O período descontínuo na aposentadoria por idade rural:

uma análise acerca do princípio da igualdade e justiça social

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31/05/2020 às 14:22

Resumo:


  • A inclusão do trabalhador rural na previdência social brasileira foi um avanço significativo, garantindo proteção financeira a essa classe trabalhadora, especialmente considerando a informalidade e instabilidade de sua atividade.

  • O Segurado Especial, categoria que inclui o trabalhador rural, possui tratamento diferenciado na previdência, com possibilidade de acesso a benefícios sem contribuição direta e com a comprovação da atividade rural por meios alternativos.

  • O "período descontínuo" na atividade rural é um conceito presente na legislação previdenciária que permite ao trabalhador rural intercalar períodos de atividade rural e urbana sem perder o direito à aposentadoria por idade rural. Contudo, a falta de clareza na lei quanto à definição desse período gera insegurança jurídica e discricionariedade nas decisões, afetando a igualdade e a justiça social.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

CONCLUSÃO

O presente trabalho se propôs ao reconhecimento do Segurado Especial diante dos princípios constitucionais de proteção social-previdenciária. Tendo como relevante ponto o chamado período descontínuo, que, nos termos do artigo 48, § 2º da lei 8.213/91, possibilita que este segurado comprove o exercício do seu labor rural, mesmo que exista afastamento da atividade agrícola, a fim de que possa ter o respectivo direito ao benefício previdenciário resguardado.

Todavia, no que se refere à aplicação do referido dispositivo, verifica-se que o legislador não estabeleceu de forma definitiva a atuação do aplicador do direito quanto a forma de contagem desse tempo, permitindo uma atuação discricionária deste, o que pode gerar prejuízo ao segurado, visto que há possibilidade de julgamentos desiguais em casos concretos idênticos, dependendo da época de cada período descontinuado na atividade rural.

Assim, na busca por uma possível solução para essa lacuna legislativa, que possibilite cumprimento do princípio da igualdade diante da aplicação dos julgados, em prol da almejada justiça social, analisou-se, inicialmente a inclusão do trabalhador rural na previdência social, a partir de um contexto histórico-constitucional, onde se destacou o sistema da seguridade social, como também os princípios constitucionais relacionados ao tema, sendo demonstrada a necessidade de assegurar direitos previdenciários aos trabalhadores informais, como os rurais,  de forma igualitária aos trabalhadores formais.   

No segundo momento, abordou-se a figura do segurado especial, com ênfase em suas características diante da previdência, a exemplo da forma contributiva e os meios comprobatórios de sua atividade, conforme definição da legislação. Desta análise, apresenta-se que, embora a previdência seja obrigatoriamente contributiva, o Segurado Especial pode fazer jus aos benefícios independentemente de ter contribuído. No tocante à comprovação do exercício rural, apresenta-se a necessidade de documentos como comodato, ITR, filiação à sindicatos rurais, dentre outros requeridos pela lei, como forma de contabilizar a carência necessária para a consecução do benefício. 

E por fim, se destacou o instituto do período descontinuo, elencando suas especificidades a partir da legislação, destacando a omissão existente no termo jurídico e fazendo um paralelo com o estudo acerca dos conceitos de igualdade e justiça à luz de uma decisão mais favorável ao segurado, a fim de buscar uma maior justiça social. Através da análise de três julgados apresentados, que configuram as três correntes jurisprudenciais sobre o tema, ficou demonstrado que a discricionariedade derivada da omissão legislativa causa diversos entendimentos sobre um mesmo tema jurídico, incorrendo na possibilidade de julgamentos desiguais.

Assim, partindo dessas posições, podemos levantar as seguintes reflexões: considerando a ideia de que um ordenamento jurídico lacunoso possibilita a discricionariedade do julgador e, portanto, uma injustiça social, temos que a existência de uma lei definidora de um direito constitucional fundamental, que possui lacunas e interpretações diversas, não condiz com o ideal de justiça, visto que gera interpretações subjetivas e a possibilidade de julgamentos desiguais entre iguais, ferindo, assim, princípios fundamentais como a igualdade e a dignidade da pessoa humana.    

Vale salientar ainda, que o exercício da atividade rural está diretamente atrelado à fatores climáticos que mantêm influência na produção agrícola. Desta feita, em períodos de seca, o trabalhador rural fica obrigado a procurar outros meios de manter a si e a sua família, sendo obrigado, muitas vezes, a deixar o labor rural e exercer alguns vínculos de emprego urbano. É perceptível, portanto, que a vida do trabalhador rural é penosa e árdua, tanto que, com os avanços do direito, foi possível inseri-lo em uma classificação própria frente à previdência social, mas ela é falha em alguns momentos quando não lhe proporciona uma proteção mais vantajosa em face da sua árdua labuta. 

Percebeu-se, portanto, que há uma necessidade de auferir ao empregado rural, ao menos no tocante à aposentadoria por idade, um tratamento diferenciado dos demais segurados, levando em consideração o fato de compor um grupo de pessoas mais vulneráveis em questão de saúde, devido ao labor que é penoso e desgastante, e também pela hipossuficiência financeira. 

Com isso é indiscutível o fato de que há a necessidade de buscarmos normas que regulamentem a comprovação da qualidade de segurado especial dos trabalhadores rurais, suprindo as omissões e obscuridades que acometem a lei de benefícios. Um dos pontos observados como prejudiciais à comprovação da qualidade de segurado especial e que gera discricionariedade tanto no meio administrativo como judicial é constatado quando os aplicadores da lei atuam com discricionariedade, julgando de forma subjetiva os beneficiários requeridos, em especial no que se refere a contagem do período descontínuo.

Comprovou-se, neste estudo, que há grande subjetividade em relação à aplicação do período descontínuo, frente aos requerimentos de aposentadoria por idade rural, quando observamos os vários posicionamentos jurisprudenciais que não seguem uma única corrente, causando um dano ao princípio da igualdade e da justiça social, considerando que a concessão do benefício pretendido dependerá do livre convencimento do aplicador da lei, não se limitando as provas apresentadas pelo requerente.

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Assim, diante dos posicionamentos jurisprudenciais aqui analisados, conclui-se que a corrente jurídica que defende a soma de períodos intercalados sem qualquer restrição, deve ser aquela sempre seguida pelos aplicadores do direito, por possibilitar definitivamente uma ideia de efetiva justiça social, ao considerar todo o tempo de exercício rural que o indivíduo tenha constituído, somando tais períodos de forma independente de afastamento do meio rural.  Assim, tem-se a permanência da qualidade de Segurado Especial sendo assegurada quando o trabalhador necessitar exercer um trabalho formal e, posteriormente, retorne à atividade agrícola, sendo computado todo o tempo pretérito de trabalho rurícola.

Além disso, é relevante acentuar que a verdadeira mudança deve acontecer na própria legislação, a partir da elaboração de uma norma que compute de forma inquestionável a soma dos períodos intercalados de atividade rural, vinculando o aplicador a uma atuação socialmente mais cômoda à vida sofrida deste segurado, o que, sem dúvidas, eliminaria a discricionariedade dos magistrados, no que se refere à contagem, no momento de aplicação da lei, e, acima de tudo, valorizaria sua dignidade, proporcionando a igualdade material tão perseguida por todos e, inegavelmente, perfazendo o ideal de justiça.


REFERÊNCIAS

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