1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tem o objetivo de esclarecer às sociedades empresárias exportadoras sobre os custos de tradição (despesas e riscos) nas operações de exportação. Especificamente, visa questionar se os rendimentos decorrentes da prestação de serviços de transporte prestados por empresa com sede no exterior estão sujeitos ou não à retenção do Imposto de Renda na fonte. Trata-se, portanto, de uma investigação que parte do problema para o sistema no sentido de verificar se incide ou não Imposto de Renda na fonte sobre remessa para pagamento de despesas com transporte de mercadoria, cujas exportações foram contratadas com a cláusula DDU ou DDP.
O tema é bastante complexo e controverso porque envolve prestação de serviços internacionais. Como se sabe, o comércio de serviços tem crescido de maneira exponencial em termos mundiais e os países desenvolvidos têm pressionado no sentido de maior liberalização, como ocorre com o comércio de bens. Há, por parte dos países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, certa resistência em relação a uma liberalização generalizada, principalmente naqueles setores em que o País se sente enfraquecido. Isso, entretanto, não impediu que fosse firmado o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) na Rodada do Uruguai. De qualquer modo, não tem sido fácil determinar a exata compreensão do tratamento tributário que a legislação brasileira dá aos serviços internacionais. Há certo descompasso entre a doutrina e algumas respostas proferidas no âmbito da Receita Federal.
Antes, porém, de adentrar na questão tributária, faz-se necessária uma incursão sobre o contrato de compra e venda no comércio exterior e sua relação com o contrato de prestação de serviços de transporte, dado às ligações inexoráveis entre Direito dos Contratos e Direito Tributário que envolve e repercute sobre o tema.
2. GLOBALIZAÇÃO E DIREITO CONTRATUAL
O crescimento da economia capitalista e a globalização dos mercados, além de intensificar a intervenção estatal na exploração da atividade econômica, tornaram mais complexas as relações contratuais no comércio exterior, motivo pelo qual o ordenamento jurídico adquire ainda mais a função de instrumento de gestão e planejamento, cuja finalidade básica consiste em viabilizar o crescimento da atividade econômica e evitar práticas desleais no comércio internacional, garantindo ao empresário as expectativas de lucro. Para a consecução desse fim utilitário, o Estado dispõe de instrumentos jurídicos que lhe possibilita intervir no comércio exterior, especialmente por intermédio da legislação tributária e do Direito Administrativo. A intervenção do Estado, entretanto, não pode ser realizada contra a iniciativa privada (o empresário), mas a seu favor, conforme estabelece a Constituição Federal, no Título VII, quando trata "Da Ordem Econômica e Financeira".
A produção ininterrupta de instrumentos jurídicos (tratados, emendas constitucionais, leis complementares e ordinárias, decretos, deliberações, portarias, instruções, atos normativos etc.) provoca a expansão do ordenamento jurídico e acelera o processo de mudança nos seus conteúdos. Com isso, amplia-se o universo de possibilidades e alternativas, uma vez que um número maior de relações contratuais no comércio exterior torna-se juridicamente possível. Esse fenômeno, entretanto, gera incertezas e inseguranças que, na maioria das vezes, não são devidamente neutralizadas pelo emaranhado de instrumentos jurídicos emanados dos órgãos estatais. Além disso, a presença ostensiva do Estado por meio de dezenas de órgãos fiscalizadores e burocráticos gera mais inseguranças e incertezas em virtude de suas competências sancionadoras e repressivas. Enfim, a legislação que incide sobre o comércio exterior, em especial a legislação tributária, ainda é confusa e obscura. O imposto sobre a renda nas operações de comércio exterior é um exemplo que reflete essa situação.
Para compreender as novas possibilidades e alternativas e neutralizar os riscos que elas implicam, é necessário considerar o ordenamento jurídico na sua totalidade, tendo em vista que as normas jurídicas perfazem um todo (o sistema normativo), cujas partes, isto é, os diversos ramos do Direito (Comercial, Tributário, Administrativo, Penal etc.), são solidárias e interdependentes, mas concorrem para o mesmo fim: viabilizar a exploração da atividade econômica e intensificar o comércio exterior com neutralização de riscos e otimização de resultados. Além disso, quando se trata de comércio exterior, é preciso considerar as regras da Lex Mercatoria, em especial os Incoterms e os Tratados Internacionais. Ademais, é preciso ter sempre presente que o contrato de compra e venda de bens no comércio exterior exige outras negociações que implicam outros contratos, como: contrato de prestação de serviços de transporte internacional, contrato de prestação de serviços de transporte local, intermunicipal ou interestadual, contrato de câmbio, contrato de armazenagem, contrato de seguro etc. Trata-se, portanto, de uma rede normativa (contratual) extremamente complexa que se conecta de modo inexorável ao Direito Tributário, dando origem a fatos geradores que se ajustam às hipóteses de incidências de diversos tributos: Imposto sobre a Exportação (IE), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Operações de Câmbio (IOC), Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Serviços (ISS), além de taxas e outras contribuições.
3. COMPRA E VENDA NO COMÉRCIO EXTERIOR
A partir da década de 1980, intensifica-se o movimento no sentido de romper as políticas protecionistas e as barreiras às importações, uma vez que essas políticas constituíam entraves ao desenvolvimento da atividade econômica. O sistema econômico capitalista forçou a superação desses entraves por intermédio de diversos mecanismos (OMC, GATS, Mercosul etc.), que possibilitaram a celebração de tratados internacionais sobre comércio exterior, visando à paulatina eliminação de subsídios e barreiras tarifárias. Esse mecanismo tem repercutido no Direito dos Contratos e no Direito Tributário, dois ramos jurídicos bastante sensíveis à globalização da economia capitalista.
No que diz respeito ao Direito dos Contratos, o desenvolvimento do comércio internacional forçou certa padronização dos direitos e deveres dos contratantes e, com isso, reduziu o grau de insegurança e incerteza nas relações contratuais. Assim, com o objetivo de fornecer padrões gerais de distribuição, entre exportador e importador, das despesas e riscos com o transporte de bens (mercadorias) no comércio exterior, a Câmara de Comércio Internacional (CCI) e outros organismos corporativos têm aperfeiçoado o comércio internacional pela consolidação dos contratos-tipo e dos Incoterms.
Nos contratos-tipo (como é o caso da compra e venda de commodities ou de grãos) consolidados por organismos corporativos (London Trade Corn Association, Internacional General Produce Association, American Spice Trade Association e outros), as partes aderem às cláusulas estabelecidas, abstendo-se de negociá-las, como fariam em contratos de outra natureza. Os Incoterms, regras de interpretação de cláusulas contratuais identificadas por siglas, sintetizam a repartição dos custos de tradição (despesas e riscos) entre o vendedor e o comprador. A última revisão dos Incoterms começou a vigorar em 1.º de janeiro de 2000 (Publicação n. 560 da CCI).
3.1. Custos de tradição
Um aspecto fundamental no contrato de compra e venda no comércio exterior é a necessidade de definir as responsabilidades do comprador e do vendedor no que diz respeito às despesas (serviços de transporte, estadias em portos, impostos etc.) e aos riscos (subtração, perda ou dano) que envolvem a transação. A regra de repartição desses riscos e despesas estabelece que, até o momento da tradição, eles correm por conta do vendedor e, a partir de então, do comprador. O momento da tradição é contratado entre vendedor e comprador por intermédio de regras conhecidas por Incoterms. Essas regras determinam, portanto, não apenas o momento da tradição, mas, sobretudo, estabelecem a distribuição das despesas e riscos inerentes principalmente ao transporte das mercadorias do estabelecimento do vendedor para o estabelecimento do comprador.
Com o intuito de enquadrar o tema Imposto de Renda sobre remessa ao exterior e vinculá-lo ao contrato de compra e venda no comércio exterior e às regras de interpretação (Incoterms) relativas ao custo de tradição, propõe-se a seguinte situação hipotética: uma máquina fabricada na cidade de São Paulo é exportada pelo porto de Santos para um empresário espanhol sediado em Madri, com desembarque no porto de Barcelona.
Trajetória da máquina
: a) a máquina deve ser transportada até o porto de Santos e, para isso, paga-se o serviço de transporte à empresa transportadora; b) no porto de Santos, além do pagamento pelo uso do guindaste de embarque e pelo trabalho dos estivadores e portuários, pagam-se também as diárias de estadia no armazém ou trapiche e, se for o caso, paga-se a inspeção feita por peritos (pre-shipment inspection – PSI); c) incidem então impostos brasileiros, que devem ser pagos para o desembaraço aduaneiro, além de outras taxas administrativas do controle de fronteiras; d) na travessia transatlântica paga-se à empresa de transporte marítimo ou armador pelo espaço que a máquina ocupa no navio; e) geralmente, faz-se o seguro, que implica pagamento do prêmio cobrado pela empresa seguradora; f) chegado o navio ao porto de Barcelona, incidem os impostos espanhóis e demais encargos relacionados ao desembaraço aduaneiro e controle de fronteira; g) pagam-se, também, os equipamentos e serviços de desembarque e eventual estadia da máquina em um armazém portuário; h) finalmente, paga-se o transporte da máquina até a cidade de Madri. Como se nota, além do contrato de compra e venda da máquina, outros contratos são pactuados, em especial os contratos de prestação de serviços de transporte.3.1.1. Custos de tradição e cláusulas
IncotermsNo exemplo acima, os itens dos custos de tradição mais importantes são os seguintes: 1) transporte do estabelecimento do vendedor até o porto e despesas com armazenagem; 2) desembaraço aduaneiro de exportação; 3) embarque no navio; 4) transporte marítimo; 5) seguro do transporte marítimo; 6) desembarque do navio; 7) desembaraço aduaneiro de importação; 8) transporte até o estabelecimento do comprador.
Assim, para o exportador brasileiro definir o preço da máquina é necessário, antes, definir quais itens de custos de tradição ficarão sob a sua responsabilidade.
Para não deixar dúvida e imprimir segurança ao negócio, o contrato entre o exportador brasileiro e o importador espanhol deve especificar a cláusula Incoterms, conforme as seguintes hipóteses, indicadas de maneira bastante sintética e apenas para viabilizar a discussão sobre o tema tributário: a) EXW-São Paulo: o importador espanhol responde pelo pagamento de todos os itens; b) FAZ-Santos: o exportador brasileiro responde pelos itens 1 e 2 e o importador espanhol, pelos demais; c) FOB-Santos: o exportador tem a obrigação de pagar os itens de custo 1 a 3; d) CFR-Barcelona: o exportador paga os itens 1 a 4; e) CIF-Barcelona: o exportador paga os itens 1 a 5; f) DEQ-Barcelona: o exportador paga os itens 1 a 7; g) DDU-Madri: o exportador responde pelos itens 1 a 6 e 8 e o importador pelo item 7; h) DDP-Madri: o exportador responde por todos os itens.
Assim, caso o contrato de compra e venda seja pactuado com a cláusula DDU ou DDP, o exportador brasileiro fica responsável pela entrega da máquina no estabelecimento do importador espanhol, motivo pelo qual deverá firmar, com uma ou mais empresas transportadoras, um ou vários contratos de prestação de serviços de transporte que lhe possibilite cumprir o pactuado.
4. SERVIÇOS DE TRANSPORTE
Podem-se apontar dois contratos de transporte marítimo internacional: a) contrato de fretamento; b) contrato de transporte marítimo.
No contrato de fretamento, cujo instrumento contratual é a charter party (carta de fretamento), o fretador (proprietário e/ou armador) obriga-se a colocar à disposição do afretador (expedidor ou destinatário) os serviços do navio, mediante o pagamento do frete. No contrato de transporte marítimo, a finalidade não é apenas a cessão de um espaço no navio mas também o efetivo transporte da carga de um ponto de origem ao destino final, e o instrumento jurídico que o representa é o Conhecimento Marítimo ou Bill of Lading (B/L).
O contrato de transporte marítimo pode ser celebrado de acordo com diversos regimes contratuais, quais sejam: a) House to House: a mercadoria é retirada no estabelecimento do exportador e entregue no estabelecimento do importador; b) Pier to Pier: a mercadoria é retirada no porto de partida e entregue no porto de chegada; c) House to Pier: a mercadoria é retirada no estabelecimento do exportador e entregue no porto de chegada; d) Pier to House: a mercadoria é retirada no porto de partida e entregue no estabelecimento do importador. Em linhas gerais, o regime contratual adotado determina a responsabilidade em caso de avaria, furto ou perda da carga.
Há, ainda, no comércio exterior, o denominado contrato de transporte multimodal de cargas (TM). O transporte multimodal utiliza dois ou mais modais (marítimo, aéreo, terrestre) para o transporte de cargas de um ponto de origem ao destino final, mediante a celebração de apenas um contrato e a intermediação de um único agente, denominado Operador de Transporte Modal (OTM). Para atuar, o OTM necessita de habilitação prévia e registro perante o Ministério dos Transportes, procedimento esse previsto no Dec. n. 3.411/2000. Assim, mediante pagamento de frete, o OTM se obriga a executar ou fazer executar o TM contratado. O OTM emite um documento denominado Conhecimento de Transporte Modal (CTM) que rege a operação desde o recebimento da carga até a sua entrega no destino e serve como prova de que a carga está sob a sua custódia e, portanto, responde objetivamente por qualquer dano, avaria ou atraso na entrega.
Como se nota, também no âmbito dos serviços de transportes várias alternativas de relações contratuais, juridicamente possíveis, são postas à disposição do empresário exportador. A escolha do contrato mais apropriado geralmente se submete à relação custo/benefício que rege a exploração da atividade econômica. Aqui, cabe especificar que o preço do serviço pago à empresa transportadora não caracteriza renda, mas apenas receita bruta operacional.
5. TRIBUTOS NA EXPORTAÇÃO
Nos custos de tradição, além das despesas operacionais, também se incluem os pagamentos de impostos, taxas e contribuições. Conforme especificado acima, na compra e venda com a cláusula DDU ou DDP, o exportador brasileiro fica responsável pelo pagamento de todas as despesas, inclusive os impostos brasileiros e espanhóis, motivo pelo qual é necessário mensurar a carga tributária como forma de elaborar o cálculo que determina o preço da mercadoria a ser exportada. Com o intuito de enquadrar esse tema de maneira sistemática e melhor esclarecer o empresário, faz-se uma brevíssima referência sobre alguns impostos e contribuições brasileiros que repercutem nas operações de exportação de produtos industrializados.
a) IE: o Imposto de Exportação está previsto na CF (art. 153, II), no CTN (art. 23), no Dec.-lei n. 1.578/77 e no Regulamento Aduaneiro (Dec. n. 4.543/2002, arts. 212 a 236). O imposto incide sobre mercadorias nacionais ou nacionalizadas destinadas ao exterior. O Poder Judiciário decidiu que o fato gerador do imposto é a data do registro da exportação no Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex – Acórdão n. 301-30541). A base de cálculo é o preço normal de venda da mercadoria, ao tempo da exportação. A alíquota é de 30%, podendo ser alterada, conforme Dec.-lei n. 1.578/77 (art. 3.º), com nova redação dada pela Lei n. 9.716/98 (art. 1.º), porém nunca poderá ser superior a 150%. O Estado brasileiro, no sentido de favorecer as exportações e de acordo com as regras estabelecidas em Tratados Internacionais, concede isenções. De modo geral, os produtos industrializados estão isentos do imposto de exportação.
b) IPI e ICMS: a CF concede imunidade ao estabelecer que não incidirão IPI e ICMS sobre produtos industrializados destinados ao exterior (art. 153, § 3.º, III, e art. 155, § 2.º, X, "a").
c) PIS/Pasep e Cofins: essas contribuições estão previstas nos arts. 149 e 195 da CF e na Lei n. 10.865/2004. O fato gerador é o pagamento ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados no exterior como contraprestação por serviço prestado. A base de cálculo é o valor remetido ao exterior antes da retenção do IRRF, acrescido do ISS e do valor das próprias contribuições. As alíquotas são de 1,65% (PIS/Pasep) e de 7,6% (Cofins). A Superintendência Regional da Receita Federal (SRRF) da 8.ª Região Fiscal firmou entendimento segundo o qual as importâncias remetidas pelo exportador a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, a título de despesas com agenciamento de carga, frete interno (entre o porto e o depósito) e armazenagem, necessárias à entrega da mercadoria no local designado pelo importador (contrato com cláusula DDU), apesar de serem consideradas remuneração de serviços, não estão sujeitas à incidência da Cofins nem à incidência da contribuição para o PIS/Pasep, por não se enquadrarem nas hipóteses previstas na Lei n. 10.865/2004 (Processo Consulta n. 189/2005).
d) IOC: o imposto sobre operações de câmbio incide sobre negócios jurídicos relativos a câmbio e à compra e venda de moeda estrangeira. São contribuintes do imposto os compradores e os vendedores de moedas estrangeiras nas operações para liquidação de contratos de câmbio nas importações e exportações. A base de cálculo é o montante em moeda nacional, recebido, entregue ou posto à disposição, correspondente ao valor, em moeda estrangeira, da operação de câmbio (art. 64, II, do CTN). A alíquota é de 25%, podendo ser reduzida nas situações previstas na Lei n. 8.894/94, art. 5.º. De modo geral, o IOC, hoje, é contemplado com alíquota zero.
e) ISS: a CF estabelece que compete aos Municípios instituírem impostos sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II e definidos em lei complementar (art. 156, III). Os Municípios não podem instituir ISS sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior (art. 155, II, da CF). Cabe à lei complementar excluir da incidência do ISS as exportações de serviços para o exterior (art. 156, § 3.º, II da CF). Conforme LC n. 116/2003, no caso de importação de serviços, compete ao tomador (localizado no território nacional), a obrigação de reter e recolher o ISS devido pelo prestador estrangeiro.
f) IR: a CF determina que compete à União instituir impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza (art. 153, III). O Código Tributário Nacional estabelece que o imposto tem como fato gerador o acréscimo patrimonial decorrente do produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos e de proventos de qualquer natureza. A LC n. 104/2001, entretanto, estabelece que a incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. Há, contudo, isenções e alíquotas reduzidas para zero que envolvem contratos de fretamento e contratos de transporte marítimo, que serão analisadas com detalhes adiante.
5.1. Observação preliminar
Como se nota, as imunidades, isenções e reduções de alíquotas concedidas às exportações revelam que o Estado brasileiro intervém nessa atividade econômica mediante uma política de incentivo, tendo em vista a otimização de resultados. Essa política também se revela nas diversas modalidades de financiamento estatal direcionadas às exportações. Há, portanto, um descompasso quando, diante de uma legislação ambígua, pretende-se entender que o Estado teve a intenção de tributar remessas ao exterior para pagamento de itens relativos aos custos de tradição de produto industrializado exportado.
Esse entendimento tem encontrado apoio em respostas da SRRF da 8.ª Região, proferidas nos seguintes termos: "as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas pelo exportador, necessárias à entrega da mercadoria no local designado pelo importador (cláusulas DDU/DDP), a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior que caracterizarem remuneração pela prestação de serviços, estão sujeitos à incidência do Imposto de Renda na fonte, ainda que a remessa seja efetuada ao próprio importador" (Processo Consulta n. 331/2002) ou "as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas pelo exportador a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, a título de despesas com agenciamento de carga, frete interno (entre o porto e o depósito) e armazenagem, necessárias à entrega da mercadoria no local designado pelo importador (contrato com cláusula DDU), por caracterizarem remuneração pela prestação de serviços, estão sujeitas à incidência do Imposto de Renda na fonte à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento), ainda que a remessa seja efetuada ao próprio importador" (Processo Consulta n. 189/2005). Essas respostas, como dito, têm servido de fundamento para justificar o entendimento segundo o qual incide Imposto de Renda na fonte sobre remessas para pagamento de serviços de transporte de produtos exportados. Esse entendimento não pode ser generalizado, é preciso, no mínimo, considerar a possibilidade de existência de normas que excepcionam a regra ou a existência de instrumentos normativos entre o Brasil e o país de destino, proibindo a dupla tributação ou estabelecendo a reciprocidade de tratamento tributário.
5.2. Especialização do problema tributário
O problema, repetindo, consiste em saber se incide ou não Imposto de Renda na fonte sobre remessa para pagamento a residente no exterior de prestação de serviços de transporte de produto exportado por empresário brasileiro. Para melhor especificá-lo, imaginemos a seguinte situação hipotética: a) é firmado contrato de comércio exterior entre um exportador brasileiro e um importador espanhol, regido pela cláusula DDP-Madri; b) o objeto do contrato de compra e venda é uma máquina que deve ser transportada de São Paulo até Madri. O empresário brasileiro pode firmar os seguintes contratos com a empresa transportadora sediada na Espanha: a) o transporte da máquina do porto de Santos até o porto de Barcelona; b) o transporte da máquina do porto de Barcelona até Madri; c) o transporte da máquina de São Paulo até Madri. O exportador brasileiro pagará os serviços de transporte à empresa transportadora espanhola mediante remessa de valores à Espanha.
A análise inicial, que se expõe na seqüência, abstrai as normas tributárias de leis ordinárias que concedem isenções ou alíquotas zero a determinados fatos geradores do Imposto de Renda nas operações de transporte internacional. Essa abstração tem o sentido de fixar o entendimento segundo o qual a remuneração pela prestação de serviços de transporte realizado por pessoa jurídica não constitui "renda", mas apenas "receita bruta operacional", razão pela qual não procede a retenção de Imposto de Renda na fonte no caso de pessoa jurídica domiciliada no exterior.