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O valor da terra nua (VTN) e o cálculo do ITR pelos municípios: critério justo?

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Por qual motivo a fiscalização fazendária exige que o contribuinte fundamente o valor da terra nua por ele lançado? Não é dela este ônus?

Chega ano, vai ano, e uma das preocupações do produtor rural, dentre tantas outras, é o ITR (Imposto Territorial Rural).

E essa preocupação ficou maior de uns anos para cá, em especial, após a EC 42/03, que passou a autorizar os municípios a firmarem convênios com a União, por intermédio da Receita Federal, que lhes possibilitam fiscalizar e cobrar os respectivos impostos, ficando, em consequência, com toda a receita.

Desde então, os municípios, em sua grande maioria, passaram a ter uma atenção maior sobre o referido imposto, pois, como dito, firmado o convênio, ficam com toda sua receita, o que, indiretamente, acabou inflacionando seu preço.

E mais.

Além da maior fiscalização por parte do município (o que já trouxe um aumento significativo de autuações), cabe ao próprio contribuinte apurar e, consequentemente, efetuar o pagamento do ITR. Em outras palavras: é o contribuinte que irá "decidir" o valor a ser pago.

É evidente que não se trata de uma livre escolha. Existem critérios previstos em lei que devem ser observados, sob pena de a Receita Federal proceder com lançamento de ofício, cumulando-o com multa e juros.

Mas, de forma resumida: a alíquota do ITR, que é progressiva, deve incidir sobre o Valor da Terra Nua Tributável (VTNt), que é o Valor da Terra Nua (VTN) multiplicado pela diferença entre a Área Tributável e a Área Total (VTN x Área Tributável – Área Total = VTNt x alíquota = imposto a ser recolhido).

Entretanto, o que nos interessa neste trabalho não é apuração do ITR propriamente dita e, sim, a declaração do VTN pelo contribuinte e sua correlação com as "famosas" pautas municipais do ITR.

Lembrando que VTN ou Valor da Terra Nua é o valor total do imóvel, excluídos os valores relativos a todos os melhoramentos (sentido amplo), como benfeitorias, culturas permanentes ou temporárias etc. Assim, ano a ano, cabe ao contribuinte informar o VTN de sua área, através da entrega do Documento de Informação e Apuração do ITR (Diat), cujo período, normalmente, é entre agosto e setembro de cada ano.

Já referidas pautas municipais, denominadas, tecnicamente, SIPT — planilha do Sistema de Informação de Preços de Terras —, serão utilizadas quando não houver a entrega do Diac ou Diat, bem como quando houver subavaliação ou prestação de informações inexatas, incorretas ou fraudulentas [1] por parte do contribuinte.

Mas, na prática, não é bem isso que vem acontecendo.

Na do dia a dia, autoridades fiscais vêm autuando os contribuintes quando, simplesmente, mesmo que cumprida a obrigação acessória no sentido de entregar tempestivamente o Diac ou Diat, o VTN lá contido for menor que o estabelecido no sistema em questão (SIPT).

Ou seja, basta que o VTN declarado pelo contribuinte seja menor que o valor constante na planilha do SIPT, que a autoridade fiscal simplesmente o intima para que ele preste esclarecimentos; ou melhor, faça prova de que, de fato, o valor por ele declarado é real, mesmo que menor daquele constante na planilha.

Inclusive, a jurisprudência do Carf dispõe que, salvo se houver laudo técnico, feito por profissional habilitado, de acordo com as normas da ABNT, havendo uma subavaliação em relação à planilha, o arbitramento por parte do Fisco é legal [2].

Dito isso, pergunta-se: não se trata de um tributo cujo lançamento é de responsabilidade do contribuinte? Não é ele, contribuinte, que deve declarar no Diat o VTN correspondente ao imóvel, conforme artigo 8º da Lei 9393/96 [3]?

Se assim o é, por qual motivo, então, a fiscalização fazendária vem fazendo exigências, na prática, a fim de que o contribuinte comprove que, de fato, o valor por ele lançado é real? Não deveria ser o contrário? Isto é, a fiscalização tributária que deveria demonstrar, através de laudos, que o valor declarado pelo contribuinte é, realmente, menor que o preço de mercado?

Exigir do contribuinte referido laudo é, no mínimo, uma exigência ilegal.

A uma, pois, não há previsão legal neste sentido. A Lei 9.393/96 apenas dispõe que, se houver falta da entrega do Diac ou do Diat, ou se houver subavaliação ou prestações inexatas, incorretas ou fraudulentas, é que o Fisco irá proceder com o lançamento de ofício.

Porém, em momento algum prescreve que o mínimo a ser respeitado pelo contribuinte, ao proceder com o autolançamento, é a planilha do SIPT. Apenas menciona que, havendo indícios de subavaliação, será levado em consideração referido sistema, mas não que ele deve ser observado de forma inexorável. Ademais, além de não haver previsão neste sentido, o artigo 14, §1º, ainda dispõe que:

(...) as informações sobre preços de terra observarão os critérios estabelecidos no artigo 12, § 1º, inciso II da Lei nº 8.629, de 25/2/1993, e considerarão levantamentos realizados pelas Secretarias de Agricultura das Unidades Federadas ou dos Municípios.

Ou seja, determina, de forma expressa, que o Fisco observe, pelo menos, mais dois critérios, a saber: 1) aqueles previstos para fins de desapropriação para reforma agrária; 2) bem como levantamentos feitos pelas Secretarias de Agricultura das unidades federadas ou dos municípios. Fica claro, portanto, a inexistência de observação irrestrita de referida tabela.

Assim, reitera-se, o ônus da prova é realmente do contribuinte? Como dito anteriormente, não cabe a ele fazer uma autoavaliação?

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Não bastasse a imposição ilegal de referida pauta, pois não previsto em lei, a exigência de laudo técnico para evitar o arbitramento de ofício pelo fisco gera um custo demasiado ao contribuinte, pois, bem se sabe, a depender da região e do profissional que irá confeccioná-lo, o valor é por demais alto, motivo pelo qual muitos deixam de fazê-lo e, infelizmente, se submetem a planilha do SIPT.

E, assim fazendo, o contribuinte é muito sacrificado, pois, citada planilha, além de não possuir previsão legal no sentido de ser parâmetro mínimo, pode trazer grandes injustiças.

Ora, a planilha em questão não leva em consideração condições peculiares de cada área, apenas divide o valor do hectare, em cada região, em seis grupos, quais sejam: 1) lavoura aptidão boa, 2) lavoura aptidão regular, 3) lavoura aptidão restrita, 4) pastagem plantada, 5) silvicultura ou pastagem natural e 6) preservação da fauna ou flora. Não é objeto do presente estudo os critérios utilizados para incluir uma área no grupo de "lavoura aptidão boa" e outra em "lavoura aptidão regular". Porém, a crítica que aqui se faz é:

Será que é justa e confiável uma planilha segundo a qual determinada área considerada "lavoura aptidão boa" — na cidade de Igarapé (MG) — teve seu VTN avaliado em R$ 150 mil, enquanto na cidade de Mário Campos — município limítrofe de Igarapé, a 20 km de distância — outra área teve seu VTN avaliado em R$ 30 mil?

Poucos quilômetros de distância representam R$ 120 mil de diferença? Qual o critério para tanto?

E se o produtor de determinada região investiu milhares de reais em insumos na sua área, enquanto seu vizinho pouco investiu, pergunta-se: aquele que muito investiu terá que pagar o mesmo ITR daquele que pouco investiu, pelo fato de ambas as áreas estarem incluídas no mesmo grupo da planilha? Na prática, sim, o que representa, certamente, uma injustiça.

E, se não bastasse isso, como já dito em artigo anterior [4], o VTN declarado tem interferência direta no IR-Ganho de Capital, o que pode representar mais uma injustiça para o produtor.

Enfim, são estes e outros pontos que deveriam ser levados em consideração a fim de revisar a utilização da planilha do SIPT como critério mínimo pelo Fisco, cabendo a nós, operadores do direito, levantá-los, a fim de que um dia, quem sabe, a prática seja diferente.


[1] Artigo 14. No caso de falta de entrega do Diac ou do Diat, bem como de subavaliação ou prestação de informações inexatas, incorretas ou fraudulentas, a Secretaria da Receita Federal procederá à determinação e ao lançamento de ofício do imposto, considerando informações sobre preços de terras, constantes de sistema a ser por ela instituído, e os dados de área total, área tributável e grau de utilização do imóvel, apurados em procedimentos de fiscalização.

[2] 1) CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS / Carf / Data de publicação: 3/4/2014 3/4/2014 / Grifo nosso MATERIA: IRPF / Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf - 2a. Seção TURMA ESPECIAL / ACÓRDÃO: 2802- 002.741; 2) CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS - CARP ITR ÁCORDÃO, 2802-002.693/Data de publicação: 28/5/2014 / Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf - 2a. Seção - za TURMA ESPECIAL.

[3] Artigo 8º O contribuinte do ITR entregará, obrigatoriamente, em cada ano, o Documento de Informação e Apuração do ITR - Diat, correspondente a cada imóvel, observadas data e condições fixadas pela Secretaria da Receita Federal.

[4] https://www.rotajuridica.com.br/artigos/ir-ganho-de-capital-na-venda-de-imovel-rural-pela-pessoa-fisica-como-funciona/#:~:text=*Leonardo%20Scopel%20Macchione%20de%20Paula&text=Em%20resumo%2C%20o%20IR%2DGanho,o%20valor%20de%20sua%20venda.

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Sobre o autor
Leonardo Scopel Macchione de Paula

Advogado do agronegócio Especialista em direito tributário e contratual Mestrando

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULA, Leonardo Scopel Macchione. O valor da terra nua (VTN) e o cálculo do ITR pelos municípios: critério justo?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6637, 2 set. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/92642. Acesso em: 21 nov. 2024.

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