Responsabilidade civil por dano moral decorrente de falha do serviço de transporte aéreo e alteração legislativa oriunda da Lei nº 14.034/2020

28/09/2021 às 15:20
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O presente artigo tem como finalidade trazer esclarecimentos acerca da responsabilidade civil decorrente da falha do serviço de transporte aéreo.

Inicialmente cumpre registrar que a relação existente entre os passageiros e a empresa de transporte aéreo é regida pelas normas do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90).

O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de prevalência do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), em relação à Convenção de Varsóvia com suas posteriores modificações (Convenção de Haia e Convenção de Montreal) e ao Código Brasileiro de Aeronáutica, nos casos de responsabilidade civil decorrente de má prestação dos serviços pela Companhia aérea, afora o regramento específico do  CC,  artigos  734  a  742,  e  do  CBA.

 Nos termos do artigo 14 do Diploma legal supramencionado, o fornecedor responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores em decorrência de defeitos relativos à prestação do serviço.

Como dito alhures, não há dúvida de que o negócio jurídico, vertente da espécie, encerra relação de consumo, aplicando-se, conjuntamente, nos termos do art. 7.º da Lei de n.º 8.987/95 (Lei das Concessões Públicas), as disposições do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, que, em seus arts. 14 e 22, dispõe:

"Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido."

"Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código."

Assim, acrescenta-se que, em se tratando de ação visando o recebimento de indenização decorrente de falha dos serviços de transporte aéreo de passageiros, prestados por empresa privada enquanto concessionária de serviço público, responde o prestador, de forma objetiva, também nos termos do artigo 37, § 6.º, da Constituição da República:

"Art. 37. (...) 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos caso de dolo ou culpa. (...)

Inobstante, quanto à lesão de ordem moral, é indispensável para sua caracterização a ofensa a algum direito da personalidade do indivíduo, que são inatos, intransmissíveis, irrenunciáveis e não sofrem limitação voluntária, salvo exceções legais previamente estabelecidas.

Nesse sentido, cabe destacar, porquanto relevante, a inclusão do artigo 251-A na Lei de n.º 7.565/98 (Código Brasileiro da Aeronáutica) pela Lei de n.º 14.034/2020, que versa nos seguintes termos:

"Art. 251-A. A indenização por dano extrapatrimonial em decorrência de falha na execução do contrato de transporte fica condicionada à demonstração da efetiva ocorrência do prejuízo e de sua extensão pelo passageiro ou pelo expedidor ou destinatário de carga."

Cumpre registrar que esta inovação legislativa, tem por objetivo evitar o chamado dano moral in re ipsa ( aquele que independe de qualquer comprovação) no transporte aéreo.

Inclusive o entendimento atual do STJ é no sentido de que, na hipótese de atraso de voo, não se admite a configuração do dano moral in re ipsa.

Na específica hipótese de atraso ou cancelamento de voo operado por companhia  aérea, não  se vislumbra que o dano moral possa ser presumido  em  decorrência  da  mera  demora e eventual desconforto, aflição e transtornos suportados pelo passageiro. Isso porque vários outros fatores devem  ser  considerados  a  fim  de  que  se possa investigar acerca da real ocorrência do dano moral, exigindo-se, por conseguinte,   a   prova,   por   parte   do  passageiro,  da  lesão extrapatrimonial sofrida.

Em resumo, as circunstâncias  que  envolvem  o caso concreto servirão  de  baliza  para  a  possível  comprovação e a consequente constatação  da  ocorrência  do dano moral. A exemplo, pode-se citar particularidades  a  serem  observadas:  i)  a averiguação acerca do tempo  que  se  levou  para  a  solução  do problema, isto é, a real duração  do  atraso;  ii)  se a companhia aérea ofertou alternativas para melhor atender aos passageiros; iii) se foram prestadas a tempo e  modo informações claras e precisas por parte da companhia aérea a fim  de  amenizar  os  desconfortos  inerentes à ocasião; iv) se foi oferecido  suporte material (alimentação, hospedagem, etc.) quando o atraso  for  considerável;  v)  se o passageiro, devido ao atraso da aeronave, acabou por perder compromisso inadiável no destino, dentre outros.

Assim o novo art. 251-A do CBA encontra-se, de certa forma, em harmonia com o entendimento do STJ.

O referido diploma legislativo prevê ainda alterações nas excludentes de responsabilidade por dano a passageiro:

Art. 256 (...)

§ 1º O transportador não será responsável:

I - no caso do inciso I do caput deste artigo, se a morte ou lesão resultar, exclusivamente, do estado de saúde do passageiro, ou se o acidente decorrer de sua culpa exclusiva;

II - no caso do inciso II do caput deste artigo, se comprovar que, por motivo de caso fortuito ou de força maior, foi impossível adotar medidas necessárias, suficientes e adequadas para evitar o dano.

 O surgimento  da  pandemia  do  Covid-19 (causada  pelo  vírus  SARS-CoV-2)  caracteriza  fortuito externo,  isto  é,  evento  imprevisível  e  inevitável,  estranho  à  atividade  do  prestador  de serviço,  e  que  excluiria  em  decorrência  a  responsabilidade  objetiva  do  transportador de  pessoas  (artigos  393  e  734  do  Código  Civil).

No Código Brasileiro de Aeronáutica não havia uma definição dos conceitos de caso fortuito ou força maior, entretanto, a Lei nº 14.034/2020, resolvendo a questão, acrescentou um parágrafo ao art. 256 trazendo esse conceito inclusive de forma exemplificativa:

Art. 256 (...)

§ 3º Constitui caso fortuito ou força maior, para fins do inciso II do § 1º deste artigo, a ocorrência de 1 (um) ou mais dos seguintes eventos, desde que supervenientes, imprevisíveis e inevitáveis:

I - restrições ao pouso ou à decolagem decorrentes de condições meteorológicas adversas impostas por órgão do sistema de controle do espaço aéreo;

II - restrições ao pouso ou à decolagem decorrentes de indisponibilidade da infraestrutura aeroportuária;

III - restrições ao voo, ao pouso ou à decolagem decorrentes de determinações da autoridade de aviação civil ou de qualquer outra autoridade ou órgão da Administração Pública, que será responsabilizada;

IV - decretação de pandemia ou publicação de atos de Governo que dela decorram, com vistas a impedir ou a restringir o transporte aéreo ou as atividades aeroportuárias.

 

A principal alteração em termos práticos está no inciso I do § 3º do art. 256 do CBA, isso porque agora eventual atraso ou cancelamento decorrente de condições de meteorológicas adversas, não haverá obrigação, a indenizar os passageiros mesmo que isso gere danos.

Entretanto, mesmo diante desta excludente, a companhia aérea é obrigada a prestar assistência material aos passageiros, fornecendo, por exemplo, hospedagem e alimentação enquanto se aguarda um novo voo.

Além disso, a companhia também é obrigada a oferecer o reembolso do valor pago, a reacomodação ou a prestação do serviço por outra modalidade.

Veja-se:

Art. 256 (...)

§ 4º A previsão constante do inciso II do § 1º deste artigo não desobriga o transportador de oferecer assistência material ao passageiro, bem como de oferecer as alternativas de reembolso do valor pago pela passagem e por eventuais serviços acessórios ao contrato de transporte, de reacomodação ou de reexecução do serviço por outra modalidade de transporte, inclusive nas hipóteses de atraso e de interrupção do voo por período superior a 4 (quatro) horas de que tratam os arts. 230 e 231 desta Lei.

Com  efeito,  sobre  alteração  do  contrato  de transporte  aéreo  por  parte  do  transportador,  dispõe  a  Resolução  nº 400/2016,  da  Agência  Nacional  da  Aviação  Civil  (ANAC),  o  seguinte:

“Art.  12.  As  alterações  realizadas  de  forma  programada  pelo transportador,  em  especial  quanto  ao  horário  e  itinerário originalmente  contratados,  deverão  ser  informadas  aos passageiros  com  antecedência  mínima  de  72  (setenta  e  duas) horas. §  1º  O  transportador  deverá  oferecer  as  alternativas  de reacomodação  e  reembolso  integral,  devendo  a  escolha  ser  do passageiro,  nos  casos  de: I  -  informação  da  alteração  ser  prestada  em  prazo  inferior  ao  do caput  deste  artigo;  e II  -  alteração  do  horário  de  partida  ou  de  chegada  ser  superior  a 30  (trinta)  minutos  nos  voos  domésticos  e  a  1  (uma)  hora  nos  voos internacionais  em  relação  ao  horário  originalmente  contratado,  se o  passageiro  não  concordar  com  o  horário  após  a  alteração.

§  2º  Caso  o  passageiro  compareça  ao  aeroporto  em  decorrência  de falha  na  prestação  da  informação,  o  transportador  deverá  oferecer assistência  material,  bem  como  as  seguintes  alternativas  à  escolha do  passageiro: I  -  reacomodação; II  -  reembolso  integral;  e III  -  execução  do  serviço  por  outra  modalidade  de  transporte.”. (g.n.)

 E ainda, o  artigo  21  da  Resolução  400,  de  13  de  dezembro  de  2016, da  ANAC (Agência  Nacional  de  Aviação  Civil),  regra  que:

“Art.  21.  O  transportador  deverá  oferecer  as  alternativas  de reacomodação,  reembolso  e  execução  do  serviço  por  outra modalidade  de  transporte,  devendo  a  escolha  ser  do  passageiro, nos  seguintes  casos:  I  -  atraso  de  voo  por  mais  de  quatro  horas  em relação  ao  horário  originalmente  contratado;  II  -  cancelamento de  voo  ou  interrupção  do  serviço;  III  -  preterição  de  passageiro;  e IV  -  perda  de  voo  subsequente  pelo  passageiro,  nos  voos  com conexão,  inclusive  nos  casos  de  troca  de  aeroportos,  quando  a causa  da  perda  for  do  transportador.  Parágrafo  único.  As alternativas  previstas  no  caput  deverão  ser  imediatamente oferecidas  aos  passageiros  quando  o  transportador  dispuser antecipadamente  da  informação  de  que  o  voo  atrasará  mais  de  4 (quatro)  horas  em  relação  ao  horário  originalmente  contratado”.

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Nos  termos  dos  artigos  26  e  27,  da  Resolução  400/2016,  da ANAC,  nos  casos  de  atraso,  cancelamento  ou  interrupção  de  voo  assim  como preterição  de  passageiro,  está  assegurado  ao  passageiro  direito  de  receber  do transportador  a  devida  assistência  material:

Art.  26.  A  assistência  material  ao  passageiro  deve  ser  oferecida nos  seguintes  casos:  I  -  atraso  do  voo;  II  -  cancelamento  do  voo; III  -  interrupção  de  serviço;  ou  IV  -  preterição  de  passageiro”. Art.  27.  A  assistência  material  consiste  em  satisfazer  as necessidades  do  passageiro  e  deverá  ser  oferecida  gratuitamente pelo  transportador,  conforme  o  tempo  de  espera,  ainda  que  os passageiros  estejam  a  bordo  da  aeronave  com  portas  abertas,  nos seguintes  termos:  I  -  superior  a  1  (uma)  hora:  facilidades  de comunicação;  II  -  superior  a  2  (duas)  horas:  alimentação,  de acordo  com  o  horário,  por  meio  do  fornecimento  de  refeição  ou de  voucher  individual;  e  III  -  superior  a  4  (quatro)  horas: serviço  de  hospedagem,  em  caso  de  pernoite,  e  traslado  de  ida  e volta.  §  1º  O  transportador  poderá  deixar  de  oferecer  serviço  de hospedagem  para  o  passageiro  que  residir  na  localidade  do aeroporto  de  origem,  garantido  o  traslado  de  ida  e  volta.  §  2º  No caso  de  Passageiro  com  Necessidade  de  Assistência  Especial PNAE  e  de  seus  acompanhantes,  nos  termos  da  Resolução  nº  280, de  2013,  a  assistência  prevista  no  inciso  III  do  caput  deste  artigo deverá  ser  fornecida  independentemente  da  exigência  de  pernoite, salvo  se  puder  ser  substituída  por  acomodação  em  local  que atenda  suas  necessidades  e  com  concordância  do  passageiro  ou acompanhante.  §  3º  O  transportador  poderá  deixar  de  oferecer assistência  material  quando  o  passageiro  optar  pela reacomodação  em  voo  próprio  do  transportador  a  ser  realizado em  data  e  horário  de  conveniência  do  passageiro  ou  pelo reembolso  integral  da  passagem  aérea

Por fim conforme ementas abaixo os tribunais já te aplicado as novas disposições normativas senão vejamos:

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO MORAL DECORRENTE DE ATRASO DE VÔO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MAIORES CONSEQUÊNCIAS DANOSAS NA ESFERA ÍNTIMA DA VÍTIMA - PREJUÍZO MORAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - SENTENÇA REFORMADA.

1. A responsabilização civil do fornecedor por defeito na prestação do serviço prescinde da comprovação da sua culpa na ocorrência do dano ao consumidor, mas não dispensa a demonstração do dano - material e/ou moral - e do nexo de causalidade que, potencialmente, os conecta.

2. O artigo 251-A, incluído na Lei de n.º 7.565/98 (Código Brasileiro da Aeronáutica) pela Lei de n.º 14.034/2020, normatiza que a indenização por dano extrapatrimonial em decorrência de falha na execução do contrato de transporte fica condicionada à demonstração da efetiva ocorrência do prejuízo e de sua extensão pelo passageiro ou pelo expedidor ou destinatário de carga.

3. Não comprovado que o atraso na espera pela decolagem de vôo doméstico, adiado pela companhia aérea por razões de ordem técnica, teve maiores repercussões lesivas aos direitos da personalidade e/ou honra objetiva e subjetiva do consumidor, fica rechaçada a configuração do dever reparatório por prejuízo moral. 

(TJMG -  Apelação Cível  1.0000.20.595392-0/001, Relator(a): Des.(a) Márcio Idalmo Santos Miranda , 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/05/2021, publicação da súmula em 18/05/2021)

 AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONSUMIDOR. PACOTE TURÍSTICO. TRANSPORTE AÉREO DOMÉSTICO. CANCELAMENTO DO VOO DE RETORNO. REMARCAÇÃO APÓS DOIS DIAS. LEI 14.034/2020. DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE PRESTAR ASSISTÊNCIA AOS PASSAGEIROS. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E AUXÍLIO COM HOSPEDAGEM E ALIMENTAÇÃO DURANTE O PERÍODO EM QUE OS AUTORES AGUARDAVAM A REALOCAÇÃO EM OUTRO VOO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EVIDENCIADA NO CASO CONCRETO. DANOS MATERIAIS PARCIALMENTE COMPROVADOS. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

(Recurso Cível, Nº 71010052306, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Cleber Augusto Tonial, Julgado em: 26-08-2021)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. AFASTADA. MÉRITO. PACOTE TURÍSTICO. VIAGEM ÁEREA. HOSPEDAGEM. TRASLADOS. EVENTOS. CANCELAMENTO. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. PANDEMIA. COVID-19. MP Nº 948/2020. PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI. RESCISÃO CONTRATUAL E DEVOLUÇÃO INTEGRAL DA QUANTIA PAGA. MANUTENÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. Todos aqueles que participam da cadeia de consumo, auferindo vantagem econômica ou de qualquer outra natureza, por intermediar transações e parcerias, devem responder solidariamente aos prejuízos causados (§ 2º do artigo 3º; parágrafo único do art. 7º; §1º do art. 25, todos do CDC). 2. Considerando a responsabilidade solidária da cadeia de fornecedores de produtos e serviços, a discricionariedade do consumidor no exercício de sua pretensão e o fato de que a legitimação para a causa deve ser analisada com base nas afirmações feitas na petição inicial (teoria da asserção), cuja necessidade de um exame mais acurado deve ser realizada como próprio mérito da ação, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva das apelantes, intermediadoras de serviços turísticos. 3. O consumidor adquiriu pacote turístico que englobava serviços de transporte aéreo, hospedagem, traslados e eventos culturais. Assim, aplica-se as disposições da Medida Provisória nº 948/2020 (convertida na Lei nº 10.046/2020), que dispôs sobre o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e de cultura em razão da pandemia de covid-19, deixando a aplicação da MP nº 925/2020 para os casos que tratam, exclusivamente, do serviço de aviação civil no Brasil. 3.1. A aprovação do projeto de lei de conversão da MP nº 948/2020 (Lei nº 10.046/2020) se deu com alterações do texto original da medida provisória. Assim, de acordo com o princípio da irretroatividade das leis, os novos dispositivos têm aplicabilidade somente a partir da vigência da lei de conversão. Os efeitos da inovação legislativa não retroagem ao tempo da edição da medida provisória. 4. Se por um lado a MP nº 948/2020 objetiva resguardar a higidez econômica das empresas, privilegiando a manutenção dos contratos celebrados, com a remarcação dos serviços ou a disponibilização de crédito, neste contexto de grave crise sanitária imposto pela pandemia de covid-19; por outro, também procura equilibrar a relação de consumo, assegurando alternativas adequadas aos envolvidos. 5. O Estado, sob o pálio das modernas tendências protetivas do consumidor, observados os princípios e direitos traduzidos na Lei nº 8.078/90, outorgou-lhe amplo espectro de proteção, coibindo costumeiros abusos e criando mecanismos poderosos de prevenção e repressão contra antigos excessos. 6. O consumidor solicitou o cancelamento do serviço turístico após a edição da MP nº 948/2020 e antes da sua conversão em lei. 7. Demonstrado que há previsão normativa de solução diversa da simples remarcação do serviço ou concessão de crédito e que o consumidor é idoso e manifestou que pretende o reembolso das parcelas pagas, em razão da impossibilidade de realizar a viagem, durante a pandemia de covid-19, a sentença não merece reparos. 7.1. O apelado possui 85 (oitenta e cinco) anos de idade. Neste caso é desarrazoado obrigá-lo a se manter vinculado a um contrato que não sabe se poderá gozar do serviço ou que, usufruindo, o coloque em situação de risco à saúde e à vida. É fato notório o de que a pandemia está longe de terminar e não se sabe quando as medidas de isolamento social serão desaconselhadas. 8. O recorrido não pode ser responsabilizado pelos prejuízos decorrentes de caso fortuito ou de força maior, nos termos do art. 393 do CC. 9. Os juros de mora são devidos, desde a citação inicial, a teor do estabelecido no art. 405 do CC. 10. Quanto ao requerimento subsidiário das apelantes, que vai ao encontro do requerido pelo apelada na petição inicial, mantem-se a determinação de que a devolução dos valores pode ser em até 12 (doze) parcelas mensais e iguais, a contar do cancelamento do voo cancelado, por analogia ao disposto no art. 3º da Lei nº 14.034/2020. 11. RECURSO DESPROVIDO.

(Acórdão 1346820, 07195930420208070001, Relator: ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 9/6/2021, publicado no DJE: 25/6/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Por fim, entendemos que, as alterações anteriormente comentadas, não pode atingir contratos celebradas anteriormente, por força da vedação, diante de ato jurídico perfeito à irretroatividade (sequer mínima) de norma que não seja constitucional originária.


Bibliografia

https://www.dizerodireito.com.br/2020/08/lei-140342020-altera-o-codigo.html

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Sobre o autor
Rodrigo Almeida Chaves

Defensor Público do Estado do Acre, desde o ano de 2007 atualmente lotado no Subnúcleo do Superendividamento e Ações do Consumidor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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