Artigo Destaque dos editores

Omissão em apresentar documentos à auditoria-fiscal da Previdência Social no curso da ação fiscal:

impossibilidade de corrigir a infração e ser de ser beneficiado com a relevação da multa

11/09/2006 às 00:00
Leia nesta página:

            O descumprimento das obrigações acessórias tributárias (deveres instrumentais de fazer, não fazer ou tolerar no interesse da arrecadação ou fiscalização de tributos) rende ensejo à aplicação de multa punitiva (art. 113, §§ 2º e 3º, Código Tributário Nacional) em desfavor do contribuinte faltoso.

            Além da denúncia espontânea (art. 138 do CTN), a qual se verifica quando o contribuinte cumpre, mesmo que extemporaneamente mas sem estar sob ação fiscal, a obrigação acessória, há na seara previdenciária a possibilidade de aquele, dentro do prazo de impugnação à autuação, corrigir a infração (cumprir a obrigação acessória) e requerer a relevação da multa aplicada, nos termos do art. 291, § 1º, do Regulamento da Previdência Social (RPS), aprovado pelo Decreto n.º 3048/1999:

            "Art.291.. ..........................................................

             § 1º A multa será relevada, mediante pedido dentro do prazo de defesa, ainda que não contestada a infração, se o infrator for primário, tiver corrigido a falta e não tiver ocorrido nenhuma circunstância agravante."

            No caso da relevação, a infração subsiste, inclusive para fins de reincidência nos próximos 5 anos. A multa, de seu turno, é perdoada, cancelada.

            Trata-se de uma forma de incentivar os contribuintes a cumprirem seus deveres instrumentais previdenciários mesmo após a lavratura de autuação.

            Ocorre que, para alguns tipos de infração, descabe o benefício da relevação, haja vista a impossibilidade de corrigir a falta.

            A omissão em apresentar livros e documentos à Auditoria-Fiscal da Previdência Social no curso de uma ação fiscal, conduta que representa literal infração ao art. 33, § 2º, da Lei n.º 8212/1991, cuida de uma das exceções:

            "Art. 33.. ..................................................

             ................................................................

            § 2º A empresa, o servidor de órgãos públicos da administração direta e indireta, o segurado da Previdência Social, o serventuário da Justiça, o síndico ou seu representante, o comissário e o liqüidante de empresa em liquidação judicial ou extrajudicial são obrigados a exibir todos os documentos e livros relacionados com as contribuições previstas nesta Lei."

            O objetivo de a Auditoria-Fiscal previdenciária intimar o fiscalizado a apresentar livros e documentos relacionados às contribuições previdenciárias é apenas um: o de possibilitar o regular desenvolvimento da ação fiscal. Assim, o descumprimento desse dever instrumental provoca um prejuízo ao próprio desenvolvimento da ação fiscal.

            A infração ora focalizada se concretiza nos exatos dia e hora em que o contribuinte não exibe à Auditoria-Fiscal previdenciária os livros e documentos que esta intimou aquele a apresentar.

            Mas, para efeito de corrigir a falta, temos de distinguir duas situações: 1ª) o fiscalizado, após ser autuado, exibe, ainda durante a ação fiscal, os livros e documentos a que foi intimado a apresentar; e 2ª) o fiscalizado, após ser autuado, somente exibe os livros e documentos em sua impugnação contra a autuação.

            Na primeira situação, a conduta do fiscalizado ainda possibilitará o restabelecimento do normal transcurso da ação fiscal. O prejuízo provocado pela omissão inicial é superado pela apresentação dos livros e documentos, pois o agente fiscal poderá examiná-los para realizar seu mister. Já na segunda situação essa possibilidade não acontecerá, pois a ação fiscal já se encerrou, tendo o agente fiscal lançado mão de outros documentos ou até de presunções para cumprir seu mister. O prejuízo inicial não é superado.

            É uma situação semelhante ao arrependimento posterior previsto no art. 16 do Código Penal. Segundo esse preceito, se o infrator, por ato voluntário, reparar o dano, até o recebimento da denúncia ou da queixa, terá, como benefício, a redução da pena.

            Pois bem, reparar o dano, no caso da infração tributária contemplada em autuação fiscal, consiste, repita-se, apresentar os livros e documentos enquanto a ação fiscal ainda estiver em curso. Encerrada a ação fiscal, o dano ao regular desenvolvimento desta não pode mais ser reparado.

            Ressalte-se, ainda, que a interpretação a contrario sensu do §2º do art. 291 do RPS/1999 não autoriza a conclusão de que, excetuando as infrações relacionadas à falta de entrega de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) e àquelas cuja multa decorra de falta ou insuficiência de recolhimento tempestivo de contribuições ou outras importâncias devidas à Seguridade Social, as outras infrações sempre seriam passíveis de correção. Não!

            O dispositivo em pauta apregoa, tão-só, que as multas aplicadas em face das infrações nele mencionadas não podem ser relevadas. Só isso.

            É verdade que um dos requisitos para a relevação da multa por descumprimento de dever instrumental é corrigir a falta. Mas há exemplos vários de infrações que não têm como ser corrigidas. É o caso da infração concernente à omissão de se exigir Certidão Negativa de Débito para se permitir a prática de algum ato ou negócio jurídico (contratação com o Poder Público, alienação ou oneração de bem imóvel, registro de ato relativo à baixa de empresa, averbação em Registro de Imóveis). Se tais atos ou negócios jurídicos forem concretizados sem que se exigisse a apresentação da CND, haveria como corrigir a infração? É óbvio que não. E essas infrações não estão elencadas no §2º do art. 291 do RPS/1999. Mas nem por isso será possível corrigir as infrações correspondentes.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

            Conclui-se, destarte, que o §2º do art. 291 do RPS/1999 não elenca hipóteses taxativas de interdição à relevação, mas somente exemplificativas.

            Por conseguinte, a infração de deixar de apresentar à Auditoria-Fiscal da Previdência Social livros ou documentos relacionados com as contribuições previdenciárias não é corrigida pela apresentação desses livros ou documentos apenas com a impugnação contra a autuação.

            Em conseqüência, esta infração não comporta a relevação da multa aplicada.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Ricardo Araujo Cozer

procurador do Trabalho, com lotação na Procuradoria Regional do Trabalho da 7ª Região, Ofício de Sobral (CE), bacharel em Direito pela UFPE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COZER, Ricardo Araujo. Omissão em apresentar documentos à auditoria-fiscal da Previdência Social no curso da ação fiscal:: impossibilidade de corrigir a infração e ser de ser beneficiado com a relevação da multa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1167, 11 set. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8885. Acesso em: 26 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos