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Sentença superveniente:

o destino do agravo de instrumento

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INTRÓITO – DELIMITAÇÃO DO TEMA

            Debates existem sobre qual o real destino do Recurso de Agravo de Instrumento pendente de julgamento no Tribunal, quando o juiz de 1º grau profere Sentença, extinguindo o processo, com ou sem resolução de mérito.

            Os dispositivos do Código de Processo Civil não são claros no que toca à matéria em questão, muito menos expressos.

            Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça dá sinais de contornos mais ou menos definidos acerca da matéria, o que se irá demonstrar nas breves linhas que se seguem.


DECISÃO INTERLOCUTÓRIA x RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO

            Como se sabe, o Agravo de Instrumento é a via recursal através da qual, por meio do efeito devolutivo inerente, transfere-se ao Tribunal – não exclusivamente – o tratamento de matéria incidentemente surgida no processo, podendo inclusive ser meritória.

            As decisões proferidas no curso do processo, que não põe fim ao mesmo no 1º grau de jurisdição, chamadas de interlocutórias, são as passíveis do Recurso de Agravo de Instrumento.

            No sapiente dizer de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in Código de Processo Civil Comentado, 5ª edição, ed. Revista dos Tribunais:

            "Toda e qualquer decisão do juiz proferida no curso do processo, sem extingui-lo, seja ou não sobre o mérito da causa, é interlocutória. Como, para classificar o pronunciamento judicial, o CPC não levou em conta seu conteúdo, mas sim sua finalidade, se o ato não extinguiu o processo, que continua, não pode ser sentença mas sim decisão interlocutória. Pode haver, por exemplo, decisão interlocutória de mérito, se o juiz indefere parcialmente a inicial, pronunciando a decadência de um dos pedidos cumulados, e determina a citação quanto ao outro pedido;(...)".

            Portanto, de acordo com a definição legal do art. 522, é o Recurso de Agravo de Instrumento a via própria para levar à instância superior os debates surgidos no processo, que não põem fim ao mesmo, verbis:

            "Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de dez (10) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento."

            Tal é a nova redação conferida pela Lei Federal nº 11.187/2005. Assim, a regra passa a ser a interposição do agravo retido, admitindo-se o de instrumento somente "quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação", assim como "nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida".

            No entanto, mesmo tendo a novata lei restringido a tais hipóteses o cabimento do Agravo de Instrumento, há outras, emanadas da própria lógica e natureza da decisão interlocutória proferida, como ocorre nos casos de determinação de emenda à inicial (art. 284, CPC); quando é julgada a exceção de incompetência; entre outros, em que de forma alguma seria lógica a interposição do agravo retido.

            Tais considerações são ora abalizadas justamente no intuito de esclarecermos o cabimento do agravo de instrumento, bem como para ressaltarmos que, com a nova lei que alterou o regime do recurso de agravo, diversas matérias que antes poderiam ser debatidas no Agravo de Instrumento, hoje ficarão restritas ao retido, que deverá ser renovado como preliminar por ocasião das razões ou contra-razões do recurso apelatório.


SENTENÇA

            A sentença, por sua vez, é o ato do juiz através do qual este encerra o processo no 1º grau de jurisdição, resolvendo ou não o mérito da lide (art. 267 e 269, CPC).

            Em tese, pondo fim à lide no primeiro grau, as questões debatidas no curso do processo estariam encerradas, devidamente apreciadas e sopesadas pelo livre convencimento (art. 131, CPC).

            Ocorre que, a partir do instante em que o magistrado profere uma decisão interlocutória, meritória ou não, se gera às partes o direito de recorrer dessa decisão, podendo fazê-lo através do Recurso de Agravo de Instrumento, quando cabível, nos termos do vigente Pergaminho Adjetivo Civil.

            Quando qualquer das partes recorre de uma decisão interlocutória, leva-se ao Tribunal o tratamento da matéria, deixando a mesma de precluir, diante da expressa impugnação recursal.

            Nesse sentido, questiona-se: a sentença superveniente acarreta necessariamente a perda do objeto do agravo de instrumento?

            Necessariamente, não. Mas a casuística é que deverá servir como parâmetro delineador.

            Passemos então a explanar algumas situações, ora em que a sentença acarreta a perda superveniente do objeto do agravo de instrumento; ora em que esta perda de objeto não ocorre, podendo inclusive a sentença vir a restar prejudicada pelo provimento do recurso de agravo.


SENTENÇA SUPERVENIENTE AO AGRAVO DE INSTRUMENTO PENDENTE

            Dispõe o art. 559 do vigente Código de Processo Civil:

            "Art. 559. A apelação não será incluída em pauta antes do agravo de instrumento interposto no mesmo processo.

            Parágrafo único. Se ambos os recurso houverem de ser julgados na mesma sessão, terá precedência o agravo."

            Da leitura da norma vemos que, não obstante deixar de expressar com clareza, o CPC implicitamente admite a sobrevivência do Agravo de Instrumento à sentença e, conseqüentemente, à Apelação.

            No entanto, tal sobrevivência não ocorre sempre.

            Por outro lado, há casos em que, de fato, a sentença não acarreta a perda de objeto do Agravo de Instrumento.

            No julgamento do AgRg no REsp nº 675.771 – RS, da Relatoria do eminente Ministro José Arnaldo da Fonseca, o Superior Tribunal de Justiça unanimemente decidiu que:

            "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EMENDA À INICIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXTINÇÃO DO FEITO. APELAÇÃO. PERDA DO OBJETO DO AGRAVO. INOCORRÊNCIA.

            "...a superveniência de sentença ao agravo de instrumento interposto em face de decisão interlocutória proferida pelo juiz de primeiro grau, em sede de emenda à inicial, sob pena de indeferimento, não prejudica o exame de mérito do recurso, mesmo que a ele não tenha sido deferido o efeito suspensivo." (REsp nº 674.288/RS, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa). Agravo desprovido."

            Ao proferir seu voto, o Ministro Relator ressaltou que "havendo matéria de mérito, a ser enfrentada, primeiro deve ocorrer o desate do agravo de instrumento para, depois de observar se ainda restam pontos pendentes, passar à análise da apelação".

            Vê-se que o posicionamento adotado no julgado supra-transcrito é dotado de plena lógica jurídica, homenageando aos Princípios Processuais da Utilidade e da Celeridade, uma vez que, no caso, a matéria tratada no recurso de Agravo de Instrumento é a mesma do Recurso de Apelação.

            Ora, com a interposição do inconformismo recursal tirado contra a decisão do juiz que determina a emenda à inicial, mas que posteriormente, ante a não concessão – ou até não requerimento – de efeito suspensivo ao agravo interposto, chega a sentenciar o feito em razão do descumprimento da determinação de emenda, certo é que o Agravo deverá prevalecer, até porque, acaso provido, irá prejudicar a própria sentença, obtendo conseqüentemente o efeito expansivo objetivo externo (através do qual a decisão do agravo irá atingir todos os atos processuais posteriores à decisão recorrida).

            Nessa esteira, a decisão proferida no Recurso de Agravo de Instrumento, quando provido, substituindo a decisão interlocutória proferida pelo juiz de 1º grau, irá atingir todos os atos processuais posteriores à decisão recorrida, inclusive a sentença, maculando-a com nulidade.

            Analisando cuidadosamente a situação, pode-se até chegar a uma conclusão não muito confortável, em termos de segurança jurídica: uma vez sendo a matéria do agravo de instrumento a mesma da sentença – que extinguiu o feito, ante o não cumprimento da determinação de emenda à inicial, não obstante a existência do recurso de agravo -, e admitindo-se que o agravo de instrumento seja provido – quando aí se anula os atos posteriores à decisão recorrida -, pode-se dizer que, uma vez que o agravo não deixou precluir a matéria travada, efeito inerente que é ao recurso, até mesmo se a parte não recorresse da sentença, não poderia ocorrer o trânsito em julgado desta.

            É que, se a sentença é nula diante do provimento do agravo, não gera efeitos, não se permitindo possuir a mesma a qualidade de autoridade de coisa julgada material.

            Tal conclusão, sem dúvidas, encontra respaldo nos fundamentos adotados alhures, relativizando-se assim a formação da coisa julgada.

            Porém, relembro que somente podem ocorrer tais conseqüências nessa excepcional situação, ou seja, quando a sentença extingue o processo sem resolução de mérito, baseada em anterior decisão recorrida que determina a emenda à inicial, decisão esta reformada pelo Tribunal, ou a ela análoga (discussão no agravo de matéria processual).

            Em interessante julgado [01], a Segunda Turma do STJ já chegou a propor a solução da situação da seguinte forma, fazendo aplicar dois critérios, que seriam: "a) o da hierarquia, segundo o qual a sentença não tem força para revogar a decisão do tribunal, razão porque o agravo não perde o objeto, devendo ser julgado; b) o da cognição, pelo qual a cognição exauriente da sentença absorve a cognição sumária da interlocutória.". Afirma ainda o acórdão que, neste último caso, "o agravo perderia o objeto e não poderia ser julgado".

            Temos que, às claras, tais critérios podem ser aplicados, porém não da forma simplificada como se propôs, afinal a casuística para tais discussões se faz tremenda. Acrescente-se que o julgamento do Recurso Especial aludido se deu por maioria, que teve como votos-vencidos a Ministra Eliana Calmon e o Ministro João Otávio de Noronha.

            No seu voto, a eminente Eliana Calmon duramente criticou a utilização do Princípio da Hierarquia, asseverando que "é natural que caia por terra a decisão interlocutória que foi examinada no Tribunal, à vista dos pressupostos pertinentes a uma interlocutória, em cognição sumária".

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            Razão assiste à ilustre magistrada, mas tão-somente nos casos em que, exemplificativamente, o objeto do Recurso de Agravo de Instrumento seja a insurreição contra uma decisão interlocutória que concedeu ou negou um pedido cautelar ou uma tutela antecipada. Não se poderia aplicar o raciocínio da Ministra no primeiro caso citado acima, em que o juiz extinguiu o feito pelo não cumprimento de determinação de emenda à inicial (discussão de matéria processual, v.g. condições da ação, pressupostos processuais, etc.), mas existia agravo de instrumento pendente.

            Em caso de pendência de Agravo de Instrumento contra decisão que concedeu ou negou tutela antecipada, é pacífico o STJ no sentido de que, sobrevindo a sentença, perde o recurso de agravo seu objeto. Vejamos:

            "PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO QUE CONCEDEU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM AÇÃO ORDINÁRIA. PROCESSO PRINCIPAL SENTENCIADO. PERDA DE OBJETO. RECURSO ESPECIAL PREJUDICADO.

            1. A orientação jurisprudencial prevalente no âmbito desta Superior Corte de Justiça é no sentido de que, havendo sentença superveniente procedente, o conteúdo da liminar antecipatória restará exaurido, ensejando ao sucumbente a impugnação da sentença, e não mais da liminar, restando prejudicados o agravo de instrumento e o recurso especial, por perda de objeto.

            2. Agravo regimental desprovido." [02]

            Destarte, enfim, concluímos que a matéria trazida é ainda por demais debatida e controvertida, principalmente diante do forte peso da casuística na situação jurídica analisada.

            Tanto é que entende Teresa Arruda Alvim Wambier que inevitável é "a conclusão de que o destino que deve ser dado ao agravo, depois de proferida a sentença, depende do conteúdo da decisão impugnada." (O destino do agravo depois de proferida a sentença. Aspectos polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e de Outros Meios de Impugnação às Decisões Judiciais. Série 7. Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier – coordenadores. São Paulo: RT, 2003). Nada mais correto.

            No entanto, o STJ, que tem como missão constitucional a uniformização da jurisprudência e da interpretação da lei federal, já vem de certa forma sedimentando, gradativamente, entendimento jurisprudencial, como acima visto, sendo certo que, não obstante os envidados esforços, a matéria tratada ainda irá causar muitas discussões doutrinárias e jurisprudenciais.


Notas

            01

RECURSO ESPECIAL Nº 742.512 – DF, Rel. Min. Castro Meira, DJ 21/11/2005. Maioria.

            02

AgRg no REsp 476.306/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04.10.2005, DJ 07.11.2005 p. 86.
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Sobre o autor
Danilo Galvão Martiniano Lins Filho

bacharelando em Direito em Recife (PE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LINS FILHO, Danilo Galvão Martiniano. Sentença superveniente:: o destino do agravo de instrumento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1024, 21 abr. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8290. Acesso em: 18 nov. 2024.

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