Uma das novidades trazidas pela já não tão recente emenda constitucional 45/04 foi a concentração da presidência dos Conselhos permanente e especial no juiz de direito do juízo militar.
Antes do advento da emenda referida, a presidência em tais colegiados era atribuída ao oficial general ou ao oficial superior de posto mais elevado que o dos demais juízes militares, ou de maior antiguidade, no caso de igualdade [01].
Segundo preconiza o artigo 435 do CPPM, nas votações, o Juiz de direito vota primeiro e o presidente, por último. Assim, no regime revogado, o agora juiz de direito do juízo militar prolatava o primeiro voto, que, no mais das vezes, influenciava o voto dos juízes militares que o sucediam na votação.
Na disciplina anterior à emenda constitucional 45, o juiz togado lançava voto condutor, a que aderiam invariavelmente os juízes militares, com honrosas exceções de magistrados militares que, bem compreendendo a natureza de seu munus, ousavam divergir e até mesmo motivar o voto de divergência.
A razão da influência do voto do juiz togado sobre o voto dos juízes militares de 1º grau é de ordem variada. De início, atua o respeito reverencial que os militares têm pelas autoridades do Poder Judiciário; depois, é natural que o Juiz Militar reconheça no Juiz togado qualidades técnicas e de experiência judicante de que ele, Juiz Militar, não dispõe, por não ser a atividade judicante de seus misteres corriqueiros. Certo, assim, que o voto do juiz togado acaba sendo norte seguro para o juiz militar na ordem de votação implementada, prevalecendo, no mais das vezes, o juízo de valor formulado inicialmente pelo juiz togado, tanto para o bem, como para o mal.
A questão que agora desafia os operadores do direito castrense está no fato de que a partir da emenda 45, por força do disposto no parágrafo quinto do artigo 25 da, Constituição da República, o juiz de direito do juízo militar passou a ser também presidente do colegiado (Conselho permanente ou especial), de sorte que passa a imperar a dúvida sobre a ordem de votação, mais exatamente, sobre o juiz de direito votar primeiro ou por último na ordem referida.
A resposta a esta questão está no fundamento da regra de ordenação dos votos nos juízos colegiados: impedir-se que o juiz de maior autoridade influencie o voto do juiz de menor autoridade.
Assim, com espeque no critério apontado, resulta que, a partir da vigência da emenda constitucional 45, por força da redação do parágrafo quinto do artigo 25 da Constituição da República, o juiz de direito do juízo militar passou a ser o último a votar, de sorte que seu voto não influencie de nenhum modo o voto dos juízes militares que estão submetidos à sua autoridade nos Conselhos permanente e especial.
A redação dada ao parágrafo quinto do artigo 25 da Constituição da República corrige, assim, critério equivocado do plano infraconstitucional, posto que, de fato, a autoridade maior dos Conselhos permanente e de justiça sempre foi a do juiz togado, com enorme influência sobre o convencimento dos juízes militares.
Deste modo, na sessão de julgamento, o presidente do Conselho de justiça convidará os juízes a se pronunciar sobre as questões preliminares e o mérito da causa, votando em primeiro lugar os juízes militares, por ordem inversa de hierarquia, e, finalmente, o juiz de direito do juízo militar.
Note-se que, na oportunidade referida, nada impedirá que o juiz de direito do juízo militar esclareça aos juízes militares os elementos sensíveis da matéria a ser julgada, abstendo-se, entretanto, de emitir elementos de sua convicção íntima. Concluídos os esclarecimentos, passam a votar os juízes militares, votando, ao final, o juiz de direito.
Não prospera, assim, o argumento segundo o qual o juiz de direito do juízo militar deve votar primeiro pelo imperativo de esclarecer os juízes militares. Ao votar primeiro, o juiz de direito não só "esclarece" como indevidamente influencia a decisão dos pares militares. Incidem nesta hipótese de forma mais intensa os juízes de direito que têm por técnica resumir oralmente os elementos do processo, já explicitando os elementos de sua convicção judicante, ainda que dissimuladamente, passando imediatamente a votar, como sói ocorrer.
Findados os debates, abrem-se dois momentos: o do esclarecimento das dúvidas existentes de parte dos juízes militares (quando e somente quando os juízes militares externam pontos de dúvida), a teor do artigo 434 do CPPM, e o momento da votação. Assim, no novo regime, o juiz de direito esclarece as dúvidas quando existentes e, sem qualquer manifestação de juízo de valor acerca dos fatos postos em julgamento, convida o juiz de menor patente a lançar seu voto, reservando-se para votar ao final, oportunidade em que dará as razões de sua convicção, como já afirmado.
A mudança da presidência dos Conselhos permanente e especial também trouxe a vantagem de que, nas hipóteses de empate, o "voto de Minerva" passa a ser do juiz de direito, de sorte que, nos julgamentos onde o juízo é controverso, havendo dissensão entre os juízes militares que importe em empate de votos, a sorte do réu passa a ser fixada pelo magistrado de acervo técnico-jurídico mais elaborado (juiz de direito do juízo militar), com enorme vantagem, em princípio, para a justiça e o direito.
A inobservância do critério de ordem de votação aqui apontado é nulidade que causa prejuízo evidente ao réu, posto que a autoridade do juiz de direito do juízo militar influirá seguramente no convencimento dos juízes militares, fazendo preponderar o juízo da autoridade sobre o juízo da justiça e do direito livremente fixados.
O requerimento de observância da ordem de votação que se finde com o voto do juiz de direito do juízo militar deve ser formulada ao término dos debates, nos termos do permissivo do artigo 434 do CPPM.
O eventual indeferimento da ordem de votação que se finde com o voto do juiz de direito do juízo militar deve ser objeto de registro na ata da sessão de julgamento nos termos dos artigos 395 e 448 do CPPM.
A inobservância da ordem de votação como aqui indicada dá ensejo a habeas corpus por nulidade do processo, devendo também ser articulada como matéria preliminar de apelação, nos termos da letra "b" do artigo 504 do CPPM.
Notas
01 Vide artigo 16 da Lei n° 8.457, de 4 de Setembro de 1992.