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Organização do Estado

09/10/2021 às 17:55
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O federalismo brasileiro, em parte, é dual, diante das competências exclusivas que a Constituição assegura, e, em parte, de cooperação, tendo em vista a existência de competências compartilhadas.

Os elementos orgânicos ou organizacionais da Constituição Federal são os que disciplinam a organização do Estado e dos Poderes.

Como os direitos fundamentais da pessoa antecedem ao próprio Estado, a Constituição de 1988 os disciplinou primeiro, no título II, reservando o título III, para tratar da Organização do Estado.

A Constituição atual consagrou a Federação como forma de Estado e a República como forma de governo, seguindo os passos que perduram entre nós desde a Constituição de 1891, promulgada após a proclamação da República, que rompeu com o modelo de Estado Unitário, adotado na época do Império. Aliás, a Federação é cláusula pétrea, não pode ser alterada por Emenda Constitucional.

FORMAS DE ESTADO: UNITÁRIO E FEDERAÇÃO

As formas de Estado variam conforme a distribuição do poder pelo território nacional.

No Estado Unitário, o poder concentra-se num único ente. É o modelo geralmente adotado nos Estados com territórios pequenos (exemplos: Chile, França, Uruguai, etc). Ao tempo do Império, o Brasil era um Estado Unitário, mas descentralizado, porque havia as Províncias (atuais Estados-Membros), que tinham autonomia administrativa. Esta descentralização administrativa, no entanto, é insuficiente para o Estado ser rotulado de Federação. Quem governava as províncias era uma autoridade pública nomeada pelo Imperador. Elas não tinham, portanto, autonomia política, nem auto-organização, isto é, não podiam elaborar as suas próprias Constituições.

Outra forma de Estado, que se contrapõe ao Unitário, é a Federação, que consiste na autonomia recíproca entre os entes que a integram, revelada essencialmente por três aspectos:

  • Capacidade de auto-organização, que é o poder de cada Estado-Membro elaborar as próprias leis e Constituições.
  • Capacidade de autogoverno, isto é, autonomia política, que é o poder de eleger os próprios governantes, sem que eles sejam indicados pelo Presidente da República.
  • Capacidade de autoadministração, que é o poder de instituir e arrecadar os próprios impostos para a execução dos seus fins.

É claro que ainda há outras inúmeras características peculiares ao Estado Federal, mas estas três, sem dúvida, são as essenciais, sob pena de não se configurar este modelo estatal.

PRINCIPAIS TIPOS DE FEDERALISMO

Quanto à origem, classifica-se em:

a) Federalismo Típico ou por Agregação: é a junção de Estados independentes que renunciam à própria soberania para formar um só Estado soberano. As treze ex-colônias inglesas, por exemplo, que já eram independentes, se reuniram em Filadélfia para formar os Estados Unidos da América. Igualmente, a Alemanha é fruto da união de vários Estados independentes que abdicaram da soberania para constituir um único Estado soberano.

b) Federalismo Atípico ou por Segregação: é a transformação do Estado Unitário em Estado Federal, através da autonomia política e administrativa que se confere aos Estados-Membros. Em relação à origem, o federalismo brasileiro é por segregação.

Quanto ao predomínio das forças e competências, pode ser:

a) Federalismo Centrípeto: no ente central, no caso a União, predomina o poder e o maior número de competências.

b) Federalismo Centrífugo: nos entes descentralizados, no caso os Estados-Membros, concentram-se a maior parte do poder e das competências. É o modelo dos EUA.

c) Federalismo de equilíbrio: há verdadeira harmonia de forças e distribuição de competências entre o governo central e os governos estaduais.

Em relação, à forma de divisão das competências, pode ser:

a) Federalismo Dual ou Dualista: é o que prevê, para o governo central e governo estadual, competências exclusivas e estanques, sem qualquer possibilidade de competências comuns ou concorrentes. Foi o modelo adotado pelas primeiras federações, que pautavam por uma rigorosa repartição de competências exclusivas.

b) Federalismo de Cooperação: é o que prevê competências compartilhadas (comuns e concorrentes) à União e Estados-Membros. Em razão da crise econômica e social emanada das duas grandes guerras mundiais, os entes da federação uniram forças em relação a algumas matérias, favorecendo a busca do bem estar social, surgindo, então, essa modalidade de federalismo. Sobre o federalismo de cooperação, dispõe o art. 241 da CF: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos”. Estes consórcios públicos e convênios celebrados entre os entes federativos, regulados pela Lei 11.107/2005, para uma atuação conjunta em determinada área, visam otimizar a prestação dos serviços públicos, tendo ampla aplicação prática na área de saúde.

O Federalismo brasileiro, em parte, é dual, diante das competências exclusivas que a Constituição assegura, e, em parte, de cooperação, tendo em vista a existência de competências compartilhadas. De fato, o art. 23 da CF prevê o rol das competências comuns a todos os entes da federação e o art. 24 as competências concorrentes da União, Estados-Membros e Municípios. Aliás, em vez de dual, o federalismo brasileiro é, na verdade, tridimensional, à medida que as competências são repartidas entre três entes (União, Estados-Membros e Municípios).

Finalmente, quanto à uniformidade ou não dos entes da federação, classifica-se em:

a) Federalismo Simétrico: os entes da federação encontram-se no mesmo nível.

b) Federalismo Assimétrico: os entes da federação encontram-se em níveis diferentes.

No Brasil, há simultaneamente simetria e assimetria conforme aquilo que é analisado na comparação entre os Estados-Membros ou entre a União e os Estados-Membros ou ainda entre os Estados-Membros e o modelo de federalismo adotado pela Constituição.

Com efeito, no quesito riqueza, dimensão territorial e número de habitantes, denota-se a assimetria entre os Estados-Membros. Mas, em contrapartida, todos eles desfrutam da mesma competência e dos mesmos poderes, inclusive, em matéria da representação política, pois, cada Estado-Membro, tem 3 (três) Senadores, revelando-se, nesses aspectos, grande simetria. Na composição da Câmara dos Deputados, porém, tendo em vista que a quantidade populacional de cada Estado-Membro é decisiva para se definir o número de parlamentares dessa natureza, vigora novamente a assimetria.

Os mecanismos constitucionais que podem combater a assimetria e favorecer a redução da desigualdade entre os Estados-Membros são a criação, pela União, de regiões em desenvolvimento (art. 43 da CF) e a previsão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do país (art. 151, I, da CF).

CARACTERÍSTICAS DAS FEDERAÇÕES

Nas federações é importante salientar as seguintes características:

a) A soberania é apenas do Estado Federal e não dos entes que o compõem. No Brasil, os entes que integram a federação são a União, Distrito Federal, Estados-Membros e Municípios (art. 218 da CF). Todos eles gozam de autonomia, tanto política quanto administrativa, de modo que um não é subordinado ao outro. Todavia, são apenas pessoas jurídicas de direito público interno, observação válida inclusive para a União. A soberania, no entanto, é exclusiva do Estado Federal que, nas relações internacionais, é representada pela União (art. 21, I, da CF). Cumpre não confundir a autonomia, que é o fato de o ente federativo ter governo próprio e competências próprias estabelecidas pela Constituição, com a soberania, que é a independência e capacidade de manifestar-se no plano internacional. A União, na verdade, tem duplo papel. Com efeito, enquanto ente da federação, é simplesmente uma pessoa jurídica de direito público interno, mas ao mesmo tempo ela representa o Estado Nacional nas relações jurídicas internacionais. A soberania do Estado é, pois, exercida através da União. Frise-se porém, que a União apenas representa o Estado Nacional, mas com ele não se confunde.

b) O pacto federativo deve ser previsto na Constituição. No Brasil, a federação, além de figurar expressamente no texto constitucional, é ainda uma de suas cláusulas pétreas. Cumpre observar que federação é a união indissolúvel de entes autônomos para constituir um único Estado soberano, ao passo que a Confederação é a aliança de Estados soberanos que não perdem as respectivas soberanias, e, por isso, o pacto confederativo figura em Tratados Internacionais, podendo, portanto, ser dissolvido a qualquer tempo.

c) A existência de duas esferas autônomas de governo, com capacidade de autogoverno, isto é, de organização dos próprios Poderes Públicos. No Brasil, além da União, os Estados-Membros ou Distrito Federal organizam também os seus três Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário). Nos Municípios, o autogoverno restringe-se ao poder de estruturar o próprio Poder Legislativo e o próprio Poder Executivo, mas não existe o Poder Judiciário Municipal. Os Municípios são conhecidos como entes da federação de terceiro grau. De fato, no Brasil, a federação é composta por três esferas autônomas: União, Estados-Membros ou Distrito Federal e Municípios.

d) A repartição constitucional de competências entre os entes da federação. Trata-se de uma característica essencial à federação, que garante a autonomia dos entes que a compõem. É a repartição constitucional de competências que define se o federalismo será centrípeto (centraliza-se as forças para a União) ou centrífugo (prioriza-se os Estados-Membros) ou ainda de equilíbrio (distribuição harmônica das competências entre os entes da federação).

e) A participação dos Estados-Membros na formação da vontade nacional. No Brasil, cada Estado-Membro tem 3 (três) Senadores. O Senado Federal é a instituição representativa dos Estados-Membros. A vontade nacional, expressada pelas leis, conta com a participação dos Estados-Membros que, através do Senado Federal, atua ativamente no processo de elaboração das espécies normativas.

f) A capacidade de auto-organização dos Estados-Membros. É o fato de, cada Estado-Membro, elaborar as próprias Constituições Estaduais e respectivas leis. O Estado unitário descentralizado não ostenta o “status” de federação justamente pela falta de capacidade de autolegislação.

g) A autonomia administrativa dos Estados-Membros. Os Estados-Membros devem ter competências próprias e capacidade para gestão e execução dos seus serviços públicos, independentemente daqueles que já são oferecidos pela União.

h) A autonomia política dos Estados-Membros. É, pois, a capacidade de autogoverno. O Governador do Estado e os Deputados Estaduais devem ser eleitos no próprio Estado e não por indicação do Presidente da República.

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i) A autonomia financeira dos Estados-Membros. Os Estados-Membros devem ter capacidade para instituir e arrecadar os próprios tributos para a consecução dos seus serviços públicos. As fontes próprias de recursos prestigiam os Estados-Membros, garantindo-lhes a autonomia.

j) A previsão constitucional de um Tribunal independente incumbido de solucionar os eventuais conflitos entre o governo central e o governo estadual. Compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar, originariamente, as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive, as respectivas entidades da administração indireta (art. 102, I, alínea “f”, da CF).

k) A iniciativa dos Estados-Membros para apresentação de proposta de reforma à Constituição Federal. De acordo com o art. 60, III, da CF, a Constituição poderá ser emendada mediante proposta de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.

l) A vedação da secessão, isto é, desmembramento de parte do território nacional para constituir país independente. A federação é, pois, a união indissolúvel da União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios. Estes entes federativos são autônomos, mas não gozam de independência. A simples tentativa de secessão gera três consequências:

  • É crime contra a Segurança Nacional (art. 11 da Lei 7.170/1983);
  • É crime de responsabilidade, quando emanar de ato do Presidente da República (art. 85, I, da CF).
  • É cabível a intervenção federal para se garantir a manutenção da integridade nacional (art. 34, I, da CF).

CLÁUSULA PÉTREA

Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado (art. 60, § 4º, I, da CF).

A federação é cláusula pétrea, isto é, não pode ser alterada por Emenda Constitucional.

A expressão “tendente a abolir”, constante do citado art. 60, § 4, I, da CF, veda que, através de Emenda Constitucional, se suprima uma das características da federação, mencionadas acima, ainda que o objetivo seja para melhor atender os interesses da população.

OS MUNICÍPIOS COMO ENTES DA FEDERAÇÃO

Sobre o assunto, há duas correntes:

1ª) O Município não é uma entidade do Estado Federal. Trata-se apenas de um componente intraestatal, uma circunscrição territorial dentro do Estado-Membro. De acordo com esse ponto de vista, defendido por José Afonso da Silva, os entes da federação são a União, os Estados-Membros e o Distrito Federal. Os principais argumentos são que os Municípios não têm representantes no Senado Federal e, por isso, não participam da formação da vontade nacional, outrossim, não desfrutam de competência para apresentação de proposta de emendas constitucionais.

2ª) O Município é um dos entes da federação (Posição dominante). Com efeito, o art. 1º da CF, ao arrolar os entes da federação, incluiu expressamente os Municípios. De fato, os Municípios têm:

  • Capacidade de auto-organização, elabora as próprias leis, inclusive, a lei orgânica municipal que, embora não tenha a natureza de norma constitucional, destina-se à organização da vida social e política do Município.
  • Capacidade de autogoverno, elege os próprios prefeitos e vereadores.

Além disso, os Municípios ainda gozam de autonomia financeira e administrativa, preenchendo as principais características que integram o ente à Federação.

TERRITÓRIOS FEDERAIS

Os Territórios Federais não são entes da federação, tanto é que o art. 18 da CF, que arrola esses entes, não os inclui no seleto rol.

Até a Constituição de 1988 existiam, no Brasil, três territórios: Fernando de Noronha, que foi incorporado ao Estado de Pernambuco, Roraima e Amapá, que tornaram-se Estados-Membros.

Atualmente, não há Territórios, mas eles ainda podem ser criados por lei complementar.

Com efeito, dispõe o § 2º do art. 18 da CF: “Os Territórios Federais integram a União, e sua criação, transformação em Estado ou reintegração ao Estado de origem serão reguladas em lei complementar”.

Caso sejam criados, pertencerão à União e, portanto, diante da total falta de autonomia, não serão considerados entes da federação.

Os territórios têm natureza jurídica de autarquia territorial. Não passam de simples divisão administrativa da União. Podem ser definidos como descentralizações administrativas da União, porquanto não gozam da capacidade de autogoverno, tanto é que o seu Governador é nomeado pelo Presidente da República, após aprovação do Senado Federal. As contas do Governador do Território serão ainda submetidas ao Congresso Nacional, com parecer prévio do Tribunal de Contas da União.

Quanto à função legislativa nos Territórios, é exercida pelo Congresso Nacional. É, pois, a União que legisla para os Territórios. Os Territórios Federais com mais de cem mil habitantes, no entanto, terão Poder Legislativo, denominado Câmara Territorial, conforme § 3º do art. 33 da CF, devidamente eleitos, nos termos definidos por lei. A competência da Câmara Territorial, segundo a doutrina, limita-se aos assuntos de interesse da região. Quanto às questões maiores, isto é, de interesse de todos os Territórios, mantém-se a competência do Congresso Nacional.

Em relação ao Poder Judiciário, os Territórios Federais com mais de cem mil habitantes terão seus próprios órgãos judiciários de primeira e segunda instância, membros do Ministério Público e Defensores Públicos Federais (§ 3º do art. 33 do CP). Caso tenham menos de cem mil habitantes, esses órgãos serão os mesmos do Distrito Federal.

Os Territórios Federais não desfrutam de autonomia financeira, eles são financiados pela União, que, inclusive, arrecada os tributos federais e estaduais, que incidem na região.

Os Territórios poderão ser divididos em Municípios (§ 1º do art. 33 da CF). Os referidos municípios terão as mesmas características dos demais municípios do País, isto é, poderão eleger os vereadores e prefeitos, arrecadarem os tributos municipais, elaborarem suas próprias leis orgânicas, etc.

Finalmente, cada Território elegerá 4 (quatro) Deputados Federais, independentemente do número de habitantes, mas, evidentemente, não elegerão Senadores.

DISTRITO FEDERAL

O Distrito Federal é um dos entes da federação citado pelo art. 18 da CF. Goza de autonomia, nos termos do art. 32 da CF. Não é, portanto, subordinado à União e, nesse aspecto, distingue-se dos Territórios e se iguala aos Estados-Membros.

No Distrito Federal localiza-se Brasília, que é a Capital Federal.

O Distrito Federal é localizado numa área territorial separada e autônoma para se preservar a igualdade entre os Estados-Membros. Se a Capital Federal se localizasse em determinado Estado-Membro, a isonomia, no plano real, seria quebrada devido à importância maior que lhe seria conferida.

O Distrito Federal é então a área que se reserva para servir de sede da União e dos Três Poderes Públicos Federais. E, para que o Presidente da República e o Congresso Nacional, não tenham a preocupação extra de gerir o funcionamento administrativo e legislativo dessa região, é que se confere autonomia ao Distrito Federal, através de sua inserção como ente da federação.

O Distrito Federal tem o poder de elaborar a sua própria Constituição que, no entanto, recebe o nome “Lei Orgânica Distrital”. Outrossim, o poder de eleger o seu Governador e Deputados Distritais, que desfrutam das mesmas prerrogativas e restrições impostas aos Governadores e Deputados Estaduais. No âmbito distrital, tanto o Poder Executivo quanto o Poder Legislativo são mantidos pelos cofres financeiros do próprio Distrito Federal.

Quanto à Justiça e a Polícia do Distrito Federal, isto é, o Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Polícia Civil, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros, são organizados e mantidos financeiramente pela União Federal (art. 21, XIII e XIV, da CF). Esses órgãos exercem as atribuições que lhes são próprias nos Estados-Membros. No âmbito do Poder Judiciário, por exemplo, a competência é a mesma dos Tribunais e Juízes Estaduais. As Polícias e Corpo de Bombeiros do Distrito Federal subordinam-se ao Governador Distrital, embora sejam organizados e financiados pela União (§ 6º do art. 146 da CF).

É vedada a divisão do Distrito Federal em Municípios (art. 32 da CF). Portanto, as divisões territoriais não podem ser chamadas de Municípios e sim regiões administrativas, compostas por Brasília e as cidades satélites. O Governador do Distrito Federal, mediante aprovação da Câmara Legislativa, nomeia os administradores regionais dessas cidades satélites, que, portanto, não têm Prefeitos.

Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios (§ 1º do art. 32 da CF). Ao arrecadar os tributos estaduais e municipais, garante a sua autonomia administrativa e financeira, e, por isso, não se confunde com os Territórios Federais.

O Distrito Federal, como se vê, acumula a competência exclusiva do Município, identificada pelas matérias de interesse local, e a competência remanescente dos Estados-Membros. Não cabe, destarte, ação direta de inconstitucionalidade de lei do Distrito Federal derivada da sua competência legislativa municipal (Súmula 642 do STF), mas será possível a ADI no STF para questionar lei distrital quando no exercício da competência estadual.

Acrescente-se ainda que à União compete prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio do fundo próprio (art. 21, XIV, da CF).

Finalmente, além dos deputados distritais, que equivalem aos estaduais, o Distrito Federal, na qualidade de ente da federação, ainda elege 8 (oito) Deputados Federais e 3 (três) Senadores.

FORMAÇÃO DOS ESTADOS-MEMBROS

Sobre a formação dos Estados-Membros, dispõe o § 3º do art. 18 da CF: “Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar”.

São, portanto, três os mecanismos constitucionais previstos para a formação dos Estados-Membros: incorporação, subdivisão e desmembramento.

Incorporação é a absorção de um Estado-Membro por outro. O Estado-Membro incorporador continua existindo e é ainda ampliado pela anexação do Estado-Membro incorporado que, por sua vez, sob o prisma jurídico, deixa de existir. O antigo Estado da Guanabara, por exemplo, foi incorporado pelo Estado do Rio de Janeiro. A incorporação de Estados, a rigor, é prevista no art. 48, VI, da CF que, ao tratar da competência legislativa do Congresso Nacional, faz expressa menção à palavra “incorporação”.

Quanto ao § 3º do art. 18 da CF, prevê que os Estados podem “incorporar-se entre si”, e, nesse sentido, a incorporação é a fusão de dois Estados que se unem e se extinguem para formar um novo Estado. Como a Constituição não tem palavras inúteis, força convir que esse último sentido é o que deve prevalecer. Na incorporação, portanto, surge um terceiro Estado-Membro formado pela junção de outros dois ou mais que, por consequência, deixam de existir. Uma primeira corrente, liberal, admite as duas modalidades de incorporação, enquanto outra, ortodoxa, só aceita esta última.

Por outro lado, subdivisão é o fracionamento que extingue o Estado-Membro para conferir à sua área territorial um outro destino. Exemplo: o Estado-Membro é dividido em dois e cada parte passa a constituir um novo Estado. Outro exemplo: o Estado-Membro é dividido em três partes, sendo que duas se transformam em Territórios Federais e a terceira é anexada a um outro Estado.

Desmembramento, por sua vez, é o fato de uma parte da área territorial do Estado-Membro ser destinada à formação de um novo Estado. O Estado desmembrado não é extinto, apenas perde parcela de sua extensão territorial. Na década de 1970, o Estado do Mato Grosso foi desmembramento para que se formasse o Estado do Mato Grosso do Sul. A Constituição de 1988 desmembrou o Estado de Goiás e então surgiu o Estado de Tocantins. Houve ainda uma tentativa de se desmembrar o Estado do Pará, para se criar outros dois Estados, mas a proposta acabou sendo rejeitada pelo plebiscito.

Os requisitos para a formação dos Estados-Membros, seja por incorporação, subdivisão ou desmembramento são os seguintes:

a) Plebiscito. De acordo com o § 3º do art. 18 da CF, a população diretamente interessada deve ser previamente ouvida. Na verdade, quem participa do plebiscito são os eleitores, mediante voto obrigatório, e não a população em geral. De acordo com a Lei 9.708/98, que regulamenta a matéria, a convocação do plebiscito é através de decreto legislativo, por proposta de 1/3 (um terço), no mínimo, dos membros que compõem qualquer das Casas do Congresso Nacional. A realização do plebiscito é organizada pela Justiça Eleitoral. Participam do plebiscito todos os eleitores do Estado-Membro, e não apenas os que residem na área que será destacada. Se envolver dois Estados-Membros, como na incorporação, o eleitorado de ambos os Estados devem participar. Sendo rejeitada a proposta, o projeto de Lei Complementar para formação do Estado não poderá ser apresentado. Se o resultado, no entanto, for favorável, o projeto da lei complementar será apresentado, mas não necessariamente aprovado, porquanto o Congresso Nacional expressa a vontade nacional e não apenas a do eleitorado regional.

b) Audiência das Assembleias Legislativas dos Estados-Membros envolvidos. Esta audiência é junto à Casa perante a qual tenha sido apresentado o projeto de lei complementar. É claro que as manifestações das Assembleias Legislativas não vinculam o Congresso Nacional a votar a favor ou contra a formação do Estado.

c) Aprovação pelo Congresso Nacional do projeto de lei complementar que prevê a formação do Estado-Membro.

FORMAÇÃO DE MUNICÍPIOS

Sobre a formação dos municípios, dispõe o § 4º do art. 18 da CF: “A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei”.

Do exposto denota-se que são quatro os mecanismos de formação dos Municípios: criação, incorporação, fusão e desmembramento. Não há, contudo, a previsão para a subdivisão de municípios.

Na incorporação, aqui empregado no seu significado genuíno, um Município absorve o outro. O Município incorporador continua existindo, com ampliação de sua área, enquanto o Município incorporado desaparece.

Na fusão, dois ou mais Municípios se integram para formar um terceiro município. Quanto aos municípios fundidos, são extintos.

No desmembramento, uma parte da área territorial do Município é separada para formar outro Município. O Município desmembrado, no entanto, continua existindo, mas numa extensão menor.

O grande enigma do citado § 4º do art. 18 é a expressa menção à criação de Municípios como sendo fenômeno distinto da incorporação, fusão e desmembramento. Como na Constituição não há palavras inúteis, a doutrina embrenhou-se para encontrar o real significado desse termo. Por consequência, a criação de Municípios recai sobre uma área que, até então, não pertencia a nenhum outro Município (exemplo: terras arrastadas pela aluvião formam uma ilha que, depois, torna-se Município) ou então refere-se à emancipação de um Distrito Municipal, isto é, a sua transformação em Município. E, diante disso, o termo desmembramento tem o seu significado alterado e passa a abranger a área municipal que é destacada para anexar-se a outro Município já existente.

Por outro lado, a formação dos Municípios, através de um desses quatro mecanismos, exige os seguintes requisitos.

a) Plebiscito convocado pela Assembleia Legislativa do respectivo Estado-Membro. Nas consultas plebiscitárias participam os eleitores dos Municípios envolvidos. É organizado pela Justiça Eleitoral. A votação desfavorável gera o encerramento do procedimento de formação do Município. Se for favorável, prossegue-se. O assunto é regulado pela Lei 9.709/1988.

b) Apresentação, nos termos da lei, dos Estudos de Viabilidade Municipal. Entretanto, até o presente momento, esta lei ainda não existe.

c) Fixação, através de lei complementar da União, do período em que é possível a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios. Este requisito, à semelhança do anterior, foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 15/1996, mas também não houve a edição dessa lei complementar.

d) Aprovação da Assembleia Legislativa do projeto de lei estadual apresentado para a formação do Município.

O § 4º do art. 18 da CF, com a redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 15/1996, tornou-se norma constitucional de eficácia limitada, carece de dupla regulamentação. Primeiro, é necessária uma lei ordinária disciplinando os Estudos de Viabilidade Municipal. Segundo, é preciso que lei complementar estabeleça o período em que é possível a formação dos Municípios. Diante da omissão, diversos Estados-Membros, através de leis estaduais, formaram novos Municípios. Evidentemente que essas leis estaduais foram declaradas inconstitucionais pelo STF, em ADI movida pelo Procurador Geral da República. O STF, contudo, modulou os efeitos da decisão e não invalidou as leis de imediato, fixou um prazo (efeito “pro futuro”) de validade de 24 (vinte e quatro) meses para esses Municípios, evitando o desastre jurídico que o efeito retroativo (“ex tunc”) poderia causar.

No julgamento de uma ADI por omissão, o STF ainda fixou o prazo de 18 (dezoito) meses para que o Congresso Nacional editasse as leis regulamentadoras. Mas, até a data de hoje, o § 4º do art. 18 da CF ainda foi regulamentado, a desídia legislativa persiste. O que o Congresso Nacional fez foi aprovar uma única Emenda Constitucional para convalidar os Municípios que foram criados até 31 de dezembro de 2006, mas o problema continua para os Municípios que porventura tenham sido criados, após essa data, por leis estaduais flagrantemente inconstitucionais.


Referências bibliográficas

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

BAHIA, Flávia. Direito Constitucional. Recife: Armador, 2017.

DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. 3ªed. São Paulo. Forense, 2016.

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Salvador. Juspodium, 2017.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 19ªed. São Paulo. Saraiva, 2015.

MENDES, Gilmar F.; BRANCO, Paulo G. G., Curso de direito constitucional, 5. ed. São Paulo. Saraiva, 2012.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 16ªed. São Paulo. Forense, 2017.

TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2008.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GALINDO, Guilherme Marques. Organização do Estado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6674, 9 out. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/93858. Acesso em: 21 nov. 2024.

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