Prisão do deputado Daniel Silveira e seus aspectos jurídicos

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O deputado Daniel Silveira foi preso após divulgar vídeo com ataques contra integrantes do STF e apologia ao Ato Institucional Nº 5 (AI-5). A prisão do parlamentar foi ordenada pelo Ministro Alexandre de Moraes e gerou grande repercussão midiática.

DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO

Em primeiro lugar, é importante ressaltar que a liberdade é um direito extenso que abrange muitas áreas: a liberdade de locomoção (o direito de ir e vir e permanecer), a liberdade de religião e de crença, de convicção filosófica ou política, a liberdade de expressão, entre outros.

A discussão central no caso do deputado Daniel Silveira é a liberdade de expressão.

Até onde este direito vai e quais são os seus limites? É fundamental ressaltar que nenhum direito é absoluto.

Todos são relativos, já que sofrem diversas restrições.

No que diz respeito à liberdade de expressão, algumas das limitações são impostas por leis infraconstitucionais, como o Código Penal e o Código Civil, resultando em sanções criminais por crimes contra a honra: calúnia (art. 138. CP), difamação (art. 139) e injúria (art. 140) ou ameaça (crime contra a liberdade individual estipulado no artigo 147 CP) e sanções civis, como danos morais, por exemplo.

Outras leis, como a Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/73), também caracterizam ações sérias que ameaçam a segurança do estado brasileiro.

Nota: os direitos fundamentais não podem ser limitados a ponto de atingir seu núcleo essencial (base mínima desse direito).


IMUNIDADES PARLAMENTARES

Os parlamentares possuem imunidade civil e penal por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

É a chamada imunidade material ou absoluta (inviolabilidade).

Tal imunidade também abrange a esfera administrativa, mas se houver abuso das prerrogativas o parlamentar poderá responder por quebra de decoro parlamentar.

Veja o que diz o caput do artigo 53 CF:

Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

A imunidade material protege os parlamentares em duas situações: quando estiver na casa legislativa ou se estiver fora dela, mas estiver verbalizando em razão do mandato.

Quando estiver em relações ou interesses meramente particulares, o parlamentar não poderá valer-se da imunidade.

As imunidades não são privilégio, mas uma garantia obtida pela separação dos poderes.

Os poderes são independentes e harmônicos entre si, sem hierarquia ou interferência entre eles.

A ideia é tentar assegurar que o legislativo exerça a sua função típica sem ser reprimido pelo poder judiciário.

Além disso, os parlamentares possuem a imunidades formais.

Uma delas refere-se a prisão: parlamentares só podem ser presos provisoriamente por FLAGRANTE DE CRIME INAFIANÇÁVEL.

Tal prisão será revisada pela casa legislativa no prazo de 24 horas.

Tal imunidade só pode ser invocada por atos praticados após assumir o mandato e em razão dele.

Para Moraes, quando o deputado defende o AI-5 e ataca os ministros do STF, o parlamentar NÃO está acobertado pela imunidade material, por não ter relação com o seu cargo.


CRIMES COMETIDOS POR DANIEL SILVEIRA

Na ordem de prisão, Moraes escreve que as condutas praticadas pelo deputado, além de tipificarem crimes contra a honra do Poder Judiciário e dos ministros do Supremo, são previstas, expressamente, na Lei nº 7.170/73, que trata de crimes contra a segurança nacional, especificamente nos artigos 17, 18, 22, 23 e 26.

Veja quais são essas condutas:

Art. 17. - Tentar mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito.

Pena: reclusão, de 3 a 15 anos

Exercício dos Poderes

Art. 18. - Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados.

Pena: reclusão, de 2 a 6 anos.

Publicidade da violência

Art. 22. - Fazer, em público, propaganda:

I - de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social;

IV - de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.

Pena: detenção de 1 a 4 anos.

§ 1º - A pena é aumentada de um terço quando a propaganda for feita em local de trabalho ou por meio de rádio ou televisão.

Subversão da ordem

Art. 23. - Incitar:

I - à subversão da ordem política ou social;

II - à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis;

IV - à prática de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.

Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.

Calúnia, difamação

Art. 26. - Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação.

Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.

Os crimes previstos na lei de segurança nacional prevalecem sobre os crimes contra a honra tipificados no CP por conta do princípio da especialidade.

Sendo assim, Silveira será julgado por esses crimes da lei 7.170/73 e possivelmente será condenado.


PRISÃO EM FLAGRANTE

A prisão em flagrante de Daniel Silveira foi fundamentada em uma situação chamada crime permanente (quando a consumação do delito se prolonga no tempo. (Ex: tráfico de drogas).

Enquanto a droga permanecer na posse do agente, o crime estará se consumando e a prisão em flagrante poderá ocorrer.

No sequestro, enquanto a vítima estiver privada de liberdade o crime se consuma e o flagrante estará ocorrendo).

Segundo o STF, o fato criminoso praticado por Daniel Silveira foi um crime permanente na medida em que se consuma a cada segundo em que o vídeo estava publicado, autorizando a prisão em flagrante a qualquer momento.

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Tal decisão não possuía precedentes e inova o ordenamento jurídico, gerando preocupações quanto ao futuro das decisões judiciais por conta desse novo precedente.

O crime seria inafiançável porque estão presentes os requisitos da prisão preventiva do artigo 312 do CPP.

Estabelece o artigo 324, IV do CPP que nos casos em que couber prisão preventiva a fiança não poderá ser arbitrada.

Sendo assim, ficou caracterizada a única hipótese de prisão de um parlamentar: flagrante de crime inafiançável.

Após a prisão em flagrante, a câmara dos deputados manteve a prisão.

O deputado deverá ser julgado por crime comum no próprio STF (outra imunidade formal referente ao tribunal competente para julgar parlamentares).

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Sobre o autor
Cristiano Henrique Oliveira Campos

Estudante de Direito na Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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