar humilhações ou simplesmente para viverem com dignidade.

Ao longo de seus 118 artigos são tratadas questões fundamentais, desde garantias prioritárias aos idosos, até aspectos relativos à transporte, passando pelos direitos à liberdade, à respeitabilidade e à vida, além de especificar as funções das entidades de atendimento à categoria, discorrer sobre as questões de educação, cultura, esporte e lazer, dos direitos à saúde através do SUS, da garantia ao alimento, da profissionalização e do trabalho, da previdência social, dos crimes contra eles e da habitação, tanto em ações por parte do Estado, como da sociedade.

Cada uma dessas questões tem um tratamento minucioso, mas fazendo uma síntese, os aspectos mais significativos são os seguintes:

a) Nas aposentadorias, reajuste dos benefícios na mesma data do reajuste do salário mínimo, porém com percentual definido em regulamento; a idade para requerer o salário mínimo estipulado pela Lei Orgânica da Assistência Social-LOAS cai de 67 para 65 anos;

b) Assegura desconto de pelo menos 50% nas atividades culturais, de lazer e esportivas, além da gratuidade nos transportes coletivos públicos;

c) No caso do transporte coletivo intermunicipal e interestadual, ficam reservadas duas vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos e desconto de 50% para os idosos da mesma renda que excedam essa reserva;

d) Prioridade na tramitação dos processos e procedimentos dos atos e diligência judiciais nos quais pessoas acima de 60 anos figurem como intervenientes;

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e) Os meios de comunicação também deverão manter espaços ou horários especiais voltados para o público idoso, com finalidade educativa, informativa, artística e cultural sobre o envelhecimento;

f) Os currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal deverão prever conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, a fim de contribuir para a eliminação do preconceito, sendo que o poder público deverá apoiar a criação de universidade aberta para pessoas idosas e incentivar a publicação de livros e periódicos em padrão editorial que facilite a leitura;

g) Quanto aos planos de saúde, a lei veda a discriminação do idoso com a cobrança de valores diferenciados em razão da idade, determinando ainda ao poder público o fornecimento gratuito de medicamentos, assim como prótese e outros recursos relativamente ao tratamento, habilitação ou reabilitação;

h) O idoso terá prioridade para a compra de moradia nos programas habitacionais, mediante a reserva de 3% das unidades, sendo prevista, ainda, a implantação de equipamentos urbanos e comunitários voltados para essa faixa etária.

O art. 3º do estatuto do idoso apresenta uma série de direitos que devem ser assegurados, prioritariamente, às pessoas com mais de 60 anos. Seu parágrafo 1º, então, apresenta o conteúdo dessa garantia. Deves ser prioritários ao idoso, portanto:

  1.  o atendimento preferencial imediato e individualizado junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população;
  2. a preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas específicas;
  3. a destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso;
  4. a viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convívio do idoso com as demais gerações;
  5. a priorização do atendimento do idoso por sua própria família, em detrimento do atendimento asilar, exceto dos que não a possuam ou careçam de condições de manutenção da própria sobrevivência;
  6. a capacitação e reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia e na prestação de serviços aos idosos;
  7. o estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento;
  8. a garantia de acesso à rede de serviços de saúde, como o SUS, por exemplo e de assistência social locais.
  9. a prioridade no recebimento da restituição do Imposto de Renda.    

Ainda, é preciso ressaltar que, entre os idosos, possuem prioridade aqueles com mais de 80 anos.

No campo do direito penal destaco o artigo. 98. Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado:

Pena – detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa.

O recolhimento de idosos em instituições, como hospitais e entidades de longa permanência, ainda é uma prática comum na sociedade. No entanto, não deve implicar em um abandono destes nos estabelecimentos. Do contrário, configura a negligência vedada já no art. 4ª da Lei 10.741/2003.

Trata-se de crime formal, de perigo, que exige o dolo e está sujeito à ação penal pública incondicionada.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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