Meios de pagamento eletrônicos nos pedágios: cerceamento do direito de ir e vir

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01/08/2020 às 11:52
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4 O direito de ir e vir e os meios de pagamento eletrônicos nos pedágios

Considerando os meios de pagamento aceitos nos pedágios, consistentes somente em dinheiro e pagamentos automáticos, é notável a existência de interesse público na aceitação de mais formas de pagamento, como cartões de crédito e débito, pois atualmente são um dos meios de pagamento mais utilizados no mundo. Nesse caso, não vamos considerar os boletos, haja vista que não é uma regra, é faculdade de cada concessionária.

Segundo dados apresentados pela ABECS (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços) o balanço dos valores transacionados, no Brasil, por meios eletrônicos no primeiro trimestre de 2019 totalizaram 416 bilhões de reais, número este que poderia ser muito maior se houvesse incentivo por parte do poder público. Nesse sentido:

O cartão de crédito e débito é a opção de pagamento preferida de quatro a cada dez brasileiros, segundo pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) no ano passado. Aproximadamente um terço dos consumidores de serviços do país prefere essa modalidade por enxergar nela segurança, conforto e por não precisar levar dinheiro vivo consigo. Segundo o Banco Central, são 50 milhões de indivíduos com pelo menos um desses cartões em suas bolsas e carteiras. (ESTRADAS, Disponível em: https://estradas.com.br/por-que-nao-e-possivel-pagar-pedagio-com-cartaode-credito, 2018)

Neste artigo resta demonstrado que quase dois bilhões de veículos transitam pelas rodovias pedagiadas do Brasil. Em 2017 eram aproximadamente 53 concessionárias administrando as estradas no território brasileiro e nenhuma delas aceitava cartões de crédito e débito, somente dinheiro em papel moeda, o pagamento automático e o vale-pedágio. O artigo sustenta também que não cabe aos transeuntes optar por usar ou não a estrada, então as empresas se valem da necessidade para usurpar o direito, abusam da vulnerabilidade do cidadão diante desta situação.

Desde 2012 está pronto para ser votado, na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP), o projeto de lei estadual nº 761/2011. Ele versa sobre a possibilidade do pagamento por meio de cartão magnético nas praças de pedágio no Estado, que tem a maior concentração de estradas pedagiadas do país. Pela proposta, pelo menos metade dos guichês deveriam ter as máquinas. Mas há seis anos o projeto não entra na ordem do dia, ato que depende de decisão do presidente da Casa, Cauê Macris (PSDB-SP) e de pedido de algum parlamentar. A proposta é assinada por Carlos Grana (PTSP), que não é mais deputado. Situação semelhante se vê na Câmara dos Deputados em Brasília. Há anos vários projetos com teor semelhante se arrastam nas comissões. Um vai sendo apensado ao outro e nenhum deles tem previsão para ser apreciado. O mais antigo é o projeto de lei nº7452/2010, que reúne seis apensos. Tendo passado por duas comissões, aguarda o parecer do relator Ronaldo Nogueira (PTB-RS) na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público (CTASP) desde junho deste ano. Se não há lei que obrigue, cabe verificar o que foi pactuado. A Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo (ARTESP) é a autarquia que regula as 21 concessões em vigor no Estado. Ela diz que o pagamento por cartões de débito e crédito não está previsto em nenhum dos contratos. Não há normas que proíbam e nem obriguem das concessionárias de disponibilizar a opção de pagar com cartões de crédito. Portanto, qualquer outro meio de pagamento é liberalidade da concessionária — só faz quem quer. A Associação Brasileira de Concessionárias Rodovias (ABCR) tem entendimento semelhante. A entidade que congrega todas as concessionárias do país diz que as formas de pagamento são reguladas pelos poderes concedentes, normalmente via agência reguladora. As concessionárias apenas implantam o procedimento definido em contrato. (ESTRADAS, 2018)

Nesse sentido, como se verifica, a alegação de algumas concessionárias é a questão da não obrigatoriedade, haja vista que os contratos de concessão são omissos nesse ponto e diante disso, a fim de atender ao interesse público.

Pesquisa feita em dezembro do ano passado a pedido da Mastercard com mais de 2.000 usuários que pagam pedágio hoje com dinheiro mostra que o tempo de espera na fila e a falta de troco na fila são as principais reclamações. Veja algumas observações da pesquisa: 81% gostariam de pagar o pedágio com cartão de crédito ou de débito por aproximação 62% prefeririam utilizar seu cartão de crédito ou de débito em vez de cartão prépago exclusivo para pedágio. (GOITIA, 2019)

Os dados apresentados por Goitia corroboram a ideia de relevante interesse público na medida a ser adotada.[25]

A questão da sustentabilidade no tocante aos cartões não é tão favorável, haja vista que o plástico demora em média 450 (quatrocentos e cinquenta) anos para decompor e o papel apenas 6 (seis) meses, mas pensando de forma útil para os usuários, o cartão não é um meio tão sujo quanto o dinheiro pois fica somente com seu titular, o âmbito de circulação é muito mais restrito, além do que a quantidade de cartões produzidos se comparados com as cédulas de dinheiro são quase irrisórios, por mais que uma pessoa tenha mais de um cartão não podemos comparar com a quantidade de cédulas disponíveis.

Outro ponto de grande relevância é para a melhor exploração do turismo, haja vista que quando as pessoas viajam o cartão é um meio mais seguro de se portar o dinheiro, pois atualmente quase todos os lugares aceitam cartão, com exceção, do pedágio.

Insta salientar que o aparato estatal deve estar devidamente equipado para atender aos interesses sociais de forma que caso o cidadão só possua cartões, ele deve poder exercer seu direito, pois não ter dinheiro em papel moeda não me impede de efetuar pagamentos.

4.1 Por qual motivo o pagamento do pedágio por meio eletrônico deve ser considerado para evitar o cerceamento do direito de ir e vir

Nos pedágios quando somos impedidos de impedir viagem por que o sistema de cobrança não está equipado da forma adequada a atender toda a sociedade, isso é cerceamento do direito de ir e vir. Não é nenhum crime, trapaça ou absurdo querer pagar o que se deve com o uso de cartões.

O Estado investe tanto em tecnologia, que não se percebe nenhum problema em disponibilizar aos cidadãos mais um meio de pagamento dos pedágios, além do que, como dito no tópico anterior, um turista que vai de um lugar a outro e passa por um pedágio pode estar portando apenas cartões internacionais, justamente por segurança ou por preferência, que seja.

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O aparato estatal tem que estar preparado para atender aos interesses sociais, e a aceitação de cartões em locais de atendimento ao público não extrapola nenhum limite e nem tampouco é uma exigência de difícil cumprimento.

No Rio de Janeiro existe um projeto de lei que foi aprovado em 20 de agosto de 2019 exige que pelo menos uma das cabines aceite pagamento com o cartão de crédito ou outros meios alternativos para o cidadão efetuar o pagamento, concedendo as concessionárias o prazo de noventa dias para se adequarem.[26] Fato é que em caso de descumprimento a multa aplicada às concessionárias é de cinco vezes o valor da tarifa do pedágio e poderá ser dobrada em caso de reincidência, o que convenhamos em alguns casos é muito menor do que a multa aplicada a quem evade do pagamento.

No Estado de São Paulo são aceitos cartões, porém, não se tratam de cartões de crédito ou débito, e sim de um cartão específico, como os cartões utilizados em ônibus, no qual o usuário insere um valor em créditos e utiliza até o limite daquele valor, é como um cartão pré-pago.[27] Existe uma proposta no Estado, Projeto de Lei Estadual, que prevê que no mínimo metade dos guichês de cobrança deveriam estar equipados com as máquinas de cartão magnético, mas há seis anos o projeto não entra na pauta de discussões.

Conforme prevê o artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal, é cabível habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.

RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRAÇA DE ARRECADAÇÃO DE PEDÁGIO. PASSAGEM OBSTADA PELA AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DA TARIFA. PAGAMENTO POR CARTÃO QUE NÃO É EXIGIDO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO 1. RELATÓRIO Trata-se de ação indenizatória proposta por SELVINO RENNER em face de ECONORTE SA - EMPRESA CONCESSIONARIA DE RODOVIAS DO NORTE S/A na qual a parte autora sustentou que ao tentar passar por pedágio, não tendo o valor suficiente, não foi aceito pagamento com cartão, sendo impedido de continuar viagem. Requereu indenização pelos danos morais. O juízo monocrático julgou improcedentes os pedidos iniciais, sob fundamento de que a empresa requerida não era obrigada ao recebimento do valor da tarifa através de cartão de crédito, mesmo assim, ofertou diversas formas de resolver a questão, todas negadas pelo requerente, que, se sofreu abalo moral, o mesmo ocorreu por sua culpa exclusiva, pois perpetrou a questão desnecessariamente, não merecendo a empresa requerida qualquer reprimenda. Inconformado, a parte autora recorreu alegando, R 2 reiterando os termos da exordial. A parte ré apresentou contrarrazão ao recurso, pleiteando a manutenção da sentença. Em síntese, é o relatório. 2. VOTO Satisfeitos os pressupostos processuais viabilizadores da admissibilidade do recurso, tanto os objetivos quanto os subjetivos, razão pela qual devem ser conhecidos. Quanto ao mérito, da análise dos autos, tenho que a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos, com base no permissivo do artigo 46, da Lei nº 9.099/95. No mais, este já foi o entendimento dos Tribunais:

RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL E MATERIAL. PRAÇA DE ARRECADAÇÃO DE PEDÁGIO. PASSAGEM OBSTADA PELA AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DA TARIFA. A responsabilidade do Estado pelos atos comissivos de seus agentes é objetiva, a teor do art. 37, § 6º, da CF e abrange a concessionária de serviço público. Em princípio, é regular o procedimento que impede a passagem de veículo ante a ausência de pagamento da tarifa de pedágio. Na hipótese o autor não dispunha de dinheiro para pagamento do pedágio, tendo passado por praça de arrecadação anterior e pago a passagem regularmente. O recebimento do valor mediante cartão de débito ou boleto bancário pela concessionária não era exigível. De acordo com o conjunto de provas não está R 3 presente falha na prestação do serviço, abuso ou excesso no exercício do direito. Mantida a improcedência. Negativa de seguimento à apelação. (Apelação Cível Nº 70056175102, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Cezar Muller, Julgado em 28/08/2013) (TJ-RS - AC: 70056175102 RS , Relator: Marcelo Cezar Muller, Data de Julgamento: 28/08/2013, Décima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/09/2013) (grifei)

Portanto, nego provimento ao recurso apresentado, mantendo-se a sentença pelos seus próprios fundamentos.

Não logrando êxito, a parte recorrente deve arcar com as despesas do processo e verba honorária, arbitrada em 20% sobre o valor da condenação, com fulcro no artigo 55 da Lei 9099/95, observada a suspensão na cobrança pela Lei 1.060/1950, caso a parte recorrente seja beneficiária da assistência judiciária gratuita.

3. DISPOSITIVO

Diante do exposto, decidem os Juízes Integrantes da 1ª Turma Recursal Juizados Especiais do Estado do Paraná, por unanimidade, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos exatos termos do voto. O julgamento foi presidido pelo Senhor Juiz Leo Henrique Furtado (votante) e dele participaram e votaram as Senhoras Juízas Fernanda de Quadros Jorgensen Geronasso e Fernanda Bernert Michielin (relatora).

Curitiba, 03 de setembro de 2015.

FERNANDA BERNERT MICHIELIN Juíza De Direito Substituta R 4

Diante do exposto, decidem os Juízes Integrantes da 1ª Turma Recursal Juizados Especiais do Estado do Paraná, por unanimidade, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos exatos termos do vot (TJPR - 1ª Turma Recursal - 000640148.2013.8.16.0160/0 - Sarandi - Rel.: Fernanda Bernert Michelin - - J. 09.09.2015) (TJ-PR - RI: 000640148201381601600 PR 000640148.2013.8.16.0160/0 (Acórdão), Relator: Fernanda Bernert Michelin, Data de Julgamento: 09/09/2015, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 16/09/2015)

(JUSBRASIL. Disponível em: https://tjpr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/233033787/processo-civel-e-do-trabalhorecursos-recurso-inominado-ri-640148201381601600-pr-00064014820138160160-0-acordao?ref=serp. Acesso em: 07 nov 2019)

No caso em questão, o autor sofreu iminente violência em sua liberdade de locomoção, haja vista que ele passou pela primeira praça de pedágio e conseguiu efetuar o pagamento, ao passar pela segundo possuía apenas cartão de crédito ou débito, enfim, ele teve seu direito de ir e vir cerceado pela ausência de dinheiro físico, o que ocorreu no Paraná. Como medida de justiça, em busca de reestabelecer seu direito buscou medidas judiciais capazes de reparar seu dano emocional, o que não foi provido, restando a ele ainda o pagamento das custas e honorários processuais. O que é um patente absurdo. No caso, naquele momento caberia um habeas corpus, mas não era viável, haja vista que, ainda que o habeas corpus seja uma medida de urgência, poderia demorar dias para ser julgado. Sendo assim, o único prejudicado foi o próprio requerente e naquela oportunidade a medida mais viável era a ação cível de danos morais.

Outros Estados já usam cartões gerais

No Paraná e Rio Grande do Sul, a EcoRodovias já opera com cartões de crédito e de débito com bandeiras de ampla aceitação. Em abril, será a vez de Minas, com cartões de débito, por enquanto. Paraná: Ecovia: Desde outubro de 2016 (uma cabine aceita cartão de crédito; as demais, de débito) Ecocatararas: Desde maio de 2018 (todas as cabines aceitam cartão de débito) Rio Grande do Sul: Ecosul: Desde outubro de 2016 (todas as cabines aceitam cartão de débito) Minas Gerais: Eco135: A partir de abril deste ano (30 cabines vão aceitar cartão de débito) Cartões deixam atendimento mais rápido "Além de ser um meio de pagamento de massa, o que melhora significativamente a experiência do usuário, os resultados são bastante satisfatórios também em tempo de atendimento", declarou Luciano de Moraes, gerente de arrecadação da EcoRodovias. Segundo ele, a média do tempo de atendimento para operações com dinheiro é de 12 segundos. Com cartões, celulares e pulseiras por aproximação, sem senha, as concessionárias do grupo registram uma média de apenas três segundos. Quando o pagamento envolve senha, leva dez segundos. (ESTRADAS, 2018)

Além da vantagem do uso do meio de pagamento eletrônico, que torna mais acessível os pagamentos nos pedágios, isso implicará na redução de evasões dos pedágios, na diminuição do tempo de atendimento (tendo em vista que não será preciso o cálculo de troco). Logo, a aceitação de meios alternativos de pagamento diminuiriam o cerceamento do direito de locomoção no território brasileiro, ou pelo menos mineiro.

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Sobre a autora
Lorenna Nizer

Bacharel em Direito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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