Segregação Racial nos EUA

Considerações sobre a segregação racial nos Estados Unidos (EUA).

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13/05/2020 às 05:02
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A segregação racial nos EUA conheceu trajetórias diferentes apesar de se assentar em desigualdades e crueldade triviais no comportamento dos colonizados pelos povos europeus.

Contemporaneamente a segregação racial ainda pode ser definida como uma espécie de política do Estado que visa separar os indivíduos ou grupos de indivíduos de uma mesma sociedade com base em critérios étnicos ou raciais. Tal medida foi executada particularmente ao final do século XIX e encontrou ênfase no século XX, em países como a Alemanha nazista, que empreendera uma política antissemitista, na África do Sul, com a instituição do apartheid e igualmente nos EUA.

 

Nesse último país, a questão racial reporta ao processo de formação dos EUA, principalmente em razão de diferenças básicas entre o Sul e o Norte.  Os EUA inicialmente foram colonizados pelos ingleses, que originaram as famosas Treze Colônias no leste do país.

 

No entanto, as colônias do Sul obtiveram desenvolvimento diferente das colônias do Norte. Pois, enquanto que no Norte firmou-se o modelo de pequena propriedade privada, do trabalho livre e assalariado, propiciando o desenvolvimento da indústria. Já no Sul prevalecera o modelo de latifúndio, da monocultura (chamada de plantation) e, assentou-se o uso de trabalho escravo, particularmente, de escravos negros trazidos do continente africano.

 

Durante longo período em que predominou a escravidão no Sul dos EUA, e os negros assim como ocorreu no Brasil e também em outras partes do mundo naquela época, considerados mercadorias de seus donos e, não indivíduos portadores de direitos e deveres.

 

Tal dicotomia teve fim, somente, com término do modelo econômico escravocrata no Sul e, propiciada pela Guerra Civil (Guerra da Secessão) que se deu nos anos de 1861 e 1865. Nessa guerra entraram em confronto os Estados do Norte, ou União, comandados pelo então presidente Abraham Lincoln e os autoproclamados Estados Confederados do Sul, que pretendiam fundar uma confederação separatista A guerra terminou finalmente com a vitória do Norte e resultou na imediata abolição da escravatura em todo o país.

 

Após a guerra, fez-se necessário o processo de reconstrução do país e reincorporação dos Estados do Sul ao restante do país. E, nesse período, que correspondem aos anos finais da década de 1860, apareceram as primeiras tentativas de implementação de políticas segregacionistas.

 

Para a maioria dos brancos sulistas era mesmo inaceitável que os negros, recém-libertos, tivessem os mesmos direitos e ocupassem os mesmos espaços que eles. E, no ano de 1865 foi formada a seita Ku Klux Klan (que é onomatopeia do fuzil sendo municiado) por um ex-combatente das tropas sulistas, chamado de Nathan Bedford Forrest. 

 

A polícia da União sufocou os primeiros focos de ação da violenta Klan contra os negros. Porém, no início do século XX, a seita voltaria com muita força, ganhando milhares de adeptos.

 

A respeito da implantação das leis segregacionistas norte-americanas, o historiador Leandro Karnal, esclarece in litteris:

        “Leis de segregação racial haviam feito breve aparição durante a reconstrução, mas desapareceram até 1868. Ressurgiram no governo de Grant, a começar pelo Tennesse, em 1870: lá, os sulistas brancos promulgaram leis contra o casamento inter-racial. Cinco anos mais tarde, o Tennessee adotou a primeira Lei Jim Crow e o resto do sul o seguiu rapidamente. O termo “Jim Crow[1], nascido de uma música popular, referia-se a toda lei (foram dezenas) que seguisse o princípio “separados, mas iguais”[2], estabelecendo afastamento entre negros e brancos nos trens, estações ferroviárias, cais, hotéis, barbearias, restaurantes, teatros, entre outros. Em 1885, a maior parte das escolas sulistas também foram divididas em instituições para brancos e outras para negros. Houve “leis Jim Crow” por todo o sul. Apenas nas décadas de 1950 e 1960 a Suprema Corte derrubaria a ideia de “separados, mas iguais”.

 

Os entraves sociais promovidos pelas leis de segregação racial nos EUA e o violento racismo daí decorrente, só começariam, ser parcialmente resolvidos com os movimentos de luta pelos direitos civis dos negros, entre os líderes desses movimentos, destacou-se Martin Luther King Jr.

 

Conveniente citar literalmente parte do discurso de Martin Luther:

 

Eu tenho um sonho: o de que, um dia, nas colinas vermelhas da Geórgia, os filhos dos antigos escravos e os filhos dos antigos senhores de escravos poderão se sentar juntos à mesa da fraternidade.”

 

Com esse famoso discurso, conhecido como I have a dream (Eu tenho um sonho), proferido na cidade de Washington D.C., Martin Luther King Jr., (1929-1968) marcou um dos principais momentos da luta contra a opressão racial nos EUA. Sua biografia revela que era filho de um pastor batista, King seguiu os passos do pai também se transformando em pastor, chegando ainda a se doutorar em teologia na Universidade de Boston, em 1955.

 

Em 1964, aos trinta e cinco anos, Martin se tornara o mais jovem ganhador do Prêmio Nobel da Paz em face de sua luta contra segregação e opressão racial nos EUA. Sua luta era pacifista inspirada na atuação de Gandhi e na desobediência civil.

 

A pioneira na luta foi Rosa Parks que passou a não aceitar essa segregação. Logo em seguida, Luther King aderiu ao movimento. O boicote no transporte coletivo durou 382 (trezentos e oitenta e dois) dias, período em que Luther King ficou preso, tendo sua casa como alvo de bombas e sendo submetido a abusos pessoais.

 

O resultado foi a decisão da Suprema Corte dos EUA, em 1956, de que a segregação racial em locais públicos nos EUA era ilegal. Era uma vitória do movimento negro na conquista de direitos civis.[3]

 

Essa proposta de ação, pautada na não violência e na desobediência civil, contrastava com a de outros grupos da luta contra a opressão racial nos EUA, como os Panteras Negras[4] e os muçulmanos negros liderados por Malcom X, que eram adeptos de ações de confrontos violentos contra o Estado.

 

Após o boicote de 382 dias, Martin Luther King tornou-se uma liderança nacional no movimento negro dos EUA. Em 1957, foi eleito presidente da Conferência dos Líderes Cristãos do Sul (Southern Christian Leadership Conference, SCLC). Luther King aliava em sua prática política ideais cristãos de igualdade com a tática da desobediência civil e da não violência de Gandhi.

 

Não obstante a retórica contrária e a linguagem de liberdade e igualdade em seus principais documentos fundacionais, os EUA adotaram o racismo desde sua fundação.  Ao longo de quase duzentos e cinquenta anos de existência da nação norte-americana, as elites brancas deliberadamente construíram e sustentaram a sociedade fulcrada na supremacia branca.

 

E, os primeiros colonos vindos da Inglaterra, desenvolveram uma nação colonizada através do deliberado genocídio dos povos indígenas da América do Norte, confiscando suas terras, e de forma engenhosa, subtraindo-as.

 

Aliás é infame chamá-los de "índios" devido ao horrendo erro de navegação cometido por Cristóvão Colombo, bem como dos mexicanos que também sofreram pois tiveram porções territoriais do México anexadas por colonos ingleses.

 

Afora isso, os colonizadores passaram a chamar a si mesmo de brancos e criar raças para os outros, cuja exclusão de seu regime desejavam. E, os africanos foram transformados em negros ao serem retirados de sua origem e transportados por navios negreiros, sendo acorrentados e forçados a trabalhar sem qualquer compensação e, isso perdurou por dois séculos e meio.

 

Toda a riqueza da nação norte-americana foi constituída à medida em que as elites brancas exploravam econômica, social e politicamente] aqueles definidos como não brancos, mestiços ou híbridos.

 

Por outro lado, foi justamente o trabalho negro que fez com que os EUA passassem de uma economia pobre para uma economia potente e gigante com uma pujante produção agrícola.

 

Em síntese, os colonizadores europeus cunharam raças, para si mesmos e também para outros seres humanos, criando sua própria supremacia branca, assim construíram uma hierarquia racial, subjetivando a esta todos os demais. 

 

Ergueram o privilégio com a categorização dos fenótipos ou tons de pele e com a exploração, todos esses atos entrelaçados, apesar de terem sido criados de modo inconsistente e ilógico. Desta forma, alguns europeus do Norte e seus descendentes mantiveram-se no topo da hierarquia racial, elaborando sistemas de classificação racial e criando crenças raciais justamente com sistemas de sanção para aqueles que não cumprissem tal lógica racial.

 

Tanto as ciências naturais como as sociais deram importantes passos para responder a tantas incômodas questões.

 

A definição de raça[5] é feita com base num sistema de classificação humana que visa classificar seres humanos em categorias distintas de acordo com constelação de traços físicos, cognitivos e culturais, cuja existência se acredita ser hereditária, distintiva e largamente inescapável.

 

Contudo, os seres humanos não podem ser classificados dessa forma[6]. E, nem vivemos o suficiente nesse planeta para terem surgidos diferentes subespécies que atualmente denominamos de raças. 

 

Em verdade, não existe traço biológico ou genético que marque definitivamente um indivíduo como membro de um grupo racial em detrimento de outro, tampouco existe qualquer outra característica que o identifique todos os membros de um único grupo racial como distintos de todos outros grupos raciais.

 

Há mais de um século de evidência científica demonstraram que raças humanas tais como subespécies raciais atreladas a um fenótipo e outras características genéticas ou biológicas não existem. A crença na possibilidade de se categorizar cientificamente os seres humanos, como por exemplo, o racialismo, que deriva na fé no positivismo (crença que o conhecimento advém de métodos científicos que podem ser aplicados, de modo preciso e empírico, ao comportamento humano).

 

Todavia, o positivismo é apenas uma crença, tal como o é o racialismo, nenhum desses sistemas de crenças pode apresentar a ideia de raça como cientificamente válida.

 

Existem nos EUA ou somos induzidos a pensar que existem quatro grupos raciais: brancos, asiáticos, hispânicos ou latinos e negros. Esse esquema classificatório termina por considerar pessoas com cabelo cacheado como brancas ou negras; pessoas com pele morena ora como asiáticas ou como negras; enquanto que todos os grupos possuem pessoas com lábios grandes e pequenos.

 

Os materiais genéticos são parecidos com nossos olhos no que tange à definição de raças, mas existem cientistas naturais que ainda buscam por uma ferramenta confiável para classificação racial[7] e, muitos possuem a esperança de que o esclarecimento quanto ao genoma humano[8], finalmente nos conduzirá até a verdade total.

 

Definitivamente não existe meio cientificamente válido para classificar humanos em raças, cientistas sociais estão cada vez mais certos de que raça é apenas uma construção social; significando que raças são ficções criados pelo homem, de mentes que se baseiam em fatores que não tem significado, embora lhe seja atribuído um significado por construções feitas por nós e com as quais (alguns de nós) concordamos

 

O esquema classificatório mais comum emprega o fenótipo os racialistas e racistas acreditam que as pessoas com certas características físicas, tais como textura ou curvatura capilar, grau ou ausência de melanina na pele, cor de íris, espessura de lábios pode ser associada a certa raça[9].

 

São atores sociais que decidem utilizar as características fenotípicas para atribuir pessoas a raças, declarando pessoas como racialmente parecidas. Porém, quando realizamos tais atribuições, ignoramos, de forma incoerente, uma enorme lista de elementos que distinguem tais pessoas, incluindo a naturalidade, língua, cultura, parentalidade e ancestralidade.

 

Por exemplo, nos EUA, ilogicamente, acreditamos que a prole de uma pessoa “branca” com uma pessoa “negra” necessariamente será “negra”, devido à aderência a uma regra de hipodescendência aplicada a pessoas com qualquer grau de “negritude” – exceto se tal indivíduo for “branco” o suficiente e viver de modo a evitar sua detecção como uma pessoa negra.

 

Categorias raciais estão em constante uso nos EUA, ainda que mudem com o tempo. Nesse país, a identificação racial consta de formulários cotidianos: candidaturas para empregos, questionários médicos, matrículas escolares, e até no acesso a edifícios em seu controle de visitantes!

 

Como já foi mencionado anteriormente, a maioria das pessoas, nos EUA, diria que há por volta de quatro categorias: brancos, asiáticos (e ilhéus do Pacífico), latinos e negros[10].

 

Crucial é entender que quanto à raça diferentemente de etnia[11] ou outras formas classificatórias de seres humanos, tal categorização hierárquica, com brancos na posição mais altas e negros nas posições mais baixas. Porém, ainda que saibamos que raça é proclamada como construção social, que tem consequências consideráveis.

 

Os norte-americanos partilham um conjunto comum de ideias sobre como rotular as pessoas como membros de uma determinada categoria social, ou seja, há um senso comum racial.

 

E não é apenas aplicado na rotulagem, mas também dita as expectativas sobre seu comportamento e, ainda, define como tais pessoas devem se comportar diante de pessoas racialmente diversas.

 

Assim, quando não cumprida essas expectativas sobre seu comportamento, surgem as sanções raciais. Que podem ser brandas, como mera desaprovação verbal e que podem ser rigorosas e cruéis, quando alguém se encontra nas mãos de membros de um grupo de ódio, que constitui uma milícia racial destinada a defender uma ordem racial estrita.

 

Tais fundamentos que organizam a ordem racial tal como as hierarquias e sanções são vistos como elementos estruturantes do paradigma racial dos EUA.

 

A maior parte dos norte-americanos – incluindo cientistas – pensa de uma forma muito mais racializada do que podemos esperar, e o essencialismo biológico é muito mais prevalente do que a ideia de que raça é uma mera construção social. Ao examinarem ancestralidade e etnicidade, os  norte-americanos determinam (com ações e palavras) que tais conceitos também são relacionados à ideia de raça.

 

Aderimos à crença de que raça tem um sentido real (talvez no que diz respeito à produção de aptidões e propensões para o sucesso econômico,  habilidades parentais, ou comportamento criminal) que pode ser aplicado a grupos raciais, ainda que a forma de se classificarem os seres humanos  seja variada e desorganizada (primeiro através da aparência física e do sangue e, mais recentemente, através dos genes), levando a categorias  raciais em constante mutação e que são nebulosas. Por certo, os antirracistas necessitam lutar contra todas essas desigualdades  e as crenças que as sustentam.

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Há interessante episódio da política norte-americana ocorrido em 1860 quando o Senador Jefferson Davis fez um discurso, opondo-se

às verbas federais destinadas à educação de negros e, declarando que a indiferença racial existia desde sempre mas que o governo não fora

fundado por negros e nem para negros, mas sim, por homens brancos para homens brancos.

 

A Guerra Civil Americana começaria logo no ano seguinte e terminaria somente em 1865, com a libertação daqueles que se tornaram

escravos pela escravidão racial. As ficções raciais que historicamente transformaram a escravidão uma realidade e que continuou a moldar

as iniquidades raciais contemporâneas.

Todo esse contexxto explica como compreendemos um ao outro como seres étnicos, formando nosso conhecimento quanto a quem pertence à nação e quem

nunca será incluído, também contribuindo para nosso conhecimento quanto a quem pertence à nação e quem nunca será incluído.

 

A inequidade significa tratar os desiguais igualmente, não saber agir perante o diferente, achar que todos devem ser tratados igualmente.

 

As inequidades raciais nos EUA são evidentes. Portanto, faz sentido começar a tratar as desigualdades raciais no nascimento e na morte.

 

E, notoriamente nos EUA são os pobres entre os países mais desenvolvidos no que tange aos cuidados com os recém-nascidos e com as recém-mães, tendo caído no ranking o do sexto lugar para vigésimo-sexto lugar nos últimos cinquenta anos.

 

A cada ano, 23.000 recém-nascidos morrem nos EUA, antes de seu primeiro aniversário. Os resultados têm influência de questões raciais, uma vez que a maior parte dessas mortes envolve não brancos. Na capital do país, Washington DC, o distrito mais pobre (Ward 8, onde residentes negros são maioria) tem uma taxa de mortalidade infantil que é 10 vezes maior que aquela observada no distrito mais rico (Ward 3, com residentes predominantemente brancos).

 

Na costa oposta, em São Francisco, mães negras têm 8 (oito) vezes mais chances de sofrer com a morte de seu filho recém-nascido do que as mães brancas.

 

Tem se tornado evidente que a razão de tal disparidade se vincula a uma questão de racismo[12], não sendo apenas decorrente do fato de elas se situarem em classificações raciais distintas.

 

Em que pese a taxa de mortalidade infantil geral ter caído desde 1950, a diferença entre a mortalidade infantil de  negros e brancos, em verdade, cresceu nas quatro décadas subsequentes e chega, agora, à situação na qual um número 50% maior de crianças negras morre no primeiro ano de vida, em comparação com o de crianças brancas.

 

Quando negros norte-americanos sobrevivem à infância, eles têm a menor expectativa de vida (74,6 anos) dentre todos os grupos raciais, enquanto asiáticos e latinos[13] têm a maior expectativa, no patamar de 86,5 e 82,8 anos, respectivamente, e brancos têm a expectativa de 78,9 anos.

 

Percebe-se que a qualidade de vida de uma pessoa nos EUA, entre seu nascimento e morte, varia enormemente desigualmente entre as raças.

 

A título de exemplo, negros e indígenas (indígenas norte-americanos e nativos do Alasca) têm performance muito inferior a dos brancos, na maioria dos indicadores de saúde, enquanto que os latinos e asiáticos possuem desempenho pior em alguns e melhor em outros.

 

As pessoas adultas não brancas possuem maiores chances de estar sem seguro de saúde para promover as melhores condições de assistência.

 

Contudo, as disparidades raciais ou étnicas existem mesmo quando existem similaridades em termos de cobertura por seguro de saúde, renda, idade e, gravidade de condições médicas ou clínicas. Por ser a taxa de mortalidade de câncer, doenças cardíacas e diabetes significativamente maior entre as minorias raciais e étnicas[14] do que entre brancos, tais disparidades são inaceitáveis.

 

Assim, nos EUA as raças têm vidas segregadas e, todas as grandes cidades são hipersegregadas, significando afirmar que a segregação racial é evidente, independentemente de como seja medida.

 

A segregação é fator que contribui para problemas, entre estes, o não menos importante, o racismo do meio ambiente uma vez que, quando comparados aos brancos, os negros sofrem com os maiores níveis de exposição a toxinas, tanto em razão da segregação geográfica, quanto pelo fato de empresas poluírem mais em áreas habitadas por negros.

 

Homens jovens negros com idades entre 18 e 34 anos têm seis vezes mais chances de ser presos do que seus pares brancos. O número desproporcional de não brancos presos encarcerados e jogados nas amarras do sistema de justiça criminal tem efeitos devastadores nas comunidades dessas pessoas.

 

A existência de ficha criminal torna o acesso ao mercado de trabalho excessivamente difícil para ex-detentos não brancos. A alta taxa de encarceramento diminui enormemente as possibilidades de matrimônio para mulheres não brancas, afetando negativamente a renda e a estabilidade familiares.

 

Além disso, o encarceramento, muitas vezes, leva à exclusão política de pessoas negras, a tal ponto que acadêmicos começam a considerá-la a reencarnação do regime de opressão de Jim Crow. É justo concluir que o encarceramento em massa, tendente à prisão de pessoas não brancas, eleva a opressão racial nos Estados Unidos a níveis alarmantes, na contemporaneidade.

 

Existem outros indicadores de qualidade de vida demonstram disparidades raciais similares. O relatório publicado pelo Centro de Pobreza (CPI) e  Desigualdade da Universidade de Stanford no ano de 2017 se concentrou em 10 áreas de desigualdade (emprego, pobreza, uso de seguridade social,  moradia, educação, encarceramento, saúde, renda, riqueza e mobilidade), tendo concluído que profundas desigualdades existem e persistem em muitos  desses setores, e que as diferenças entre brancos dominantes e não brancos são substanciais e sua diminuição vem ocorrendo de forma mais lenta ou  deixando de ocorrer por completo.

 

O emprego de homens negros norte-americanos tem sido mais baixo do que o de outros homens desde o início do registro  desses dados; o emprego dos primeiros atualmente se encontra em patamar de 11 a 15% menor do que o de homens brancos, e tem sido esse o cenário todos  os meses, desde janeiro do ano 2000.

 

A recuperação total no emprego, após a Grande Recessão de 2008, alcançou todas as áreas da população, exceto homens negros. A retenção do emprego também é permeada por disparidades raciais: enquanto apenas 1 em 18 brancos tem medo de perder o emprego no prazo de um ano, 1 em 9 negros e 1 em 6 hispânicos têm o mesmo receio.

 

Negros empregados sofrem com desigualdade salarial, e a pobreza marca o grupo como um todo. Logo após o Movimento dos Direitos Civis, alguns ganhos foram obtidos no que diz respeito à disparidade salarial, mas ainda hoje a renda média de homens negros é 32% menor que a de homens brancos – em quatro décadas, a disparidade salarial teve uma redução de apenas 7%.

 

Paralelamente, a diferença salarial média entre homens brancos e hispânicos foi de 29% a 42%, essencialmente em razão de a legislação anti-imigração ter aumentado a desigualdade

 

Em paralelo, brancos e asiáticos possuem as menores taxas de pobreza na nação de 11,5% e 11,2%, respectivamente, enquanto negros, indígenas e hispânicos têm taxas de, respectivamente, 24%, 27% e 21%.

 

Tais grupos altamente afetados pela pobreza dependem mais da rede de seguridade social do país. Famílias negras, hispânicas e indígenas têm chances 57%, 51% e 41% menores de ter casa própria hipotecada, respectivamente, se comparadas às famílias brancas.

 

O ônus de se pagar pela moradia, considerando-se as diferenças de empregabilidade e salário, é considerável: 20% dos locatários negros e hispânicos gastam mais de metade da sua renda com moradia e correm maior risco de despejo.

 

Em contraste, 1 em 6 negros ou hispânicos com casa própria despendem metade da sua renda com moradia, enquanto o dado para proprietários brancos é de 1 em 12.

 

Um estudo da Tufts University demonstrou que “Brancos acreditam que substituíram os negros como vítimas de discriminação racial nos Estados

Unidos contemporâneos”. Além disso, para eles, os ganhos obtidos por pessoas negras são associados com uma tendência antibranca, em um jogo racial no

qual um só ganha se o outro perder (“jogo de soma zero”). Por certo, brancos veem os ganhos de não brancos como “racismo reverso” e creem que esse é

um problema maior do que o racismo contra negros! As percepções dos negros são bastante diversas – pessoas negras nos EUA não veem a existência de um

jogo de soma zero, e acreditam que as supostas perdas não ocorrem quando obtêm vitórias em lutas pela igualdade.

 

 

O que veio antes, a ação racista ou o pensamento racial? Isso pode ser debatido. Alguns sustentam que nem mesmo teríamos raças se seres humanos não insistissem na desigualdade entre eles e aqueles vistos como racialmente inferiores.

 

Em outras palavras, alguns acadêmicos sugerem que a desigualdade racial causa nossa percepção de existência e visibilidade de diferenças raciais entre seres humanos.

 

Se eles estiverem certos, tornar as “raças” iguais ajudaria muito a resolver os problemas raciais dos EUA. Faz sentido, portanto, examinar a luta contra “disparidades raciais [que são] mais antigas que a vida dos Estados Unidos”.

 

Como é sabido, a noção de raça foi inventada por europeus, que se autodenominavam brancos e se colocavam em supremacia, criando, por outro lado, negros, os quais subordinavam através da escravidão racial.

 

O regime escravagista norte-americano se aproximou metaforicamente de uma jaula de ferro de dominação humana. Os pesquisadores da escravidão norte-americana tais como Aptheker, e Franklin concordam que a escravidão racial foi um complexo sistema de sujeição.

 

O sistema escravagista utilizava de medidas duras e cruéis tais como o assassinato, castigo com chicote e outras formas brutais de punição, restrições ao deslocamento e a relações sexuais, ignorância imposta, violência ideológica e mental e monitoração constante para que se manter.

 

A escravatura norte-americana se estender por mais de dois séculos, existia um complexo controle militar, aliás, praticamente todos os homens adultos brancos eram responsáveis pelo serviço de patrulhamento.  Mesmo a aristocracia manteve brancos como vigilantes que eram recompensados com rendas e status modesto com base na ideia de que melhores do que os escravos negros.

 

Através de brutal exploração dos escravos, a aristocracia branca sulista acumulou enorme riqueza e construiu um elaborado império fundado na produção de algodão, tabaco e outras commodities. E, as elites europeias também dependiam dessa escravidão negra, na América e, em outros lugares, para alimentar seus ambiciosos impérios.

 

Sob a escravidão, a pele negra e a dominação branca se tornaram entrelaçadas, o que levou a uma característica duradoura de uma sociedade estadunidense que  provocou terrorismo racial sobre não brancos, enquanto proclamava: “[...] consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas,  que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade  e a procura da felicidade”

 

Os negros norte-americanos sempre participaram de protestos individuais e coletivos contra a opressão racial. A resistência negra à escravidão teve início dentro de navios negreiros, durante a passagem transatlântica.

 

Nos navios, traficantes de escravos e seus vigilantes tinham de se manter sempre alertas para prevenir rebeliões e controlar aquelas que se iniciavam em condições desafiadoras. Em muitos casos, escravos rebelados tomavam os navios negreiros, matavam traficantes brancos e retornavam à África. Alguns navios vagavam eternamente no mar quando rebeliões os tiravam de curso.

 

Também era comum que escravos se jogassem no mar, optando pela morte em vez da escravidão em uma terra desconhecida. Decerto, o protesto negro contra a escravidão nasceu dentro de navios negreiros, pois sua carga humana lutou implacavelmente pela liberdade.

 

Os escravos que aportavam em solo norte-americano se rebelavam, não obstante toda brutalidade hostil e da intensa vigilância que acompanhava sua condição de escravos.

 

E, através de protestos, escravos majoravam os custos da subordinação racial e do terror que era usado para mantê-los obedientes, transformando a instituição cruel em um negócio de alto risco e perigoso, o que levou, posteriormente, à sua derrocada.

 

Assim, os negros escravos nos EUA frequentemente interrompiam os mecanismos da escravidão através de atos de resistência, que incluíam a automutilação, o suicídio, abortos indetectáveis, envenenamento de senhores e a provocação de incêndios e desastres de toda espécie.

 

Após muitos anos de servidão, os escravos educaram-se a si mesmo, construindo organizações comunitárias e, por vezes, utilizavam disfarces com várias camuflagens, como árvores na floresta. Especialmente relevante foi a igreja negra, que inicialmente era invisível ao olho não convertido.

 

E, com passar dos tempos, a igreja se tornou uma instituição feita de tijolo e argamassa, mas, mesmo nessa forma edificada, continuo a apresentar diferentes disfarces ao mestre e aos congregantes de escravos.

 

A resistência coletiva e organizada emergiu da Igreja e de outras formas de organização. Tal resistência se manifestou através da redução do ritmo laboral, na complexa ferrovia subterrânea, pela qual os escravos escapavam para serem livres e, de revoltas organizadas que ameaçavam o terrível regime. As revoltas de escravos negros continuaram a baquear o regime e a supremacia branca, instaurando a instabilidade e tornando a escravidão num alvo frontalmente atacado.

 

Du Bois, em sua obra clássica intitulada Black Reconstruction, elucidou como os escravos negros libertaram a si mesmos, dentro do contexto da Guerra Civil Americana, a qual correspondeu a um conflito entre os Estados do Norte (a União), que temiam a dominação da economia escravagista e mais robusta dos Estados do Sul, e os sulistas escravagistas ou a Confederação.

 

Du Bois demonstrou que a Confederação teria provavelmente ganhado a guerra, não fosse pelas determinadas insurreições de escravos e os danos que elas causaram ao Sul. Através dos anos de aparentemente interminável servidão, os protestos de escravos enfraqueceram a instituição, levando à sua completa queda. Eles provaram que Frederick Douglas estava correto: “Aquele que seria livre deve dar o primeiro golpe”.

 

O regime Jim Crow permitiu que brancos capitalistas do Sul levassem os negros de volta às plantações, forçando-os a trabalhar em troca de uma compensação que mal gerava uma renda de subsistência, num sistema de débito servil.

 

Como possuidores de fração da terra cultivada, os antigos escravos ficavam endividados perante seus antigos senhores, presos num sistema de contabilidade que tornava impossível o acúmulo de dinheiro suficiente para se tornarem economicamente independentes ou providenciarem abrigo e comida de forma adequada às suas famílias.

 

Sob o regime Jim Crow, as elites brancas prosperaram, e as classes trabalhadoras brancas continuaram a servir como intermediárias raciais, possuindo uma renda um pouco maior do que aquela obtida por negros. 

 

Tais disparidades raciais de renda e o bônus do privilégio racial foram suficientes para desencorajar a união entre trabalhadores brancos e negros em uma classe. O regime em questão correspondia a um sistema tripartite de dominação, uma vez que controlava os negros política, social e economicamente.  Durante as nove décadas do regime Jim Crow, os negros do Sul não possuíam direitos políticos que os brancos devessem respeitar.

 

A exclusão dos negros significava que eles não podiam participar como jurados em júris populares, nem eleger membros da classe política. Sem direitos políticos, as pessoas negras não podiam proteger seus interesses.

 

Além disso, elas eram constantemente restringidas, política e socialmente, por ameaças constantes de terror, inclusive linchamento.

 

A dominação racial que os negros vivenciaram sob o regime Jim Crow foi pessoal e humilhante. O sistema estabelecia uma rígida segregação racial entre brancos e negros. Ao analisar tal forma de dominação, Morris concluiu:

         O sistema Jim Crow trabalhou para estampar nos negros a ideia de que estes constituíam uma população subordinada, ao forçá-los  a viver em uma sociedade separada e inferior [...] os negros tinham de utilizar banheiros separados, frequentar escolas separadas, sentar-se no fundo de ônibus e trens, dirigir-se a brancos enquanto eram tratados de forma desrespeitosa, jurar com bíblias  diferentes em um tribunal, comprar roupas sem experimentá-las antes, passar por mesas ‘apenas para brancos’ após adquirirem comida, e viajar sem dormir, pois hotéis não os hospedavam.

 

A vigência formal do regime Jim Crow, que perdurou por nove décadas, correspondeu a um sistema brutal de dominação racial, legitimado pela lei, pela violência e pelos costumes.

 

Por conta dele, em meados do século XX, as enormes populações negras nos Estados Unidos eram pobres, sem teto, tinham baixo índice de escolaridade e batalhavam contra a intimidação produzida pela violência. Ainda assim, tal como fizeram durante a escravidão, os negros nos EUA resistiram ao regime Jim Crow desde o princípio.

 

Tal resistência teve início no final do século XIX e persistiu durante o século XX. Boicotes, ações judiciais, marchas e outras formas de resistência, incluindo a proliferação de organizações de protesto, avançaram o ataque contra a segregação e as desigualdades raciais.

 

Já na década de cinquenta, a comunidade negra passou por considerável urbanização em face da migração dos negros do Sul para as cidades do Norte e, então, as instituições urbanas, especialmente, a Igreja, eram mais fortes e mais capazes de mobilizar e apoiar um movimento de massa contra o regime Jim Crow.

 

O boicote ao ônibus em Montgomery teve como base essas instituições e organizações comunitárias negras e logo evoluiu para um movimento de massa. Liderado pelo carismático líder Martin Luther King Jr., o movimento escolheu o método de ação direta não violenta como uma tática principal para derrotar o regime Jim Crow. Também nova para o movimento foi a mobilização em massa.

 

Em tempos anteriores à ação de Montgomery, as lutas antirracistas tendiam a ser iniciadas por indivíduos ou travadas por poucos litigantes e advogados na justiça. O boicote ao ônibus se diferenciou enormemente de tais esforços: ele envolveu as massas negras diretamente numa atividade organizada que pretendia perturbar o status quo.

 

O Reverendo James Lawson, um grande estrategista do movimento, explicou a diferença que fez a ação direta de massa não violenta: “Muitas pessoas, quando sofrem e veem seu povo sofrendo, querem participação direta. Então, você põe nas mãos de todos os tipos de pessoas comuns uma alternativa positiva à impotência e à frustração. Essa é uma das grandes coisas da ação direta”.

 

Martin Luther King Jr., concordando com Lawxon, explicou como o poder da perturbação fora usado para obtenção de mudança. A ação direta não violenta objetiva criar uma crise e, enfim, estabelecer uma tensão criativa, de modo que uma comunidade, que sempre se recusou a negociar é forçada a confrontar a questão.

 

Assim, o boicote ao ônibus mudou inteiramente a lógica da resistência antirracista, e o sucesso de tal ação foi confirmado com o término da segregação nos ônibus de Montgomery.

 

Partindo de tal vitória, grandes ações diretas não violentas passaram a incluir outros boicotes, grandes marchas, sit-ins[15], detenções em massa, demonstrações em massa e outras técnicas deliberativamente criadas para incomodar a ordem do regime Jim Crow.

 

A ação direta não violenta modificou a distribuição de poder entre os dominadores e os dominados em razão da sua capacidade de perturbar a ordem social de forma simples e eficiente. Sistemas de dominação perduram, pois monopolizam o poder nas mãos daqueles em posições altas e impõem uma ausência de poder aos dominados.

 

Os movimentos sociais podem gerar a força necessária para a mudança através da mobilização; uma comunidade faz um pacto para explicitamente recusar que as coisas funcionem como sempre. Os participantes do Movimento dos Direitos Civis[16] aperfeiçoaram o uso efetivo de ações diretas não violentas a partir de meados da década de 1950 e na década de 1960.

 

Quando grandes mobilizações forçaram o governo federal a passar a Lei de Direitos Civis de 1964, a qual baniu todas as formas de segregação racial, uma grande vitória contra o regime de Jim Crow foi finalmente alcançada.

 

Outras mobilizações, em 1965, fomentaram a adoção, pelo governo federal, da Lei de Direitos de Voto, a qual trouxe a inclusão dos negros do Sul e retirou outro pilar do regime Jim Crow, que vedava a participação política de pessoas negras.

 

Se, por um lado, tais conquistas foram notáveis, por volta de 1955 ficava claro que a remoção das barreiras estabelecidas pelo regime Jim Crow não excluiria os efeitos de séculos de opressão econômica e social que debilitara pessoas negras, suas economias e comunidades.

 

Uma intervenção direta, na forma de ação afirmativa, era necessária para que fosse endereçada essa privação e, em 1965, o Presidente Johnson apoiou sua adoção para que fossem remediadas as dificuldades sofridas pelas pessoas negras, tendo afirmado:

 

Mas liberdade não foi suficiente. Não se podem varrer as cicatrizes de séculos ao dizer: ‘Agora vocês estão livres para ir para onde quiserem, fazer o que quiserem, e escolher os líderes que lhes agradam’. Deram-lhe a liberdade, porém, não a igualdade.

 

Não se pega uma pessoa que, por anos, ficou acorrentada e a liberta, trazendo-a para a linha de início de uma corrida, dizendo: ‘Você está livre para competir com todos os outros’, acreditando-se que tal situação é justa.

 

Assim, não é suficiente apenas abrir os portões da oportunidade. Todos os nossos cidadãos precisam ter a possibilidade de caminhar por esses portões.

 

Bastou apenas uma década, o Movimento dos Direitos Civis derrubou o regime formal de Jim Crow[17] e abriu a possibilidade de implementação de medidas tangíveis que foram necessárias para haver a equalização da qualidade de vida entre as raças.

 

E a queda do referido regime certamente abriu a oportunidade para novas possibilidades, o que incluía a eleição de Barak Obama, que foi o primeiro presidente negro dos EUA, quatro décadas posteriores.

 

A tese da inferioridade negra impedia ver que ele era oprimido e o resultado foi a internalização de tal mentira, tanto que muitas pessoas negras nos EUA sofriam e sofrem ainda de baixa estima. E, vários instituições norte-americanas incluindo a mídia, o mercado de trabalho, escolas, universidades acreditavam nas visões da supremacia branca que estavam presentes em cada um.

 

Surgiu novo movimento, como o Black Power surgiu no final da década de sessenta e no início da década de setenta, para erradicar a tese de inferioridade negra e para buscar o poder, em vez de uma mera integração racial. Assim, tal movimento defendia novo modo de se encarar a negritude. Negro é lindo, ou seja, black is beautiful. E se tornou tema central na arte, na literatura do movimento de Renascimento do Harlem, na década de 1920.

 

Já o Movimento Garvey, da década de 1920, contribuiu para essa perspectiva empoderada, ao promover o orgulho negro. O Movimento Black Power popularizou essa perspectiva nas massas, lutando pelo estabelecimento de Estudos Negros (“Black Studies”), especialmente em universidades, explorando nobres heranças negras presentes na Diáspora Africana.

 

Raça e etnia são dois conceitos relativos a âmbitos distintos. Raça refere-se ao âmbito biológico; referindo-se a seres humanos, é um termo que foi utilizado historicamente para identificar categorias humanas socialmente definidas.

 

As diferenças mais comuns referem-se à cor de pele, tipo de cabelo, conformação facial e cranial, ancestralidade e genética. Portanto, a cor da pele, amplamente utilizada como característica racial, constitui apenas uma das características que compõem uma raça.

 

Entretanto, apesar do uso frequente na Ortodontia, um conceito crescente advoga que a cor da pele não determina a ancestralidade, principalmente nas populações brasileiras, altamente miscigenadas.

 

Etnia refere-se ao âmbito cultural; um grupo étnico é uma comunidade humana definida por afinidades linguísticas, culturais e semelhanças genéticas. Essas comunidades geralmente reclamam para si uma estrutura social, política e um território.

 

Nos EUA do século XXI, a escravidão e a opressão legal do regime de Jim Crow estão rigidamente proibidas por lei. Realmente a discriminação racial é francamente tida como politicamente incorreta, mesmo no Brasil, a Lei Caó, em homenagem Carlos Alberto Caó de Oliveira que era jornalista, advogado e militante do movimento negro. Surgiu a Lei 7.716 que define os crimes de racismo[18].

 

Os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Tais crimes, estão obstaculizando o acesso de pessoa devidamente habilitada a um cargo público ou negar emprego na iniciativa privada, que podem render penas de dois a cinco anos de reclusão.

 

O crime de racismo é tipificado por uma conduta discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade e não depende de representação da vítima podendo a denúncia ser realizada pelo Ministério Público. Já a injúria racial é a ofensa à honra de  uma pessoa, usando, para tanto, elementos como raça, cor, etnia, religião. E, nesse caso, a vítima precisa apresentar representação contra o ofensor.

 

Em nosso país, há outras legislações relevantes na luta para combater a discriminação racial, entre estas, o Estatuto da Igualdade Racial, sancionada em julho de 2010 (Lei 12.288/2010)[19] e cujo objetivo é garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

 

Outra legislação que teve efeitos polêmicos foi a criação de cotas raciais[20], sancionada em agosto de 2012, para regular uma prática que já era adotada por algumas instituições de ensino superior, como a Universidade de Brasília, que foi pioneira.

 

A referida lei reserva uma quantidade de vagas em universidades federais para negros e indígenas, proporcional ao número de negros e indígenas na unidade da Federação em que a instituição está instalada.

 

Referências

 

DU BOIS , W. E. B. Souls of black folk . Chicago: A. C. McClurg , 1903.

­­­­­­­­­­­­­­­­­_________________. Black Reconstruction in America . Nova York : Henry Holt , 1935.

FLEMING , C. M. ; MORRIS , A. Theorizing Ethnic and Racial Movements in the Global Age: Lessons from the Civil Rights Movement .  Sociology of race and ethnicity , jan . 2015.

FRANKLIN , J. H. From slavery to freedom . Nova York: Alfred A. Knopf, 1967.

ING JR., M. L. Letter from a Birmingham Jail. Liberation: an independent monthly, v. 8, n. 4, 1963.

KARNAL, Leandro; DE MORAIS, Marcus Vinícius; FERNANDES, Luiz Estevam;  PURDY, Sean. História dos Estados Unidos; das origens ao século XXI. São Paulo: Editora Contexto, 2012.

KING JR., M. L. Honoring Dr. Du Bois. Freedom ways, v. 8, n. 2, spring 1968. 

LAWSON, J. Interview with Aldon Morris, Los Angeles, oct. 1978.

MORRIS, Aldon; TREITLER, Vilna Bashi. O Estado Racial da União: compreendendo raça e desigualdade racial nos Estados Unidos

da América. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-49792019000100015  Acesso em 14.03.2020.

STEINBERG, S. The ethnic myth: race, ethnicity, and class in America. 3. ed. Nova York: Beacon Press, 2001. 

Biblioteca do Senado Federal. Igualdade racial e étnica. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/520765/igualdade_racial_e_etnica_1ed.pdf Acesso em 14.3.2020.

 

 

 

 

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Sobre a autora
Gisele Leite

Gisele Leite, professora universitária há quatro décadas. Mestre e Doutora em Direito. Mestre em Filosofia. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Possui 29 obras jurídicas publicadas. Articulista e colunista dos sites e das revistas jurídicas como Jurid, Portal Investidura, Lex Magister, Revista Síntese, Revista Jures, JusBrasil e Jus.com.br, Editora Plenum e Ucho.Info.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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