As movimentações de Oficiais e Praças das Forças Armadas é um assunto que vem suscitando discussões com implicações significativas para a Administração Militar e para os militares administrados. A movimentação é ato discricionário? É direito ou dever do militar?
A ausência de regras legais específicas sobre o tema gera interpretações divergentes que demandam uniformização, mormente por envolver aspectos ligados ao interesse público e à família, bens igualmente tutelados pelo texto constitucional.
O escopo deste artigo não é o de precisar o resultado da ponderação entre os bens jurídicos envolvidos, mas tão somente o de demonstrar as peculiaridades das questões afetas aos militares e à Administração Militar, a fim de viabilizar as decisões administrativas e judiciais atinentes às movimentações dos militares das Forças Armadas.
A movimentação por interesse da Administração Militar, dever do militar, decorrente do interesse público, visa, precipuamente, ao preenchimento dos cargos e funções previstas nas tabelas de lotação, no intuito de assegurar a presença do efetivo mínimo necessário à eficiência operativa e administrativa das Organizações Militares. Outros motivos administrativos podem ensejar a movimentação dos militares, tais como a matrícula em cursos e a realização de estágios; a aplicação de conhecimentos e experiências adquiridos em cursos, estágios, cargos e funções, desempenhadas no país e no exterior; e o exercício de cargos e funções compatíveis com o grau hierárquico e com a proficiência demonstrada no desempenho de comissões anteriores e com a experiência já adquirida ao longo da carreira.
O regime estatutário militar federal é definido, basicamente, por alguns dispositivos da Constituição Federal e pelo Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/80). O regime estatutário militar difere dos demais estatutos em decorrência da destinação constitucional das Forças Armadas, Art. 142, caput, in verbis:
As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Incontroversa, portanto, a natureza jurídica da movimentação como dever do militar, decorrência lógica das obrigações da carreira militar.
A movimentação por interesse do militar pode decorrer de diversos motivos, de difícil delimitação, haja vista a gama de interesses particulares próprios de cada ser humano. Por isso, controvertida torna-se a configuração da movimentação como direito do militar, principalmente pela predominância do interesse público sobre o privado e pela ausência de dispositivos legais específicos sobre o assunto, fatores que, por si só, já justificam estas breves considerações.
Da diversidade de interesses inerentes ao ser humano, convém destacar a questão da família, por configurar bem jurídico merecedor de especial proteção do Estado, ao ponto de, em determinadas situações, que serão abordadas neste trabalho, sobrepor-se aos interesses da Administração Pública, indicando a movimentação como um direito do militar decorrente do resultado da necessária ponderação entre o interesse público e a proteção da família.
Além dos já citados instrumentos normativos básicos que disciplinam as relações administrativas entre a Administração Militar e os militares administrados (a Constituição Federal e o Estatuto dos Militares), existem ainda os regulamentos internos de cada Força, legitimados pelo texto constitucional e pelo Art. 4º da Lei Complementar nº 97, de 09JUN1999, que dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas, que assim dispõe:
Art. 4º A Marinha, o Exército e a Aeronáutica dispõem, singularmente, de um Comandante, nomeado pelo Presidente da República, ouvido o Ministro de Estado da Defesa, o qual, no âmbito de suas atribuições, exercerá a direção e a gestão da respectiva Força.
Dentre tais instrumentos, somente os regulamentos tratam da movimentação como direito do militar. Como exemplo, podemos citar a publicação da Marinha do Brasil denominada DGPM-310 (NORMAS SOBRE NOMEAÇÃO, DESIGNAÇÃO, MOVIMENTAÇÃO, DISPENSAS DO SERVIÇO, LICENÇAS, FÉRIAS E OUTROS AFASTAMENTOS TEMPORÁRIOS DO SERVIÇO DE PESSOAL MILITAR DA MARINHA) e a publicação do Exército Brasileiro denominada R-50 (REGULAMENTO DE MOVIMENTAÇÃO PARA OFICIAIS E PRAÇAS DO EXÉRCITO), que serão abordadas oportunamente.
A Constituição Federal não define regras atinentes à movimentação dos militares, deixando tal assunto a cargo da legislação infraconstitucional. De acordo com o inciso X do § 3º do Art. 142,
§ 3º. Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:
(omissis)
X - a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.
Grifo nosso
O Estatuto dos Militares, por sua vez, nas diversas alíneas do Art. 50, que relaciona os direitos dos militares, não faz qualquer menção à movimentação como direito, mas ressalva, numa alínea residual, a eventual existência de outros direitos previstos em leis específicas, in verbis:
Art. 50. São direitos dos militares:
(omissis)
s) outros direitos previstos em leis específicas.
Analisando outras leis específicas, afetas aos militares, não constatamos a existência de regras que tratem da movimentação dos militares, à exceção da Medida Provisória nº 2215-10, de 31 de agosto de 2001 (dispõe sobre a reestruturação da remuneração dos militares das Forças Armadas), que, regulamentada pelo Decreto nº 4.307, de 18 de julho de 2002, trata, especificamente, dos direitos pecuniários dos militares movimentados no interesse da Administração Militar.
Por outro lado, da análise do regime jurídico afeto aos servidores públicos federais (Lei nº 8112/90), verifica-se a ocorrência de regras que disciplinam a movimentação como direito dos servidores. A citada lei refere-se à remoção e trata de suas modalidades no Art. 36, definindo situações em que a remoção deve ser atendida independentemente do interesse da administração, in verbis:
Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção:
I - de ofício, no interesse da Administração;
II - a pedido, a critério da Administração;
III - a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:
a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;
b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;
No conflito entre os interesses da Administração Pública e a entidade familiar, a norma em questão houve por bem privilegiar esta, concretizando o princípio constitucional de ordem programática que protege a unidade familiar, in verbis:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
Como se vê, com a promulgação da Constituição Federal, a questão que envolve a movimentação dos servidores públicos sofreu grande alteração.
Assim, pelo regime jurídico dos servidores civis, a Administração fica obrigada a atender as movimentações quando surgem questões específicas afetas à manutenção da família, na esteira de sua especial proteção pelo texto constitucional acima transcrito.
Nesse sentido, convém trazer à colação os seguintes julgados, respectivamente do STF e do TRF da 5ª Região:
Diante da impossibilidade de serem conciliados, como se tem na espécie, os interesses da Administração Pública, quanto a observância da lotação atribuída em lei para seus órgãos, com os da manutenção da unidade da família, é possível, com base no art. 36. da Lei nº 8.112/1990, a remoção do servidor-impetrante para o órgão sediado na localidade onde já se encontra lotada a sua companheira, independentemente da existência de vagas. 1
1. A remoção a pedido do servidor se dá em duas hipóteses: Uma a critério da administração e a outra para localidade diversa, independentemente do interesse da administração, atendidos os requisitos externados nas alíneas do inciso III do art. 36. da Lei nº 8.112/90. 2. Restando comprovada por junta médica oficial o problema de saúde em dependente de servidor, é direito seu a transferência para outra localidade, independentemente da existência de vagas. 3. Agravo de instrumento improvido.2
Tal regime jurídico não se aplica diretamente aos militares, mas, ante a ausência de dispositivos legais específicos sobre o assunto, podem servir de parâmetro para as decisões judiciais e administrativas que envolvem a movimentação dos militares, desde que observadas também as peculiaridades da carreira militar.
A despeito da legislação atinente ao regime jurídico dos militares não ter sido ainda adaptada ao texto constitucional, antecipou-se os comandos militares no estabelecimento de regras internas que vão ao encontro dos ideais traçados pela Constituição Federal.
Nesse diapasão, convém trazer à colação os já citados regulamentos da Marinha do Brasil e do Exército Brasileiro que tratam do assunto, respectivamente a DGPM-310 e o R-50.
A DGPM-310, no item 3.7, que dispõe sobre as Diretrizes para a Movimentação, após abordar a movimentação por interesse do serviço, disciplina diversas modalidades de movimentação que levam em consideração o interesse privado, dentre elas destacamos a movimentação por interesse do próprio militar, a movimentação por motivo social e a movimentação para acompanhar cônjuge, tratadas a seguir.
Na movimentação por interesse do próprio militar, a Administração Militar Naval tenta conciliar os seus interesses com os interesses dos militares administrados, preceituando o seguinte:
3.7.4 - Movimentação por interesse do próprio militar
a) As movimentações de pessoal devem ser, em princípio, geradas pela conveniência do serviço, observados, sempre que possível, os requisitos de carreira. Entretanto, para o atendimento dos casos previstos na subalínea VI da alínea b) do inciso 3.7.1, os militares poderão ser movimentados para atender a seus próprios interesses, observadas as prescrições deste inciso.
b) Aos militares será facultado indicar as comissões de sua preferência, através da Folha de Preferência de Comissões para Oficiais (FPCO) e da Folha de Preferência de Comissão de Praças (FPCP), preenchida e encaminhada nos termos do artigo 3.8.
c) As preferências indicadas pelos militares serão atendidas sempre que se coadunarem com o interesse do serviço, devendo ser dada prioridade às que vierem a atender requisitos de carreira.
d) As movimentações decorrentes de FPCO e de FPCP, que afetarem sensivelmente as equipes envolvidas em atividades operativas dos navios, poderão ser flexibilizadas quanto à época de seu cumprimento, pelos respectivos SDP, após os necessários entendimentos com a DPMM, por ocasião das indicações dessas movimentações.
e) O militar que desejar ser movimentado antes de completar o tempo mínimo de comissão, poderá requerer à autoridade que o nomeou ou designou, por meio da sua cadeia de comando, circunstanciando as razões de sua pretensão, observando o previsto na alínea j) deste inciso.
f) O requerimento de que trata a alínea anterior e a FPCO, referida na alínea b), com a solução que for dada a eles, serão juntados às Informações Confidenciais do militar, arquivadas na DPMM, para perfeito esclarecimento futuro das circunstâncias que motivaram a movimentação, ou para registro das preferências do militar por comissões.
g) A movimentação a pedido, feita por autoridades responsáveis por órgãos extra-MB, não será considerada, a não ser no expresso interesse do serviço, e se fundamentada em documento apropriado; neste caso, será registrada nas Informações Confidenciais do militar interessado, ao qual será dado conhecimento do referido pedido; neste mesmo documento deverá ser aposto o seu "ciente" e sua concordância ou discordância com a movimentação solicitada.
h) A movimentação a pedido de terceiros, principalmente de fora do âmbito da MB, além de não ser atendida, por constituir transgressão de preceitos da conduta militar, poderá caracterizar contravenção disciplinar por parte do militar interessado, caso fique constatada a sua participação.
i) Qualquer que seja a origem das movimentações a pedido, deverá ser fielmente observado o que, a respeito, prescreve a LRM.
j) As FPCO e as FPCP serão consideradas, se atendidas, como movimentações por interesse do serviço.
A movimentação por motivo social, prevista no subitem 3.7.6, é condicionada ao constatado no relatório de análise social - documento elaborado por profissional da área de serviço social, subsidiado por outros profissionais que atuam nos núcleos de assistência integrada da Marinha, dependendo de cada caso concreto. Esta espécie de movimentação é mais comum nas situações que envolvem problemas de saúde do militar ou de seus dependentes.
A movimentação para acompanhar cônjuge é condicionada à existência de lotação na Organização Militar Naval pretendida. No entanto, mesmo não havendo a citada lotação, a Administração Naval, em consonância com a especial proteção constitucional destinada à família, não impede o militar de acompanhar o seu cônjuge, uma vez que lhe faculta o direito de solicitar Licença para Acompanhar Cônjuge (LAC), uma espécie de licença para tratar de interesse particular, sem remuneração, por um período de até 2 (dois) anos, podendo ser renovada. Transcrevemos abaixo o item 3.7.12, da DGPM-310, que trata do assunto:
3.7.12 - Movimentação para acompanhar Cônjuge
É aquela decorrente do afastamento, em caráter permanente, dentro do território nacional, do cônjuge ou companheiro reconhecidos legalmente (militar da MB ou não) da sede onde o militar solicitante exerce suas atividades, atendido o interesse do serviço. O encaminhamento das solicitações fica condicionado à existência, na lotação da OM pretendida ou respectivo SDP, de Posto/Graduação e especialidade compatíveis com as do militar solicitante. Caso contrário, será facultado ao militar acompanhante solicitar LAC, nos termos do inciso 2.2.6, ou ainda, ao cônjuge ou companheiro movimentado por interesse da MB, requerer a revisão da sua movimentação.
O R-50 (Regulamento de Movimentação para Oficiais e Praças do Exército), aprovado pelo Decreto nº 2.040, de 21 de outubro de 1996, por sua vez, estabelece, em seu Art. 1º, princípios e normas gerais para a movimentação de oficiais e praças da ativa do Exército, considerando:
I - o caráter permanente e nacional do Exército;
II - o aprimoramento constante da eficiência da Instituição;
III - a prioridade na formação e aperfeiçoamento dos Quadros;
IV - a operacionalidade da Força Terrestre em termos de pronto emprego;
V - a predominância do interesse do serviço sobre o individual;
VI - a continuidade no desempenho das funções, a par da necessária renovação;
VII - a movimentação como decorrência dos deveres e das obrigações da carreira militar e, também, como direito nos casos especificados na legislação pertinente;
VIII - a disciplina;
IX - o interesse do militar, quando pertinente;
X - a racionalização dos recursos destinados à movimentação de pessoal.
O Art. 2º do R-50 estabelece que "o militar está sujeito, em decorrência dos deveres e das obrigações da atividade militar, a servir em qualquer parte do País ou no exterior", mas ressalva em seu parágrafo único que "poderão ser atendidos interesses individuais, quando for possível conciliá-los com as exigências do serviço".
No trato dos objetivos da movimentação (Art.13), o R-50 consigna, entre outros, o atendimento dos interesses individuais (inciso IX).
Os artigos 15 e 16 disciplinam, respectivamente, a movimentação por interesse próprio e a movimentação para atender problemas de saúde, in verbis:
Art. 15. A movimentação por interesse próprio, prevista no inciso IX, do art 13, somente poderá ser realizada mediante requerimento do interessado ao órgão movimentador, seguindo os canais de comando, após completado o prazo mínimo de permanência a ser estabelecido pelo Ministro de Estado do Exército.
Art. 16. A movimentação, para atender aos problemas de saúde do militar ou de seus dependentes, poderá ser realizada a requerimento do interessado ao órgão movimentador, seguindo os canais de comando, e considerado o interesse do serviço.
Os dois artigos acima transcritos viabilizam o atendimento, pelo Exército Brasileiro, do mandamento constitucional que visa à proteção da família, podendo, inclusive, amparar a movimentação para acompanhar cônjuge.
Como se vê, a despeito da inexistência de dispositivos legais, a Administração Militar antecipou-se no trato da questão, dispondo, em suas normas internas, sobre regras que vão ao encontro dos ideais traçados pelo texto constitucional, propiciando, ao mesmo tempo, a manutenção da família e a preservação do interesse público.
Por oportuno, convém salientar que, atualmente, encontra-se em tramitação o Projeto de Lei nº. 1.410/2003, de iniciativa do Poder Executivo, que altera a redação de disposições constantes da Lei nº. 6.880, de 09 de dezembro de 1980 (Estatuto dos Militares), criando a licença para acompanhar cônjuge.
Tal projeto se constitui em aperfeiçoamento oportuno e conveniente para a legislação que regula a política de movimentação de pessoal das Forças Armadas.
Em sua justificação, o Poder Executivo se reporta ao mandamento constitucional que elege a família como base da sociedade, com direito a especial proteção do Estado, e ao fato de que a referida licença já é concedida para os servidores civis na Lei nº. 8.112/1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais), assumindo, ao final, que a proposição não implica aumento de despesas para o Erário.
Enquanto a alteração não é implementada, as questões são resolvidas pelos regulamentos internos, que, na maioria dos casos, atendem às necessidades da Administração Militar e dos militares administrados.
As questões mais complexas são as que envolvem a colisão entre os bens juridicamente tutelados pela Carta Magna ou quando os interesses dos militares destoam dos interesses da Administração. Daí a necessidade de delimitação das hipóteses de movimentação que podem/devem ser atendidas pela Administração Militar.
Essa delimitação já possui contornos bem definidos pela jurisprudência no que diz respeito à movimentação dos servidores públicos civis. Tais julgados podem ser considerados no trato das questões afetas aos militares, uma vez que estes são espécie do gênero servidores públicos.
No tocante à movimentação para acompanhar o cônjuge, a jurisprudência vem manifestando-se no sentido segundo o qual a remoção do servidor para preservar a família deve ser concedida nas "hipóteses em que o fator desagregador foge ao controle do interessado", vedando sua concessão nas hipóteses em que "a situação de desconforto decorre da inadaptação do cônjuge" no local onde está lotado o servidor.3
Esse entendimento é plausível uma vez que a regra do Art. 226. da Constituição não pode ser considerada isoladamente. Há que se efetivar uma interpretação sistemática, não deixando de considerar os princípios da supremacia do interesse público, da indisponibilidade do interesse público e da razoabilidade, entre outros. Nesse sentido, trazemos à colação o seguinte julgado:
A remoção a pedido é um direito do servidor, desde que verificada qualquer das hipóteses dos incisos II e III do art. 36. da Lei nº 8.112/90, com a redação dada pela Lei nº 9.527/97, o que não ocorre in casu. 2. O princípio da unidade familiar (CF, art. 226) não pode ser interpretado de forma isolada, antes deve sê-lo em conjunto com os demais princípios e normas constitucionais, tais como os princípios da independência dos poderes e da supremacia do interesse público sobre o interesse particular, além do princípio da legalidade. Ademais, o art. 36. da Lei nº 8.112/90, com a redação dada pela Lei nº 9.527/97, dá albergue ao princípio da unidade familiar, compatibilizando, nos casos previstos ao inciso III, os interesses e conveniências familiares com os interesses e conveniências da Administração. 3. Precedente do STF. 4. Agravo de instrumento provido e agravo inominado prejudicado.4
Quanto à condição de "servidor" do cônjuge que enseja a movimentação do outro servidor, já manifestou-se o STF sinalizando que não deve ser atendida a remoção independentemente de vaga quando aquele não é servidor público.5
É comum o pedido para acompanhar cônjuge na hipótese em que o militar ou o servidor civil recém nomeado tem a primeira lotação diferente da que reside com o seu cônjuge. Nesta hipótese, não há que se falar em movimentação ou remoção, uma vez que não houve deslocamento do servidor no interesse da administração. O servidor/militar quando se submete ao concurso público já sabe que pode ser lotado em qualquer das unidades da federação. É o caso versado no julgado abaixo, do TRF da 5ª Região:
A autora submeteu-se a concurso público para provimento do cargo de Agente da Polícia Federal, tendo prévio conhecimento, através do Edital de Concurso, que a critério da Administração, o candidato poderia ser lotado em qualquer Unidade Policial Federal nos Estados e Distrito Federal; 6. Tendo sido nomeada para localidade distinta da que reside com seu cônjuge, intentou a presente ação ordinária, objetivando sua remoção para o seu Estado de origem, sob o argumento de que seu cônjuge é empresário estabelecido a mais de 7 anos no Estado do Ceará, e a sua permanência em outro Estado irá degradar a unidade familiar; 7. Sabe-se que o instituto da remoção previsto no art. 36, parágrafo único, inc. III, letra "a" da Lei 8.112/90 é reflexo da preocupação estampada nos arts. 226. e 227 da Carta Magna, em assegurar uma especial proteção do estado a unidade familiar, a medida em que possibilita o deslocamento do servidor, para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e Municípios, que tenha sido deslocado no interesse da administração. 8. In casu, observando-se que o cônjuge da suplicante é empresário, portanto não se enquadrando na condição de servidor público, resta desamparada legalmente a pretensão aqui deduzida; 9. Apelação improvida.6
Nesta mesma linha de raciocínio, convém transcrever o seguinte julgado do TRF da 1ª Região:
(...) 2. A participação do agravante, em concurso nacional, com posterior aprovação e nomeação em localidade diversa do domicílio do cônjuge, não caracteriza direito líquido e certo a ser amparado em mandado de segurança, uma vez que não houve deslocamento no interesse da administração. 3. O artigo 226 da Constituição Federal, embora seja norma de aplicabilidade imediata, é de eficácia contida, podendo ter alcance reduzido pela legislação ordinária.7
Convém ainda trazer à baila a notícia abaixo, que relata a decisão do STJ envolvendo o pedido de remoção de uma serventuária da justiça para acompanhar seu cônjuge militar:
É legal a decisão que indefere pedido de remoção de servidora para acompanhar cônjuge militar das Forças Armadas se o deslocamento não foi por determinação da Administração, mas a critério da funcionária. O entendimento unânime da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão da Justiça gaúcha, impedindo a remoção de uma servidora de Campo Novo para Cruz Alta.
Tatiana Freitas Rosa é servidora do Judiciário gaúcho, lotada em Campo Novo, e seu marido é militar do Grupo de Artilharia do Exército brasileiro, servindo em Cruz Alta, razão pela qual ela pediu sua remoção para esta cidade. O pedido foi indeferido pelo Conselho da Magistratura, o que fez com que ela impetrasse mandado de segurança contra a decisão.
Novamente o pedido foi indeferido. O Tribunal de Justiça (TJ) entendeu que o afastamento do lar se deu por provocação da servidora, uma vez que ela já residia em Cruz Alta quando se candidatou à vaga de oficiala escrevente na outra cidade.
Diante do novo fracasso em sua tentativa de morar perto do marido, a servidora recorreu ao STJ, afirmando possuir direito líquido e certo à remoção para a outra cidade, baseando-se, para tanto, no Código de Organização Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul.
O relator do caso no STJ, ministro Gilson Dipp, considerou totalmente correta a decisão do Judiciário gaúcho, não havendo direito líquido e certo da servidora a ser resguardado. Para Dipp, ficou bem claro pela decisão do TJ que a situação de afastamento foi criada pela própria servidora, a qual, na constância do casamento, residindo com seu marido em Cruz Alta, aceitou nomeação e posse em Campo Novo, não se tratando de remoção para acompanhamento de cônjuge deslocado no interesse da Administração.
O ministro considerou corretos os argumentos do Governo gaúcho de que ela fez o concurso, foi aprovada e tomou posse no cargo em Campo Novo, quando já era casada e, desde o casamento, o casal residia na outra cidade. Ou seja: o marido já residia na cidade, não tendo sido removido para lá. Manteve, assim, a decisão da Justiça do Rio Grande do Sul.8
Como se vê, na maioria dos julgados, preponderam o interesse e a conveniência da Administração Pública. Ficou consignado, outrossim, que a especial proteção constitucional à família, prevista no art. 226. da Constituição Federal, embora seja uma norma de aplicabilidade imediata, tem sua eficácia contida e seu alcance pode ser reduzido pela legislação ordinária.