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Justiça Penal e direitos fundamentais

01/10/1999 às 00:00

Resumo:


  • Abordagem do tema pela vertente normativa internacional

  • Variedade de correntes de políticas criminais e penitenciárias

  • Descompasso entre as garantias constitucionais e a realidade brasileira

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A abordagem desse tema poderia ocorrer pela vertente normativa internacional, todavia, abordá-lo pelo flanco interno, à luz de nossa Carta Magna é o que pretendo a seguir.

Convivemos com várias correntes de políticas criminais e penitenciárias não só no Brasil, mas em todo planeta, as quais advogam posições de orientação legislativa inspiradas em seus diversos movimentos, quer preconizando o endurecimento do sistema penal, quer defendendo sua abolição, quer, medianamente, pretendendo a redução do campo de incidência penal.

Várias correntes que dividem nossos legisladores e inspiram os feitores da lei, às vezes equivocadamente, norteiam os caminhos da política criminal brasileira.

Quando confrontamos as garantias que estão gravadas em nossa Carta Magna, com a realidade brasileira é que observamos a ausência de uma coerência na política criminal brasileira.

O artigo 5º da Constituição Federal, em seu "caput", fixou a igualdade de todos perante a lei, uma utopia que se pretende, todavia que jamais se conseguirá, pois a desigualdade está presente em nossa sociedade que trata desigualmente os que procuram nossos tribunais.

Ainda no mesmo tópico, o legislador garante o direito à vida e de forma intrínseca à saúde, num gigantesco descompasso entre o pretendido e nossa realidade cruel e brutal que omite socorro até aquele que agoniza.

Quanto ao direito à segurança, tal representa, principalmente nos grandes centros a latente falácia constitucional, pela incompetência de nossos administradores, sem esquecer do sagrado direito à liberdade, violado pelo Estado, que muitas vezes confunde a regra da liberdade, com a exceção da prisão deliberada, injusta e inclusive ilegal.


Nosso sistema penal revela-se uma verdadeira armadilha que permanece à espreita para alcançar qualquer um de nós.

Tenho insistido que o legislador ordinário, que deveria observar os comandos constitucionais foi o primeiro a pisoteá-los, quando na elaboração da lei que pune os chamados crimes hediondos, estabeleceu como regra a prisão, afastando as possibilidades do arbitramento da fiança ou da liberdade provisória e com isso desrespeitando o princípio da presunção de inocência, um dos mais importantes princípios constitucionais atuais.

Foi também o constituinte que estabeleceu que os litigantes em processos judiciais e administrativos, além dos acusados em geral, tivessem direito ao contraditório, que garante ao acusado se contrapor a tudo o que contra si for produzido, vertendo provas outras para contraditar a que fora apresentada.

Tal garantia torna-se indispensável quando se verifica que o embate ocorre entre o Estado, que é gigantesco e de outro lado a criatura, isolada, às vezes desamparada, a exceção de seu defensor.

Trata-se de um salutar equilíbrio. Ocorre, todavia, que tal muitas vezes não se verifica exclusivamente porque se privilegia o Estado e sua prova, invertendo-se o ônus que cabe à acusação, para desequilibrar o feito, tolhendo-se outra garantia que é da ampla defesa, aliás, defesa que jamais poderá ser meramente formal nem tampouco tímida.

São gravíssimos os defeitos perpetrados pela inobservância desses princípios, que geram nulidades, perda de tempo, de dinheiro e de credibilidade na Justiça, portanto perde a sociedade como um todo.


E por fim, quando se constatar que um cidadão fora prejudicado pelo Estado, até com a supressão de sua liberdade, há de se indenizar, pois assim está previsto na Carta Magna, que estabeleceu o comando para se indenizar o erro, realidade presente, diariamente, em nossos tribunais, mas há de se indenizar também além dos presos condenados, os presos que não foram condenados, os processados indevidamente, os denunciados sem justa causa e os indiciados injustamente.

Por fim, à luz da realidade, aflora a angústia de um advogado criminalista que registra o descompasso abissal entre o que pretendia o legislador máximo de 88 e nossa realidade cruenta.

Todavia há esperança. Tal que se renova a cada nova turma de bacharéis que contaminados pela legalidade de inspiração constitucional, povoarão os tribunais e operarão nosso Direito sem esquecer que a garantia do sistema é a nossa garantia, pois ninguém poderá afirmar que jamais será acusado, mesmo injustamente e para enfrentar essa realidade, esse infortúnio, precisamos estar preparados, com um sistema que nos dê a chance de provar nossa inocência, vale dizer, "de passar pelo lamaçal, sem sujar as barras das calças!"

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Sobre o autor
Luiz Flávio Borges D'Urso

Advogado Criminalista, Mestre e Doutor em Direito Penal pela USP, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção de São Paulo por três gestões (2004/2012), Presidente de Honra da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM) e Presidente da Academia Brasileira de Direito Criminal (ABDCRIM).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

D'URSO, Luiz Flávio Borges. Justiça Penal e direitos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. -1370, 1 out. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/943. Acesso em: 22 dez. 2024.

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