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Dez anos da lei de arbitragem

30/09/2006 às 00:00
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O décimo aniversário da Lei nº 9.307, de 23.09.1996, comprova que uma lei bem feita e aceita pela sociedade civil pode transformar construtivamente setor importante da vida nacional, tornando-se, assim, catalisadora de seu desenvolvimento. Não obstante as resistências, no passado, em relação à arbitragem, foi possível realizar verdadeira revolução cultural, dando-se maior eficiência e rapidez à solução de litígios. Criou-se processo ágil e flexível, adaptando-se às necessidades de cada caso, sem prejuízo de manutenção dos princípios básicos do contraditório e do direito à ampla defesa das partes. Conseguiu-se, assim, descongestionar os tribunais, em pequeno percentual, que, todavia, foi relevante em virtude da complexidade das causas, que deixaram de ser submetidas ao Poder Judiciário.

O mérito da lei inovadora, que gerou jurisprudência construtiva é imenso, visto que até 1990, a prática comercial brasileira desconhecia a arbitragem. Explica-se o fato pela longa demora que, à época, caracterizava o processo arbitral, submetido sempre ao controle judicial. Basta dizer que a decisão final, para permitir a execução da decisão dos árbitros, chegou, em determinado caso, a ocorrer trinta anos após a constituição do tribunal arbitral! O fato da cláusula compromissória -pela qual as partes se obrigam a sujeitar os litígios a arbitragem- não permitir a execução específica e a necessidade de dupla homologação para as arbitragens realizadas no exterior foram, então, obstáculos insuperáveis para o desenvolvimento do instituto em nosso país.

Pode-se dizer que a nova lei funcionou como verdadeiro exemplo de "destruição criadora" no campo do direito, para utilizar-se a terminologia dos economistas. Em dez anos, realizou-se evolução que, em outros países, levou quase um século. Tudo mudou no campo da arbitragem. As estatísticas são eloqüentes. De um número insignificante de processos arbitrais, em 1996, ano em que foi promulgada a nova lei, passou-se para cerca de 4.000 arbitragem realizadas anualmente, das quais cerca de noventa por cento no campo trabalhista e do direito do consumidor, e as demais em questões comerciais, internacionais e domésticas.

Basta lembrar que, enquanto uma ação trabalhista leva longos anos para terminar, uma arbitragem na matéria é concluída num mês. Na justiça comum, sabe-se que as ações, até o transito em julgado, levam cerca dez anos. Numa arbitragem comercial, é possível obter-se solução em prazo que varia entre seis meses e dois anos, não havendo possibilidade de recurso. Mas a velocidade não é o único atributo da arbitragem, que se beneficia também da escolha dos árbitros pelas partes entre especialistas na matéria, da confidencialidade do processo arbitral, do seu informalismo e do espírito de cooperação que o inspira. Já se disse que a arbitragem é um instrumento de paz social e de conciliação econômica. Efetivamente, enquanto o processo judicial é uma espécie de guerra, que afasta as partes, a arbitragem tenta manter as relações entre as mesmas de modo que possam continuar a atuar em conjunto, nos contratos de longo prazo, quer como fornecedores e clientes, quer como sócios.

No plano internacional, a inclusão da convenção de arbitragem nos contratos facilita as relações comerciais, atrai os investimentos e dá maiores garantias aos contratantes, permitindo inclusive a redução dos custos de transação.

O sucesso da arbitragem no Brasil também se deve em grande parte à posição dos juízes. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da lei. Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, facilitou a homologação das decisões arbitrais estrangeiras, aplicando, de imediato, a nova lei, admitindo a convenção de arbitragem tácita, definindo mais adequadamente a ordem pública e consagrando a arbitrabilidade dos conflitos nos quais uma das partes é sociedade de economia mista. Finalmente, os juízes de primeiras instâncias e os tribunais estaduais passaram a apreciar as decisões arbitrais com menor formalismo, só decretando a sua nulidade em raros casos de violação do direito da defesa ou de suspeição de árbitros.

O século XXI se caracteriza pela velocidade. Em virtude das novas tecnologias e da globalização, a solução dos litígios não pode eternizar-se. É preciso, todavia, que as decisões do conflitos não sejam tão-somente rápidas, sendo imprescindível que também sejam eficientes e justas. Num mundo conturbado, com tribunais sobrecarregados, a arbitragem é a melhor alternativa para determinados casos, em que se pode obter soluções eficientes, justas e éticas. Eis o mérito da Lei nº 9.307.

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Sobre o autor
Ives Gandra da Silva Martins

advogado em São Paulo (SP), professor emérito de Direito Econômico da Universidade Mackenzie, presidente do Centro de Extensão Universitária, presidente da Academia Internacional de Direito e Economia, presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Ives Gandra Silva. Dez anos da lei de arbitragem. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1186, 30 set. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8992. Acesso em: 5 nov. 2024.

Mais informações

Texto publicado na Folha de São Paulo, 24/09/2006.

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