O processo e a busca da efetividade da tutela jurisdicional
Os breves comentários acerca da jurisdição e do tempo tiveram o objetivo de aproximar os institutos, demonstrando da sua indissociabilidade e prejudicialidade. Indissociável, porque a função jurisdicional se opera de acordo com o tempo exigido para sua prestação. Exemplo disto são as tutelas de urgência, que buscam tolher a cognição do magistrado à vista da possibilidade de dano. Prejudicial, justamente pela sua influência demarcadora da jurisdição. A aceleração das relações sociais, como já destacado, provoca também uma aceleração dos conflitos e um aumento no número de novas ações, o que acaba, por fim, tornando ineficaz o próprio sistema.
A doutrina moderna vem apregoando, à luz da velocidade do tempo e do crescimento das necessidades sociais, a necessidade da adoção pelos sistemas de Direito positivo, de tutelas jurídicas diferenciadas, buscando-se alcançar a efetividade do processo.
Estamos em época de busca de efetividade o pode ocorrer por alterações legislativas específicas, como é o caso do art. 461 do Código de Processo Civil ou o incremento de tutelas jurídicas diferenciadas. Acrescenta-se a isso a identificação e a preocupação com a tutela dos "novos direitos" ou seja, aqueles que embora não sejam efetivamente "novos", foram garantidos de forma explícita na Carta de 1988, como o direito à saúde e ao meio ambiente.
Segundo Nelson Nery Júnior tutelas jurídicas diferenciadas "podem ser concebidas com a criação de instrumentos mais efetivos à solução da lide ou com mecanismos de agilização da prestação jurisdicional."
Como exemplo, podemos citar a ação coletiva para a defesa de direitos individuais homogêneos, espécie de class action for damages (art. 81 do CDC parágrafo único, III, e 91 et seq.), os juizados especiais cíveis e criminais (Lei 9.099/95) e a tutela antecipatória, instituída pelo Código de Processo Civil, art. 273, agora recentemente reestruturado pela 2ª onda de reformas do CPC, com a inclusão dos parágrafos 6º (concessão da tutela quando o pedido ou parte dele se mostrar incontroverso) e 7º, este com especial relevância, à vista da inserção, no sistema processual, da fungibilidade das medidas de urgência.
A fungibilidade das medidas de urgência, trazida pela inovação legislativa da Lei 10.444/2002, reforça a idéia da prestação jurisdicional efetiva (adequada e tempestiva), no momento em que flexibiliza, ainda mais, a possibilidade de pleito junto ao Judiciário de decisões urgentes e satisfativas.
Entendemos, entretanto, que o estudo da prestação jurisdicional de urgência vai além da flexibilização e alargamento de possibilidades para a sua ocorrência, mas interfere diretamente na garantia constitucional do acesso à justiça, ainda mais à vista da alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 45 que determinou da celeridade do processo como garantia constitucional, colocando o Poder Judiciário novamente em crise para amparar toda uma gama de garantias sem, ao mesmo tempo, deixar de apreciar com o devido cuidado, individualmente, cada caso que lhe é apresentado.
O que ocorre em todas as hipóteses em que, no processo civil, há antecipação de efeitos executivos da tutela é uma decisão com base em cognição sumária, devendo o juiz certificar-se apenas da probabilidade da existência do direito afirmado em juízo."
Mesmo que superada a discussão processual entre as diferenças entre a antecipação de tutela e a medida cautelar, à vista da possibilidade da fungibilidade e porque ambas exigem apenas uma cognição sumária, vale a pena ainda repisar a distinção básica entre os institutos. Assim, verificamos que na tutela antecipada, a antecipação refere-se aos efeitos pretendidos com a sentença de mérito . Portanto, não temos uma tutela de caráter cautelar exatamente por não se limitar a assegurar o resultado prático do processo, nem a assegurar a viabilidade da realização do direito afirmado pelo autor.
O objetivo da tutela antecipada é o próprio provimento jurisdicional pleiteado ou seus efeitos, não possuindo natureza cautelar, pois sua finalidade precípua é adiantar os efeitos da tutela de mérito, visando sua imediata execução, o que não se confunde com o objetivo da tutela cautelar, que é o de assegurar o resultado útil do processo de conhecimento ou de execução ou, ainda, a viabilidade do direito afirmado pelo autor.
Em síntese: a cognição sumária como regra é matéria que vem sendo objeto de recentes estudos, na busca de uma solução processual justa e que atenda às garantias constitucionais, apimentadas com a novel inserção do inciso LXXVIII ao art. 5º da CF/88, que garante, além do devido processo legal, um processo célere, com uma resposta em tempo adequado.
Para que bem se entenda a idéia de sumarização do procedimento, primeiramente é necessário revisar a idéia de cognição sumária, destacando os posicionamentos adotados por dois juristas de importante renome, Ovídio Baptista da Silva e Kazuo Watanabe, uma vez que divergentes as posições adotadas frente ao tema.
De acordo com o entendimento do professor Ovídio, que opta pelo conceito de cognição sumária de Chiovenda, diferencia-se a cognição sumária da cognição ordinária por uma classificação em função da área de cognição. Assim, a cognição sumária seria uma cognição incompleta, e que se subdividiria nos aspectos da superficialidade (o juiz conhece de todas as questões, porém de forma superficial) e da parcialidade (elimina-se a cognição de uma área toda de questões).
Já Kazuo Watanabe defende que a distinção da cognição sumária se dá segundo dois planos distintos, quais sejam da extensão (cognição se estabelece sobre todas as questões, ela é horizontalmente ilimitada) e da profundidade (se a cognição é eliminada de uma área toda de questões, seria limitada quanto à extensão, mas se quanto ao objeto cognoscível a perquirição do juiz não sofre limitação, ela é exauriente quanto à profundidade).
Assim, "em linha de princípio, pode-se afirmar que a solução definitiva do conflito de interesses é buscada através de provimento que se assente em cognição plena e exauriente, vale dizer, em procedimento plenário quanto à extensão do debate das partes e da cognição do juiz, e completo quanto à profundidade dessa cognição. Decisão proferida com base em semelhante cognição propicia um juízo com índice de segurança maior quanto à certeza do direito controvertido, de sorte que a ela o Estado confere a autoridade de coisa julgada".
Conforme defendido pela mais moderna doutrina, mais do que a certeza e a segurança jurídica, tão importantes na época das codificações, o que se busca, no processo, é a sua efetividade. Entretanto, no tempo em que o próprio tempo é o maior obstáculo no processo, as chamadas demandas plenárias se mostram como verdadeiras inimigas da efetividade.
No dizer de Ovídio Baptista da Silva, "existem, a nosso ver, no sistema brasileiro, três grandes obstáculos, a conspirar contra a efetividade do processo civil. Pela ordem de importância, podemos arrolá-los deste modo; a) a generalização do procedimento ordinário, com demandas plenárias, formadoras dos ‘processos totais’ como os chamava Carnelutti; b) o sistema recursal, excessivamente amplo e liberal; e c) o princípio da responsabilidade pelas despesas processuais, que o sistema aplica equivocadamente pela metade"."·".
Ora, quanto mais reduzirmos o número de pretensões de direito material, agrupando em uma só lide as questões litigiosas que poderiam compor duas ou mais demandas diferentes, aumentamos a complexidade, com as naturais conseqüências disso decorrentes, ao passo que, se as pulverizamos em lides parciais, distribuindo por muitas ações aquelas questões formadoras da imaginada lide total, criaríamos ações de pequena complexidade, capazes de permitir soluções rápidas e seguras.
Se pudermos desdobrar as demandas plenárias ("processos totais", como os chamava Carnelutti) em demandas sumárias teríamos a celeridade desejada. O inconveniente, alerta, Ovídio Baptista que essa opção provocaria seria a inversão do contraditório, liberando o autor vitorioso no sumário de ter de ajuizar o plenário, sob pena de ver desfeito o resultado por ele conseguido."·".
Sem considerarmos, aqui, questões de ordem filosófica, devemos ter presente que temos razão política que justifica o retorno às ações sumárias. Estas razões podem ser resumidas, de um lado, na exigência, cada vez mais vigorosa, de uma justiça efetiva e condizente com os tempos da civilização eletrônica; de outro no completo fracasso, que o sonho racionalista prometera, de um direito "científico", tão previsível e exato quanto um teorema matemático.
Quanto à desilusão da idéia iluminista de que o direito pudesse ser uma ciência tão demonstrável quanto a matemática, como pensava Leibniz e os demais filósofos racionalistas, ressalta Ovídio Baptista que a "completa cognizione" a que se referira Liebman, além de contribuir para a eternização dos feitos não assegura uma justiça superior.
Estamos ainda acostumados às lides totais, significativamente denominada por Chiovenda, "cognição ordinária", ou seja, plenária. Isso mantém a ideologia da ordinariedade. Porém a plenariedade da cognição, determina um aumento do índice de incerteza. Quanto mais se pode perquirir, mais dúvida acerca da justiça do decidido.
Seria possível afirmar que o nível de insegurança quanto ao resultado de qualquer demanda judicial, cresce na razão direta do tempo exigido para sua conclusão, e nba mesma proporção do número de recursos admitidos pelo sistema, somado à amplitude das alegações e defesas que as partes se possam valer.
Se a "certeza do direito" não se sustenta e o procedimento ordinário não pode oferecer a única vantagem que dele se poderia esperar, pois quanto mais se avolumam de questões litigiosas, mais se exarceba sua natural morosidade e maior passa a ser insegurança do resultado final, então o caminho que nos poderá dar alguma esperança de aliviar as tensões e reduzir a insatisfação com os resultados da jurisdição estatal será o resgate das ações sumárias, com o definitivo abandono do procedimento ordinário, como temos preconizado, com sua limitação apenas às causas de grande complexidade probatória."·".
Resistência existe, porém o avanço precisa seguir. Devemos abandonar o compromisso com a segurança, superar o paradigma.
Entendemos, entretanto, que o estudo da prestação jurisdicional de urgência vai além da flexibilização e alargamento de possibilidades para a sua ocorrência, mas interfere diretamente na garantia constitucional do acesso à justiça, ainda mais à vista da alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 45 que determinou da celeridade do processo como garantia constitucional, colocando o Poder Judiciário novamente em crise para amparar toda uma gama de garantias sem, ao mesmo tempo, deixar de apreciar com o devido cuidado, individualmente, cada caso que lhe é apresentado.
A releitura dos princípios constitucionais à luz da garantia da razoável duração do processo
Por fim, cumpre-nos fazer uma análise do princípio da razoável duração do processo em relação aos demais princípios e garantias constitucionais que regem o processo.
Tema que tem sido desenvolvido e estudado ao longo das últimas décadas, o acesso à justiça, além de garantia constitucional (art. 5., inc. XXXV da CF/88), é princípio basilar da estrutura do sistema processual brasileiro, uma vez que referido princípio garante não apenas a "inafastabilidade do controle jurisdicional", mas a necessidade de novas técnicas, suficientemente adequadas para a prestação da atividade jurisdicional.
Magistral é a lição de Mauro Cappelletti e Bryant Garth:
De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos.
Continua, ainda, referido autor:
Uma tarefa básica dos processualistas modernos é expor o impacto substantivo dos vários mecanismos de processamento de litígios. Eles precisam, conseqüentemente, ampliar sua pesquisa para mais além dos tribunais e utilizar os métodos de análise da sociologia, da política, da psicologia e da economia, e ademais, aprender através de outras culturas. O "acesso" não é apenas um direito social fundamental, crescentemente reconhecido; ele é, também, necessariamente, o ponto central da moderna processualística. Seu estudo pressupõe um alargamento e aprofundamento dos objetivos e métodos da moderna ciência jurídica.
Nesse sentido, extremamente válidas as considerações de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:
A doutrina processual civil e os operadores do direito estão obrigados a ler as normas infraconstitucionais à luz das garantias de justiça contidas na Constituição Federal, procurando extrair das normas processuais um resultado que confira ao processo o máximo de efetividade, desde, é claro, que não seja pago o preço do direito de defesa. É com esse espírito que o doutrinador deve demonstrar quais são as tutelas que devem ser efetivadas para que os direitos sejam realizados, e que a estrutura técnica do processo está em condições de prestá-las.
Verificamos que no momento em que o legislador entrega nas mãos do judiciário a possibilidade de realizar ou deixar de realizar expectativas (geradas a partir da propositura da demanda), ao mesmo tempo lhe entrega a responsabilidade de utilizar o bom senso para o deferimento das medidas de urgência, assumindo o risco de, não havendo um sistema interno de freios e contrapesos, acabarmos por mitigar o acesso à justiça.
A Emenda Constitucional nº 45, ao destacar sobre a duração do processo em prazo razoável, faz direta referência, sendo, portanto manifestação, do direito fundamental do acesso à justiça.
Entretanto, à vista de uma espessa névoa de urgências, algumas considerações são necessárias para que se entenda a questão do acesso à justiça em prazo razoável.
No dizer de Fabiano Carvalho,
Reconhecem-se como características marcantes da garantia constitucional do prazo razoável para duração do processo: (i) universalidade, porquanto é destinada a todos que estão submetidos à jurisdição brasileira; trata-se, portanto, de um direito fundamental assegurado a todos, indistintamente; (ii) limitabilidade, os direitos fundamentais não são absolutos; isso quer dizer que a garantia da duração razoável do processo deve ser interpretada à luz do sistema e que duas garantias constitucionais podem chocar-se, como, v.g., celeridade e contraditório. Tal fenômeno é denominado conflito positivo, resolvido pelo princípio da proporcionalidade, também chamado de princípio absoluto; (iii) cumulatividade, uma vez que essa garantia pode, e não raras vezes, é cumulada com outras; finalmente (iv) irrenunciabilidade, na medida em que os titulares da garantia constitucional não podem dela dispor.
Assim, quando falamos em prestação jurisdicional de urgência, automaticamente estamos enfrentando uma garantia constitucional na questão da prestação jurisdicional (a inafastabilidade prevista no inciso XXXV do art. 5º da CF/88), bem como na questão do tempo para a realização do direito, a partir da "razoável duração do processo".
Retomando as palavras do autor, não basta para a efetividade da justiça o suprimento de instâncias e formalidades, é necessário buscar o equilíbrio do sistema, no momento em que o sentido de proporcionalidade de garantias deve estar sempre visualizado pelo Magistrado ao apreciar o pedido de urgência.
Aproveitando as palavras utilizadas para o fim de amenizar os efeitos da garantia da razoável duração do processo, adequando-as à questão da tutela jurisdicional de urgência, podemos concordar com Fabiano Carvalho, ao apontar que nem sempre uma decisão rápida/célere, e, em se falando em tutela de urgência, liminar, vai ao encontro do justo direito. No dizer do autor,
(...) o resultado "mais rápido" seguramente nem sempre é o "mais efetivo". A celeridade processual, conquanto sendo um valor que deve presidir a administração da justiça, não poderá, claramente, ser erigida a um tal ponto que, em seu nome, vá sacrificar outros valores que, afinal, são componentes de direitos funamentais, tais como os do acesso aos tribunais em condições de igualdade e de uma efetividade de defesa.
Como já amplamente trabalhado na mais alta doutrina, o direito processual moderno se ampara e se distingue pelo uso da principiologia como forma de suprir eventuais lacunas e superar eventuais nulidades, levando-se em conta sempre a noção de tutela jurisdicional como resposta efetiva e adequada ao direito requerido em juízo.
Entretanto, não é apenas com relação ao acesso à justiça que o princípio da razoável duração do processo deve ser estudado.A análise das garantias constitucionais frente ao princípio da razoável duração do processo nos traz temas dignos de expressão própria, como o contraditório (pleno e ilimitado), ampla defesa (cognição sumária como regra), da inafastabilidade do controle jurisdicional (direito de ação e direito á adequada tutela jurisdicional), da razoabilidade (à variação das inúmeras espécies de procedimento) e da proporcionalidade (análise da situação fática de urgência), mas que aqui serão trabalhadas sinteticamente.
O devido processo legal, previsto no inciso LIV do art. 5º da Magna Carta é tratado no âmbito processual como uma norma de encerramento. O due process of law contém em si todos os demais princípios processuais, abarcando, inclusive, aqueles que porventura não chegaram a ser positivados pelo texto constitucional, devendo ser entendido, dessa forma, como um princípio que assegura todos os demais princípios previstos constitucionalmente, ou seja, garante o direito à ação (princípio da inafastabilidade da apreciação judicial - art. 5º, XXXV), de defesa, prova, contraditório, ampla defesa, sentença, o uso dos recursos a ela inerentes (art. 5º, incisos LIII, LIV e LV), da inadmissibilidade do uso da prova ilícita (art. 5º, LVI), bem como da publicidade e motivação dos atos processuais (art. 5º, LX e 93, IX).
Assim, todo e qualquer princípio aplicável ao processo, mesmo que não previsto expressamente, pode ser inserido dentro do conceito de devido processo legal. Exemplo disso é a garantia de uma celeridade processual, entendendo-se que todo acusado tem direito a um processo célere, não tumultuado pela própria complexidade dos atos processuais, mas rápido, que vise, primeiramente, tirar o acusado do estado de insegurança que o processo lhe proporciona (tendo em vista que o que está em jogo é a sua liberdade), ao mesmo tempo em que dá uma resposta imediata à sociedade, atingida pelo fato delitivo.
Assim, seguindo os princípios constitucionais básicos como o contraditório, a ampla defesa, aliados a princípios como da primazia das formas e da proporcionalidade, vemos da necessidade de também repensar da adequada aplicação deste instituto.
Esculpidos no art. 5º, LV, da CF/88, estão os princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurando aos litigantes no processo administrativo ou judicial e acusados em geral todos os meios e recursos inerentes a estes princípios. Manifestações do devido processo legal, contraditório e ampla defesa não derivam um do outro, senão estão intimamente ligados pela própria natureza do processo. Assim, temos o princípio do contraditório atrelado ao princípio da bilateralidade da audiência, onde é infesto ao juiz ouvir uma parte e não dar a chance para que a outra se manifeste. Esta idéia está vinculada ao aspecto da dialeticidade que move a decisão judicial.
De importante relevância no processo civil, é no processo penal que o contraditório e a ampla defesa assumem papel inafastável, devendo a ampla defesa, inclusive, ser plena e eficaz, sob pena de nulidade. Trata-se não apenas de garantia do acusado em defender-se, mas de garantia de interesse público, da própria justiça, sendo indeclinável a defesa técnica.
O contraditório é assegurado durante todo o processo, e não se esgota com a defesa do réu. Assim, para que seja efetivo, também necessita de um tempo adequado para ser realizado. Abreviar ou extinguir o contraditório em qualquer das etapas do processo é violar a sua aplicação.
Dentre outros princípios aplicáveis ao direito processual temos o princípio da ação, bem como o princípio dispositivo (da disponibilidade do direito de ação), possibilitando às partes dispor de seus direitos, retratando-se na liberdade que as pessoas têm de exercê-los ou não. Procedente no processo civil - muito embora reconheçamos a existência de bens indisponíveis também no processo civil -, deparamo-nos, no processo penal, com princípio oposto que é o da indisponibilidade (ou da obrigatoriedade) da ação penal (pública incondicionada ressalve-se). Entretanto, o desenfreado uso de tal faculdade (princípio da ação), acaba também por chocar-se com a garantia da razoável duração do processo, uma vez que quanto maior o número de lides a serem resolvidas pelo judiciário, maior a demora na sua apreciação (isso, é claro, por um problema de organização judiciária e falta de recursos para a sua ampliação e aperfeiçoamento).
Outro princípio polêmico e importante no direito processual é o princípio dispositivo e da livre investigação das provas – verdade formal e verdade real. De acordo com o art. 131 do CPC, o juiz deve sentenciar formando seu convencimento de forma livre, valorando os elementos de prova segundo critérios lógicos, aplicando seu conhecimento jurídico e sua experiência social, fundamentando seu decisório.
Como já analisado em obra anterior, insistimos que, embora ainda vigore a distinção entre verdade formal e verdade material, defendendo-se a idéia de uma verdade formal no processo civil, onde o juiz pode satisfazer-se com as provas produzidas, limitando-se a acolher o que as partes levam ao processo e eventualmente rejeitando a demanda ou a defesa por falta de elementos probatórios e de uma verdade real no processo penal, onde o juiz deve buscar todos os elementos que possam retratar a realidade dos fatos, entendemos que tal posição é um pouco ingênua, tendo em vista que o conceito de verdade real é apenas mítico, pois o que existe no processo penal são versões de um mesmo fato, que somente os envolvidos saberão (ou não), sendo inviável o juiz reconstituir os fatos assim como ocorreram.
Entretanto, esta verdade estará sujeita à dialética inerente ao jogo processual. Ou seja, somente através do contraditório, da discussão sobre a possibilidade, verificabilidade e veracidade probatória, e aqui ressaltamos a importância destes institutos no processo penal, onde basicamente, temos a instrução cognitiva através da prova, é que será possível dizer sobre um fato, sendo a sentença, portanto, o filtro das provas, clarificadora da verdade dos fatos.
Acelerar este tempo é suprimir do magistrado a possibilidade de um conhecimento adequado da lide e, conseqüentemente, aumenta a possibilidade de uma má interpretação da situação de fato e de direito apresentada ao Judiciário.
O princípio da publicidade e da motivação das decisões judiciais, esculpidos nos arts. 5º, LX e 93, IX da Constituição Federal, servindo como mecanismo de legitimação da função jurisdicional, eis que toda decisão judicial deve ser fundamentada, motivada e, da mesma forma, deve ser dado publicidade ao julgamento e aos atos processuais, sendo inconstitucional o ato praticado sob sigilo. O princípio da publicidade é a arma da sociedade para a fiscalização da Justiça, pois esta não pode ser secreta, e muito menos arbitrária em suas decisões.
Levando em conta o ideal no qual deveria inspirar-se o direito processual, principalmente o civil, que seria o de acesso à Justiça de forma rápida e de baixo custo para todos, temos o princípio da economia e da instrumentalidade das formas. Sendo um dos fatores apontados por todos (críticos e não críticos ao próprio Poder Judiciário) como causadores do estado de "crise" pelo qual passa o "Estado" e, assim como em decorrência, o "Direito", está o volume de demandas e a impossibilidade do Estado de atendê-las de forma eficiente, levando a maior parte das questões para o Judiciário.
A nossa preocupação se revela no momento em que não é possível exigir do magistrado o respeito a todas as garantias constitucionais e, ao mesmo tempo, que a decisão seja rápida, adequada e eficaz para a recuperação do status quo ante. É exigir "milagre" por parte do julgador e "iludir" o jurisdicionado, frente à evidente problemática existente na prestação jurisdicional.
Assim, vemos que os princípios que regem o direito processual não podem ser mitigados como forma de cumprimento do preceito constitucional inserto pela EC 45/2004, mas, a partir desta garantia, deve-se repensar a forma de atuar do direito processual e a busca de novas formas de solução dos conflitos, sem a necessidade de deformar a estrutura processual vigente.
Para tanto, apostamos na mediação e na arbitragem, na possibilidade de ampliação das formas de conciliação nos feitos, nos projetos implantados pelos tribunais no sentido de informalizar o processo, sem, contudo, retirar-lhe a forma, tornando-a, apenas, mais flexível e adequada à realidade social.