Da evolução jurisprudencial acerca do prequestionamento ficto, sua positivação no Código de Processo Civil de 2015, e a subsequente insegurança jurídica provocada pelos Tribunais Superiores

Exibindo página 1 de 2
04/11/2021 às 11:55

Resumo:


  • O artigo científico aborda a evolução do entendimento jurídico sobre o prequestionamento ficto, desde sua concepção em 1946 até a atualidade, destacando as mudanças nos tribunais superiores.

  • São apresentadas as diferentes interpretações sobre o prequestionamento ficto, incluindo o posicionamento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, assim como as críticas da doutrina jurídica.

  • O texto destaca a insegurança jurídica atual em relação à admissibilidade dos recursos extraordinários, evidenciando a divergência de entendimentos entre os tribunais superiores e a incerteza sobre os critérios de prequestionamento a serem adotados.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O presente artigo científico tem como escopo demonstrar a progressão da compreensão jurídica dada ao instituto nominado de prequestionamento ficto, alvo de mutações no tocante ao entendimento dos tribunais superiores quanto à sua admissibilidade.

Resumo: O presente artigo científico tem como escopo demonstrar, através da dissecação das primordiais fontes do direito – legislação constitucional e infraconstitucional, doutrina e jurisprudência –, a progressão da compreensão jurídica dada ao instituto nominado de prequestionamento ficto, partindo do momento de sua concepção, nos meados de 1946, até a presente ocasião, em que, mesmo após a sua positivação no ordenamento jurídico pátrio, continua sendo alvo de mutações no tocante ao entendimento dos tribunais superiores quanto à sua admissibilidade. O que, na visão deste autor, externa grande potencialidade lesiva aos jurisdicionados.

Palavras-chave: Direito Processual Civil; Recursos Extraordinários; Prequestionamento Ficto; Admissibilidade Recursal;

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo científico versará a respeito do tema admissibilidade recursal, dando ênfase, mais especificamente, ao requisito constitucional da “causa julgada”, popularmente conhecida no mundo jurídico como prequestionamento, em sua modalidade ficta, à luz dos entendimentos jurisdicionais concebidos desde a sua criação até a contemporaneidade.

A escolha do tema se deu em virtude da relevância que o tema exterioriza até ao momento, e do prejuízo à comunidade jurídica que significa a mantença do posicionamento do Tribunal da Cidadania em oposição à vigente letra de lei, bem como a possível transformação do entendimento hoje adotado pela Corte Constitucional.

Neste contexto, será demonstrado, de modo evidente, a evolução jurisprudencial ocorrida desde a concepção do pressuposto recursal, seus impactos no mundo jurídico, as considerações doutrinárias e repercussões legislativas levantadas ao seu respeito, assim como, ao fim, a ameaça que um novo direcionamento cognitivo pode provocar a direitos fundamentais dos jurisdicionados.

O trabalho científico foi estruturado de modo conciso, de modo a, rapidamente e sem maiores delongas, esclarecer o ponto nodal.

O presente estudo parte, principalmente, da revisão doutrinária e jurisdicional, se valendo de consultas à normativa constitucional e processual civil, tal como às mais conhecidas e avaliadas doutrinas e aos mais relevantes julgados no cenário nacional.

2. DESENVOLVIMENTO

Conforme é de se esperar, com o advento de um novo compêndio normativo, como foi o Código de Processo Civil de 2015, novos institutos surgem à tona, impondo modificações ao modo como situações antes eram dilucidadas e, via de consequência, à maneira como antes se entendia aquele determinado direito.

Ocorre que, como é da natureza humana, muitas vezes aceitar o novo é penoso, uma vez que é mais confortável e cômodo manter-se adepto àquilo ao que se era acostumado, e ao modo como as coisas já vinham sendo realizadas.

Não diferente vem sendo o constado no tocante ao instituto do prequestionamento ficto, tema cuja discussão remonta a tempos anteriores à vigente Carta Magna, nos quais, diga-se de passagem, se remete a origem da terminologia, como assinala Cássio Scarpinella Bueno[1], visto que a atual letra constitucional refere-se ao mencionado pressuposto de admissibilidade como “causas decididas”, ao passo que as anteriores, 1891 e 1946, tratavam do cabimento do apelo extremo, “dentre outras hipóteses, quando questionasse sobre a validade de lei federal em face da Constituição”.

Já naquele período, na vigência da Constituição Federal de 1946, compreendia-se que, malgrado fosse imperioso para o conhecimento do recurso extraordinário – não havia, à época, previsão do recurso especial, violação à lei constitucional e infraconstitucional federal eram de competência do Supremo Tribunal Federal – o prequestionamento da matéria a ser revisada, não havendo esta sido abordada pelo tribunal de origem após a oposição de embargos declaratórios, deduzia-se como sanado o vício, caso reconhecida a omissão pelo órgão julgador.

Entendimento este que, à mesma época, veio a dar origem ao verbete de súmula n. 356 do Pretório Excelso. Observemos:

O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.[2]

Tal posicionamento foi, e ainda é, aclamado por boa parte da doutrina, visto que compreendido como a conduta mais adequada a garantir a devida prestação jurisdicional, satisfazendo, ademais, princípios como a efetividade, celeridade, eficiência e economia processual.

Ocorre que com o advento da Constituição Cidadã de 1988, que instituiu o Superior Tribunal de Justiça e, concomitantemente, o expediente do recurso especial, fixou-se que, como discursado por Cássio Scapinella Bueno, para que fosse possibilitado o exame de possível violação ao texto constitucional ou infraconstitucional federal pelos tribunais superiores, imprescindível far-se-ia conhecer da abordagem daquele tribunal censurado sobre a temática, razão pela qual, forçosa a figura do prequestionamento.

Verbo ad verbum:

 (...) para que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça desempenhem adequadamente a sua missão constitucional, de uniformizar a interpretação e aplicação do direito federal em todo o território brasileiro, é mister que eles julguem, em sede de recurso extraordinário e em sede de recurso especial, o que já foi decidido. É das decisões proferidas por outros órgãos jurisdicionais que decorrem, ou não, violações e contrariedades às normas federais e à jurisprudência de outros Tribunais. Sem prévia decisão, não há como estabelecer em que medida as normas federais, constitucionais ou legais, foram ou deixaram de ser violadas pelos demais componentes da estrutura judiciária nacional.[3]

A inovação trazida pelo legislador constitucional deu azo, assim, que uma nova interpretação sobre o instituto fosse formulada por aquele neonato tribunal, que, ao seu tempo, surpreendeu com uma compreensão em muito distanciada daquela presenteada pelo Supremo Tribunal Federal, firmando que, conquanto opostos aclaratórios contra o acórdão de tribunal local que não enfrentasse a discussão sobre o direito federal dito por infringido, persistindo a omissão, não seria cabível a interposição de recurso especial visando a reavaliação do julgamento, mas, tão somente, a anulação do acórdão decorrente de error in procedendo.

Compreensão posteriormente sedimentada, dando ensejo ao enunciado de sumula n. 211, STJ:

Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo.[4]

Como bem expõem Eduardo Arruda Alvim, Daniel Willian Granado e Eduardo Aranha Ferreira:

(...) se, a despeito da oposição de embargos declaratórios, a questão federal, a respeito da qual se pretenda recorrer ao STJ pela via do recurso especial, não foi tratada pelo acórdão recorrido, a orientação firmada pelo STJ é que não houve prequestionamento apto a ensejar a sua discussão pela via do apelo extremo. Claro que o recorrente poderá, todavia, pela via do recurso especial, por infringência ao art. 1.022, II, do CPC/2015, pleitear a anulação do julgado do tribunal local, para o fim de que outro seja proferido, sanando-se a omissão antes apontada. De acordo com o STJ, em tal hipótese, só caberá recurso especial por infringência ao art. 1.022, II, do CPC/2015. Este entendimento restou cristalizado na Súmula 211 do STJ que dispõe: “Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo”.[5]

A respeito da nova concepção dada ao instituto pela Corte Cidadã, embora reconhecido o seu fundamento, posto que, como afirmado parágrafos acima, é essencial para que se possa realizar uma reforma jurisdicional, conhecer do posicionamento a ser reformado, não veio o mesmo a ser bem aceito pela comunidade jurídica, havendo diversas críticas ao seu sentido prático e ao seu compromisso com a prestação jurisdicional, pela doutrina pátria.

Discordâncias, estas, que bem podem ser depreendidas do escólio de Elpídio Donizetti:

O STJ, na sistemática do CPC/1973, exige o prequestionamento expresso, conforme Súmula nº 211: “Inadmissível, recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo”. Assim, havendo omissão de uma questão que a parte pretende arguir em REsp, devem se interpor embargos declaratórios. Depois dos declaratórios, decidida a questão, viabilizado está o especial. Caso o tribunal não aprecie a questão nos declaratórios, há que se interpor um REsp, alegando ofensa ao art. 535 do CPC/1973 para compelir o tribunal a julgar a questão, ou seja, a apreciar, na sua inteireza, os declaratórios interpostos. Decidida a questão, caberá novo REsp com base no 105, III, da CF. É isso mesmo. Dois recursos especiais. Um para compelir o tribunal de origem a julgar a questão e outro, se for o caso, sobre o que restou decidido, incluindo a decisão proferida nos declaratórios. Essa prática, embora possa estar em conformidade com a literalidade do dispositivo constitucional e com o entendimento da referida Corte, atenta contra os princípios da efetividade, celeridade e eficiência. (Grifos acrescidos)[6]

Por fim, com o surgimento do Código de Processo Civil de 2015, acredita-se que visando pôr fim à testilha, optou, o legislador ordinário, por eleger o entendimento perfilhado antecedentemente pela Suprema Corte Federal, por meio de seu enunciado de súmula n. 356, a integrar o conjunto de artigos daquele códex, positivando, dessarte, a compreensão de que é válido e admitido pelo ordenamento jurídico brasileiro o instituto do prequestionamento ficto, uma vez que, como previsto pelo art. 1.025 do dito compêndio normativo, “Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.

Percepção também alcançada pelo Tribunal Constitucional, como afere-se do precedente firmado pelo Órgão Plenário, de relatoria do Ministro, à época presidente, Dias Toffoli:

Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito Processual Civil. Prequestionamento explícito. Requisitos. Embargos de declaração. Inovação recursal. Impossibilidade. Prequestionamento ficto. Art. 1.025, do CPC/15. Requisitos. 1. O Supremo Tribunal Federal sempre exigiu o prequestionamento explícito da matéria constitucional ventilada no recurso Por outro lado, não admite o chamado “prequestionamento implícito”. 2. Não há necessidade de a decisão recorrida mencionar expressamente o artigo da Constituição Federal para se estar caracterizado o prequestionamento explícito. Basta que o ato judicial tenha decidido a questão constitucional. 3. Mesmo com a interposição de embargos de declaração, é necessário que o Tribunal de origem efetivamente esteja obrigado a se manifestar sobre determinada questão constitucional. Não raro, há inovação recursal, como ocorreu no caso concreto. 4. O entendimento dominante no STF sempre foi no sentido de que o ponto omitido pelo acórdão recorrido, desde que opostos embargos de declaração e diante da recusa da instância de origem em se manifestar sobre ele, é passível de apreciação no recurso extraordinário, sem a necessidade de arguição de nulidade do acórdão. Ou seja, o STF sempre admitiu o prequestionamento ficto, suavizando, claramente, a austeridade literal do enunciado constante de sua Súmula nº 356/STF. 5. O art. 1.025, do CPC/2015, apenas agasalhou o entendimento dominante no STF, cristalizado na Súmula nº 356/STF, consagrando o prequestionamento ficto. 6. Agravo regimental não provido, com imposição de multa de 1% (um por cento) do valor atualizado da causa (art. 1.021, § 4º, do CPC). 7. Havendo prévia fixação de honorários advocatícios pelas instâncias de origem, seu valor monetário será majorado em 10% (dez por cento) em desfavor da parte recorrente, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, observados os limites dos §§ 2º e 3º do referido artigo e a eventual concessão de justiça gratuita.[7]

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Com o episódio, entenderam os doutrinadores pátrios como resolvido o percalço jurisprudencial até então vivido, dado que, positivado o direito, somente restaria à Corte Superior adotá-lo, ainda que outro fosse o seu parecer sobre a temática, como, por sinal, asseverou Fredie Didier Jr., ao proclamar a necessidade de cancelar-se a súmula nº 211 do STJ:

O CPC-2015 consagrou, porém, o antigo entendimento do STF, criando uma ficção legal de pré-questionamento: "art. 1.025. Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade".

A opção do CPC-2015 é coerente com um sistema que prestigia o julgamento do mérito - primazia da decisão de mérito (art. 40, art. 932, par. ún. e, especificamente em relação aos recursos extraordinários, o art. 1.029, §3°, CPC). O n. 211 da súmula do STJ deve ser cancelado.[8] (Grifos acrescidos)

Contudo, para a surpresa de todos, a Superior Corte de Justiça, contra todas as críticas doutrinárias e contra legem, manteve o seu já assentado posicionamento jurisprudencial, desconhecendo de todo e qualquer recurso especial que interposto sem que devidamente dilucidado o confronto normativo federal no acórdão impugnado, não importando se disposto ou não de recurso horizontal para o seu aperfeiçoamento.

Vejamos o teor de seus mais recentes precedentes:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. INDEVIDA NEGATIVA DE COBERTURA. CONDUTA ABUSIVA. PRECEDENTES. SÚMULA N. 83/STJ. DANO MORAL CONFIGURADO. SÚMULA N. 83/STJ. QUANTUM INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. DISPOSITIVOS TIDOS POR VIOLADOS. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. O entendimento firmado no âmbito desta Corte Superior é no sentido de que "o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de terapêutica indicada por profissional habilitado na busca da cura. Desse modo, entende-se ser abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento, medicamento ou procedimento imprescindível, prescrito para garantir a saúde ou a vida do beneficiário" (AgInt no REsp 1.453.763/ES, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 1º/6/2020, DJe 15/6/2020)

2. De fato, "é pacífica a jurisprudência da Segunda Seção no sentido de reconhecer a existência do dano moral nas hipóteses de recusa injustificada pela operadora de plano de saúde, em autorizar tratamento a que estivesse legal ou contratualmente obrigada, por configurar comportamento abusivo" (AgInt no REsp n. 1.841.742/SP, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 1º/6/2020, DJe 4/6/2020).

3. Não há como afastar a premissa alcançada pelo acórdão quanto à configuração da falha na prestação do serviço hospitalar e o consequente dever de reparação moral na hipótese, sem proceder ao revolvimento do conteúdo fático-probatório dos autos, o que é vedado no âmbito do recurso especial, nos termos da Súmula n. 7/STJ.

4. Segundo a orientação deste Tribunal, o quantum estabelecido pelas instâncias ordinárias pode ser revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso, de modo que a sua revisão também encontra óbice na Súmula n. 7/STJ

5. O prequestionamento é exigência inafastável contida na própria previsão constitucional, impondo-se como um dos principais pressupostos ao conhecimento do recurso especial. Dessa forma, há a necessidade de ser a causa decidida à luz da legislação federal indicada, com emissão de juízo de valor acerca dos respectivos dispositivos legais, interpretando-se sua aplicação ou não ao caso concreto.

5. 1. O prequestionamento ficto, previsto no art. 1.025 do CPC/2015, só é admissível quando, após a oposição de embargos de declaração na origem, o recorrente suscitar a violação ao art. 1.022 do mesmo diploma, porquanto somente dessa forma é que o órgão julgador poderá verificar a existência do vício e proceder à supressão de grau.

6. Agravo interno improvido.[9]

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. MULTA FIXADA NA HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL PROFERIDA NA DEMANDA PRETÉRITA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INEXISTÊNCIA DE INDICAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC (ART. 1.022 DO CPC/2015). PREQUESTIONAMENTO FICTO. IMPOSSIBILIDADE. INTERESSE DE AGIR. CONDIÇÃO DA AÇÃO. EXTINÇÃO DO FEITO. DECISÃO MANTIDA.

1. O conteúdo normativo dos arts. 333, I e II, do CPC/1973, 6º, IV, VI e VIII, e 14 da Lei n. 8.078/1990, 186, 422 e 927 do CC/2002 não foi apreciado pelo Tribunal a quo, apesar da oposição de embargos declaratórios. Caberia à parte alegar violação do art. 535 do Código de Processo Civil de 1973 (art. 1.022 do CPC2015). Dessa forma, à falta do indispensável prequestionamento, incide a Súmula n. 211 do Superior Tribunal de Justiça.

2. A admissão do prequestionamento ficto previsto no art. 1.025 do CPC/2015 exige que se aduza, no recurso especial, violação do art. 1.022 do Diploma Processual (art. 535 do CPC/1973), o que não ocorreu.

3. A Corte de origem manteve a extinção do feito, por ausência de interesse processual da parte autora para a propositura da demanda. Rever a conclusão do acórdão, quanto à impossibilidade de obter indenização pela falta de provocação da parte ao Juízo a quo, para dar efetividade à medida coercitiva, exigiria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é inviável em recurso especial, conforme a orientação da Súmula n. 7 do STJ.

4. A análise do recurso especial fundado na alínea "c" do permissivo constitucional exige a comprovação do dissídio, por meio da apresentação de julgados que evidenciem a similitude fática das situações às quais foram dadas soluções distintas, na aplicação do direito à espécie. Tal providência não foi adotada pelo recorrente, motivo por que a fundamentação do recurso encontra-se deficiente. Dessa forma, correta a aplicação da Súmula n. 284 do STF.

5. Agravo interno a que se nega provimento.[10]

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. DANOS MORAIS. MATÉRIA DE FATO. SÚMULA 7/STJ.

1. A ausência de prequestionamento dos dispositivos legais tidos por violados impede o conhecimento do recurso especial (Súmula 282/STF).

2. "A admissão de prequestionamento ficto (art. 1.025 do CPC/15), em recurso especial, exige que no mesmo recurso seja indicada violação ao art. 1.022 do CPC/15, para que se possibilite ao Órgão julgador verificar a existência do vício inquinado ao acórdão, que uma vez constatado, poderá dar ensejo à supressão de grau facultada pelo dispositivo de lei" (REsp 1639314/MG, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 4.4.2017, DJe 10.4.2017).

3. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula n. 7/STJ).

4. Agravo interno a que se nega provimento.[11]

Não bastasse o entendimento esposado pela Corte Cidadã, espanta-nos ainda mais constatar um direcionamento de parcela dos julgadores da Suprema Corte, integrantes da Primeira Turma, a perfilhar tal posicionamento vedado por lei, como pode-se extrair dos precedentes emanados pelos Ministros Dias Toffoli, Rosa Weber e Alexandre de Moraes.

AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DISSOCIAÇÃO DE FUNDAMENTOS. SÚMULA 284/STF. 1. O Juízo de origem não analisou a questão constitucional veiculada, não tendo sido esgotados todos os mecanismos ordinários de discussão, INEXISTINDO, portanto, o NECESSÁRIO PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO, que pressupõe o debate e a decisão prévios sobre o tema jurígeno constitucional versado no recurso. Incidência da Súmula 282 do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 2. A pura e simples oposição de embargos de declaração não basta para a configuração do prequestionamento. Tal somente se verificará caso o Tribunal recorrido tenha se omitido sobre ponto a respeito do qual estava obrigado a se manifestar. Inteligência do art. 1.025 do Código de Processo Civil. 3. A indicação, no recurso extraordinário, de norma completamente estranha ao que se decidiu no acórdão recorrido atrai o óbice da Súmula 284/STF, aplicável por analogia (É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia). 4. Agravo Interno a que se nega provimento.[12]

Agravo regimental no agravo de instrumento. Processual. Ausência de impugnação de todos fundamentos da decisão agravada. Óbice ao processamento do agravo. Precedentes. Súmula nº 287/STF. Prequestionamento. Ausência. Incidência da Súmula nº 282/STF. 1. Há necessidade de impugnação de todos os fundamentos da decisão agravada, sob pena de se inviabilizar o agravo. Súmula nº 287/STF. 2. Ante a ausência de efetiva apreciação de questão constitucional por parte do Tribunal de origem, incabível o apelo extremo. Inadmissível o prequestionamento implícito ou ficto. Precedentes. Súmula nº 282/STF. 3. Agravo regimental não provido.[13]

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO, DA AMPLA DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. OFENSA REFLEXA. REEXAME INCABÍVEL NO ÂMBITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. JULGAMENTO CONTRÁRIO AOS INTERESSES DA PARTE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL NÃO PREQUESTIONADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA STF 282. INAPTIDÃO DO PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO OU FICTO PARA ENSEJAR O CONHECIMENTO DO APELO EXTREMO. INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA STF 356. DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. INCIDÊNCIA. ATIVIDADE DE CORRETAGEM E INTERMEDIAÇÃO. OPERAÇÕES EM BOLSA DE MERCADORIAS E FUTURO. INTERPRETAÇÃO DA LISTA DE SERVIÇOS ANEXA À LEI COMPLEMENTAR 56/1987. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE PROVAS. SÚMULA STF 279. O exame do suposto malferimento dos postulados da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa dependeria de prévia análise da legislação processual que disciplina a matéria, configurando, mesmo que procedente, violação reflexa e oblíqua da Carta Constitucional, que não enseja o conhecimento do recurso extraordinário. O artigo 93, IX, da Constituição da República exige que o órgão jurisdicional explicite, ainda que sucintamente, as razões do seu convencimento, sendo prescindível o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes. A simples contrariedade da parte não configura negativa de prestação jurisdicional. O requisito do prequestionamento obsta o conhecimento de questões constitucionais inéditas. Esta Corte não tem procedido à exegese a contrario sensu da Súmula STF 356 e, por consequência, somente considera prequestionada a questão constitucional quando tenha sido enfrentada, de modo expresso, pelo Tribunal a quo. A mera oposição de embargos declaratórios não basta para tanto. Logo, as modalidades ditas implícita e ficta de prequestionamento não ensejam o conhecimento do apelo extremo. Aplicação da Súmula STF 282: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada”. O reconhecimento da acenada violação do princípio da legalidade pressuporia a revisão da exegese de normas infraconstitucionais acolhida pelo Tribunal regional, o que não é viável em sede de recurso extraordinário, nos termos da Súmula STF 636. Inviável, especificamente, a revisão da interpretação da lista de serviços anexa à LC 56/1987, e em especial dos seus itens 46 e 50, que dizem respeito à incidência do ISS sobre as atividades de agenciamento, corretagem ou intermediação de títulos e bens móveis, ressalvando aquelas praticadas pelas instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central. Descabimento do exame de fatos e provas no apelo extremo (Súmula 279/STF), o que seria imprescindível, conjuntamente com a exegese da legislação infraconstitucional, para divergir da conclusão a que chegou o acórdão de origem quanto à natureza dos serviços prestados pelas recorrentes e à sua descaracterização como instituições financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central. Agravo regimental conhecido e não provido.[14]

Destarte, o que se extrai do presente artigo cientifico é a cognição de como o requisito constitucional de admissibilidade recursal aos apelos extremos, prequestionamento, nasceu e veio sendo interpretado, em sua modalidade ficta, pelas soberanas cortes de justiça nacionais, partindo, num primeiro momento, de uma compreensão mais próxima    ao jurisdicionado e mais afeta aos princípios que regem o direito processual civil, e passando, a posteriori, a privilegiar uma obstaculização processual apartada inclusive da forma, uma vez que não atende nem mesmo a orientação legal prescrita ao tema.

Nesta perspectiva, paira, atualmente, sobre a matéria uma grande incerteza jurídica, visto que não há segurança, sequer no Supremo Tribunal Federal, sobre em que moldes os recursos extraordinários poderão vir a serem admitidos, visto que, embora autor da tese jurisdicional que embasou a materialização do dispositivo nº 1.025 do Código Adjetivo Civil de 2015, a Corte Constitucional já demonstrou indícios de que não mais advogará pelos princípios que jurou defender, corporificados pelos incisos XXXV e LIV do art. 5º da Carta Federativa de 1988 – a adequada prestação jurisdicional e o devido processo legal.

3. CONCLUSÃO

Após este trabalho de análise e compreensão da legislação vigente, da doutrina e do consolidado entendimento jurisprudencial pátrio, ascende-se a nítida visão da insegurança jurídica hoje propagada pelos tribunais superiores pátrios, visto que, malgrado positivado o entendimento normativo de que não apenas é cabível, como é admitido pelo ordenamento jurídico o instituto do prequestionamento ficto, insiste a Corte Cidadã em fechar seus olhos para tal diretriz, escolhendo manter um “filtro” injusto, custoso, contraproducente e lesivo ao jurisdicionado, tal como vem descortinando, parcela dos ministros integrantes do Pretório Excelso, o despautério com que vem alterando o entendimento consolidado pela súmula nº 356, STF, para adotar o raciocínio inescrupuloso sustentado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Victor Lacerda de Figueiredo

Advogado | Especialista em Direito Público, Civil e Processual Civil

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos