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Imposto sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos (ITCMD):

aspectos polêmicos, especialmente do ponto de vista prático

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13/05/2006 às 00:00
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Na atribuição constitucional de competências tributárias, o imposto causa mortis, como é usualmente tratado, está reservado aos Estados.

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Competência e aspecto material da hipótese de incidência. 3. Base de cálculo. 3.1. Generalidades, atualização e termo a quo. 3.2. Valor do bem transmitido: data do óbito ou da avaliação? 3.3. Repetição da avaliação para arbitramento da base de cálculo. 3.4. Abatimento de dívidas. 3.5. Compromisso de compra e venda. 4. Isenção. 4.1. Breves comentários ao artigo 6º, inciso I, "a", da Lei 10.705/00. 4.2. Procedimento para reconhecimento da isenção. 5. Prazo para recolhimento: o polêmico artigo 17 da Lei 10.705/00. 6. Recolhimento do imposto e expedição de alvarás. 7. À guisa de conclusão.


1.Introdução

            A escassa produção doutrinária a respeito do imposto sobre a transmissão causa mortis [01] revela-se incompatível com a fertilidade de problemas que sua aplicação tem gerado na prática do Direito das Sucessões.

            Nesse contexto, o presente trabalho tem por objetivo, primeiramente, identificar alguns dos temas polêmicos em relação ao referido tributo, analisando-os especialmente à luz da Jurisprudência. Após, do cotejo de entendimentos não raro conflitantes nos Tribunais, pretendemos oferecer nossas sugestões.

            Considerando que a instituição do imposto sobre a transmissão causa mortis compete aos Estados, muitos dos temos analisados refletem discussões semeadas, particularmente, em São Paulo, onde o autor tem atuação profissional. Todavia, pudemos observar que as diversas leis estaduais que tratam desse imposto apresentam semelhanças que fazem coincidir, aqui e acolá, os temas objeto de costumeira polêmica.


2.Competência e aspecto material da hipótese de incidência

            Na atribuição constitucional de competências tributárias, o imposto causa mortis, como é usualmente tratado, está reservado aos Estados, aos quais compete sua instituição sobre "a transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos" (Constituição Federal: artigo 155, I).

            No Estado de São Paulo, a Lei 10.705/00, que vigora com as alterações da Lei nº 10.992/01, alargou o aspecto material da hipótese de incidência do ITCMD, que na Lei nº 9.591/66 se limitava à transmissão causa mortis de bens imóveis. Desse modo, com o advento da nova legislação, passou-se a tributar a transmissão de quaisquer bens ou direitos a eles relativos, móveis ou imóveis.

            Já aqui, chama-se a atenção para o fato de que a Lei Complementar nº 5.172/66 (o Código Tributário Nacional), em seu artigo 35, trata apenas do imposto sobre a transmissão causa mortis de bens imóveis. E, com isso, pode-se indagar se as diversas leis aprovadas nos Estados-membros e no Distrito Federal, que passaram a tributar a transmissão de bens móveis, teriam deixado de observar o comando constitucional segundo o qual cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária (Constituição Federal: artigo 146, III).

            Quem suscita e bem responde a questão é JOSÉ ANTONIO LOPES LIMA [02], ao dizer que existe permissão constitucional expressa nesse sentido, presente no artigo 34, §3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), onde se lê:

            "Promulgada a Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão editar as leis necessárias à aplicação do Sistema Tributário Nacional nela previsto."

            E, ao lado desta autorização constitucional de caráter não-permanente, o autor menciona a competência concorrente suplementar dos entes federativos para legislar sobre matérias em relação às quais a União não o tenha feito (Constituição Federal: artigo 24), de modo que, sob esse prisma, não há que se falar em desobediência ao texto constitucional.

            Superada esta questão e retornando ao aspecto material da hipótese de incidência na lei paulista, observa-se que o artigo 2º, inciso I, da referida lei, prevê a incidência do ITCMD sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória, e por qualquer título sucessório, inclusive o fideicomisso (artigo 2º, § 2º), bem como sobre a legítima dos herdeiros, ainda que gravada (artigo 2º, § 3º). O artigo 3º e seus incisos veiculam outras hipóteses e o artigo 4º trata dos casos em que o falecido possuía bens fora do país, era residente ou teve processado seu inventário no exterior, cuidando o dispositivo seguinte dos casos de não incidência.

            Ainda a esse respeito, se a transmissão tiver por objeto bem imóvel situado no Estado (ou direito a ele relativo), sujeita-se ao imposto causa mortis do Estado em que se encontra, mesmo que o respectivo inventário ou arrolamento seja processado em outro, no Distrito Federal ou mesmo no exterior (artigo 3º, § 1º). Se, por outro lado, tiver por objeto bem móvel (ou direito a ele relativo), a transmissão sujeita-se ao imposto do local onde se processa o inventário ou o arrolamento, ainda que o bem se encontre em outro Estado ou no Distrito Federal.

            Em linhas gerais, são essas as regras introdutórias no tocante ao aspecto material da hipótese de incidência do imposto sobre a transmissão causa mortis, necessárias para que prossigamos naquilo a que o estudo se propõe.


3.Base de cálculo

            3.1.Generalidades, atualização e termo ‘a quo’

            A base de cálculo do imposto de transmissão causa mortis é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo). Considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão, atualizado monetariamente até a data do pagamento (Lei nº 10.705/00: artigos 9º, § 1º e 15).

            Nem sempre o ITCMD terá por base de cálculo o valor integral da herança (monte-mor), pois há casos em que se deverá excluir a meação do cônjuge sobrevivente ou do companheiro, que decorre do regime de bens do casamento ou da união estável [03].

            Foi o que reafirmou recentemente o Superior Tribunal de Justiça, aplicando este raciocínio para afastar a incidência da taxa judiciária sobre a meação: "É certo que a taxa judiciária, em autos de processo de inventário, deve incidir sobre os bens deixados pelo de cujus. Porém, há que se excluir da incidência da exação a meação do cônjuge supérstite, pois essa parcela não se enquadra no conceito legal de herança." (REsp nº 343.718-SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 19/05/2005).

            Para que se determine o valor da base de cálculo, deve-se, primeiramente, calcular o valor do patrimônio transmitido à época da abertura da sucessão, convertendo-o em UFESP’s. Futuramente, quanto do efetivo pagamento, multiplica-se o número de UFESP’s pelo valor da unidade fiscal em vigor.

            No passado, já se contestou a legalidade da atualização da base de cálculo pela UFESP, certamente porque, com freqüência, esta operação provoca um aumento significativo no valor do imposto.

            Todavia, hoje a questão parece superada. De fato, reconhece-se ao Estado-membro o poder autônomo de tributar, no que está compreendida a possibilidade de fixar critérios de atualização do imposto de sua competência, desde que respeitado o art. 97 do Código Tributário Nacional (ver, a esse respeito: Tribunal de Justiça de São Paulo, agravo de instrumento nº 174.915-1, 05.08.92, Relator Des. Campos Mello).

            A UFESP é índice de correção monetária e, como tal, não implica majoração do tributo. Apenas representa, como se diz no jargão, a "reposição do valor aquisitivo da moeda", à falta da qual se impinge prejuízo ao Erário e, em última instância, ao próprio interesse público.

            Por esta razão, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido, reiteradamente, a legalidade da atualização pelo índice oficial praticado no Estado-membro ou Distrito Federal, como se vê nos seguintes julgados:

            "Atualização. Os Estados criam impostos e podem dispor sobre sua atualização. Legítima a aplicação da UPF/RS para cálculo do imposto de transmissão causa mortis." (STJ, 1ª Turma, REsp. nº 41.990/RS, Rel. Ministro Garcia Vieira, DJ de março de 1994, pág. 5.454)

            "É legítima a criação de índice de correção fiscal pelo Estado, na mesma medida em que é legítimo ao Estado legislar sobre os seus próprios tributos." (STJ, 1ª Turma, REsp nº 39.598/SP, Rel. Ministro Garcia Vieira, DJ de fevereiro de 1994, p. 2.137)

            Tem também entendido dessa forma o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo [04], assegurando-se, contudo, que a correção monetária não seja feita pela UFESP diária [05].

            O entendimento é razoável, ainda que, em muitos casos, verifiquem-se resultados extremamente desvantajosos do ponto de vista econômico em razão de sucessivas atualizações, situação que recomenda o recolhimento do imposto antes da mudança anual do valor da unidade fiscal [06].

            O termo a quo da atualização da base de cálculo do imposto causa mortis é a data do óbito, quando se opera o fato gerador ou hipótese de incidência do tributo, a teor do que dispõe o artigo 15, caput, da Lei 10.705/01 e na esteira do que entendem o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo:

            "A correção monetária deve ser aplicada a partir da data do óbito." (REsp nº 39.598/SP, 1ª Turma, Relator Ministro Garcia Vieira, DJ de fevereiro de 1994, pág. 2.137).

            "Inventário - Imposto de transmissão causa mortis - Correção devida desde o óbito e não a partir do sétimo mês do inventário." (Agravo de instrumento nº 213.547-1, Relator Walter Moraes, 08.03.94)

            3.2.Valor do bem transmitido: data do óbito ou da avaliação?

            Como vimos, a base de cálculo do ITCMD corresponde ao valor de mercado do bem ou direito transmitido na data da abertura da sucessão (artigo 9º, § 1º, da Lei 10.705/00), atualizado monetariamente até o pagamento.

            Embora pareça tranqüila, a questão tem gerado discussão na hipótese em que o bem ou direito transmitido se submete à avaliação judicial ou administrativa (a última perante o órgão fiscal) para exata determinação de seu valor.

            Para exemplificar, considere-se a sucessão causa mortis de um bem imóvel, cujo valor em regra atribuído nos inventários, pelos herdeiros, é aquele estabelecido como base de cálculo para lançamento do IPTU, fixado pela administração municipal.

            Neste caso, a Fazenda do Estado tem normalmente admitido, sem maiores questionamentos, o valor constante da folha de rosto do carnê referente àquele tributo. E, no mais das vezes, o órgão fazendário não tem por costume questionar o valor atribuído pelos interessados, desde que obtido com base em critério conhecido da administração.

            Porém, o órgão fazendário não está adstrito àquele valor e poderá proceder à avaliação para atribuição do valor de mercado do bem na data da abertura da sucessão. No caso específico de bem imóvel, o que determina a Lei nº 10.705/00 é que o valor da base de cálculo não poderá ser inferior ao fixado para o lançamento do IPTU ou declarado para lançamento do imposto territorial rural – ITR (artigo 13).

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            Fato é que, para exata determinação do valor do bem ou direito transmitido, a lei assegura aos interessados (administração, cônjuge meeiro, herdeiros ou legatários) a possibilidade de avaliação administrativa ou judicial do patrimônio.

            Em tal hipótese, o que se tem por controvertido é se a base de cálculo do ITCMD deve corresponder ao valor do bem na data da abertura da sucessão ou na data da avaliação.

            A problemática coloca-se, especialmente, em face do que dispõe a Súmula nº 113 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual o imposto de transmissão "é calculado sobre o valor dos bens na data da avaliação". A Lei nº 10.705/00 adotou expressamente esta orientação (via de regra favorável aos cofres públicos) ao prescrever, em seu artigo 15, que: "O valor da base de cálculo é considerado na data da abertura da sucessão, do contrato de doação ou da avaliação (...)." (destacamos)

            Contudo, o que se tem defendido, a nosso ver com razão, é que o objetivo visado pela súmula, isto é, evitar distorções prejudiciais ao Fisco, encontra-se de há muito atendido mediante possibilidade de aplicação da correção monetária, posterior à consolidação daquele posicionamento pelo Supremo Tribunal Federal.

            Assim restou decidido no recurso extraordinário nº 98.589/RJ, de relatoria do Ministro Aldir Passarinho, em que se concluiu: "É que, antes, não interessava ao contribuinte pagar a Fazenda, prontamente, o imposto que era devido, mas com a correção monetária a distorção foi evitada." (STF, 2ª Turma, DJ de 11 de novembro de 1983, pág. 17.543)

            No mesmo sentido, tem-se orientado a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como se constata no seguinte julgado:

            "Embora a Súmula 113 do STF estabeleça que o referido imposto é calculado sobre o valor dos bens na data da avaliação, a jurisprudência posterior daquela Corte assentou ser possível a fixação de tal momento na data da transmissão dos bens." (STJ, 2ª Turma, REsp nº 15.071/RJ, Rel. Min. José de Jesus Filho, DJ de 10 de outubro de 1994, pág. 27.141). E ainda: REsp nº 2.263/RJ, 1ª Turma, Relator Ministro Armando Rolemberg, DJ de 18 de junho de 1990, pág. 5.681.

            Todavia, em que pese a existência desta corrente de interpretação, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, reunido recentemente para revisão de suas súmulas, confirmou a vigência da de nº 113.

            Respeitado o entendimento da Corte, acreditamos, não obstante, que referida súmula está superada. E isso não apenas pelo fato de lei posterior à sua aprovação ter estabelecido a correção monetária suficiente para resguardar o Erário.

            Também por isso. Mas principalmente porque, ao prever a instituição do ITCMD, fê-lo o constituinte, expressamente, em relação à transmissão causa mortis (art. 155, I) e este fato jurídico, por disposição também expressa da lei civil, opera-se com a abertura da sucessão, isto é, com o falecimento do autor da herança: "Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários." (Código Civil, artigo 1.784). É o conhecido direito ou princípio de saisine.

            Ora, não há dúvidas de que os aspectos material e temporal da hipótese de incidência do referido tributo, embora não esmiuçados pela Carta Magna (até porque tal tarefa compete à lei complementar), tiveram seus contornos, por assim dizer, delineados pelo constituinte, sendo defeso à lei ultrapassá-los.

            Portanto, se o aspecto material da hipótese de incidência do ITCMD é a transmissão causa mortis e esta ocorre com a abertura da sucessão, isto é, na data do óbito, é inadmissível que se queira haver como base de cálculo quantia fixada em data diversa, quando fatores externos poderão ter alterado o valor do bem desde sua efetiva transmissão.

            Em síntese, portanto, o que se tem por tributável é o valor dos bens no exato momento da transmissão, não quando de eventual avaliação – assegurada ao Fisco, obviamente, a atualização monetária até a data do pagamento.

            Para concluir, imagine-se sucessão aberta em janeiro do ano de 2002, tendo por objeto um bem imóvel. Os herdeiros pretendem, em 2005, efetuar o pagamento do imposto de transmissão e a Fazenda resolve requerer a avaliação do bem. A rigor, deve-se calcular o valor que o imóvel possuía na data da abertura da sucessão, atualizando-o segundo o índice de correção estadual.

            Neste mesmo caso hipotético, imaginemos que, um mês após a abertura da sucessão, referido imóvel tenha experimentado valorização de 50% por conta de uma obra pública realizada em seu entorno ou por qualquer outro motivo. Em 2005, os herdeiros pretendem, igualmente, efetuar o pagamento do ITCMD, procedendo à avaliação. Na linha de raciocínio desenvolvida, dita avaliação não deverá considerar a valorização havida, pois posterior à data da abertura da sucessão.

            3.3. Repetição da avaliação para arbitramento da base de cálculo

            O Código de Processo Civil, em seu artigo 1.010, I e II, admite a repetição da avaliação dos bens transmitidos caso a primeira esteja "viciada por erro ou dolo do perito" ou "quando se verificar, posteriormente à avaliação, que os bens apresentam defeito que lhes diminui o valor".

            Interpretando o dispositivo, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido no sentido de ser "cabível a realização da nova avaliação dos bens inventariados, para cálculo do pagamento do imposto causa mortis, se os valores tributáveis já se encontram defasados." (REsp nº 14.880/MG, 1ª Turma, Relator Ministro Demócrito Reinaldo, DJ de 19 junho de 1995, pág. 18.636 – destacamos).

            Também em São Paulo, o Tribunal de Justiça reconheceu tal possibilidade: "A avaliação para efeito de partilha deve ser renovada se, pelo decurso de longo tempo, tiver ocorrido grande alteração dos valores atribuídos inicialmente aos bens" (RTJ 110/416, in Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Theotonio Negrão, pág. 978, nota 1 ao artigo 1.010.)

            Data venia, não é este o sentido a ser empregado ao artigo 1.010, II, da lei processual.

            Com efeito, ao contrário do que tem entendido majoritariamente o Superior Tribunal de Justiça, o Código de Processo Civil, ao prever a hipótese de repetição da avaliação, não inclui na dicção do dispositivo a possibilidade de que tal providência seja adotada em razão da defasagem dos valores já apurados, o que nada tem a ver com a verificação, posterior à avaliação, de que os bens "apresentam defeito que lhes diminui o valor" (esta é a redação da lei).

            E não é só. O defeito a que se refere a lei - e que dá ensejo à possibilidade de nova avaliação - é aquele que, embora já existente ao tempo daquela, foi por qualquer motivo negligenciado e deixou de incorporar o valor final atribuído ao bem. Portanto, não se trata de defeito surgido posteriormente à avaliação. E isso por uma única razão: como já dissemos, para fins de arbitramento da base de cálculo do ITCMD, deve-se considerar o valor do bem à data da abertura da sucessão, de forma que quaisquer circunstâncias que lhe alterem o valor, se posteriores a tal data, não se lhe incorporarão.

            Assim, a nosso ver, a repetição da avaliação, na hipótese do artigo 1.010, II, do Código de Processo Civil, é cabível somente nos casos em que a primeira avaliação desconsiderou circunstância que altere significativamente o valor do bem. E tal circunstância poderá ser um defeito que lhe diminua o valor, como diz expressamente o Código, ou uma qualidade que lho aumente, à qual a lei não se refere de maneira expressa, mas que se extrai da intenção do legislador.

            O problema da defasagem dos valores pelo decurso do tempo, utilizado como argumento para a repetição da avaliação, resolve-se com sua atualização pelo índice oficial de correção monetária (em São Paulo, a UFESP).

            Embora seja aquele o posicionamento majoritário do Superior Tribunal de Justiça, a própria Corte já reconheceu o contrário ao afirmar que "(...) basta a aplicação de correção monetária ao valor apurado na avaliação" (RSTJ 99/248) e "Inocorrendo as hipóteses previstas no CPC, art. 1.010, a avaliação dos bens imóveis de espólio não será repetida" (RSTJ 127/218).

            3.4.Abatimento de dívidas

            Outra questão freqüentemente objeto de dúvidas diz respeito ao abatimento ou não de determinadas dívidas para que se determine a base de cálculo do imposto sobre a transmissão causa mortis. Trata-se, por exemplo, das dívidas deixadas pelo falecido e, especialmente, das despesas funerárias e dos custos com a contratação de advogado pelo inventariante.

            Em síntese, diverge-se acerca da titularidade de tais dívidas, isto é, se pertencem ao espólio e, portanto, devem ser abatidas, ou se são encargos exclusivos dos herdeiros e não devem ser descontadas.

            Embora a lei paulista seja clara ao vedar, para este fim, o abatimento de quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, bem como as do espólio (Lei nº 10.705/00: artigo 12), a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite o abatimento de despesas com a contratação de advogado pelo inventariante, além das funerárias [07].

            A respeito das despesas com a contratação de advogados, o mesmo Supremo Tribunal Federal editou a súmula 115, segundo a qual: "Sobre os honorários do advogado contratado pelo inventariante, com a homologação do juiz, não incide o Imposto de Transmissão Causa Mortis", posicionamento que se mostra ponderado diante do fato de que os herdeiros se vêem obrigados à contratação do profissional para a solução do inventário.

            Ressalte-se que, em sentido contrário, EUCLIDES DE OLIVEIRA e SEBASTIÃO AMORIM defendem o seguinte entendimento

            "(...) relativamente às despesas do processo e honorários advocatícios, em que pese o enunciado da súmula 115, prevalece o entendimento de que não se enquadram como dívida da herança, e sim como encargos de responsabilidade pro rata do viúvo-meeiro e dos sucessores, por isso não dedutíveis para efeito da apuração da herança líquida tributável." [08]

            3.5.Compromisso de compra e venda

            A Lei nº 10.705/00 nada diz, em específico, a respeito da base de cálculo do ITCMD quando a sucessão recai sobre bem imóvel compromissado à venda. A solução, que é intuitiva, coube à jurisprudência.

            Dessa forma, se o imóvel foi compromissado à venda pelo autor da herança, o imposto deve incidir apenas sobre o valor ainda não quitado pelo compromissário comprador, isto é, sobre a quantia a ser transmitida aos herdeiros; por outro lado, se o bem é de terceiro e foi compromissado à venda ao de cujus, o ITCMD incidirá apenas sobre as parcelas já pagas até a data do óbito.

            Tal entendimento restou sufragado no verbete da Súmula nº 590 do Supremo Tribunal Federal, verbis: "Calcula-se o imposto de transmissão ‘causa mortis’ sobre o saldo credor da promessa de compra e venda de imóvel, no momento da abertura da sucessão do promitente vendedor."

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Sobre o autor
Frederico Liserre Barruffini

Bacharel em Direito pela PUC/SP. Pós-graduado em Direito Civil. Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Autor de artigos nas áreas de Direito Civil, Direito de Família e Direito Processual Civil. Advogado em São Paulo (SP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARRUFFINI, Frederico Liserre. Imposto sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos (ITCMD):: aspectos polêmicos, especialmente do ponto de vista prático. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1046, 13 mai. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8350. Acesso em: 22 nov. 2024.

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