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Sócrates e Jesus Cristo:

a relação entre a fé e a razão

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Resumo:


  • Investigação da relação entre fé e razão através das vidas de Sócrates e Jesus Cristo, utilizando metodologias de pesquisa dogmática e instrumental, técnicas bibliográficas e documentais.

  • Análise crítica de livros especializados, trechos bíblicos e da encíclica fé e razão revelou pontos de contato entre as histórias de Sócrates e Jesus, destacando a importância da filosofia na interpretação das ideias bíblicas e o papel da fé na expansão do conhecimento filosófico.

  • Na pós-modernidade, a comparação e cooperação entre fé e razão podem permitir ao indivíduo uma busca mais profunda pelo conhecimento, influenciando a formação humana e contribuindo para o debate sobre fundamentos religiosos e filosóficos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Resumo

[Introdução] Trabalho cujo escopo de pesquisa visa investigar a relação entre a fé e a razão, mediante a comparação entre as histórias de vida do Filósofo Sócrates e de Jesus Cristo. [Metodologia] Por meio da pesquisa dogmática e instrumental, e das técnicas bibliográfica e documental de pesquisa, sistematizou-se livros específicos e de documentos oficiais, como a encíclica fé e razão e de trechos bíblicos, a fim de investigar a relação entre a fé e a razão pela comparação entre Sócrates e Jesus Cristo. [Resultados] A análise crítica de livros especializados, de trechos bíblicos e da encíclica fé e razão demonstrou alguns pontos de contato entre o histórico de vida de Sócrates e a passagem de Jesus Cristo. A encíclica fé e razão mostrou a importância da filosofia para a interpretação e concretização das idéias contidas nos documentos bíblicos, e o papel da fé no descobrimento de novos horizontes para o conhecimento filosófico. [Conclusão] O período da pós-modernidade – ao mesmo tempo em que apresenta uma crítica ao contexto religioso posto, em razão das transformações científicas, tecnológicas e culturais – permite a pessoa o acesso às informações. Assim, a comparação e a cooperação entre a fé e a razão poderá possibilitar ao sujeito a busca pelo conhecimento.

 Palavras-chave: Sócrates; Jesus Cristo; Fé; Razão; Filosofia; Conhecimento Filosófico.


1 Considerações iniciais

"Oculos habent et nom videbunt"

Em nossa vida cotidiana, afirmamos, negamos, desejamos, aceitamos ou recusamos coisas, pessoas, situações. Fazemos perguntas, dizemos frases, avaliamos coisas e pessoas. Quando se fazem certas afirmações, acredita-se que existem relações de causa e efeito entre as coisas. Acredita-se, assim, que a realidade é feita de causalidades; que as coisas, os fatos, as situações se encadeiam em relações causais que podemos conhecer e, até mesmo, controlar o uso de nossa vida.

Acreditamos que o espaço existe, possui qualidades (perto, longe, alto, baixo) e quantidades, podendo ser medido (altura, largura, comprimento).

A necessidade de um alicerce sobre o qual construir a existência pessoal e social se faz sentir de maneira premente, principalmente quando se é obrigado a constatar o caráter fragmentário de propostas que elevam o efêmero ao nível de valor, iludindo assim a possibilidade de se alcançar o verdadeiro sentido da existência. [01]

Em plena época pós-moderna, em que as transformações culturais, científicas e tecnológicas chegam em grande velocidade, e o sujeito retorna ao centro das discussões sociais, a acuidade dos dados históricos (em razão das novas ferramentas de estudo) e o grande número de informações (aumentadas substancialmente com o desenvolvimento da tecnologia da informação, cujo grande exemplo é a internet) começam a entrar em confronto com o contexto religioso até então existente.

Nossa Constituição, mesmo que promulgada em 05 de outubro de 1988, reflete, em seus aspectos fundamentais, os valores pós-modernos discutidos. A dignidade da pessoa humana entra em xeque (CF, art. 1º, III), e os valores religiosos (CF, art. 5º, VI) e os pensamentos filosóficos (CF, art. 5º, VIII) podem ser discutidos no âmbito da pluralidade de idéias e valores (CF, art. 1º, V), pela livre manifestação do pensamento (CF, art. 5º, IV).

Acredita-se que a Filosofia nada mais é do que a decisão de não aceitar como óbvias e evidentes as coisas, as idéias, os fatos, as situações, os valores, os comportamentos de nossa existência cotidiana; jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e compreendido.

Imagine se as pessoas começassem a fazer perguntas inesperadas, como "O que é o sonho? A loucura? A razão? O que é causa, efeito?" Ao se fazer questionamentos deste tipo, estaríamos nos distanciando da vida cotidiana e de nós mesmos, passando a indagar o que são as crenças e os sentimentos que alimentam, silenciosamente, nossa existência. Estaríamos interrogando a nós mesmos, desejando conhecer por que cremos, no que cremos, por que sentimos o que sentimos e o que são nossas crenças e nossos sentimentos. Estaríamos adotando, pois, a chamada Atitude Filosófica.

A atitude filosófica se inicia dirigindo tais indagações ao mundo que nos rodeia e às relações que mantemos com ele. Pouco a pouco se descobre, porém, que essas questões se referem à nossa capacidade de conhecer, de pensar. Por isso, pouco a pouco as perguntas da Filosofia se dirigem ao próprio pensamento.

A Filosofia se torna, então, o pensamento interrogando-se a si mesmo, uma volta que o pensamento realiza sobre si mesmo, como uma Reflexão. Logo, a reflexão filosófica é radical porque é um movimento de volta do pensamento sobre si mesmo para conhecer-se a si mesmo, para indagar como é possível o próprio pensamento.

O conhecimento filosófico é um trabalho intelectual. É sistemático porque não se contenta em obter respostas para as questões colocadas, mas exige que as próprias questões sejam válidas e, em conseqüência, que as respostas sejam verdadeiras, estejam relacionadas entre si, esclareçam umas às outras, formem conjuntos coerentes de idéias e significações, sejam provadas e demonstradas racionalmente.

Em poucas palavras, a Filosofia se interessa por aquele instante em que a realidade natural (o mundo das coisas) e a história (o mundo dos homens) se tornam estranhas, incompreensíveis e enigmáticas, quando o senso comum já não sabe o que pensar e dizer e as ciências e as artes ainda não sabem o que pensar e dizer.

Dentro desse contexto, um dos aspectos marcantes dos dias de hoje é um interesse crescente pela vida espiritual. Porém, o cidadão moderno é mais participativo e procura aliar a razão à fé, o conhecimento à doutrina.

Nesse sentido, Jesus Cristo (talvez a personalidade mais conhecida em todas as culturas) começa a ter sua vida investigada por estudos históricos, os quais entram em conflito com as informações reveladas pelo Vaticano nos trechos dos Evangelhos, colocados à disposição dos fiéis.

Com efeito, a comparação da vida do Cordeiro com o filósofo Sócrates, torna-se – pois – possível, tendo em vista a grande semelhança existente entre o perfil, a metodologia empregada e alguns dos valores contidos nos ideais defendidos por cada um.

Assim, é importante destacar que não se pretende desmistificar nenhuma das duas figuras (uma, a essência da filosofia; a outra, a pedra de torque da fé), mas sim apresentar características situadas nos respectivos contextos e fontes de pesquisa.

Nessa perspectiva, perquire-se: qual a importância dessa comparação para o Direito? Além do embate filosófico-teológico já ter sido objeto de análise comparativa com o Direito [02], é justamente nas asas da fé e da razão que se pretende voar (pelo menos) em direção à apresentação de fundamentos que situem a importância da razão para a teologia e da fé para a filosofia, pois a relação entre fé e razão reflete na estrutura argumentativa da ciência jurídica. Estudar – pois – estes elementos (apresentando-os no Capítulo 1, com uma resenha da vida de Sócrates, contextualizando o mistério do Cordeiro, com dados sobre Jesus Cristo no Capítulo 2), explicitando a relação entre eles (a fé e a razão – Capítulo 3), constitui – sem dúvida – um interessante convite à continuação de um debate acerca dos fundamentos e da importância da Palavra de Deus e da Filosofia para a formação da pessoa humana.


2 A vida de Sócrates

"Scio quod nihil scio"

2.1 Prolegômenos

Sócrates nasceu em 470 (ou nos primeiros meses de 469) a.C. O pai, Sofronisco, era escultor; a mãe, Fenarete, parteira. Completou em Atenas a sua educação juvenil (tem-se que ele provavelmente estudou geometria e astrologia). Só se ausentou de Atenas por três vezes, para cumprir os deveres de soldado, tendo participado nas batalhas de Potideia, Délios e Anfípolis.

Sócrates se manteve afastado da vida política. Sua vocação, tarefa a que se dedicou e a que se manteve fiel durante toda a vida, foi a filosofia. Entretanto, compreende a investigação filosófica como um exame incessante de si próprio e dos outros, ao qual dedicou – sem nenhum ensinamento regular – todo o seu tempo. Por essa tarefa, viveu pobremente com sua mulher (Xantipa) e filhos.

Sua figura não tinha qualquer dos traços tradicionalmente utilizados para delinear o caráter de outros sábios. Sua personalidade tinha qualquer coisa de estranho e inquietante que não escapava àqueles que dele se aproximavam e o descreveram. Sua própria aparência física chocava o ideal helênico (ou seja, relativo à Grécia antiga) da alma sábia num corpo belo e harmonioso. Graças ao aspecto inquietante de sua personalidade, fôra comparado por Platão à tremelga ("que entorpece quem a toca"): do mesmo modo, provocava a dúvida e a inquietação no ânimo daqueles que dele se aproximavam. [03]

Destaca-se que este homem – o qual se dedicou inteiramente à filosofia, e por ela morreu – nada escreveu. Tem-se, pois, o maior paradoxo da filosofia grega, mas não um fato casual. Isso porque, se Sócrates nada escreveu, foi porque defendia que a pesquisa filosófica (tal como ele a entendia e praticava) não podia ser levada adiante ou continuada depois dele, por escrito.

Nas palavras do rei egípcio Thamus, dirigidas a Theut, inventor da escrita:

"Tu ofereces aos alunos a aparência, não a verdade da sabedoria; porque quando eles, graças a ti, tiverem lido tantas coisas sem nenhum ensinamento, julgar-se-ão na posse de muitos conhecimentos, apesar de permanecerem fundamentalmente ignorantes, e serão suportáveis para os demais, porque terão não a sabedoria, mas a presunção da sabedoria." [04]

Para Sócrates, o qual entende o filosofar como exame incessante de si mesmo e dos outros, nenhum escrito pode suscitar e dirigir o filosofar. O escrito pode comunicar uma doutrina, não estimular a pesquisa.

Assim, a renúncia de Sócrates a escrever se deveu (e fez parte essencial) à sua própria atitude filosófica.

2.2 A personalidade de Sócrates

Tendo em vista a renúncia acima descrita, difícil se faz a caracterização da personalidade de Sócrates, o que é feito através de testemunhos indiretos, como estes: (a) Xenofonte (pessoa ouço dotada de espírito filosófico) nos passa uma imagem extremamente pobre e mesquinha da personalidade de Sócrates; nada no seu retrato justifica a enorme influência que este filósofo exerceu sobre todo o desenvolvimento do pensamento humano; (b) já nos diálogos de Platão, a personalidade de Sócrates vive poderosamente; todavia, é possível que Platão, nesses casos, pense e fale ele próprio na figura de Sócrates e que, portanto não se possa encontrar nos seus diálogos o Sócrates histórico; (c) por fim, Aristóteles nada acrescenta ao já exposto por Xenofonte e Platão. [05]

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Tendo em vista a brevidade das relações de Xenofonte com Sócrates, e o fato de os testemunhos de Aristóteles parecerem depender – em grande medida – de Platão (e talvez do próprio Xenofonte), tem-se – como fonte fundamental para a reconstrução do Sócrates histórico – Platão. [06]

2.3 "Conhece-te a ti mesmo"

Cícero, ao proferir que "Sócrates fez vir a filosofia do céu à terra", exprime exatamente o caráter da investigação socrática, a qual tem por objeto – exclusivamente – o homem e seu mundo, ou seja, a comunidade em que vive. [07] Sócrates buscava promover no homem a investigação em torno do homem, o que deve tender a pôr o homem (isto é, cada homem individual) a claro consigo mesmo, a levá-lo ao reconhecimento de seus limites, e a torná-lo justo, solidário com os outros.

Por isso a expressão adotada por ele mesmo ("Conhece-te a ti mesmo"), fazendo do filosofar um exame incessante de si próprio e dos outros: de si próprio em relação aos outros, e dos outros em relação a si próprio.

A primeira condição desse exame é o reconhecimento da própria ignorância. Quando Sócrates conheceu a resposta do oráculo que o proclamava o homem mais sábio de todos, compreendeu – então – o seu verdadeiro significado: nenhum dos homens sabe verdadeiramente nada, mas é sábio apenas quem sabe que não sabe, não quem se ilude com saber e ignora assim até a própria ignorância. Na verdade, só quem sabe que não sabe procura saber, ao passo que os que crêem estar na posse de um saber fictício não são capazes da investigação, não se preocupam consigo mesmos e permanecem irremediavelmente afastados da verdade e da virtude.

O meio utilizado para promover nos outros este reconhecimento da própria ignorância é a ironia. Trata-se da interrogação que tem por objetivo revelar ao homem a sua ignorância, abandonando-o à dúvida e à inquietação, obrigando-o à pesquisa. A ironia é o meio de se descobrir a nulidade do saber fictício.

A ironia é a arma que Sócrates utiliza contra a vaidade do ignorante que não sabe que o é e, por isso, se recusa a examinar-se a si mesmo e a reconhecer os próprios limites. Por isso, é também uma libertação.

2.4 Maiêutica

Sócrates não se propõe, assim, a comunicar uma doutrina (ou complexo de doutrinas); não ensina nada, apenas comunica o estímulo e o interesse pela pesquisa. Nesse sentido, compara a sua arte à de sua mãe, a parteira Fenarete: a sua arte consiste basicamente em averiguar – por todos os meios – se o seu interlocutor tem para parir algo de fantástico e falso ou de genuíno e verdadeiro; declara-se estéril quanto à sabedoria; aceita como verdadeira a censura que muitos lhe dirigem de saber interrogar os outros, mas de nada sabe responder ele próprio. [08]

Ele não tem qualquer interesse em ensinar os outros, senão em ajudá-los em seu parto intelectual. E os outros (aqueles que dele se aproximam), a princípio, parecem completamente ignorantes, mas depois sua pesquisa se torna fecunda, sem que – todavia – nada recebam dele.

Assim, esta arte maiêutica nada mais é do que a arte de pesquisa em comum. O homem não pode ver claro por si só. A investigação de que se ocupa não pode começar e acabar no recinto fechado da sua individualidade, mas sim ser o fruto de um dialogar contínuo com os outros, bem como consigo mesmo.

O universalismo socrático não é a negação do valor dos indivíduos, mas o reconhecimento de que o valor do indivíduo só pode ser compreendido e realizado nas relações entre os indivíduos; todavia, deve essa relação entre os indivíduos ser fundada na virtude e na justiça.

Eis aqui o interesse de Sócrates: promover em cada homem a investigação de si próprio, retornando naturalmente à problemática da virtude e da justiça.

2.5 O saber e a virtude

A busca de si é, ao mesmo tempo, a busca do verdadeiro saber e da melhor maneira de viver; é – simultaneamente – investigação do saber e da virtude, conceitos estes que – segundo Sócrates – se identificam.

O homem não pode tender senão para saber aquilo que deve fazer ou aquilo que deve ser; tal saber é a própria virtude. Esse é o princípio fundamental da ética socrática.

Para Sócrates, uma ciência que seja incapaz de dominar o homem e que o abandone à mercê dos impulsos sensíveis, nem sequer parece uma ciência. Se o homem se entrega a esses impulsos, significa que ele sabe ou crê saber que essa é a coisa mais útil ou mais conveniente para ele. A ignorância (ou seja, um erro de juízo) é a base de toda a culpa e de todo o vício; uma má avaliação é que faz o homem preferir o prazer momentâneo, independente das conseqüências más ou dolorosas que daí possam advir; e um cálculo errado é fruto da ignorância. Quem verdadeiramente sabe, faz bem os seus cálculos, escolhe em cada caso o melhor prazer (aquele que não lhe trará dor nem mal), e esse é o prazer da virtude.

Assim, para ser virtuoso, não é necessário que o homem renuncie ao prazer. A virtude não é a negação da vida humana, mas sim a vida humana perfeita (engloba o prazer à prazer máximo).

O que se pode censurar a Sócrates é não ter estabelecido as distinções entre as atividades ou faculdades humanas que Platão e Aristóteles introduziram na filosofia. Para Sócrates, o homem é um ser indivisível. O seu saber não é apenas a atividade do seu intelecto ou da sua razão, mas sim um modo de ser e de se comportar. Segundo Sócrates, a virtude é ciência, é investigação (investigação autônoma dos valores em que a vida deve se fundar).

2.6 A religião de sócrates

Para Sócrates, o filosofar é uma missão divina, uma tarefa confiada por ordem divina. Fala de um demônio, de uma inspiração divina que o aconselha em todos os momentos decisivos de sua vida, demônio este o qual pode-se interpretar como a voz da consciência; na verdade, trata-se do sentimento de uma investidura recebida do alto, própria de quem abraçou uma missão com todas as suas forças. Por isso, o sentimento da divindade está sempre presente na investigação socrática, como sentimento do transcendente, daquilo que está além do homem, é superior a este, e do alto o guia e lhe oferece uma garantia providencial.

Certamente, a divindade de que fala Sócrates não é a da religião popular dos Gregos, tampouco tem a ver com o cristianismo (de que, na velha historiografia, Sócrates tem sido freqüentemente considerado precursor). Aquilo que a divindade ordena, segundo Sócrates, é o empenho na investigação e o esforço aplicado à justiça; quanto à verdade e à virtude, o homem deve procurá-la e realizá-la por si.

2.7 Das investigações socráticas

Aristóteles caracterizou a investigação de Sócrates do ponto de vista lógico. Pode-se atribuir a ele os raciocínios indutivos e definição do universal (ambos dizem respeito ao princípio da ciência).

O raciocínio indutivo é aquele que, do exame de um certo número de casos ou afirmações particulares, conduz a uma afirmação geral que exprime um conceito. Assim, a Sócrates cabe o mérito de ter sido o primeiro a organizar a investigação segundo um método propriamente científico.

Foi posto em dúvida o valor do testemunho aristotélico sobre o significado lógico da investigação socrática, tendo em vista que as afirmações de Aristóteles derivariam das de Xenofonte, e estas – por sua vez – das platônicas. Por outro lado, ainda que se atribuísse todo o valor aos testemunhos de Aristóteles e Xenofonte, não caberia a Sócrates o título de inventor do conceito, pelo fato de ter investigado apenas conceitos ético-práticos, o que exprime não aquilo que realmente é, mas sim o que deve ser. [09]

Todavia, a questão fundamental é a do significado do conceito para Sócrates. É certo que todos os conceitos elaborados por Sócrates são de caráter ético-prático, e respeitam o dever-se e não a realidade de fato, mas qualquer conceito (seja teórico ou prático) tem por objeto a essência das coisas, o seu ser permanente ou a sua substância, ou seja, o problema que Sócrates deixaria a seus sucessores, e que constitui o tema fundamental da investigação de Platão e Aristóteles.

2.8 A morte de Sócrates

Grande era a influência exercida por Sócrates sobre toda uma geração em Atenas, quando três cidadãos (Melito, Ânito e Lícon) o acusaram de corromper a juventude, ensinando crenças contrárias à religião do Estado. [10] A acusação era escassa e não teria dado nenhum resultado, se Sócrates tivesse feito qualquer concessão aos juízes, o que não ocorreu. Pelo contrário: declarou que em nenhum caso abandonaria essa tarefa (ou seja, a tarefa educativa que havia empreendido relativamente aos atenienses), a qual era chamado por uma ordem divina. Por uma pequena maioria, Sócrates foi considerado culpado, seguindo-se a condenação à morte pedida por seus acusadores.

Trinta dias decorreram entre a condenação e a execução, em decorrência de uma solenidade sagrada que, naquele período, impedia as execuções capitais. Durante esse período, os amigos de Sócrates organizaram sua fuga, procurando convencê-lo, mas ele recusou. Sócrates queria dar, com sua morte, um testemunho decisivo a favor do seu ensinamento. Vivera até então ensinando a justiça e o respeito pela lei; não podia – pela fuga – ser injusto para com as leis de sua cidade e desmentir, assim, no momento decisivo, toda a sua obra de mestre.

Por outro lado, não temia a morte. Ainda que não tivesse certeza absoluta da imortalidade da alma, nutria a esperança de uma "vida após a morte" que fosse melhor para os homens justos que para os maus. Na época, Sócrates tinha 70 anos; sentia que havia completado sua missão, que a ela havia permanecido fiel durante toda a vida, e que deveria lhe dar – com a morte – a última prova de fidelidade.

Suas últimas palavras, proferidas a seus discípulos, foram – ainda – um incitamento à investigação:

"Se tiverdes cuidado com vós próprios, qualquer coisa que façais ser-me-á grata, bem como aos meus e a vós mesmos, ainda que agora não vos empenheis em nada. Mas se pelo contrário não vos preocupardes com vós próprios e não quiserdes viver de maneira conforme àquilo que agora e no passado vos tenha dito, fazer-me agora muitas e solenes promessas de nada servirás." [11]

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Sobre os autores
André Pires Gontijo

bacharelando em Direito pelo UniCEUB, pesquisador do CNPq

Laís Helena Riecken Teixeira

bacharelanda em Direito pelo UniCEUB (DF)

Valéria de Oliveira Dias

Bacharel em Administração pela UnB, bacharelanda em Direito pelo UniCEUB e servidora do TST

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONTIJO, André Pires ; TEIXEIRA, Laís Helena Riecken et al. Sócrates e Jesus Cristo:: a relação entre a fé e a razão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1061, 28 mai. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8444. Acesso em: 25 dez. 2024.

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