RESUMO
Trata do direito à repetição de indébito fiscal à luz do CTN. Analisa a forma de apuração dos tributos sujeitos a lançamento por homologação e esclarece que a extinção definitiva do crédito desta modalidade de tributos pressupõe a homologação, expressa ou tácita, do lançamento produzido pelo contribuinte pela Fazenda Pública, sendo que a homologação tácita se consuma com o transcurso do prazo de cinco anos a contar do evento tributário. Discorre sobre a prescrição da pretensão à repetição de indébito dos tributos lançados por homologação e apresenta os entendimentos predominantes na doutrina e na jurisprudência anteriores à edição da Lei Complementar nº 118/2005, com destaque para a chamada "Tese dos Cinco mais Cinco", consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça. Aborda as inovações introduzidas pelo Art. 3º da Lei Complementar nº 118/2005 que, divergindo do entendimento então predominante no cenário jurídico nacional, definiu como marco prescricional da ação de repetição de indébito a data do pagamento antecipado efetuado pelo contribuinte, a que se refere o § 1º, do Art. 150 do CTN. Identifica o caráter inovador do referido Art. 3º no ordenamento jurídico, contrapondo-se à sua auto-intitulação de interpretativo. Explicita a violação, consumada pelo dispositivo em comento, ao Princípio da Separação dos Poderes, tendo em vista ser a atividade de interpretação das leis prerrogativa do Poder Judiciário. Aduz a inconstitucionalidade do Art. 4º da Lei Complementar nº 118/2005 e conclui pela impossibilidade de aplicação retroativa da interpretação consignada no Art. 3º da mesma Lei.
Palavras-chave: prescrição; repetição; indébito; tributo; Lei Complementar 118/2005; inconstitucionalidade.
INTRODUÇÃO
O ordenamento jurídico-tributário brasileiro assegura aos contribuintes o direito de serem ressarcidos dos valores indevidamente recolhidos aos cofres públicos a título de tributo.
No caso de tributos lançados por homologação, a doutrina e jurisprudência remansosas, lastreadas na chamada "Tese dos Cinco mais Cinco" consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, sedimentaram interpretação segundo a qual o contribuinte possuía o direito de pleitear a restituição no prazo de cinco anos a contar da homologação pelo Fisco, que poderia ocorrer expressa ou tacitamente, dentro do prazo de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador, na forma disposta no Art. 150, § 4º do CTN. Daí a denominação "Tese dos Cinco mais Cinco": cinco anos a contar do fato gerador para o Fisco homologar, expressa ou tacitamente, o lançamento; mais cinco anos a contar da homologação para o contribuinte pleitear a restituição que julgar devida. Isso porque se considerava consumada a extinção do crédito tributário com a homologação, expressa ou tácita, do lançamento.
O Art. 3º da Lei Complementar nº 118/2005 [01], auto-intitulado interpretativo, irrompeu com essa exegese doutrinária e jurisprudencial consolidadas, notadamente com o entendimento consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão jurisdicional competente para decidir em última instância sobre questões relacionadas à interpretação de lei federal (CF, Art. 105, III, "a" e "c"), como no caso sob foco. E o Art. 4º da mesma Lei, reportando-se ao Art. 106, I, do Código Tributário Nacional, determinou a incidência retroativa da interpretação consignada no Art. 3º, de forma a atingir eventos jurídicos consumados antes da sua vigência.
Esse novo quadro legislativo impõe a interpretação sistêmica de conceitos relevantes, dentre os quais o de lei interpretativa, de irretroatividade da lei, de teoria da separação dos poderes, como pressupostos para a decodificação da sistemática atual relativa à prescrição do direito de pleitear repetição de indébito de tributos sujeitos a lançamento por homologação.
O objeto de enfoque do presente trabalho consiste no novo delineamento, instituído pelo Art. 3º da Lei Complementar nº 118/2005, acerca da prescrição do direito de pleitear repetição de indébito dos tributos lançados por homologação, bem como na questão intertemporal relativa à aplicabilidade da referida norma. O aspecto nodal do estudo é de ordem técnico-pragmática, pois, além da questão conceitual já explicitada, há situações concretas que se tornaram indeterminadas em decorrência da alteração legislativa.
O tema é de grande atualidade e interesse, uma vez que a doutrina e jurisprudência ainda são incipientes e vacilantes ao tratar da matéria, o que decorre da diversidade na adoção de critérios interpretativos e da ausência de amadurecimento da questão no cenário jurídico. Para contribuir nestes estudos, busca-se embasamento em Princípios Jurídicos Gerais, Constitucionais e Tributários, a fim de obter interpretação sistêmica, de modo a conferir maior segurança jurídica aos contribuintes.
DO DIREITO A REPETIÇÃO DE INDÉBITO FISCAL
O direito a repetição de indébito tem por fundamento o princípio geral de direito da Vedação ao Enriquecimento sem Causa. O ordenamento jurídico, nos diversos ramos da Ciência do Direito (Civil, Criminal, Tributário, etc), assimila esse valor historicamente consagrado e traz positivadas normas assecuratórias da sua realização. Assim é que se tem, por exemplo, os artigos 876 [02] e 884 [03] do Código Civil, Art. 168 [04] do Código Penal, entre outros.
No plano do Direito Tributário, coube ao Art. 165 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional a regulamentação do direito do contribuinte à repetição de indébito. Segundo esse dispositivo, o sujeito passivo da obrigação tributária faz jus à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, nas seguintes hipóteses:
(I) - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;
(II) - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
(III) - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
Caracterizada qualquer das hipóteses acima, o contribuinte poderá pleitear junto ao Fisco a repetição da importância paga indevidamente ou a maior, pretensão essa que deverá ser exercitada dentro do prazo fixado pelo Art. 168 do mesmo Diploma Legal, in verbis:
Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:
I - nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;
II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.
O prazo prescricional para o exercício da pretensão à repetição de indébito fiscal, nas hipóteses do Art. 165, I e II do CTN (objeto do presente estudo), é de cinco anos, contados da data da extinção do crédito tributário.
DA EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO DOS TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO
A apuração dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação ocorre mediante a iniciativa do sujeito passivo que, com observância ao prazo e forma de recolhimento legalmente previstos, identifica o fato jurídico tributário e calcula o montante devido para efetuar o pagamento, independentemente de exame prévio da autoridade administrativa, a quem é concedida a prerrogativa de homologar ou rejeitar o lançamento produzido pelo contribuinte, conforme previsto no Art. 150, caput, do CTN:
Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
Nos tributos sujeitos a essa modalidade de lançamento, a extinção definitiva do crédito tributário pressupõe a homologação, expressa ou tácita, do lançamento produzido pelo contribuinte (auto-lançamento) pela Fazenda Pública, a teor dos § 1º e 4º do mencionado Art. 150 do CTN:
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento.
(...)
§ 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
Nesse diapasão, consolidou-se o entendimento doutrinário e jurisprudencial segundo o qual, no caso dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, considera-se extinto o crédito tributário na data da homologação, expressa ou tácita (esta pelo decurso do prazo de cinco anos a contar do fato gerador), do lançamento pelo Fisco. Neste sentido, os escólios de Brito Machado (2005, p. 35), para quem "o crédito tributário somente se considera extinto com a homologação do lançamento".
Da mesma forma, esclarece Barros Carvalho (1999, p. 210):
Quero limitar-me, por agora, a consignar dois tópicos sobre o pagamento antecipado e a homologação do lançamento.
De primeiro, que o pagamento antecipado é uma forma de pagamento, cumprindo o sujeito passivo a conduta que dele se esperava e provocando, com isso, o desaparecimento do direito subjetivo de que esteve investido o credor. Desfaz-se o crédito e, correlativamente, o débito, extinguindo-se a obrigação. Mas, precisamente aqui, ingressa um dado que é peculiar ao instituto, tal qual o prescreve o direito tributário brasileiro: ainda que o factum do pagamento tenha efeitos extintivos, requer a legislação aplicável que ele se conjugue ao ato homologatório a ser realizado (comissiva ou omissivamente) pela Administração Pública. Só assim dar-se-á por dissolvido o vínculo, diferentemente do que sucede nos casos de pagamento de dívida tributária apurada por lançamento, em que a conduta prestacional do devedor tem o condão de pôr fim, desde logo, à obrigação tributária.
Assim, a Administração Pública dispõe do prazo de cinco anos, a contar da ocorrência do evento tributário, para exercer o seu dever-poder de fiscalização do lançamento produzido pelo sujeito passivo da obrigação tributária, sendo que a extinção definitiva do crédito tributário decorre da respectiva homologação, seja mediante manifestação expressa da autoridade, seja pelo simples decurso do prazo fixado em lei.
DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO À REPETIÇÃO DE INDÉBITO DOS TRIBUTOS LANÇADOS POR HOMOLOGAÇÃO
Para garantir estabilidade nas relações sociais, a legislação fixa prazos dentro dos quais o interessado poderá exercitar determinada pretensão de direito material, sendo que a ausência do seu exercício no prazo legal acarreta a sua perda pelo fenômeno da prescrição. A propósito, como ensina Nery Junior (2002, p. 114), "prescrição é a perda da pretensão de direito material pelo seu não exercício no prazo estipulado em lei".
O Art. 168, I, do CTN fixa o prazo de 5 anos, a contar da extinção do crédito tributário, para o exercício da pretensão do contribuinte ao ressarcimento de tributos indevidamente recolhidos (total ou parcialmente) aos cofres públicos.
No caso de tributos sujeitos a lançamento por homologação, a doutrina e jurisprudência dominantes consideravam extinto o crédito tributário na data da homologação pelo Fisco do lançamento realizado pelo sujeito passivo. Este fato jurídico (homologação) seria o termo a quo da prescrição do direito do contribuinte de pleitear a repetição de indébito, consoante se infere de reiteradas decisões do Superior Tribunal de Justiça, das quais são mostra o Recurso Especial nº 584970, publicado no DJU de 1.7.2004, e o Agravo Regimental nº 480068, publicado no DJU de 14.6.2004, cujas ementas seguem abaixo:
(...) A 1ª Seção do STJ, no julgamento do ERESP 435.835/SC, Rel. P/o acórdão Min. José Delgado, sessão de 24.03.2004, consagrou o entendimento segundo o qual o prazo prescricional para pleitear a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de cinco anos, contados da data da homologação do lançamento, que, se for tácita, ocorre após cinco anos da realização do fato gerador — sendo irrelevante, para fins de cômputo do prazo prescricional, a causa do indébito (...) (destacamos).
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO – TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO – PRESCRIÇÃO – TERMO INICIAL – 1. Versando a lide tributo sujeito a lançamento por homologação, a prescrição da ação de repetição/compensação de valores indevidamente recolhidos deve obedecer o lapso prescricional de 5 (cinco) anos contados do término do prazo para aquela atividade vinculada, a qual, sendo tácita, também se opera num qüinqüênio. 2. O E. STJ reafirmou a cognominada tese dos 5 (cinco) mais 5 (cinco) para a definição do termo a quo do prazo prescricional, nas causas in foco, pela sua Primeira Seção no julgamento do ERESP nº 435.835/SC, restando irrelevante para o estabelecimento do termo inicial da prescrição da ação de repetição e/ou compensação, a eventual declaração de inconstitucionalidade do tributo pelo E. STF. 3. Conseqüentemente, o prazo prescricional para a repetição ou compensação dos tributos sujeitos a lançamento por homologação começa a fluir decorridos 5 (cinco) anos, contados a partir da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais um qüinqüênio computado desde o termo final do prazo atribuído ao Fisco para verificar o quantum devido a título de tributo. 4. Agravo regimental a que se nega provimento (destacamos).
Do mesmo modo, Brito Machado (2001, p. 184), ao comentar sobre o pagamento antecipado e homologação do lançamento, esclarece:
A extinção do crédito, nestes casos, não se verifica com o pagamento, mas com este somado à homologação do lançamento. Cronologicamente, a homologação é sempre o momento em que se opera a extinção, pois é sempre posterior ao pagamento.
Este aspecto é de grande relevância para a determinação do prazo extintivo do direito de requerer administrativamente a restituição de tributo pago indevidamente, posto que tal prazo, nos termos do art. 168, inciso I, começa na data da extinção do crédito tributário.
O Art. 3º da Lei Complementar 118/2005 irrompeu com esse entendimento, para definir como marco prescricional da ação de repetição de indébito, não a data da homologação do lançamento pelo Poder Público, mas a do pagamento antecipado efetuado pelo contribuinte, a que se refere o § 1º, do Art. 150 do CTN. Não bastasse a contraposição à exegese doutrinária e jurisprudencial vigente, o artigo em comento auto-intitulou-se interpretativo e objetivou, com isso, a sua incidência retroativa, nos termos do Art. 4º da mesma Lei [05].
PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI
Vigora na ordem jurídica o Princípio da Irretroatividade da Lei, positivado, dentre outros dispositivos, no Art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal [06]. Trata-se de um dos mais relevantes alicerces de outro princípio de maior amplitude: o da Segurança Jurídica.
A regra da irretroatividade da lei encontra-se também positivada no sistema jurídico tributário, como se infere do Art. 150, III, "a" da Constituição Federal e Art. 105 do Código Tributário Nacional:
CF, Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado; (...)
CTN, Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do artigo 116.
Como exceção à regra da irretroatividade, o Código Tributário Nacional, em seu Art. 106, I, prevê aplicabilidade pretérita da lei "quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados". Trata-se da chamada interpretação autêntica, promovida pela mesma fonte da qual se originou a norma interpretada.
Por essência, as leis interpretativas não introduzem, e nem podem introduzir, nenhum elemento novo no sistema normativo. Devem se limitar a esclarecer o significado do dispositivo interpretado, a fim de garantir a plena eficácia deste.
A Lei Complementar 118/2005, em seu Art. 3º, aduz ser interpretativa do Art. 168, I do Código Tributário Nacional. A despeito da menção expressa no texto normativo acerca da sua destinação (interpretar o Art. 168, I do CTN), impõe averiguar se, na essência, o referido dispositivo possui de fato conteúdo interpretativo.
LEI INTERPRETATIVA
Como esclarece Barros Carvalho (2005, p. 94),
As leis Interpretativas exibem um traço bem peculiar, na medida em que não visam à criação de novas regras de conduta para a sociedade, circunscrevendo seus objetivos ao esclarecimento de dúvidas levantadas pelos termos da linguagem da lei interpretada. Encaradas sob esse ângulo, despem-se da natureza inovadora que acompanha a atividade legislativa, retroagindo ao início da vigência da lei interpretada, explicitando com fórmulas elucidativas sua mensagem antes obscura.
Não é isso o que ocorre com o Art. 3º da Lei Complementar 118/2005, cujo teor representa indiscutível inovação na ordem jurídica. Trata-se de preceito modificador da sistemática anterior, cujo conteúdo não se amolda ao de lei meramente interpretativa, pois a novel legislação reduziu o prazo prescricional da ação de repetição de indébito, e pretendeu, sob a rubrica de interpretativa, aplicação a casos pretéritos, na forma do Art. 106, CTN.
Ao informar a interpretação a ser observada em relação ao Art. 168, I do CTN, a Lei Complementar suprimiu um dos possíveis entendimentos existentes antes da sua edição, justamente aquele tido por correto pela doutrina e jurisprudência majoritárias. Inegável, portanto, que o Art. 3º sob análise não é norma de caráter interpretativo, pois trouxe substancial alteração na ordem jurídica vigente, como já se posicionou a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça:
O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar os arts. 150, § 1º, 160, I, do CTN, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a "interpretação" dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal. Portanto, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.
3. O artigo 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (CF, art. 2º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI)(...)
Para Pimenta (2005), o artigo 3º em exame consiste em norma "pseudo-interpretativa". Na realidade, segundo o autor, trata-se de lei nova e, como tal, deve ser aplicada integralmente a fatos geradores posteriores a sua vigência, em face da aplicação da lei tributária no tempo.
Ademais, a norma não poderia retroagir em prejuízo dos contribuintes, cujos direitos estão resguardados pelos princípios da segurança jurídica e da irretroatividade in pejus. A se admitir a retroatividade da Lei, o contribuinte seria penalizado pela nova interpretação legal, pois perderia o prazo anteriormente assegurado pelo Poder Judiciário. Não se trata, pois, de mera alteração exegética, mas de inovação legal, prejudicial ao sujeito passivo da obrigação tributária.