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O necessário aperfeiçoamento legislativo sobre o crime organizado.

Uma visão do PLS nº 150/2006

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6. Sugestões Para o Aperfeiçoamento da Redação do Texto do Projeto de Lei no Estado em que se Encontra

          Finalmente, e apenas para argumentar, caso o projeto fosse à sanção sem a observância dos princípios e sugestões acima apresentados, cremos que seria de todo pertinente que se procedesse a alguns acréscimos e retificações no projeto.

          Entre eles estão:

          a) no art. 2º, caput - definição de crime organizado

          Em relação aos meios empregados para a obtenção de "vantagem de qualquer natureza", além do "emprego de violência, ameaça, fraude, tráfico de influência ou atos de corrupção", deveria ser incluído também todo e qualquer ato em desacordo com a lei (incluídos os atos omissivos, quando a lei obriga a declaração), de forma a açambarcar as mais variadas condutas.

          No caso do tráfico ilícito de armas, por exemplo, a atividade de transporte é lícita e o objeto em si não é proibido, desde que atendidos os preceitos legais e regulamentares (declaração e autorização, que não se confunde com "fraude"). Sugestão de redação:

          "Art. 2º - Promover, constituir, financiar, cooperar ou integrar (...) para obter, direta ou indiretamente, com o emprego de violência, ameaça, fraude, tráfico de influência, atos de corrupção ou atos em desacordo com a legislação, vantagem de qualquer natureza, praticando um ou mais dos seguintes crimes:".

          b) no art. 2º, inciso III – crime de contrabando ou tráfico ilícito de armas de fogo, acessórios, artefatos, munições, explosivos ou materiais destinados à sua produção

          Além do fato de que a lei a que o projeto faz remissão (Lei n.º 9.437, de 20 de fevereiro de 1997) foi revogada pelo Estatuto do Desarmamento (Lei n.º 10.826, de 23 de dezembro de 2003), seria necessário incluir as novas disposições em vigor acerca do assunto, tais como os crimes de comércio ilegal (que abrange o tráfico local) e de tráfico internacional de arma de fogo (art. 17 e 18 da Lei n.º 10.826/03), bem como incluir previsão relacionada aos produtos controlados pelo Exército (dispostos no Regulamento para Fiscalização para Produtos Controlados do Exército, R-105, Decreto n.º 3.665/00).

          Dentre os produtos controlados, e que não se confundem com acessórios, estão os equipamentos de proteção balística (coletes, escudos e capacetes), equipamentos de visão noturna (óculos e periscópios) e substâncias químicas e venenosas de interesse bélico. Sugestão de redação (inclusão do inciso "III-A" ou renumeração de todos os incisos):

          "Art. 2º - (...)

          III – contrabando ou descaminho;

          III-A - comércio ou tráfico internacional de armas de fogo, munições e acessórios, ou contrabando de explosivos, artefatos, equipamentos e demais produtos controlados pelo Exército em legislação específica, além de peças, componentes ou materiais destinados à sua produção (Lei n.º 10.826, de 23 de dezembro de 2003)".

          c) no art. 2º, §1º, inciso II – frauda licitações, em qualquer de suas modalidades, ou concessões, permissões e autorizações administrativas:

          Entende-se como pertinente acrescentar a fraude aos concursos públicos, crime atual e que vem sendo praticado com grande desenvoltura por grupos criminosos organizados, nos diversos Estados brasileiros. Observa-se que os tribunais superiores vêm extinguindo ações penais tratando de fraude em concurso público ao fundamento de atipicidade da conduta (segundo as altas cortes, não há lei específica tipificando a conduta de fraudar concursos públicos, e o fato não é caso de estelionato). Sugestão de redação:

          "Art. 2º - (...)

          §1º (...)

          II - frauda licitações ou concurso para o preenchimento de cargos públicos, em qualquer de suas modalidades, ou concessões, permissões e autorizações administrativas".

          As considerações ora alinhavadas, longe de serem entendidas como críticas à iniciativa e liderança legislativa, devem ser avaliadas como pertinentes para se aperfeiçoar o projeto de lei em apreço.

          Entendemos que a atividade de crime organizado merece uma reprimenda efetiva dos órgãos de segurança pública, respaldados em uma legislação forte e eficaz, entretanto, deve ser evitada a adoção de dispositivos legais que limitem a abrangência dos tipos penais e a atuação dos órgãos de persecução penal, especialmente na fase investigatória, para que o Estado brasileiro tenha sucesso em sua luta contra a criminalidade.


NOTAS

  1. Também se ressente da ausência de previsão permitindo a interceptação, subtração ou substituição de produtos objetos da prática criminosa na técnica de investigação denominada "ação controlada" ou "entrega vigiada".
  2. "Página do Advogado", endereço eletrônico http://www.advogado.adv.br/artigos/2004/valeriomazzuoli/ stfconflitotratado.htm
  3. Embora o texto da Convenção de Viena sobre Tratados esteja tramitando no Congresso Nacional para aprovação desde 1992 (PDC n.º 214/1992), suas disposições têm sido aplicadas por configurarem normas de direito consuetudinário internacional.
  4. Artigo 26.º - Pacta sunt servanda: Todo o tratado em vigor vincula as Partes e deve ser por elas cumprido de boa fé.
    Artigo 27.º - Direito interno e observância dos tratados: Uma Parte não pode invocar as disposições do seu direito interno para justificar o incumprimento de um tratado. Esta norma não prejudica o disposto no artigo 46.º.
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Sobre o autor
Marcus Vinicius da Silva Dantas

delegado de Polícia Federal em Brasília, professor da Academia Nacional de Polícia, bacharel em Direito e em Administração

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Marcus Vinicius Silva. O necessário aperfeiçoamento legislativo sobre o crime organizado.: Uma visão do PLS nº 150/2006. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1202, 16 out. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9049. Acesso em: 15 nov. 2024.

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