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O direito adquirido e o ato jurídico perfeito sob os planos da existência, validade e eficácia

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01/02/2001 às 00:00

Resumo:


  • O direito adquirido e o ato jurídico perfeito são garantias constitucionais que protegem as relações jurídicas estabelecidas sob a vigência de uma norma, mesmo que esta seja posteriormente alterada ou revogada.

  • O artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal brasileira assegura que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, impondo limites à retroatividade das normas e resguardando a segurança jurídica dos cidadãos.

  • Enquanto o direito adquirido refere-se a um direito subjetivo definitivamente incorporado ao patrimônio jurídico do titular, o ato jurídico perfeito diz respeito ao ato lícito que se tornou apto a produzir efeitos pela verificação de todos os requisitos necessários segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O tema em pauta repercute sobre um rico e complexo campo do Direito, palco de elaboradas construções doutrinárias, jurisprudênciais e até filosóficas. Enveredamos num terreno polêmico, predicado assíduo nas temáticas férteis do Direito.

A base da discussão sobre o direito adquirido e o ato jurídico perfeito situa-se sobre a temática da estabilidade dos direitos subjetivos e consequentemente a garantia constitucional da segurança dessas relações, que corresponde a um valor de ordem, de paz e de respeito inatos à consciência e desejo dos cidadãos. Vê-se, pois, que o tema transcende o direito positivo, fincando raízes no direito natural. Pois, se é verdade que o direito é dinâmico e muitas vezes deve mudar, não é menos verdade que as relações constituídas sob o império de uma norma devem perdurar ainda que tal norma seja substituída.

O artigo 5º, inciso. XXXVI, da Constituição da República alberga a garantia de segurança na estabilidade das relações jurídicas, essas continuarão a produzir os mesmos efeitos jurídicos tal qual produziam antes de se mudar a lei que regulava a relação jurídica que tais direitos subjetivos se formaram, desde que tenham se constituído em direito adquirido, ato jurídico perfeito ou em coisa julgada. Pois esses institutos jurídicos têm por escopo salvaguardar a permanente eficácia dos direitos subjetivos e das relações jurídicas construídas validamente sob a égide de uma lei, frente futuras alterações legislativas ou contratuais. Eis o sentido de segurança que proporcionam aos cidadãos. Constituem direitos constitucionais de primeira geração, os quais impõem limites na ingestão do Estado na vida dos cidadãos, insculpindo círculos intocáveis na vida das pessoas livres e imunes da ingerência estatal. Examinaremos apenas as linhas gerais dos dois primeiros institutos: o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, na perspectiva do direito material, sobre os planos da existência, validade e eficácia.

No decorrer dessa resenha traremos à lume os conceitos técnicos jurídicos dos institutos e a distinção entre o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Trata-se de conceitos técnicos, os quais devem ser bem compreendidos pelo operador do direito em face da relevância em que apresentam ao sistema jurídico.

Quando o constituinte erigiu o direito adquirido, o ato jurídico perfeito como disposições assecuratórias em defesa dos direitos subjetivos, limitou o poder do legislador, circunscrevendo os limites da legiferância, pressupôs, como ensina, Celso Bastos, que tais expressões já trouxessem, de per si, um teor de significação, impassível de restrição por parte do legislador ordinário, sob pena de se desconstituir a garantia insculpida pelo constituinte. Tal norma é dirigida primariamente ao legislador ordinário, consequentemente esse deve se ater ao significado dos institutos, segundo a ratio constitutionis e não conforme o próprio legislador os entenda. A tônica original desses institutos fora insculpida na Lei de Introdução do Código Civil (LICC) que traz as linhas gerais desses institutos e na construção interpretativa que a doutrina e jurisprudência embasaram sobre os institutos, a qual deve ser preservada pelo legislador ordinário em prol da própria Carta Magna.

A distinção preliminar básica que devemos perfazer entre direito adquirido e ato jurídico perfeito consiste na própria idéia semântica de um e de outro. O primeiro nada mais é do que uma espécie de direito subjetivo definitivamente incorporado ao patrimônio jurídico do titular, mas ainda não consumado, sendo, pois, exigível na via jurisdicional se não cumprido pelo obrigado voluntariamente. O titular do direito adquirido está protegido de futuras mudanças legislativas que regulem o ato pelo qual fez surgir seu direito, precisamente porque tal direito já se encontra incorporado ao patrimônio jurídico do titular – plano/mundo do dever-ser ou das normas jurídicas – só não fora exercitado, gozado – plano/mundo do ser, ontológico. O titular do direito adquirido extrairá os efeitos jurídicos elencados pela norma que lhe conferiu o direito mesmo que surja nova lei contrária a primeira. Continuará a gozar dos efeitos jurídicos da primeira norma mesmo depois da revogação da norma. Eis o singelo entendimento do direito adquirido.

Já o ato jurídico perfeito é o título ou fundamento que faz surgir o direito subjetivo, é todo ato lícito que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos (art. 81 do CC). Na lição de Limongi França, ato jurídico perfeito é aquele que sob o regime de determinada lei tornou-se apto para produzir os seus efeitos pela verificação de todos os requisitos a isso indispensável. Assim, o ato jurídico perfeito deve ser analisado sob a ótica de forma.

Podemos dizer que o ato jurídico perfeito é um instituto irmão do direito adquirido, algumas vezes aquele surge antes desse, como no caso do testamento válido, lavrado e assinado, mas ainda vivo o testador, ou, um negócio jurídico sujeito a condição suspensiva. Nesses exemplos há ato jurídico perfeito, pois tais atos foram constituídos validamente sob a égide de uma lei válida, porém em ambos inexiste direito adquirido, vez que, respectivamente, o testador ainda vive, e, a condição suspensiva ainda não ocorreu, art. 118 do C.C. Logo não houve a completude do fato concreto gerador do direito subjetivo. Nesse trabalho devemos enfocar o direito adquirido sob a ótica de fundo, já o ato jurídico perfeito sob a ótica de forma.

José Afonso da Silva ainda distingue os institutos ao dizer que o direito adquirido emana direitamente da lei em favor de um titular, enquanto que o ato jurídico perfeito é negócio fundado na lei. Ou seja, o direito adquirido é uma espécie de direito subjetivo, ao passo que o ato jurídico perfeito é um negócio jurídico ou o ato jurídico stricto sensu segundo a visão civilista. Para nós tanto direta e imediatamente da lei como dos atos jurídicos – os contratos, as declarações unilaterais de vontade – e portanto indireta e mediatamente da lei, podem dar ensejo ao direito adquirido.

Atente-se para o fato que só surgirá direito adquirido quando houver a completude dos seus requisitos e fatores de eficácia, elencados pelo regime jurídico peculiar do direito positivo que rege o ato, incidindo por completo o direito objetivo fazendo assim nascer o direito subjetivo, a partir daí adquirido.

Passemos à análise do direito positivo que rege a matéria. É a Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) que traz as linhas gerais do direito adquirido e do ato jurídico perfeito. Consigne-se que a LICC não se limita a uma lei introdutória ao Código Civil, constitui sim "uma lei de introdução às leis, por conter princípios gerais sobre as normas, sejam elas de direito público ou privado. Trata-se de uma lei preliminar à totalidade do ordenamento jurídico nacional,...é uma lex legum, um conjunto de normas sobre normas, constituindo um direito sobre direito, um direito coordenador de direito. Não rege as relações de vida mas sim as normas "(1) .Observe-se que não foi ao acaso a regulamentação do direito adquirido e do ato jurídico perfeito nesse diploma legislativo, pois são institutos estruturais ao ordenamento jurídico, extensivos aos diversos ramos do direito, respeitando-se certas peculiaridades. Neste sentido prescreve o art. 6º da LICC: " A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada."

§ 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.

§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.

§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba mais recurso ."

Algumas informações necessárias precisam ser esclarecidas nessa terminologia legal. A doutrina apreciando a questão tem se posicionado conforme as felizes palavras de Teori A. Zavascki "O termo "consumado" [refere-se ao ato jurídico perfeito, art. 6º, § 1º, da LICC] deve ser entendido como se referindo aos elementos necessários, à existência do ato, e não às execução ou aos seus efeitos materiais. Ou seja: ato consumado é ato existente (em que se acham completos, "consumados" , todos os requisitos para a sua formação), ainda que pendentes (= ainda que não "consumados") os seus efeitos". Quanto à interpretação literal do disposto a respeito do direito adquirido, mister ainda alguns reparos. Neste diapasão prossegue o autor "A segunda parte do dispositivo [refere-se ao direito adquirido, art. 6º, § 2º, da LICC] trata dos direitos cujo exercício está condicionado. Não se confundem tais direitos com as chamadas expectativas de direito. Os direitos condicionados, ou expectativos, são direitos existentes, estando condicionado, ou expectante, apenas o seu exercício. Diferentemente é o que ocorre com as chamadas expectativas de direito, situações em que não há direito algum, já que pendentes ("em expectativa") de configuração os próprios requisitos básicos à sua existência"(2).

O art. 6º, da LICC vem complementar o seu art. 2º, e portanto devem ser compreendidos juntos. Por sua vez o art. 2º da LICC prescreve: "Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

§ 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

§ 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência".

Revogar implica fazer cessar a vigência da norma, retira-se a norma revogada do ordenamento jurídico, mas as relações jurídicas, e sua eficácia, construídas sob o amparo dessa norma revogada não são atingidas, subsistem e continuarão subsistindo, pois a revogação produz efeitos ex nunc – daí para o futuro. Numa comparação extravagante se Tício viveu, teve Caio como filho, e depois morreu. Não obstante tenha morrido continuará sendo o pai Tício, continuará sendo o pai de Caio e continuará nas memórias dos vivos. O mesmo aplica-se às normas, ainda que revogadas, permanecem eficazes nas situações jurídicas constituídas sob o seu império quando consubstanciadas em direito adquirido, ato jurídico perfeito e em coisa julgada. Esses devem refletir a eficácia e "as memórias" daquela norma.

Da própria lógica do sistema emerge e se funda o princípio da irretroatividade da lei, que é um princípio geral de direito, e não uma peculiaridade de um ramo do direito, apesar de certas especificidades em certos casos, especialmente no Direito Público e no Direito Penal. Decorre do pressuposto de que as leis são feitas para vigorar e incidir para o futuro. São portanto prospectivas, regem situações que descrevem em seu bojo somente a partir da sua vigência, pois somente a partir daí possuem força normativa ou imperatividade. Tal postura é consentânea com o princípio da segurança jurídica e do valor de ordem inerente ao direito. As leis só poderão surtir efeitos retroativos excepcionalmente, quando a própria lei assim o estabeleça, presumem (presunção relativa) irretroativas, restando ainda nessa exceção resguardados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Posto que o princípio da irretroatividade – ainda que relativo – é inerente à lógica do sistema normativo, e ainda que haja a retroatividade da lei, a qual deve ser expressa, deverá sempre respeitar os institutos em estudo, sob pena da eiva da inconstitucionalidade, debruçamo-nos aos referidos institutos.

Para a devida compreensão dos institutos do direito adquirido, ato jurídico perfeito faremos um exame dos mesmos sob três planos sucessivos de projeção: o da existência, o da validade e o da eficácia.

Antônio Junqueira de Azevedo, estribando-se nos ensinamentos de Francesco Carnelutti, em obra específica sobre o assunto analisa o negócio jurídico sob o ângulo positivo: a existência, a validade e a eficácia do negócio. Outrora estudado na seara das nulidades, sob a ótica negativa: a inexistência, a invalidade e a ineficácia. Inverte-se pois o enfoque de análise.

Na esteira dessa doutrina analisaremos os institutos sub examine.

Junqueira de Azevedo dissecando a análise do ato jurídico o decompôs e o classificou segundo as caracteres genéricos e as distinções específicas decorrentes de sua divisão interna, elencando-o em: elementos, requisitos e fatores. "Elemento é tudo aquilo de algo mais complexo se compõe (pense-se nos elementos simples, ou puros, da química), que, por outro lado, requisitos (de requiere, requerer, exigir) são condições, exigências, que se devem satisfazer para preencher certos fins, e, finalmente, que fatores é tudo que concorre para determinado resultado, sem propriamente dele fazer parte, temos que o negócio jurídico, examinado no plano da existência, precisa de elementos, para existir; no plano da validade, de requisitos, para ser válido; e, no plano da eficácia, de fatores de eficácia, para ser eficaz. Elementos, requisitos e fatores de eficácia são respectivamente os caracteres de que necessita o negócio jurídico para existir, valer e ser eficaz "(3) .

Deveras, o direito nasce dos fatos, já diziam os romanos ex facto ius oritur . Ou seja, "do direito objetivo não surgem diretamente os direitos subjetivos; é necessário uma força de propulsão ou causa, que se denomina fato jurídico"(4). Nesse sentido pontifica Limongi França que o fato jurídico, estribado no direito objetivo, dá azo a que se crie a relação jurídica, que submete certo objeto ao poder de determinado sujeito. A esse poder se denomina direito subjetivo. Assim o direito subjetivo só nasce a partir dos fatos do mundo real, pois somente a partir da concreção do suporte fático hipotético (mundo do ser) é que a norma jurídica incide, estando até então abstrata, em estado latente ou potencial imperando no mundo das normas (dever-ser), vindo à lume e integrando o patrimônio jurídico da pessoa, titular do direito, quando surgir inteiramente o fato contemplado pelo texto legal. Em terminologia apropriada há a subsunção do fato ao texto legal, incidindo pois a norma jurídica, a qual confere direito subjetivo ao titular do direito.

Nas palavras de Pontes de Miranda invocado por Eros Grau, "o fato deve ser suficiente". Isto é, o fato ou o suporte fático concreto diz respeito ao plano da existência, devendo ser exatamente o contemplado pelo texto legal, sob pena de não existir o direito, vez que doutro modo não surge a norma.

Destaque-se que o fato deve vir por inteiro, assim como contemplado pelo texto legal, com todas as suas partes. Se o fato for simples dispensa-se maiores explicações, pois existe ou não. Já se for complexo exige maior ponderação, é aquele que surge com o advento de múltiplos atos-partes que vão se cumprindo com intervalos de tempo. Só há que se falar em direito adquirido quando o fato/ato (mundo do ser) for integralmente realizado. Gabba, citado por Celso Bastos, admite, porém, o direito adquirido se não se realizar todo o ato, mas somente quando a parte faltante seja ato infalível, isto é, deva necessariamente realizar-se. Trata-se de um aspecto polêmico. Para nós a questão deve ser enfocada sob o ponto de vista de aquisição ou incorporação do direito pelo seu titular no momento em que for exigir esse direito, só tendo força jurígena essa exigência se tal direito estiver nesse momento incorporado ao patrimônio jurídico do titular. Temos que a lei nova produz efeito imediato sobre situações jurídicas em curso de formação.

Superado o plano da existência passemos à análise da projeção dos atos sobre o plano da validade.

Pontifica Junqueira de Azevedo que quando o direito "estabelece exigências para que o ato entre no mundo jurídico com formação inteiramente regular, está determinando requisitos de validade. A validade é, pois, a qualidade que o negócio/ato deve ter ao entrar no mundo jurídico, consistente em estar de acordo com as regras jurídicas ("ser regular"). Validade é, como o sufixo da palavra indica, qualidade de um negócio/ato existente. Válido é o adjetivo com que se qualifica o ato/negócio jurídico formado de acordo com as regras jurídicas.

Os requisitos, por sua vez, são aqueles caracteres que a lei ou a C.F. exigem (requerem) nos elementos do negócio/ato para que este seja válido. Há certo paralelismo entre o plano da existência e o plano da validade: o primeiro é um plano de substâncias, no sentido aristotélico do termo: o ato/negócio existe e os elementos são; o segundo, grosso modo, um plano de adjetivos: o ato/negócio é válido e os requisitos são as qualidades que os elementos devem ter. Há no primeiro plano: a existência, o ato/negócio existente e os elementos sendo. Há, no segundo: a validade, o ato/negócio válido e os requisitos como qualidades dos elementos"(5).

A validade deve ser analisada tanto da ótica de fundo, ou objetiva, - conformidade e compatibilidade do conteúdo do ato/negócio ou mesmo da lei com as normas superiores – como também sob a ótica de forma – a observância do trâmite legal e constitucional na elaboração do ato/negócio ou da lei e da competência do agente que deflagrou o ato.

Partindo da premissa que o sistema jurídico (e a própria idéia de "sistema" pressupõe isso) é um todo homogêneo e concatenado construído num sistema hierárquico de normas e de competências, fundado na coesão e unidade das normas, assim deve ser considerado e interpretado. Logo a estrutura normativa sempre requer a coesão dos atos/negócios às normas superiores para se manter a unidade do sistema, sob pena desses atos/negócios serem maculados pela invalidade e por conseqüência expurgados do sistema.

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Em prol dessa coesão e do princípio da segurança jurídica inexistem direito adquirido ou ato jurídico perfeito com base em atos/negócios inválidos. Se se tratar de ato anulável e portanto ratificável , somente a partir dessa ratificação- e daí o ato já não é mais considerado inválido – poderá tal ato dar ensejo ao direito adquirido ou ao ato jurídico perfeito.

De qualquer sorte, cabe ao operador do direito averiguar em cada caso concreto a validade do ato, servindo-se da hermenêutica que lhe é a luz nesse escuro e árduo caminho. Releva considerar que cada ato (civil, administrativo, tributário, previdenciário etc.) deve ser regido de acordo com o regime jurídico peculiar, mas interagindo com a totalidade do sistema, pois o direito não se interpreta em tiras mas sim no todo, especialmente com a Constituição da República, nossa norma fundamental, o pilar de validade de todo sistema. E as suas normas são os vetores do intérprete e das demais normas infraconstitucionais, cabendo a essas adaptarem-se aos comandos daquela e jamais essas estabelecerem o sentido daquelas, como que se as normas constitucionais tivessem sentido vago e incerto.

Genericamente os requisitos do ato jurídico são aqueles insertos no art. 82 do C.C. e os definidos pelo direito positivo como atinentes a cada ato jurídico individualizadamente considerado.

Para Eros Grau, o ato jurídico deve ser além de suficiente (o que implica sua conversão em ato jurídico lato sensu vez que produz efeitos jurídicos) eficiente. Vale dizer: no plano da validade questionamos a eficiência do suporte fático suficiente.

Finalmente o plano da eficácia, última projeção que deve ser feita pelo operador do direito ao ato jurídico. Por tratar de planos sucessivos, só nos interessa a eficácia própria ou típica do ato, conforme a terminologia de Junqueira de Azevedo, a qual propomos a denominação de eficácia pura – pois o ato é existente, válido (superou-se regularmente os planos anteriores) e eficaz – em contraposição à eficácia imprópria ou espúria, que advém de um ato nulo ou anulável, os quais eventualmente produzem eficácia (em tese não poderiam ter eficácia), apesar da contradição com o ordenamento jurídico.

Com efeito, a eficácia imprópria ou espúria deve ser eliminada do sistema, pois advém de atos inválidos. Ocorre que muitas vezes essa invalidade só é percebida com a manifestação judicial, pois certos atos como os administrativos e as decisões judiciais presumem-se legais (válidos) – presunção relativa. E quanto aos atos privados inválidos que produzem eficácia espúria, deve a parte ou terceiro prejudicado ou quando for o caso o Ministério Público recorrer ao Judiciário e provar a invalidade dos invocados atos.

Nesse sentido ensina Uadi Lammêgo Bulos, a eficácia da lei, da sentença ou do ato inconstitucional subsistem até a decretação de sua nulidade. Enquanto não proferida a decisão que declare o ato nulo, esse continuará eficaz, produzindo as mesmas conseqüências do ato perfeito. Não obstante a decretação de nulidade produzir efeitos ex tunc (retroativos), desamparando qualquer relação estabelecida sob a sua égide. Daí porque inexistem direito adquirido ou ato jurídico perfeito com base em atos ilegais ou inconstitucionais, apesar de produzirem eficácia enquanto não declarada a nulidade do ato que lhe deu fulcro.

Do ângulo oposto, há outros atos que são existentes e válidos mas não são eficazes. Podemos dizer que há direito adquirido ou ato juridicamente perfeito ? A questão é complexa e devemos abordá-la segundo a doutrina aqui traçada.

Em relação ao ato jurídico perfeito a questão apresenta-se mais simples e linear, pois esse instituto fora concebido pelo constituinte sob o aspecto formal. Ato jurídico perfeito é aquele ato que nascera e se formara sob a égide de uma determinada lei, contemplando todos os requisitos necessários exigidos pela norma então vigorante. O constituinte assegura assim aos contratantes/partes lato sensu imunização contra eventuais futuras exigências de forma referentes ao ato, para pôr a salvo o título ou fundamento que dá e deu supedâneo ao direito subjetivo dos contratantes/partes. Protege-se indiretamente o direito adquirido, ao passo que não se pode alegar a invalidade do ato jurídico se advier lei nova mais rigorosa alterando dispositivos referentes à forma do ato.

Conclui-se que quanto ao ato jurídico perfeito o constituinte ao insculpir essa garantia no art. 5º, inciso XXXVI, da C.F. alberga, diante da própria função do instituto, somente os planos da existência e da validade, não exigindo a eficácia jurídica do ato. É, pois, considerado perfeito o ato jurídico, ainda que sujeito a termo ou condição. Nesse sentido doutrina Eros Roberto Grau, Licitação e Contrato Administrativo, Ed. Malheiros, p.109 e 110 e José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 10ª edição, Ed. Malheiros, 1995.

Já a abordagem da questão sobre o direito adquirido é mais complexa e rica de peculiaridades. Para se averiguar se há ou não direito adquirido, devemos apreciar a questão sob a ótica da incorporação do invocado direito ao patrimônio jurídico do beneficiário (titular do suposto direito). Ressalte-se que essa incorporação deve ser completa e não apenas parcial. Entende-se incorporado o direito no patrimônio jurídico do beneficiado quando esse puder exercer a qualquer momento o referido direito que a norma lhe faculta independentemente de qualquer condição alheia à sua vontade. Eis a tônica que deve ser dada à interpretação do direito adquirido.

Assim, num singelo exemplo, ilustramos melhor o raciocínio: suponha que uma lei válida e em vigor confira certo direito, como o de se aposentar depois de 30 anos de trabalho para homens, trabalhado regularmente os 30 anos qualquer homem poderá se aposentar. O direito tornar-se-á adquirido somente quando o trabalhador completar o trigésimo ano de trabalho, pois somente assim haverá a incidência completa do suporte fático exigido pela norma, e, por conseqüência, a incorporação do direito ao patrimônio jurídico do trabalhador, independentemente de se pleitear a aposentadoria. Tanto que com o advento de uma nova lei, que revogue a anterior, aumentando o prazo para 35 anos de trabalho para se obter a aposentadoria, todos aqueles que já tinham completado 30 anos de trabalho na vigência da primeira lei e ainda não se aposentaram, poderão se aposentar normalmente, não obstante a nova lei requerer 35 anos de trabalho. Pois o direito já era adquirido. Entretanto aqueles que não completaram os 30 anos de trabalho na vigência da primeira lei não têm direito adquirido, mas mera expectativa de direito, portanto não poderão se aposentar com apenas 30 anos de trabalho.

Ocorre que algumas vezes o direito exige certos fatores de eficácia, que são aqueles definidos pelo direito positivo como atinentes a cada ato jurídico individualizadamente considerado, para operar efeitos jurídicos em relação a terceiros repercutindo inclusive sobre o direito adquirido.

A compreensão da questão deve ser aclarada através de certos exemplos:

I) "A" em face da sua idade avançada faz um testamento público às vésperas de uma mudança legislativa que operará efeitos em todo o direito civil inclusive na seara dos testamentos, como é o caso do Novo Código Civil em processo de aprovação no Congresso Nacional. Supomos que a futura lei traga as seguintes alterações: i) nas formalidades do testamento: exigindo seis testemunhas para a validade do ato, ao passo que a presente lei exige apenas cinco testemunhas, art. 1.632, inciso I, do C.C. (na realidade o Projeto do Novo Código Civil exige apenas duas testemunhas no testamento público, mas para efeitos didáticos usaremos o presente exemplo fictício); ii) na legítima dos herdeiros necessários, estendendo esse rol, incluindo o cônjuge sobrevivente, independente do regime de bens, alterando, pois, o atual art. 1721 do C.C, mas deixando intacto o art. 1572 do C.C. (que cuida do direito da saisine). No testamento lavrado segundo a sistemática do atual Código Civil, em conformidade com os arts. 1.626/1637 e 1664/1769 do C.C., "A", casado no regime da separação total de bens com "C", contempla "B", seu amigo até as últimas horas, com a totalidade de seus bens, nada dispondo para "C" sua legítima esposa. Após dez meses da elaboração do testamento de "A" o Novo Código Civil é finalmente aprovado, entrando em vigor imediatamente. Passado mais dois meses o testador vem a falecer. O falecimento do testador ocorre depois de um ano da elaboração do seu primeiro e único testamento, mas já em vigor há dois meses o Novo Código Civil. Indaga-se: 1º) O testamento é válido ?; 2º) Na ocasião da morte do testador somente "C", o cônjuge sobrevivente, encontra-se vivo dentro do novo rol dos herdeiros necessários (inexistindo ascendentes ou descendentes vivos do de cujus), preceituando o Novo Código Civil que o cônjuge sobrevivente tem direito à legítima. "B", único herdeiro testamentário, encontra-se vivo. Tera a viúva "C" direito à legítima segundo a nova lei, não se respeitando a última vontade do testador, pois contemplou "B" com a totalidade de seus bens ?

Justicia, a inteligência artificial do Jus Faça uma pergunta sobre este conteúdo:

Quanto ao 1º) item, a questão repercute sobre os diferentes planos de projeção do ato jurídico perfeito. Com efeito, trata-se de um ato jurídico perfeito, pois o testamento fora lavrado e assinado (plano da existência), segundo os requisitos vigentes na época de sua elaboração (plano da validade), só adquirindo eficácia com a morte do testador. De qualquer modo o ato jurídico perfeito para ser considerado como tal prescinde do plano da eficácia. E como ato jurídico perfeito, o testamento, está imune de futuras alterações legislativas relativas à sua forma. Conclui-se, portanto, que sob o ângulo de forma, o ato é perfeitamente válido, não havendo que se falar em nulidade do ato, sob o argumento de que o Novo Código Civil exige seis e não mais cinco testemunhas para se elaborar o ato.

Já em relação ao 2º) item a questão é mais complexa e deve ser analisada sob a ótica de fundo, a teor do disposto no art. 1.572 do C.C. (que fora resguardado inteiramente pelo Novo Código Civil) – que estabelece o direito da "saisine": "Aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários". Assim os bens não ficam em momento algum sem titularidade, até a morte do de cujus os bens permanecem ligados à sua pessoa, no instante de sua morte transmite-se os bens aos seus herdeiros legítimos e testamentários, mas tal transmissão segue o que dispõe a lei em vigor no momento do falecimento do de cujus, lei essa de ordem pública, não comportando derrogação. Observe que é o fato do mundo real, a morte do de cujus, que faz incidir o direito, o art. 1.572 do C.C. Logo deve ser regido pelo direito em vigor nesse momento, incide a máxima tempus regit actum.

Dessa forma, aplica-se a lei nova que alberga o cônjuge sobrevivente como herdeiro necessário, apesar do testador não contemplá-la em seu testamento. Por força do princípio da conservação e do art. 1.727 do C.C. o testamento só prevalecerá em relação à metade dos bens do de cujus – metade disponível – respeitando-se assim a legítima que pela nova lei contempla também a mulher do de cujus.

Resta inadmissível por parte de "B" (herdeiro testamentário) invocar direito adquirido, porque antes da morte do testador ele só possuía expectativa de direito, que é uma probabilidade de adquirir um direito, e como tal não encontra qualquer proteção no ordenamento jurídico. O fato gerador do direito de "B" foi a morte de "A" que o contemplou em testamento, porém o regime jurídico aplicável é a lei em vigor no momento da morte do testador que preserva, por sua vez, a legítima de "C", cônjuge do de cujus, portanto, herdeira necessária, segundo o disposto no Novo Código Civil.

Arremate-se que o ato jurídico perfeito diz respeito aos requisitos formais do título, o testamento, não dando azo a direito adquirido para "B". Simplesmente imuniza o ato contra eventuais futuras exigências de forma, protegendo a validade formal do título, mas não ensejando eficácia de suas disposições vez que essas estão em desconformidade com as normas jurídicas no momento de sua subsunção legal – momento da morte de "B". Ademais, o ato só se projeta legitimamente no plano da eficácia se anteriormente tenha se projetado nos planos de existência e da validade. Possuindo apenas parcial validade (metade dos bens vale), em prol do princípio da conservação do ato, só essa metade irá atingir o plano da eficácia, isto é, somente metade dos bens do de cujus transmitir-se-á para "B".

II) O próximo exemplo pertine somente ao plano da validade e da eficácia sem sucessão de leis, mas de situações. Vale frisá-lo em atenção aos fatores de eficácia exigidos pelo direito positivo como atinentes a cada ato jurídico individualizadamente considerado para assim operar efeitos jurídicos em relação a terceiros.

Imagine a seguinte situação: "A" tem uma edificação próxima de um belo lago, nas montanhas, propiciando uma fantástica vista da natureza, porém "B" tem um terreno nu logo a sua frente e se edificado irá desvirtuar a vista de "A". Por isso "A" procura "B" e elaboram um singelo contrato consistente numa obrigação de não fazer por parte de "B", de não construir acima de determinada altura em seu terreno, mediante uma contraprestação em pecúnia por parte de "A". Tanto "B" como "A" são solteiros. Ambos assinam e cumprem o contrato, nada mais se operando. Um ano mais tarde, "B" vende seu terreno para "C", através de uma venda pura e simples sem nada mencionar a respeito do contrato que fizera com "A". "C" registra a escritura pública de compra do imóvel e, em seguida, começa a construir um elegante chalé no terreno. "B" inconformado tenta embargar (a rigor trata-se de ação de nunciação de obra nova, art. 934, inciso I, do C.P.C.) a obra, indaga-se: "B" tem direito adquirido consistente em impedir a construção de "C" ? A resposta vai depender dos efeitos do contrato que "A" fizera com "B". Como sabido os contratos são pessoais, obrigam tão somente os contratantes que nele intervieram, consoante o princípio da relatividade dos efeitos do contrato. Em princípio terceiros não se submetem a relação contratual, a não ser que a lei o imponha ou a própria pessoa assim consinta. Portanto, se o contrato fora apenas entre os contraentes "A" e "B", para "C" tal contrato representa res inter alios, não opera, pois, efeitos jurídicos em relação a "C", ainda que esse compre o imóvel de "B", pois são relações jurídicas autônomas e distintas. Em síntese, se o contrato for pessoal, pois assim se presume sendo a regra, só vincula "A" e "B". Não havendo que se falar em direito adquirido de "A", pois esse direito só vincula "B" e mais ninguém. Só se admite efeitos erga omnes se tratado fosse como direito real, exigindo o registro do referido contrato no Registro de Imóveis competente, havendo assim a prévia publicidade do ato, a qual vincula a todos. E tal contrato encontra-se regulado em lei, – trata-se de servidão predial, arts. 695 e 697 do C.C. - pois se não fosse resguardado em lei não seria direito real, vez que em sede de direitos reais vige o princípio da tipicidade. Acrescente-se que a servidão predial de não construir acima de determinada altura, servidão altius non tollendi, é tida como contínua e não aparente, consiste numa oneração real ao imóvel, e, como tal se exige escritura pública, a teor do disposto no art. 134, II, do C. C. e outorga uxória se o proprietário do prédio serviente for casado.

E se "B" consulta um advogado e esse recomenda que se registre o contrato feito entre "A" e "B", o qual tem firma reconhecida com data anterior a venda do imóvel de "B" para "C" para assim embargar a construção do chalé de "C", isso é possível ? Evidente que não. Primeiramente o título não seria aceito pelo Oficial de Registros Públicos, vez que não fora lavrado por escritura pública (art. 134, II, do C. C.). E ainda que fosse, estaria se usurpando os princípios da continuidade e da prioridade do registro imobiliário inerentes ao sistema registrário brasileiro, positivado respectivamente nos arts. 195 e 182/186 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73), além do próprio princípio da segurança jurídica, pois o registro público confere publicidade e presunção de que todos têm conhecimento do direito real evidentemente só a partir do registro. Ademais, conforme estipula o art. 676 do C.C., a eficácia dos registros em nosso sistema é, via de regra, constitutiva (só produz efeitos ex nunc, isto é, a partir do registro independentemente da data expressa no título) para os atos de oneração e transmissão de direitos reais inter vivos. A eficácia declaratória dos registros restringe-se às aquisições originárias (usucapião) e causa mortis devido nesse último caso a saisine. Só teria os efeitos almejados pelo advogado de "B" se "C" ainda não tivesse registrado a escritura pública de compra do imóvel, daí sim "B" poderia registrar o contrato, pois aqueles princípios atuariam seu favor nessa hipótese.

As mesmas regras aplicariam, mutatis mutandis se fosse "A" quem vendesse seu imóvel para um terceiro, sem registrar previamente o contrato que fizera com "B". Nesse caso inexistindo o registro, inexiste servidão predial, e o próprio "B" poderia edificar acima da altura antes convencionada com "A", pois fizera o contrato apenas com esse e não com terceiros.

Através do citado exemplo averigua-se a particularidade do sistema positivo em face dos fatores de eficácia de determinados atos jurídicos, que como apontamos alhures deve ter sua situação jurídica analisada à luz do direito positivo vigente e dos critérios individualizadores do ato, o que repercute inclusive sobre a questão do direito adquirido.

Várias outras situações jurídicas assemelham-se com o exemplo acima, como por exemplo a situação do locatário que no curso do contrato por prazo determinado e com cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada, é obrigado a se retirar do imóvel se esse for alienado a um terceiro, não obstante o contrato que fizera com o antigo proprietário. Só poderá opor a eficácia desse contrato ao novo proprietário se o contrato de locação contiver a aludida cláusula, estiver dentro do prazo em curso e previamente averbado no Registro de Imóvel competente, segundo o disposto no art. 167, I nº 3) da Lei de Registros Públicos. Sem o registro do contrato de locação com esses requisitos inexiste direito adquirido para o locatário oponível erga omnes. Destarte o registro representa um fator de eficácia perante terceiros, vez que através desse há uma ficção legal consistente na presunção de que todos têm conhecimento do contrato, e por conseqüência é oponível erga omnes.

Traçamos alguns conceitos e raciocínios sobre o direito adquirido em sede de teoria geral, especialmente aplicável ao direito privado, que deve ser estendido também ao Estado quando esse se nivela ao particular, ao atuar regido pelo direito privado nos chamados atos de gestão, despido da potestade estatal, pois age como um contratante comum em paridade de regime e interesse com o cidadão – age aqui na horizontal, pois atua no seu próprio interesse e não em nome do interesse geral da coletividade – incide pois o instituto do direito adquirido conforme enfocamos acima, vez que tais atos se praticados regularmente, são vinculantes para a Administração e geram portanto direito adquirido.

Tomamos como pressuposto que quando o Estado atua através de suas ramificações privadas – sociedade de economia mista, empresas públicas e fundações (criadas segundo o Código Civil) – age como particular, art. 173, § 1º, inc. II, da C. F. Quando atua através de suas pessoas jurídicas de direito público age como ente soberano (relação vertical Estado versus indivíduo, dotado de potestade), submetido portanto ao regime publicístico, salvo se praticar atos essencialmente de direito privado como uma compra e venda. Nesse último caso, referente a exceção, e no primeiro caso surgem o direito adquirido tal qual abordamos acima, isto é, conforme o regime de direito privado sem maiores especificidades. Já a abordagem que desenhamos a respeito do ato jurídico perfeito, em virtude da sua natureza que diz respeito aos requisitos de forma do ato, observada as considerações acima, deve sempre ser respeitada pelo Estado independentemente da seara em que atuar. Posto isso, arriscaremos algumas linhas de abordagem sobre o tema do direito adquirido no campo do direito público.

Generaliza-se a afirmação que não há direito adquirido em face do direito público ou de lei de ordem pública. Tal afirmação, por ser deveras genérica, torna-se simplista e superficial demais, portanto preconceituosa e imprecisa para o operador do direito. A tônica a ser seguida pelo intérprete deve ser baseada no interesse público, tendo como premissa a inexistência de direito adquirido em face do interesse público, pois como é trivial em direito público vige o primado que o interesse privado cede ao interesse público, como base de um Estado Democrático de Direito, vez que superado está o individualismo egocêntrico para dar lugar ao interesse de todos, conceito da própria a República (coisa de todos) e assim realizar o bem comum, objetivo último do Estado. Assim, grosso modo, podemos dizer que o direito adquirido não opera raízes quando inserto na área publica e contrário ao interesse público.

Antes de mais nada deve-se ter em foco o regime jurídico que rege o ato, se se tratar de um ato precário, como uma autorização, advinda de atos discricionários – os quais se pautam por critérios de conveniência e oportunidade do agente administrativo, baseados nos princípios constitucionais e no interesse público – inexiste qualquer direito de permanência daquela situação pelo particular, não tendo direito sequer à indenização se cassado o ato. Ex: autorização de porte de arma ou de caça. Já em relação aos atos vinculados, o agente administrativo atua vinculado aos critérios minuciados na lei, sem margem de liberdade na escolha dos atos, pois a lei o vincula se presentes tais critérios a praticar o ato e se ausentes a não pratica-lo. Nesses atos se o particular gozar regularmente de determinada vantagem chancelada pela Administração, essa só poderá cassá-lo se houver motivos legítimos, isto é, se provier mudança no interesse público, quer seja por alteração fática, social ou até mesmo política, desde que fundada no interesse público, pois o agente administrativo sempre atua em busca do interesse público e não pessoal – não se tolerando desvio de finalidade - mediante indenização ao particular, como forma de recompor seus prejuízos. Eis o que ocorre, grosso modo, em sede de supressão dos atos administrativos. Toda pretensão contra a Administração Pública transforma-se em indenização, vez que o particular sempre cede aos interesses da Administração, pois são, em tese, públicos (de todos), e, como tal, superiores ao do particular.

Os atos administrativos podem ser revogados ou anulados pela Administração Pública. Revoga-se por motivos de conveniência e oportunidade, produzindo efeitos ex nunc, preserva-se pois os efeitos do ato. Já a anulação surge quando o ato adveio com vício em sua validade, contrário às normas superiores ou aos princípios administrativos, produz efeitos ex tunc, portanto retroativos, exige a oitiva do administrado em prol do princípio do contraditório. Aplica-se a Súmula 473 do S.T. F. que sintetiza com propriedade o assunto: "A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada em todos os casos, a apreciação judicial". Conforme apontamos, ato ilegal jamais produz direito adquirido.

A questão do direito adquirido também na seara pública deve ser apreciada sob a forma de incorporação desse direito ao patrimônio do cidadão. A dificuldade é estabelecer quando é possível essa incorporação, pois na maioria das vezes, os bens e interesses públicos que dão supedâneo ao direito do particular são indisponíveis. Logo insuscetíveis de incorporação. Celso Bastos doutrina que só surgirá direito adquirido quando a própria lei preceituar tal incorporação, ou usar terminologia que conclua nesse sentido. O ilustre constitucionalista invoca também o critério teleológico de interpretação, com base no isolamento de tais fatos pela norma, contrapondo-se ao interesse de perdurabilidade do direito do particular e do próprio Estado ao legislar concedendo um direito ao cidadão se ele preencher determinados requisitos elencados na lei, denotando franco propósito de permanência e solidez daquele direito. Nesse sentido, traçado está as estruturas do direito adquirido e como tal deve ser tratado.

Permita-nos ilustramos o seguinte exemplo fictício, baseado no exemplo do mestre: Lei X, em tese constitucional, estabelece uma espécie de aposentadoria especial de valor razoável para militares com mais de 50 anos que lutaram por mais de quatro anos em determinada guerra que o Brasil participou. Incorporado tal direito ao patrimônio jurídico de alguns cidadãos e já fazendo gozo desses proventos, advém Lei Y, que revoga tal benefício. Logo quem ainda não completou os requisitos traçados na Lei X – 50 anos e participação de 4 anos em combate – não mais poderá requerer tal benefício, pois não incorporara tais requisitos ao seu patrimônio jurídico, não se completando o fato gerador in concreto elencado na norma – plano da existência – logo carecendo o suporte fático a norma (Lei X) não incide. Mas aqueles que já possuíam os requisitos da Lei X, tanto os que já gozavam os proventos como aqueles que ainda não tinham pleiteados administrativamente tal benefício, apesar de já poderem fazê-lo, têm a nosso ver e do mestre Celso Bastos direito adquirido. Poderão, pois, continuar gozando dos efeitos da lei X ainda que revogada e contrária aos previstos pela Lei Y que se encontra vigente. É exatamente essa a razão e a conseqüência do direito adquirido: "é o direito subjetivo de fazer valer um direito, cujo conteúdo encontra-se revogado pela lei nova"(6). Não faz sentido, pois, o legislador voltar atrás para revogar a aludida lei e varrer os efeitos da lei revogada, ainda que na seara do direito público. Ou melhor, revogar a lei é perfeitamente lícito, faz parte da potestade estatal, mas deverá preservar os direitos adquiridos até então incorporados pelo cidadão.

Celso Antônio Bandeira de Mello também analisa essa problemática do direito público, acrescentando científico e interessante critério, já adotado pela doutrina estrangeira. Diferencia a situação jurídica (que é o complexo de direitos e deveres da pessoa) do titular em geral ou impessoal, também denominada estatutária ou objetiva, da situação jurídica individual ou subjetiva. Em relação a primeira " o conteúdo é o mesmo para todos os indivíduos que delas são titulares, pois tal conteúdo é determinado por disposição geral, lei ou ato normativo,...a aplicação das situações gerais aos indivíduos depende da ocorrência de um fato ou de algum ato distintivo daquele que o gerou...Esse fato jurídico simplesmente investe alguém em uma situação jurídica geral...Esse evento é que incorporará ao sujeito a situação geral...pois o evento desencadeia o conjunto de direitos e deveres que perfazem a situação jurídica de alguém...e por meio dele não se cria direito novo...apenas implanta-se o necessário a fim de que um quadro normativo já existente passe a vigorar em relação ao sujeito ou sujeitos. Seu alcance material é precisamente este: inserir alguém no campo de incidência de um ato-geral. O ato condição não cria situação subjetiva: tão só determina a incidência de uma situação geral e objetiva sobre alguém que destarte ingressa em regime comum aos demais indivíduos colhidos sobre essa situação geral. Por exemplo: o ato de aceitar cargo público acarreta a inserção do sujeito na situação geral de funcionário, situação que é a mesma para os funcionários em geral. (...)

as situações individuais ou subjetivas são aquelas, cujo conteúdo é indubitavelmente determinado e pode variar de um para outro titular. É o caso da situação de um credor de um devedor, de um locatário em que o conteúdo da situação é específico para cada qual, modela-se pelo ato individual (e não por via geral, como no caso anterior). O ato individual (ato subjetivo), ao mesmo tempo que cria situação jurídica, investe nela o indivíduo.(...) Essas situações surgem direta e imediatamente da vontades das partes, e, mediata e indiretamente da lei que confere respaldo aos contratos. As situações subjetivas são produzidas por atos cujo alcance material restringe ao produtor ou produtores deles...Seu modelo característico é o contrato. Cifram-se a regular relações específicas do ou dos intervenientes do ato. Por meio deles os sujeitos delineiam uma específica relação jurídica, desenhando-lhes a figura com empenho de suas vontades; (...)

Nota-se a profunda diferença entre as situações gerais e as situações individuais. Intuitivamente percebe-se a imediata alterabilidade das primeiras e a intangibilidade das segundas ".

As situações gerais, justamente por serem normativas, estendem-se a números indeterminado de sujeitos. E diante da sua natureza normativa são mutáveis ao ritmo das alterações das regras jurídicas que a regulam.

Nesse sentido conclui o administrativista com os seguintes exemplos: " Teria sentido alguém pretender opor à alteração das regras do imposto de renda, argüindo direito adquirido àquelas normas que vigiam à época em que se tornou contribuinte pela primeira vez ? " – referindo-se a mutabilidade das situações gerais, pois via de regra, as alterações das normas jurídicas que regulam essa situação colhem de imediato os sujeitos inclusos nas situações jurídicas gerais modificadas.

De outra banda, as situações individuais permanecem inalteráveis, justamente por serem únicas e inter-partes. Assim "se alguém contrata com outrem trespasse de bem móvel, convindo as partes das possibilidades legais que os riscos da coisa, antes da tradição, correm por conta do comprador, cria-se situação subjetiva imutável. Daí que o vendedor poderá invocar direito adquirido àquelas cláusulas, se lei posterior à avença dispuser que os riscos da coisa vendida e ainda não entregue devem ser suportadas pelo vendedor."(7) (Ato administrativo e Direitos dos Administrados, p. 106 a 111, RT, 1981, com nossa alteração grifada).

Diante dessas explanações, doutrina e jurisprudência são uníssonas em dizer que inexiste direito adquirido a determinado regime jurídico. É precisamente o que ocorre com as legítimas alterações no Estatuto dos Servidores Públicos (RTJ , v. 123 p. 681), no padrão monetário (RT, v.117, p. 376) ou nos índices oficiais de reajustes (RTJ v. 117, p. 376) -salvo se os novos índices forem nulos – não se perquerindo sobre direito adquirido à situação pretérita por parte dos administrados, pois se cuida das sobrescritas situações jurídicas gerais. A incidência da nova lei será imediata, alcançando situações jurídicas não aperfeiçoadas na vigência da lei anterior. Ou melhor, a lei nova incide a partir da sua vigência, não retroage portanto, embora seja imediatamente aplicável às referidas situações de trato sucessivo.

Acompanhamos o pensamento dos ilustres juristas, e acrescentamos o paradigma que para nós deve ser observado pelo legislador, a boa fé dos cidadãos, que é um compromisso de lealdade e ética inatos à concepção de Estado de Direito de fazer cumprir suas leis e de se ater a elas, pois ninguém está acima da lei nem mesmo o Estado. Tal sentimento deve ser sempre respeitado, pois é a razão de ser implícita do direito adquirido, que nada mais é que um instituto de segurança para o cidadão. É dessa crença social e desse valor de justiça de se respeitar determinadas situações jurídicas consolidadas que faz o instituto do direito adquirido transcender o direito positivo e atingir as portas do jusnaturalismo, o que lhe confere legitimidade para ser tratado como uma garantia constitucional fundamental pela Constituição da República de 1988.

Questão das mais intrincadas em sede de direito constitucional, consiste em saber se o art. 5º, XXXVI, da C.F., in verbis "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada" dirige-se somente ao legislador, ou condiciona também o Poder Constituinte Derivado, impedindo que emendas constitucionais afrontem o direito adquirido, ao passo que direitos e garantias individuais são cláusulas pétreas, insuscetíveis de alteração constitucional, art. 60, § 4º, IV, da C.F. A jurisprudência dos Tribunais Superiores (S.T.F. e S.T.J., Ciência Jurídica 31:77) inclina-se a dizer, através de uma interpretação histórica – pois assim era interpretada as Constituições anteriores -, que tal garantia é dirigida tão somente ao legislador ordinário, não alcançando o Poder Constituinte Derivado. O que não se admite seria uma emenda constitucional com o propósito de abolir essa garantia dirigida ao legislador ordinário. Ademais, a alteração da Constituição segue um rito bastante rígido, ao exigir dois turnos e de três quintos dos votos de cada Casa Legislativa, além de iniciativa reservada, art. 60 da C.F. O que por si já garante segurança aos cidadãos, pois tal alteração não está sujeita a maioria ocasionais no Poder Legislativo, e sim fruto de uma vontade expressiva e sólida dos representantes do povo. Já grande parte da doutrina assevera no sentido oposto, pois toda interpretação de garantias constitucionais deve ser a mais ampla possível, e, tanto o legislador como o Poder Constituinte Derivado devem obediência irrestrita ao texto constitucional, não podendo modificar dispositivos que asseguram o espírito e a tônica do Poder Constituinte Originário. Esse sim tem poder ilimitado e incontrastável, pois inaugura uma nova ordem jurídica, inclusive reporta-se ao assunto indiretamente no art. 17 no Ato da Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal. Procuramos convidar o leitor a refletir sobre o tema.

Por derradeiro, o art. 5º, XL, da C.F. afirma que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Admite-se, pois, a retroatividade da lei benéfica, chamada lex mitior. Perfilhamos o entendimento que esse dispositivo constitucional tem acepção ampla, acolhendo também comportamentos tidos como ilícitos por norma punitiva administrativa. Assim, se determinada lei pune, com uma sanção qualquer, quem derrubar ou abater madeira com diâmetro menor que 55 cm. e se lei posterior diminuir para 50 cm. o mínimo legal, tal lei deve retroagir para beneficiar aquele que cortou madeira com 50 cm ou mais de diâmetro. O mesmo aplica-se em relação a mudanças benéficas para o contribuinte ou responsável tributário, mas somente se se tratar de infrações a obrigações tributárias acessórias. Não se estende evidentemente às obrigações tributárias principais. Além disso, só retroage se o ato não fora totalmente executado – preserva-se situações ocorridas no passado e já exauridas – se a Fazenda Pública já executou o crédito e recebeu do contribuinte, com o advento posterior da lei mais benéfica tal situação não se reverte.

Interessante notar um paralelo entre o art. 3º do Código Penal, a retroatividade da lex mitior e a repercussão desses institutos frente a semelhante situação em direito administrativo. O art. 3º do Código Penal estabelece as chamadas leis temporárias ou excepcionais determinando que, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante a sua vigência. São leis ultra-ativas, aplicam-se aos fatos ocorridos sob o seu império, mesmo que ao tempo do julgamento tais leis encontram–se revogadas. Visam impedir que, tratando-se de leis previamente limitadas no tempo, possam ser frustadas as sua sanções por expedientes astuciosos no sentido do retardamento dos processos penais, conforme esclarece a Exposição de Motivos do Código Penal de 1940. Flávio Augusto Monteiro de Barros ensina que "a ultra-atividade das leis temporárias ou excepcionais não derroga o princípio constitucional da retroatividade da lex mitior. A regra da retroatividade da lei penal benéfica soluciona os conflitos das leis no tempo. É pois aplicável à hipótese de duas ou mais leis sucessivas no tempo versarem sobre o mesmo assunto. No caso das leis temporárias ou excepcionais, não há duas leis em conflito, de modo que o problema não está relacionado com o direito intertemporal mas com a tipicidade"(8). Ou seja, a lei geral, ainda que posterior, não revoga a especial, pois essas regulam situações excepcionais. Já se "houver sucessão temporal de leis excepcionais ou temporárias sobre o mesmo assunto, será inegável a retroatividade da lei penal benéfica, já que o problema passa a ser de direito intertemporal. Por exemplo, a lei X, que incrimina quem passar pela ponte durante a guerra, é derrogada pela lei Y, que impõe a atipicidade do fato de ter passado pela ponte durante a guerra. Em ambas as leis, o tempus delicti (guerra) funciona como elemento do tipo"(9). Razão pela qual ocorre a retroatividade da lex mitior, pois daí sim se cuida de leis que versam sobre a mesma matéria, inclusive no aspecto temporal .

Situação semelhante pode suceder no direito administrativo a respeito de normas temporárias ou excepcionais, imagine-se que uma lei ambiental imponha multa para aqueles que caçam certos animais em determinado período do ano. Cessada essa lei, as situações ocorridas sob a sua égide devem ser executadas. Mesmo que posteriormente libere-se a caça no ano seguinte, pois tais animais já não estão mais em ameaça de extinção (as leis cuidam de situações temporais diversas) . A lei posterior só retroagiria se mencionasse expressamente o perdão dos infratores. Foi precisamente o que ocorreu com leis econômicas que estabeleceram o congelamento dos preços por determinado período. Aqueles que a afrontaram, foram punidos ainda que no momento do julgamento tais leis não mais imperavam. Após revogadas, continuaram ultra-ativas, e tal entendimento foi sufragado pelas Cortes Superiores do País. Aplicou-se a lei vigente da data do fato, embora o julgamento tenha ocorrido posteriormente, já operando outra lei que não retroagira.

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Sobre o autor
Douglas Camarinha Gonzales

advogado em São Paulo (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONZALES, Douglas Camarinha. O direito adquirido e o ato jurídico perfeito sob os planos da existência, validade e eficácia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 49, 1 fev. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/94. Acesso em: 27 dez. 2024.

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