O genitor que não reside com seus filhos possui o direito-dever de convivência com estes, em períodos pré-determinados, de forma igualitária, estabelecidos quer por acordo celebrado entre os pais, quer por ordem judicial, materializada em sede de liminar ou por sentença.
Nosso ordenamento jurídico trata o instituto do regime de convivência de forma muito séria e grave, possuindo inúmeros dispositivos que o regulamentam, a fim de garantir a participação de ambos os genitores, ativamente, na vida de seus filhos, em prol do seu melhor desenvolvimento psicoemocional.
Vale destacar que as visitas, acima de tudo, se constituem em um direito da criança e do adolescente, ainda que o Código Civil defina o direito de visita como uma faculdade do pai ou da mãe com os quais os filhos não possuam seu lar de referência.
Recentemente uma decisão do Tribunal do Rio Grande do Sul, em sede liminar, suspendeu o direito de visita e convivência de um genitor que se recusou a receber a vacina contra Covid-19.
No caso em questão, os pais possuem a guarda compartilhada da criança, de apenas um ano de idade, com lar referência materno. O regime de convivência é o da livre visitação, mediante prévio acordo entre os genitores.
O pai veio a contrair o vírus da Covid-19, tendo manifestado a doença de forma grave. Em razão disso, veio a contaminar sua filha. Mesmo após a sua recuperação, este se negou a tomar as vacinas determinadas pela autoridade sanitária, recusando-se, ainda, a adotar qualquer medida preventiva frente a um possível novo contágio.
Diante de tal quadro e do elevado risco de a criança contrair, novamente, a covid-19 por conta da postura paterna, a mãe, com base no dever de zelar pela saúde de sua filha, apresentou perante o Judiciário um pedido de suspensão do regime de convivência, o que foi deferido.
Vemos que o direito-dever do pai em visitar sua filha não pode confrontar com o direito à integridade física, à saúde e o bem-estar de sua filha. É dever dos pais a gestão de todos os cuidados de saúde de seus filhos.
No caso concreto, vislumbramos de forma muito clara que o beneficiário de todas as medidas de guarda e convivência é a criança. Dessa forma, em havendo risco à sua integridade e saúde, não se pode concordar com a manutenção do exercício do regime de convivência por um pai que, salvo melhor juízo, não demonstra se importar com o seu bem-estar.
Temos que a atitude do pai, in casu, se configura na violação dos deveres paternos e um abuso do poder familiar, caracterizado pela negligência com as medidas sanitárias vigentes face à pandemia de covid-19.
Esta conclusão não se resume, apenas, ao contexto pandêmico. A solução dada pelo judiciário neste caso concreto, pode ser aplicada a todos aqueles nos quais os genitores se vejam vítima de moléstia grave de natureza infecto contagiosa.
Mais ainda, temos que o cuidado sagrado com a saúde e a integridade física dos filhos merece toda a atenção e disposição dos genitores para sua garantia e sucesso. Este é o fundamento no qual devem ser apoiadas todas as pretensões similares que possam vir a ser apresentadas perante o judiciário.
Diante de tal gravidade, e tão gritante demonstração de descaso com a saúde dos filhos, neste determinado contexto, pode-se propor, ainda, a suspensão do exercício do poder familiar, em desfavor do genitor negligente.
O legislador ofereceu vários mecanismos de proteção aos filhos no contexto familiar, independente de como se apresente a relação pessoal entre os genitores. As crianças e os adolescentes diante de sua vulnerabilidade carecem de ser protegidos, em todos os aspectos de sua vida, em prol de seu franco e correto desenvolvimento, a fim de que se tornem cidadãos plenos, na vida adulta.
A missão abraçada pelos genitores perante os seus filhos impõe o dever personalíssimo do zelo e do cuidado. Negligenciar a saúde destes é o pior erro que um pai ou uma mãe podem vir a cometer.