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Passagens aéreas pela internet

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O presente artigo tem por objeto o conflito de normas, estabelecido o artigo 49, da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor) e a Resolução 400/2016, da Agência Regulatória da Aviação Civil – ANAC.

Resumo: O presente artigo tem por objeto o conflito de normas, estabelecido o artigo 49, da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), e a Resolução 400/2016, da Agência Regulatória da Aviação Civil – ANAC. Observa-se que a lei consagrou, entre os diversos direitos e garantias de proteção ao consumidor, o instituto do direito de arrependimento, que é a prerrogativa do cidadão adquirente de produto ou serviço pela internet, de cancelar a contratação, em um prazo de até 7 dias corridos, sem qualquer custo para o mesmo. Em contrapartida, a regulamentação da agência reguladora previu que, no caso de compras de passagens aéreas, seja por meios virtuais ou presenciais, o prazo para cancelamento da compra é de apenas 24 horas, não se aplicando o direito consagrado na norma legal. É apresentado um breve histórico da evolução do direito do consumidor no Brasil. Posteriormente, a narrativa sucinta do surgimento e ampliação do comércio eletrônico e a aplicação do Direito consumerista no seu arcabouço. Finalmente, o instituto do direito de arrependimento é analisado, tanto em seu aspecto doutrinário quanto jurisprudencial, especificamente no contexto do e-commerce e da aquisição das passagens aéreas, em particular. Em um segundo momento, são objeto de estudo jurisprudências conflitantes sobre o tema, o que demonstra que o problema da aplicabilidade da norma legal é relevante. Conclui-se, em razão de institutos como a hierarquia entre as normas e o princípio da proteção ao consumidor, por fim que, a despeito da controvérsia ainda não estar pacificada, que o comércio de passagens deve estar abarcado pelo direito de arrependimento.

Palavras-chave: Consumidor. Direito de arrependimento. Comércio eletrônico. Passagens Aéreas. Conflito Entre Normas


INTRODUÇÃO

O presente trabalho faz uma abordagem acerca do direito de arrependimento, instituto consagrado pela Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), e o seu aparente conflito com a atual entendimento da Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, acerca das compras de passagens aéreas via internet.

É importante ressaltar que o direito de arrependimento é uma prerrogativa do consumidor estabelecida em lei, que lhe garante um prazo de reflexão de 7 dias, durante o qual pode desistir de eventual compra de produto ou serviço adquiridos fora de estabelecimento físico. Pasme-se quando se diz que esse mesmo direito não se aplica às passagens aéreas compradas nos canais virtuais.

Diante dessa situação, os alunos, através de pesquisa doutrinária e jurisprudencial, buscaram entender porque uma Resolução da ANAC alterou os prazos de cancelamento para passagens compradas pela internet, em discordância com o artigo 49 do CDC/1990.

A Resolução 400/2016 determina que a restituição do valor pago no bilhete é assegurada quando o passageiro desiste da viagem nas primeiras 24 horas após a emissão do comprovante, desde que com antecedência de sete dias da data do embarque.

Ocorre que, de fato, o posicionamento da Agência Reguladora tem estimulado práticas abusivas por parte das companhias aéreas, e não deveria a legislação regular a vulnerabilidade que permeia o direito de arrependimento com peculiaridades próprias e condizentes com aspectos específicos do setor da aviação civil?

Deve-se ainda, atentar ao fato de que o Código de Defesa do Consumidor merece reforma, especialmente diante das mudanças estruturais pelas quais passou o comércio eletrônico brasileiro. Em meio a essa burocracia, muitos passageiros acabam desistindo ou recebendo valores bem abaixo do que teriam direito.

As inovações tecnológicas ocorrem hoje em um ritmo muito acelerado, forçando mudanças permanentes em todas as demais áreas do conhecimento humano, e não poderia ser diferente no Direito. Isto posto, é notório afirmar que muitos juízes e tribunais já estão aplicando a regra contida no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de serviços de transporte aéreos, embora as divergências em torno da matéria ainda estejam longe de acabar.

No Brasil, o legislador e o operador do Direito já se veem em face dos desafios propostos pelo uso da tecnologia da informação aplicada aos diversos institutos jurídicos, acompanhando a mesma tendência mundial.

Assim, frise-se que no momento em que este texto está sendo redigido, o mundo atravessa uma pandemia, a do Covid-19, e já se percebe que tem havido, alterações no âmbito jurídico e mesmo nas políticas de relacionamento das empresas aéreas com os consumidores.

O novo cenário de crise, econômica e sanitária, já tem demonstrado fortes reflexos na aviação civil, efeito, dentre outros elementos, das restrições ao tráfego aéreo nacional e internacional, no intuído de, se não barrar, refrear a disseminação do novo coronavírus.

Dessa forma, um tema que já não estava devidamente pacificado, a saber, o aparente conflito entre o direito de arrependimento na legislação ordinária e a regulamentação da Agência Nacional de Aviação Civil, tomou contornos de urgente readequação, jurídica e comercial.

O tema é abordado em dois tópicos principais: O primeiro traz um panorama geral do Código de Defesa do Consumidor, aplicado ao chamado e-Commerce. Nele, perpassa-se por um breve histórico do Direito do Consumidor no Brasil, bem como as origens e o cenário atual do comércio eletrônico no mercado interno, além de se explanar acerca do instituto do direito de arrependimento, aplicado às compras fora de estabelecimentos físicos, e em especial via web.

A segunda parte aborda mais especificamente a aplicação desse mesmo instituto, o direito ao arrependimento, com relação às compras de passagens aéreas, o porquê da não-aplicação do CDC e legislação correlata a esse nicho de mercado, além das propostas legislativas em andamento, além de uma análise jurisprudencial e acadêmica, por parte dos graduandos, da seguinte questão-problema: o direito de arrependimento, como previsto no código de defesa do consumidor e em legislação correlata, deve ser aplicado as compras de passagens aéreas via internet?


I – O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O E-COMMERCE

1.1 O Direito do Consumidor no Brasil

A Constituição da República de 1988, não por menos denominada Constituição Cidadã, incluiu de forma inovadora, a proteção do consumidor como direito fundamental em seus art. 1º, III, art. 5º, XXXII, art. 24, V e a sua defesa como princípio da ordem econômica no art. 170, V; prova de que de fato existe uma preocupação com os vulneráveis e que é possível, devida e necessária a intervenção do Estado nas relações privadas de consumo para garantia de defesa e da devida aplicação dos seus direitos.

O Código de Defesa do Consumidor foi criado pela Lei nº 8.078 em 11 de setembro de 1990, passando a viger em 11 de março de 1991, e, a critério histórico, importante ressaltar que nós passamos quase todo século XX aplicando o Código Civil de 1916 nas relações de consumo, a fim de sanar conflitos que surgiam entre consumidores e fornecedores, estas duas partes, a base da existência do CDC.

Neste sentido, corolário desta legislação especial, vejamos no artigo 6º do CDC, onde resta que são direitos do consumidor estampados nas normas instituídas, a proteção à vida, saúde, segurança; divulgação adequada sobre o produto; informação clara e liberdade de escolha; proteção contra publicidade enganosa e abusiva; proteção contratual; prevenção e reparação de danos materiais e morais, individuais, coletivos e difusos; acesso aos órgãos de defesa, à inversão do ônus da prova e adequada e eficaz prestação dos serviços públicos, todos aplicados em consonância com princípios basilares do ordenamento jurídico.

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012).

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. (Brasil, 1990).

Tais direitos consignados no artigo supracitados, são regidos pelos princípios que moldam a aplicação das relações jurídicas, o que não seria diferente em uma norma tão vanguardista quanto a em análise, qual seja, o Código de Defesa do Consumidor – CDC.

No entanto, antes de ingressar no tema dos princípios, deve-se ficar claro que o Código de Defesa do Consumidor é um microssistema jurídico autônomo, logicamente submetido aos critérios e normas constitucionais, que visa disciplinar as relações de consumo entre fornecedores e consumidores suas responsabilidades e deveres, estabelecendo condutas justas e mecanismos para reparar os danos que venham a ser causados aos consumidores, com definição de prazos e penalidades para fornecedores.

Nesse sentido, Leonardo de Medeiros Garcia discorre que:

Trata-se de um verdadeiro microssistema jurídico, em que o objetivo não é tutelar os iguais, cuja proteção já é encontrada no Direito Civil, mas justamente tutelar os desiguais, tratando de maneira diferente fornecedor e consumidor com o fito de alcançar a igualdade. (GARCIA, 2008, p.7).

O professor José Geraldo Brito Filomeno assim define o que seja relações de consumo:

As relações de consumo nada mais são do que 'relações jurídicas' por excelência, pressupondo, por conseguinte, dois pólos de interesse: consumidor - fornecedor e a coisa, objeto desses interesses. No caso, mais precisamente, e consoante ditado pelo Código de Defesa do Consumidor, tal objeto consiste em 'produtos' e serviços (FILOMENO, 1995, p. 47).

Em seus artigos 1º, 4º, 6º e 7º o Código de Defesa do Consumidor estabelece, os princípios que resguardam a dignidade do consumidor, primando pelo equilíbrio e igualdade das relações consumerista diárias, salientando que os princípios exteriorizados nos artigos citados, não são, portanto, taxativos e sim exemplificativos, visto que não se exaurem no que está descrito na lei, havendo diversos outros que nele estão implicitamente inseridos. São elencados a seguir os princípios inerentes ao CDC que tutelam e protegem os direitos consumidores:

O princípio da vulnerabilidade esculpido no artigo 4º, I do CDC, reconhece a fragilidade do consumidor, seja em relação jurídica, fática, econômica ou informacional, ele sempre será o elo mais fraco da relação. Essa identificação do consumidor como presumidamente vulnerável, faz nascer normas que asseguram o direito de ordem pública, indisponíveis, conforme art. 1º, do Código de Defesa do Consumidor, em face do interesse social presente na relação privada (BENJAMIN; MARQUES; BESSA, 2012).

O princípio da informação, no artigo 6º, III do CDC, aparece como um dever imposto ao Estado e ao fornecedor, de modo a prestar informações seguras, claras e precisas acerca de produtos e serviços, também está ligado ao contrato primando para que as informações sobre risco e clausulas apresentadas sejam de fácil compreensão, possibilitando que o consumidor esteja a par de tudo de forma mais transparente, para que sua escolha ou adesão seja de forma consciente.

Contudo, a transparência que se espera do fornecedor não deverá estar presente somente no momento da conclusão do negócio jurídico. Deverá existir durante a oferta e publicidade, ao longo da execução do contrato e até mesmo depois desta, como, por exemplo, no instante em que o consumidor, munido do termo de garantia, procura o reparo do produto junto a assistência técnica autorizada (SILVA, 2003, p. 69).

Também expressos no artigo 4º estão os princípios da proteção do consumidor, da transparência, confiança e harmonia dos interesses, sempre com base na boa fé e visando um equilíbrio na relação de consumo. O princípio da boa-fé é um dos princípios mais importantes do direito privado, constitui em regras de conduta ética e transparente e deveres de lealdade e honestidade. Para Leonardo de Medeiros Garcia, traduz-se em:

[...] um conjunto de padrões éticos de comportamento, aferíveis objetivamente, que devem ser seguidos pelas partes contratantes em todas as fases da existência da relação contratual, desde a sua criação, durante o período de cumprimento e, até mesmo, após a sua extinção. (GARCIA, 2008, p.41).

Importante demais deixar registrado que na forma de seu artigo 7º o Código de Defesa do Consumidor faz com que os princípios que lhe são inerentes, preconizem a teoria do diálogo das fontes, observando, interpretando e aplicando conjuntamente as normas do ordenamento jurídico:

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Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade. (BRASIL, 1990, online)

Desse modo, conforme já amplamente ressaltado, o Código de Defesa do Consumidor, um verdadeiro Microssistema Jurídico, uma Lei Especial, que com seus princípios e objetivos bem definidos, deve assim ser encarado, mormente até porque nele se esmera o célere Juizado Especial.

Nesta nuance de ciência multi e interdisciplinar, há sintetizado em seu arcabouço normativo, ainda que deveras muito dependente do CPC, por exemplo, normas de cunho civil, tributário, penal e até administrativo, normas tais específicas e também de natureza ampla.

Assim, por esta ótica, a de que verdadeiro microssistema jurídico, evolucionário e revolucionário, principalmente por sua especialidade e celeridade, é mote de exercício amplo de cidadania e garantia de dignidade dos envolvidos, qual seja, relações de consumo.

Com a globalização e a chegada do e-commerce a relação de compra e venda é de fato desequilibrada, em suma o consumidor fica em situação de vulnerabilidade em detrimento ao fornecedor do produto ou serviço, que passa, por sua vez, a ditar os padrões deste tipo de negociação. Com o interesse de harmonizar assas relações, estabeleceram-se regramentos que proporcionam a proteção à parte mais frágil da relação, que é o consumidor.

1.2 Aspectos Relacionados ao Comércio Eletrônico

A internet foi criada em 1969, nos Estados Unidos e foi denominada Arpanet, sua função inicial era função interligar laboratórios de pesquisa. Naquele ano, um professor da Universidade da Califórnia passou para um amigo em Stanford o primeiro e-mail da história. Já ano de 1989, o físico Berners-Lee propôs o sistema de hipertextos, criando as condições para a troca de quaisquer informações disponíveis nos computadores de todo o mundo. Foi, contudo, em 1993, com o advento da World Wide Web (www) que o acesso à rede universalizou-se (COELHO, 2014, 229).

Em 1994, a EMBRATEL lançou o acesso online de forma experimental. Somente no ano seguinte que se deu a liberação para o setor privado ter acesso à Internet, para estudar como explorar comercialmente os seus benefícios. Em 1997, criou-se as "redes locais de conexão" expandindo, dessa forma, o acesso a todo território nacional. No início o acesso era restrito ao meio acadêmico e científico e, de repente, a internet passa a ser responsável por transformar a sociedade. Mudando drasticamente a forma como as pessoas passaram a consumir informação, cultura, serviços, produtos, entretenimento e conhecimento.

O surgimento do comércio eletrônico se deu na virada do Século XX para o Século XXI quando a internet passa a ser mais acessível à população de modo geral. Veio como um novo método de comércio e hoje é o mercado que mais cresce no mundo. Segundo pesquisa da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico, publicada recentemente, “o faturamento do e-commerce brasileiro ultrapassará a casa dos 100 bilhões de Reais. A estimativa é que as vendas online irão gerar um volume financeiro de R$ 106 bilhões. A cifra representa um crescimento de 18% sobre o ano anterior (ABCOMM, 2020, online). ”

Conforme Ricardo Menna (2014, Apud ÂMBITO JURÍDICO, 2016), fica evidenciado que a internet vem promovendo significativas transformações no modo de vida das pessoas e não poderia deixar de influenciar seus costumes, mudou completamente a relação entre consumidores e as empresas com o surgimento do comércio eletrônico ou e-commerce, sendo este um mercado bilionário e em expansão, registrando a abertura de novos negócios dia após dia. Em entrevista o autor relata que:

Existem diversos fatores que podem estar levando a esse desenvolvimento. Por exemplo, a popularização da internet, pois hoje o acesso está muito fácil e quando eu falo em facilidade não me refiro apenas ao valor, me refiro a locais públicos com acesso à internet. Tem também a questão do crescimento do poder aquisitivo, com certeza, mas a popularização da internet em diversas cidades do Brasil – que já dispõe de wi-fi público – é uma facilidade que está levando, tranquilamente, o consumidor médio a realizar compras com certa margem de segurança (MENNA, 2014, Apud ÂMBITO JURÍDICO, online).

Os elementos que compõe as relações de consumo no comercio eletrônico, são as mesmas do comércio convencional, sendo eles fornecedor, consumidor e a aquisição de bens ou serviços, a diferenciação está na forma em adquirir os bens e serviços, contudo, a relação e os direitos são os mesmos assegurados. Segundo Fábio Ulhoa Coelho (2015), o comércio eletrônico pode se conceituar como:

A venda de produtos (virtuais ou físicos) ou a prestação de serviços realizadas em estabelecimento virtual. A oferta e o contrato são feitos por transmissão e recepção eletrônica de dados. O comércio eletrônico pode realizar-se através da rede mundial de computadores (comércio internáutico) ou fora dela (COELHO, 2015, p.32)

Há ainda outro ponto a ressaltar, o termo comércio eletrônico é utilizado para descrever um novo enfoque on-line para desempenhar funções tradicionais de compra e venda. Os consumidores se renderam à comodidade e conforto para fazer negócios via internet, assim podem pesquisar e comparar preços de produtos e serviços e ainda finalizar o negócio virtual em um “click” de onde estiver e na hora que puder. Segue neste mesmo entendimento Vitor Guglinski (2012) em seu artigo jurídico:

No que diz respeito à segurança nas transações, é verdade que o comércio virtual trouxe conforto e comodidade a empresários e, principalmente, aos consumidores, que, no caso de aquisição de produtos, podem satisfazer suas necessidades de consumo sem enfrentar os transtornos envolvendo o deslocamento até o estabelecimento comercial, bastando que selecione os bens que melhor lhe atendam, através de um simples click no mouse. No caso de contratação de serviços, procede-se da mesma forma, bastando que o consumidor manifeste sua vontade de contratar, restando somente a fruição do serviço após a concretização do negócio.

Não obstante devemos observar que com a expansão do comercio eletrônico no Brasil, houve consequentemente o crescimento no número de negociações realizadas por todo território, o também gerou aumento dos conflitos entre fornecedores e consumidores e os infortúnios decorrentes de qualquer relação de consumo. É incontestável que o consumidor com tal relação ficou mais vulnerável, pois este muitas vezes não sabe quem é o fornecedor e se o produto exposto é o que realmente será entregue.

Frisamos também, que os contratos eletrônicos celebrados pela internet possuem todas as fases de negociações características de um contrato comum, sendo no caso considerado contrato de adesão com todas as suas características e peculiaridades, conforme corrobora Antônia Espíndola Longoni Klee (GUGLINSKI, 2014, p. 171).

A proteção dos consumidores na celebração de contratos a distância deve ser no sentido de diminuir os principais riscos e inconvenientes que decorrem da sua própria natureza e de criar as condições necessárias para a existência de um clima de confiança e de segurança jurídica no tráfico jurídico e econômico realizado por meios de comunicação a distância.

Neste diapasão, a velocidade de avanço da internet não consegue ser alcançada pela visão dos legisladores, para proteção das relações de consumo o diálogo das fontes há muito vem sendo efetivamente utilizado para solucionar os conflitos existentes entre consumidor e fornecedor, com amparo na jurisprudência, analogia e costumes. Conforme entendimento da doutrinadora Maria Eugênia Finkelstein:

Sabe-se que o Direito está em constante evolução, seja para adequar-se às mudanças sociais, seja para acompanhar o surgimento de novos ramos da ciência. Tem-se que o CDC é relativamente novo se comparado a diversas outras codificações brasileiras. Assim como o Código Civil de 2002 e a CF de 1988, o CDC tem papel importante no desenvolvimento social e econômico no cenário atual. Tal importância se deve à veloz evolução de diversos ramos do Direito, em especial o Direito do Consumidor, cada vez mais atrelado às novas tecnologias, em especial a internet (FINKELSTEIN, 2011, p.19)

Nesse compasso, do aumento dos conflitos judiciais na seara do comercio eletrônico, muitos consumidores lesados recorrem ao judiciário para buscar reparação pelos danos sofridos, caso ocorra a então a necessidade de uma lide, esta deve estar amparada na lei para resguardar de forma geral a proteção e segurança jurídica do consumidor, afim de que a resposta dada seja eficaz e contundente com o caso concreto.

1.3 A Proteção Jurídica Nas Compras Pela Internet

Conforme demonstrado, as relações consumeristas pelos meios digitais, como fenômeno econômico e tecnológico relativamente recente, pungiam, pela relevância social, pela normatização jurídica.

Nisto concordam LEITE & LEMOS (2014), ao afirmarem:

Os estudos da proteção dos consumidores nos contratos eletrônicos apontam para o desenvolvimento do Direito, inserido no contexto da pós-modernidade.143 Atualmente, não há como pensar no cotidiano sem a presença dos computadores, muito menos da internet. Por isso, é preciso proteger o consumidor e o usuário, quando firmarem contratos eletrônicos, por causa da sua vulnerabilidade. (LEITE; LEMOS, 2014, p.509)

À guisa dessa realidade, foi-se formando, dentro do ordenamento jurídico brasileiro, todo um escopo normativo que, juntamente com o próprio objeto de estudo, o comércio eletrônico, está em frequente atualização.

No que diz respeito ao consumidor, polo vulnerável - e geralmente hipossuficiente - da relação de consumo, devido às particularidades do e-commerce, dispositivos legais, jurisprudenciais e doutrinários têm sido trazidos à lume, à medida que casos concretos, antes desconhecidos, tem se tornado realidade.

Marco importante nesse sentido foi o Decreto Federal 7.962/2013 (também conhecido como Lei do e-commerce), que regulamentou a Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor - CDC), no que diz respeito à contratação no comércio eletrônico. Assim dispõe em seu art. 1°:

Art. 1º Este Decreto regulamenta a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico, abrangendo os seguintes aspectos:

I - informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor;

II - atendimento facilitado ao consumidor; e

III - respeito ao direito de arrependimento. (BRASIL, 2013, online)

Três aspectos são apresentados pela ‘Lei do E-commerce’, como objetos de sua regulamentação, tratando-se de pilares para a boa relação jurídica no meio digital:

1.3.1 Informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor

O próprio CDC, em seu art.6°, IV e V, dá destaque à preservação da informação fidedigna, campo potencialmente fértil para a violação no ambiente virtual:

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas. (BRASIL, 2013, online)

Observe-se que o legislador procurou garantir os requisitos para que a vontade do consumidor, ao pesquisar, orçar, negociar e adquirir, ou mesmo desistir ou arrepender-se de eventual transação comercial por meios virtuais, fosse respeitada e preservada de vícios. Grande ênfase pode ser percebida, primeiramente, no aspecto da transparência e clareza da informação.

A lei 12.956/2014, também conhecido como o Marco Civil da Internet, legislação considerada vanguardista no âmbito internacional, no que diz respeito ao Direito Digital, dá destaque em seu bojo às relações consumeristas. Marcelo Barreto de Araújo (2014) destaca a ênfase que o Marco Civil dá ao Direito do Consumidor:

Todavia, é na legislação emanada do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que devemos mais nos concentrar, por se constituir no único ramo do Direito que o Marco Civil da Internet expressamente determinou que se aplicasse ao empresário virtual, proclamando que é garantia do usuário a “aplicação das normas de proteção e defesa do consumidor nas relações de consumo realizadas na Internet” (artigo 7º, inciso XIII, vide ainda artigo 2º, inciso V, da Lei 12.965/2014). Tal é a magnitude desta matéria no comércio eletrônico que o Poder Executivo editou o Decreto 7.962/2013, o qual regulamenta as contratações na área digital à luz do direito consumerista, como examinaremos em seguida. (ARAÚJO, 2017, p.124).

Com o autor acima, também concorda TEIXEIRA (2015), sobre o papel do Marco Civil nas relações consumeristas via internet:

Numa preliminar análise poderia se imaginar que a referida norma não trata claramente sobre comércio eletrônico em sentido estrito (quanto à compra e venda de produtos e prestação de serviços), mas apenas acerca de outras operações realizadas no comércio eletrônico em sentido amplo (como questões envolvendo a proteção à privacidade e a vedação da captação indevida de dados e da sua comercialização). Entretanto, suas regras e princípios têm implicação direta em tudo o que ocorre na internet em âmbito brasileiro, inclusive o e-commerce, enquanto operações envolvendo a produção e a circulação de bens e de serviços. Além disso, como veremos, a Lei n. 12.965/2014 (art. 7º, XIII) reafirma a aplicação das normas de defesa do consumidor nas relações firmadas pela internet, desde que configurada uma relação de consumo. (TEIXEIRA, 2015, p.91)

Ainda salienta ARAÚJO (2017), a maior probabilidade de um vício de vontade na aquisição de um bem ou serviço na web:

O dever de bem informar ao cliente ganha muito mais relevo no comércio eletrônico, onde a compra não é presencial. Não há manuseio do produto a ser adquirido, não há visualização imediata da sua cor e tamanho, o que faz com que as comunicações virtuais, por vezes, tenham que ser mais explicitadas e elucidativas. (ARAUJO, 2017, p.127).

1.3.2 Atendimento facilitado ao consumidor

O mesmo Decreto 7.962/2013, dispõe, em seu artigo 4°, no intuito de facilitar o atendimento ao consumidor, que:

Art. 4º Para garantir o atendimento facilitado ao consumidor no comércio eletrônico, o fornecedor deverá:

I - apresentar sumário do contrato antes da contratação, com as informações necessárias ao pleno exercício do direito de escolha do consumidor, enfatizadas as cláusulas que limitem direitos;

II - fornecer ferramentas eficazes ao consumidor para identificação e correção imediata de erros ocorridos nas etapas anteriores à finalização da contratação;

III - confirmar imediatamente o recebimento da aceitação da oferta;

IV - disponibilizar o contrato ao consumidor em meio que permita sua conservação e reprodução, imediatamente após a contratação;

V - manter serviço adequado e eficaz de atendimento em meio eletrônico, que possibilite ao consumidor a resolução de demandas referentes a informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento do contrato;

VI - confirmar imediatamente o recebimento d as demandas do consumidor referidas no inciso, pelo mesmo meio empregado pelo consumidor; e

VII - utilizar mecanismos de segurança eficazes para pagamento e para tratamento de dados do consumidor.

Parágrafo único. A manifestação do fornecedor às demandas previstas no inciso V do caput será encaminhada em até cinco dias ao consumidor. (BRASIL, 2013, online)

Muitas vezes, em razão da complexidade no manuseio de um sítio de vendas, o negócio jurídico fica comprometido, tanto o ato da negociação compra e, principalmente, o pós-venda, que incluiria o processo de troca, devolução, assistência técnica, cancelamento e direito de arrependimento.

Quantas vezes o consumidor tem visto tolhido o seu direito, ao tentar devolver um produto ou cancelar um determinado serviço, em razão do moroso, burocrático, trabalhoso e confuso serviço de pós-venda, elaborado justamente para dificultar ou impedir que a compra seja desfeita?

Dessa forma, o legislador procurou garantir, com diretrizes bastante explícitas, que o atendimento no e-commerce, seja no pré-venda, na efetivação do negócio e no seu pós-venda, seja o mais simplificado possível.

1.3.3 Direito de Arrependimento

Finalmente, o terceiro pilar buscado pelo legislador, com o fim de bem regular o e-commerce no Brasil é o direito do arrependimento, já consagrado no diploma de 1990, desta vez aplicado, de maneira mais específica, nas relações jurídicas consumeristas no ambiente virtual.

1.4 Lei do e-commerce - Decreto 7.962/13

Em 15 de março de 2013, foi publicado no DOU o Decreto 7.962/2013, conhecida como a Lei do E-commerce, dispõe sobre a regulamentação do Código de Defesa do Consumidor no que se refere à contratação no comércio eletrônico, trazendo novas diretrizes, inclusive sobre o direito de arrependimento. Privilegiando a clareza e precisão das informações, com garantia de riqueza de detalhes a respeito dos produtos, dos serviços e dos fornecedores, conforme artigos 1º e 2º do referido Decreto, estas devem estar dispostas em local de destaque e fácil visualização.

Art. 1º Este Decreto regulamenta a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico, abrangendo os seguintes aspectos:

I - informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor;

II - atendimento facilitado ao consumidor; e

III - respeito ao direito de arrependimento.

Art. 2º Os sítios eletrônicos ou demais meios eletrônicos utilizados para oferta ou conclusão de contrato de consumo devem disponibilizar, em local de destaque e de fácil visualização, as seguintes informações:

I - nome empresarial e número de inscrição do fornecedor, quando houver, no Cadastro Nacional de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda;

II - endereço físico e eletrônico, e demais informações necessárias para sua localização e contato;

III - características essenciais do produto ou do serviço, incluídos os riscos à saúde e à segurança dos consumidores;

IV - discriminação, no preço, de quaisquer despesas adicionais ou acessórias, tais como as de entrega ou seguros;

V - condições integrais da oferta, incluídas modalidades de pagamento, disponibilidade, forma e prazo da execução do serviço ou da entrega ou disponibilização do produto; e

VI - informações claras e ostensivas a respeito de quaisquer restrições à fruição da oferta. (BRASIL, 2013, online)

Ressalta em seu artigo 4º o princípio da boa-fé, já que determina que o atendimento deve ser facilitado, dando ao consumidor a oportunidade de prévia análise das cláusulas contratuais, e estas devem ser claras e diretas, possibilitando a fácil compreensão do consumidor, prevê também, que caso este opte pela aceitação da oferta receba imediata confirmação.

Art. 4º Para garantir o atendimento facilitado ao consumidor no comércio eletrônico, o fornecedor deverá:

I - apresentar sumário do contrato antes da contratação, com as informações necessárias ao pleno exercício do direito de escolha do consumidor, enfatizadas as cláusulas que limitem direitos;

I I - fornecer ferramentas eficazes ao consumidor para identificação e correção imediata de erros ocorridos nas etapas ante riores à finalização da contratação ;

III - confirmar imediatamente o recebimento da aceitação da oferta;

IV - disponibilizar o contrato ao consumidor em meio que permita sua conservação e reprodução, imediatamente após a contratação;

V - manter serviço adequado e eficaz de atendimento em meio eletrônico, que possibilite ao consumidor a resolução de demandas referentes a informação, dúvida, reclamação, suspensão ou cancelamento do contrato;

VI - confirmar imediatamente o recebimento d as demandas do consumidor referidas no inciso , pelo mesmo meio empregado pelo consumidor ; e

VII - utilizar mecanismos de segurança eficazes para pagamento e para tratamento de dados do consumidor.

Parágrafo único. A manifestação do fornecedor às demandas previstas no inciso V do caput será encaminhada em até cinco dias ao consumidor (BRASIL, 2013, online)

No que tange o direito de arrependimento, o artigo 5º denota que o fornecedor deve informar de forma clara e ostensiva os meios de troca, devolução e cancelamento da compra, possibilitando ao consumidor exercer seu direito de arrependimento previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor sem qualquer prejuízo. Cabendo ainda ao fornecedor a imediata comunicação a administradora do cartão de crédito para que a operação não seja lançada, em caso de confirmação de cancelamento ou devolução no prazo de sete dias.

Art. 5º O fornecedor deve informar, de forma clara e ostensiva, os meios adequados e eficazes para o exercício do direito de arrependimento pelo consumidor.

§ 1º O consumidor poderá exercer seu direito de arrependimento pela mesma ferramenta utilizada para a contratação, sem prejuízo de outros meios disponibilizados.

§ 2º O exercício do direito de arrependimento implica a rescisão dos contratos acessórios, sem qualquer ônus para o consumidor.

§ 3º O exercício do direito de arrependimento será comunicado imediatamente pelo fornecedor à instituição financeira ou à administradora do cartão de crédito ou similar, para que:

I - a transação não seja lançada na fatura do consumidor; ou

II - seja efetivado o estorno do valor, caso o lançamento na fatura já tenha sido realizado.

§ 4º O fornecedor deve enviar ao consumidor confirmação imediata do recebimento da manifestação de arrependimento (BRASIL, 2013, online)

1.5 O Direito de Arrependimento

O direito de arrependimento está estabelecido no art. 49, do CDC, que dispõe:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados. (BRASIL, 1990, online)

Especificamente nas transações via internet, o Decreto 7.962/2013, em seus art. 5°, 6° e 7°, deixa claro:

Art. 5º O fornecedor deve informar, de forma clara e ostensiva, os meios adequados e eficazes para o exercício do direito de arrependimento pelo consumidor.

§ 1º O consumidor poderá exercer seu direito de arrependimento pela mesma ferramenta utilizada para a contratação, sem prejuízo de outros meios disponibilizados.

§ 2º O exercício do direito de arrependimento implica a rescisão dos contratos acessórios, sem qualquer ônus para o consumidor.

§ 3º O exercício do direito de arrependimento será comunicado imediatamente pelo fornecedor à instituição financeira ou à administradora do cartão de crédito ou similar, para que:

I - a transação não seja lançada na fatura do consumidor; ou

II - seja efetivado o estorno do valor, caso o lançamento na fatura já tenha sido realizado.

§ 4º O fornecedor deve enviar ao consumidor confirmação imediata do recebimento da manifestação de arrependimento.

Art. 6º As contratações no comércio eletrônico deverão observar o cumprimento das condições da oferta, com a entrega dos produtos e serviços contratados, observados prazos, quantidade, qualidade e adequação.

Art. 7º A inobservância das condutas descritas neste Decreto ensejará aplicação das sanções previstas no art. 56 da Lei nº 8.078, de 1990. (BRASIL, 2013, online)

Trata-se, portanto, da prerrogativa de, após a aquisição de um determinado bem ou serviço, fora do estabelecimento comercial, o consumidor ter um período de reflexão, podendo, até o fim do mesmo, desistir do negócio jurídico sem ônus pecuniário para si, sem a necessidade de dar qualquer justificativa para a desistência.

O Código estabelece, ainda, no parágrafo único do art. 49, o direito de o consumidor, exercido o arrependimento, receber de volta os valores eventualmente pagos, a qualquer título, de imediato e monetariamente corrigido. Isso quer dizer que “havendo despesas com frete, postagem e outros encargos suportados pelo fornecedor para fazer chegar às mãos do consumidor o produto ou serviço contratado fora do estabelecimento comercial, seu ressarcimento fica por conta do risco negocial da empresa” (JÚNIOR, 2017, 139).

Com a criação deste instituto, o legislador garante ao consumidor, um período de reflexão, durante o qual o mesmo poderá testar, pessoalmente, as características e qualidades dos bens adquiridos fora do estabelecimento comercial, além de se evitar a compra motivada por impulso momentâneo.

GARCIA (2017) assim o esclarece:

Quando o contrato de consumo for concluído fora do estabelecimento comercial, o consumidor tem o direito de desistir do negócio em sete dias, a contar do recebimen1º do produto ou do serviço ou, então, da assinatura do contrato. Trata-se de um "prazo de reflexão obrigatório" instituído pela lei, de modo a assegurar que o consumidor possa realizar uma compra consciente, equilibrando as relações de consumo.

A ratio da norma é que quando o consumidor adquire o produto ou o serviço fora do estabelecimento comercial, fica ainda mais vulnerável na relação instituída com o fornecedor. Com efeito, quando o consumidor está dentro do estabelecimento, ele pode verificar o produto ou serviço (tamanho, largura, cores, condições de prestação do serviço etc.); comparar com outros de marcas ou modelos diferentes; tirar as dúvidas pessoalmente com o vendedor; conversar com outros consumidores que porventura estejam no estabelecimento e que já adquiriram o produto e/ou serviço anteriormente.

Cumpre destacar, ainda, os produtos em que o consumidor pode testar pessoalmente a qualidade e a eficiência, verificando se atende as suas expectativas, como o test drive em veículo. Concluindo, o consumidor atua de maneira mais consciente e protegida quando está dentro do estabelecimento. Assim, as vendas por telefone, reembolso postal, fax, os executados porta a porta, telemarketing ou até mesmo pela Internet se enquadram nesse contexto. (GARCIA, 2017, p.375)

Sérgio Cavalieri Filho (2019) assim explica:

A finalidade da norma, como se depreende de sua clara redação, é proteger o consumidor sempre que a compra se der fora do estabelecimento comercial. Hoje o consumidor não tem que se deslocar para os locais em que os produtos estão; os produtos é que se deslocam para os locais em que o consumidor está (FILHO, 2019, p.186).

Apesar de não citar, explicitamente, as compras via internet, o rol do artigo 49 é exemplificativo, como continua FILHO (2019):

A referência a telefone ou a domicílio contida no seu final é meramente exemplificativa, porquanto o texto faz uso do advérbio especialmente. Estão, portanto, na abrangência da norma todos os sistemas de vendas externas, como em domicílio mediante a visita do vendedor; vendas por telemarketing ou por telefone; por correspondência – mala direta, ou carta-resposta, correio, pela TV, Internet ou qualquer outro meio eletrônico. (FILHO, 2019, p.187)

Apesar de todas as garantias previstas no ordenamento jurídico, quanto à clareza das informações, e todos os recursos disponíveis no ambiente virtual, ainda assim, é possível acontecer de o consumidor, após concretizada o negócio jurídico, por razões diversas, vir a arrepender-se do mesmo.

Conforme demonstrado acima, de forma resumida, é facultado ao consumidor essa prerrogativa (do arrependimento), dentro de determinadas condições.

O fornecedor deverá informar ostensivamente em seu site que o consumidor poderá cancelar a compra até sete dias após a entrega do produto, sem que tenha que justificar o motivo para tanto. Atenção: o prazo de arrependimento começa a correr após o recebimento do produto por parte do consumidor e não da data da compra!

Deverá também permitir que o consumidor possa cancelar seu pedido, dentro dos sete dias, pela mesma forma como efetuou a compra, ou seja, online. Se o consumidor se arrepender da compra e cancelá-la, o fornecedor deverá confirmar imediatamente o recebimento do cancelamento, bem como possibilitar o encaminhamento do produto devolvido (recolhimento por transportadora, encaminhado via Correios etc.) sem qualquer custo para o consumidor.

É importante não confundir o direito de arrependimento com outras situações em que há o envio do produto novamente para o fornecedor, como é o caso das trocas por mera liberalidade e das trocas e devoluções por defeito ou vício no produto ou serviço, que possuem regras próprias. As trocas por mera liberalidade do fornecedor poderão ter seu frete cobrado dos consumidores. Por sua vez, as trocas e devoluções por defeito ou vício deverão ser realizadas sem nenhum ônus ao consumidor. (SEBRAE. 2014, p.14)

Assim posto, o direito de arrependimento nas transações via internet, ainda que não explicitamente elencado no rol exemplificativo do diploma de 1990, em razão do insipiente desenvolvimento do e-commerce na época de sua promulgação, foi especificamente abrangido em legislação posterior, em especial no Decreto 7.962, de 15 de março de 2013 (Lei do E-commerce) e na Lei 12.965, de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet).

Todavia, ainda permanece a questão: Todas as modalidades de compras via internet estão alcançadas pelo direito de arrependimento?

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Artigo apresentado como requisito de Avaliação do Curso de Direito do Centro Universitário UNA para disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso. Professor Orientador: Allan Milagres.

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