Capa da publicação Devolução de MPs pelo presidente do Congresso é constitucional?
Capa: Sérgio Lima / Poder360
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Da falta de previsão constitucional autorizadora da devolução de MPs pelo presidente do Congresso Nacional sem o juízo prévio de admissibilidade da comissão mista

18/09/2021 às 19:10

Resumo:


  • O presidente do Senado devolveu ao Executivo a Medida Provisória 1068/2021, que limitava a remoção de conteúdos nas redes sociais, por considerar que era contrária à Constituição de 1988.

  • Essa foi a sexta medida provisória devolvida no Regime da Constituição Federal de 1988, seja pelo presidente do Senado ou da Câmara dos Deputados, evidenciando um movimento de revisão e controle das MPs.

  • A devolução de MPs sem o parecer prévio da comissão mista, previsto no art. 62 da CF, não foi tema de manifestação do STF até o momento, apesar de questionamentos sobre a constitucionalidade das medidas devolvidas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Quando o presidente do Congresso Nacional faz o juízo prévio de admissibilidade constitucional de Medida Provisória, ele está suprimindo as funções da Comissão Mista e do Plenário (art. 62, §§ 5º e 9º, da Constituição).

Recentemente, “o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, confirmou que devolveu ao Executivo a Medida Provisória (MP) 1068/2021, que limitava a remoção de conteúdos publicados nas redes sociais. Com a decisão de Pacheco, as regras previstas na MP deixam de valer e não serão analisadas pelo Congresso Nacional. Ele disse considerar que as previsões da MP são contrárias à Constituição de 1988 e às leis, caracterizando exercício abusivo do Executivo, além de trazer insegurança jurídica.” (Agência Senado, 14/09/21).

A referida MP foi objeto das ações diretas de inconstitucionalidade 6.992/DF, 6.993/DF, 6.994/DF, 6.995/DF, 6.996/DF e 6.998/DF, com pedido de medida cautelar, ajuizadas por partidos políticos. A Relatora, Ministra Rosa Weber, em decisão data de 15/09 /21, julgou prejudicadas as referidas ações diretas de inconstitucionalidade (art. 21, IX, do RISTF), por perda superveniente de objeto, extinguindo os processos sem resolução do mérito, em razão da devolução da MP em comento pelo Senador Rodrigo Pacheco.

Vale ressaltar que essa é sexta medida provisória que se tem notícia que foi devolvida no Regime da Constituição Federal de 1988, até a presente data, seja por presidente do Senado ou por presidente da Câmara dos Deputados.

Em 12 de junho de 2020, o Senador Davi Alcolumbre, então presidente do Senado e do Congresso Nacional, por meio do Ato Declaratório do Presidente da Mesa do Congresso Nacional Nº 66, de 2020, devolveu ao Poder Executivo a Medida Provisória 979/2020 que permitia ao ministro da Educação nomear reitores das universidades federais durante o período da pandemia sem consulta às universidades.

Nesse episódio, o Senador Alcolumbre extraiu fundamento na interpretação do regramento inserto no art. 48, inciso XI, do Regimento Interno do Senado Federal, que atribui ao Presidente o dever de impugnar as proposições contrárias à Constituição, às leis ou ao Regimento.

Contudo, discordamos dessa interpretação. Quando o presidente do Congresso  faz o juízo prévio de admissibilidade constitucional de Medida Provisória, ele está suprimindo as funções da Comissão Mista e do Plenário (art. 62, parágrafos 5º e 9º, da Constituição Federal.

Observamos que o art. 62 da Constituição Federal define a medida provisória como ato normativo com força de lei, com vigência imediata, que pode ser editado pelo Presidente da República em caso de relevância e urgência. Depois de editada, a medida deve ser submetida de imediato à deliberação do Congresso Nacional. As medidas provisórias perdem a eficácia desde a edição se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável por mais sessenta dias. No caso de perda de eficácia de medida provisória não convertida em lei, o Congresso Nacional deverá disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes. Porém, transcorrido o prazo de sessenta dias contados a partir da rejeição ou da perda de eficácia da medida provisória sem que se proceda ao referido decreto, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas definitivamente (Cabral, 2021, CF Interpretada, p. 460).

A regra prevista no parágrafo 5º do art. 62, da Constituição Federal, estabelece que “a deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais.”

De modo que, o referido parágrafo determina que o Congresso Nacional proceda uma análise prévia acerca dos requisitos constitucionais de validade da medida provisória, consistente na apuração dos pressupostos da sua relevância e urgência para sua edição (art. 62, caput, da CF), para só depois proceder à verificação da incidência do mérito da atuação normativa excepcional do Executivo.

 A tramitação ocorre da seguinte forma: nas 48 horas seguintes à publicação, o Presidente do Congresso Nacional distribui o texto da medida provisória e designa comissão mista para estudá-la e emitir um parecer, conforme dispõe o art. 2º da Resolução n. 1/2002 do Congresso Nacional. Após essa fase preliminar, são examinados os pressupostos de constitucionalidade, a urgência, a relevância e a adequação financeira e orçamentária, em consonância com o art. 5º da Resolução n. 1/2002 do Congresso Nacional. Se o Plenário da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal decidir que não há atendimento dos pressupostos constitucionais ou adequação financeira ou orçamentária por parte da medida provisória, a consequência será seu arquivamento (Cabral, CF Interpretada, p 469).

Por seu turno, dispõe o parágrafo 9º do art. 62, da Constituição Federal, quecaberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)”

No entanto, o texto constitucional não trata de como a comissão mista procederá para a elaboração do parecer mencionado, sendo essa matéria disciplinada pela Resolução n. 1/2002, do Congresso Nacional. Esta dispõe que os trabalhos da comissão mista serão iniciados com a presença de, no mínimo, um terço dos membros de cada uma das Casas. As deliberações serão tomadas por maioria de votos, desde que presente a maioria absoluta dos membros de cada uma das Casas, conforme previsto no § 6º do art. 4º. Determina, ainda, o art. 5º da mesma Resolução que a comissão terá o prazo improrrogável de quatorze dias, contado da publicação da medida provisória no Diário Oficial da União, para emitir parecer único, manifestando-se sobre a matéria, em itens separados, quanto aos aspectos constitucionais, inclusive sobre os pressupostos de relevância e urgência, de mérito, de adequação financeira e orçamentária e quanto ao cumprimento da exigência prevista no § 1º do art. 2º da referida Resolução (apresentação da mensagem e da motivação do texto enviado pelo Presidente da República ao Congresso Nacional). (Cabral, 2021, CF Interpretada, p. 471).1

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Oportuno destacar que ao longo da promulgação da CF de 1988, até a presente data, o STF não foi instado a se manifestar sobre essa temática (devolução de MPs sem o prévio parecer da constituição mista, previsto no § 5º, do art. 62 da CF) por fim, registramos que a MP 979/2020 teve sua constitucionalidade questionada por meio da ADI 6.458, ação direta que foi julgada extinta, sem resolução de mérito, tendo em vista que a referida MP foi expressamente revogada pela MP 981/2020. Em relação à Medida Provisória (MP) 1068/2021, como já apontado, foi devolvida pelo atual presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco, sem o parecer prévio da comissão mista.


Referência bibliográfica:

CABRAL, Francisco de Assis. Do processo Legislativo, in: Constituição Federal interpretada: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo – 12ª Edição – coord, : Costa Machado; Anna Cândida da Cunha Ferraz, Ed. Manole, São Paulo: 2021.

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Sobre o autor
Francisco de Assis Cabral

Membro da IACL: The International Association of Constitutional Law, filiado ao CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito. Mestre em Direitos Fundamentais pelo UNIFIEO-SP. (concluído em 2005, sob orientação da Profa. Dra. Anna Cândida da Cunha Ferraz - Livre Docente e Professora Associada da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – FD-USP). Ex-Procurador da FUNDAC/PB – Fundação de Desenvolvimento da Criança. . Advogado em São Paulo de 1993 a 2003. Ex-Professor de Direito Constitucional e Hermenêutica Jurídica da Faculdade Integrada do Recife – Primeiro colocado na seleção pública de docente para a disciplina de Direito Constitucional – I na Faculdade Integrada de Pernambuco - FACIPE (2008). Obras do autor: a) coautor da obra Constituição Federal Interpretada - Coordenador/Organizador: Machado, Antônio Cláudio da Costa & Ferraz, Anna Cândida da Cunha. São Paulo: 12ª edição, Editora Manole, 2021; b) Controle de constitucionalidade. Editora Schoba, Salto-São Paulo 2009; c) Controle de constitucionalidade, 3ª edição, amazon.com.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CABRAL, Francisco Assis. Da falta de previsão constitucional autorizadora da devolução de MPs pelo presidente do Congresso Nacional sem o juízo prévio de admissibilidade da comissão mista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6653, 18 set. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/93283. Acesso em: 22 dez. 2024.

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