Capa da publicação Banca de concurso x revisão judicial: Tema nº 485 do STF
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O limite discricionário de entendimento na correção de questões de concurso público e o Tema nº 485 do STF

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22/03/2025 às 08:20

Resumo:


  • O Supremo Tribunal Federal, através do Tema 485, estabelece que o Poder Judiciário não deve intervir na avaliação de mérito das questões de concurso público, exceto em casos de ilegalidade ou inconstitucionalidade.

  • A separação de poderes permite que cada ramo do governo, incluindo autarquias e empresas públicas, organize seus próprios concursos, embora o processo esteja sujeito a manipulações e fraudes.

  • A contratação de uma banca examinadora para concursos públicos é um processo vinculado e necessário, mas a supervisão limitada do Judiciário abre espaço para possíveis irregularidades no processo de seleção.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A banca examinadora pode inovar o Direito e contrariar a Constituição sob o pretexto de discricionariedade? O Tema nº 485 do STF admite a revisão judicial quando há flagrante ilegalidade ou inconstitucionalidade.

1. INTRODUÇÃO

O modelo analítico adotado pelo constituinte de 1988 abarcou os mais variados temas, desde a base de fundamentação do Estado Democrático de Direito até a previsão de que o Colégio Pedro II deveria ser mantido na órbita federal (art. 242, § 2º). Além disso, previu a separação dos Poderes, assegurando independência e harmonia (art. 2º) e, assim, impedindo a invasão de um sobre outro em determinadas funções para as quais foram instituídos.

As competências inerentes aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são típicas e atípicas, sendo que as primeiras, via de regra, não permitem fiscalização, salvo nas hipóteses estritamente previstas na Constituição de 1988. O Executivo possui a função de administrar, enquanto o Judiciário julga os casos submetidos pelos jurisdicionados, e o Legislativo elabora leis. Dentro da função executiva, insere-se a organização de pessoal, cujo ingresso nos quadros de servidores públicos depende de aprovação prévia em concurso público de provas e/ou de provas e títulos (art. 37, I, da CRFB/88).

Para que seja instaurado um procedimento de concurso público, é necessária a existência de legislação prévia que estabeleça a disponibilidade de vagas e a existência de orçamento para a nomeação de pessoal na Administração Pública. Assim, o Chefe do Poder Executivo inicia um procedimento licitatório com a finalidade de contratar uma banca examinadora para dar andamento à fase de execução do concurso público.

Ocorre que a separação dos Poderes permite a eles, bem como às autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, a contratação de seus servidores e empregados públicos por meio de concurso público, realizando os atos necessários à concretização do procedimento de aferição do preparo para o exercício da função.

Não obstante, e tal como previsto, esse modelo permite as mais variadas fraudes, incluindo uma sequência de contratações diretas por meio de "arrumadinhos", comercialização de cargos e até mesmo apadrinhamentos, já que, como detentor da máquina pública, o Poder Executivo, na maioria das vezes, é exercido por políticos mal-intencionados e com dívidas de financiamento de campanha, além de amigos e parentes desempregados.

A contratação de uma banca examinadora para um concurso público é um ato vinculado e necessário. Uma vez realizado o procedimento licitatório e escolhida a empresa, esta passa a substituir a Administração em seu mister de selecionar os candidatos para o cargo.

O cerne da questão decorre do entendimento de repercussão geral (Tema 485) do Supremo Tribunal Federal, que expressamente impede o Pretório Excelso de invadir o mérito das questões elaboradas, o que, por outro lado, pode permitir manipulação dos resultados e fraudes. Nesse sentido, vejamos o entendimento adotado pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco:

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. QUESTÃO IMPUGNADA. CONTEÚDO ABORDADO. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO PELO JUDICIÁRIO. EXCEPCIONALIDADE NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO ÀS DISPOSIÇÕES DO EDITAL. DEVIDO PROCESSO LEGAL ADMINISTRATIVO OBSERVADO. RECURSO DESPROVIDO DECISÃO UNÂNIME. 1. Não é recente o entendimento jurisprudencial segundo o qual não compete ao Judiciário reavaliar o conteúdo de questões de concurso público, substituindo a atuação da banca examinadora.2. A interferência dos tribunais em matéria de concurso público só se legitima como medida restaurativa da legalidade do certame, afim de expurgar algum ato administrativo eivado de nulidade que contamine a validade do processo.3. O reexame das questões de concurso público pelo Judiciário implicaria inaceitável substituição à atuação administrativa, tolhendo-se o administrador da liberdade de exercício da função pública. Outro não foi o entendimento do Supremo exarado em sede de Repercussão Geral (Tema 485).4. Por outro lado, não é porque as questões de concurso albergam os critérios de avaliação da administração pública, segundo as competências e habilidades exigidas ao cargo, que seu conteúdo se mostra absolutamente infenso ao reexame jurisdicional.5. Existe uma hipótese em que a jurisprudência legitima a intervenção judicial, no escopo de tutela da legalidade do certame, quando haja suspeita de incompatibilidade entre o conteúdo dos quesitos e as disposições do edital.6. Na situação dos autos, não me parece haver a banca violado os termos do edital, de modo a justificar a intromissão do Judiciário. Isso porque a apelante não se insurge contra a suposta ausência de previsão do conteúdo abordado na questão no programa do edital. Pelo contrário, sua pretensão se dirige especificamente ao mérito do conteúdo abordado, impugnando o próprio entendimento adotado pela banca, rediscussão simplesmente inviável na instância jurisdicional.7. Apelo desprovido. Decisão unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Recurso de Apelação PJE nº 1813-37.2018, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Turma da Câmara Regional de Caruaru do Tribunal de Justiça de Pernambuco, pela sessão de julgamento realizada no dia ___/___/___, à unanimidade de votos, em conhecerem do recurso acima descrito, negando-lhe provimento, tudo na conformidade dos votos e do Relatório proferidos neste julgamento.P. e I. Caruaru, Des. Demócrito Ramos Reinaldo Filho

Dessa forma, o Judiciário pernambucano (1º e 2º Graus) adotou o entendimento exposto no Tema de Repercussão Geral 485 do STF, sem fundamentar a aplicação de sua exceção no caso concreto. No entanto, em determinadas situações, o entendimento da banca examinadora é manifestamente ilegal e inconstitucional, aplicando à espécie uma interpretação divergente do próprio mandamento da Colenda Corte Suprema, ferindo — ou mesmo desrespeitando — a Constituição Federal de 1988.

No presente caso, o debate foi estabelecido em torno da questão 08 da prova para o cargo de Procurador Municipal do Município de Santa Cruz do Capibaribe/PE, cujo entendimento adotado representa uma flagrante ilegalidade, somada à inconstitucionalidade e à ausência de qualquer respaldo jurídico que justifique tal posicionamento (seja por meio de doutrina, trabalhos científicos, jurisprudência, súmulas, legislação ou entendimentos consolidados).

A questão abordava a seguinte afirmação: "O estabelecimento de restrições, por lei, à entrada e locomoção de pessoas com seus bens no território nacional em tempo de paz seria uma medida incompatível com as normas constitucionais garantidoras de direitos e garantias fundamentais da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988." Nessa hipótese, o Judiciário deveria aplicar a exceção prevista no Tema 485.

Assim, ao acolher a regra adotada no Tema 485 do STF e não a sua exceção — cuja subsunção se aplica a diversos casos concretos —, os argumentos apresentados no respeitável acórdão ferem dispositivos da Constituição Federal e da legislação.


2. VIOLAÇÃO AO ART. 5º XV DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO JUÍZO DE DISCRICIONARIEDADE DA BANCA CONSUBSTANCIADO NO TEMA 485 DO STF

O entendimento adotado no acórdão foi o seguinte:

Com efeito, é imprescindível ressaltar que o STF, ao apreciar o Tema 485 da repercussão geral, fixou a tese de que "... não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade...".

Assim, o cerne da questão posta em debate decorre do fato de que, taxativamente, a Segunda Turma da Câmara Regional de Caruaru aplicou a regra geral, sem atentar para a exceção: salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade.

De acordo com o Ministro Sepúlveda Pertence, a inconstitucionalidade da questão poderia ser classificada como "enlouquecida e desvairada". Não há como negar que a banca exorbita os limites que impediriam a intervenção judicial, aplicando um entendimento sem qualquer base jurídica, doutrinária, legislativa ou jurisprudencial, nem sequer apoiado em teses acadêmicas, trabalhos científicos ou até mesmo em um manuscrito de aluno do primeiro período de faculdade de Direito. Tal conduta demonstra uma atuação descompromissada e irresponsável, típica de uma instituição que opera sem qualquer respeito pelo administrado, pelos municípios onde realiza concursos e pelos candidatos. Isso se evidencia na ausência de qualquer base sólida que justifique a banca aplicar o entendimento de que "o estabelecimento de restrições, por lei, à entrada e locomoção de pessoas com seus bens no território nacional em tempo de paz seria uma medida incompatível com as normas constitucionais garantidoras de direitos e garantias fundamentais da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988". (grifei)

Ora, percebe-se claramente que a resposta considerada correta é totalmente equivocada, uma vez que tal restrição é compatível, sim, com a Carta da República. O texto do art. 5º, inciso XV, da CRFB/88 estabelece o seguinte:

"É livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;" (grifei).

Trata-se, pois, de norma de eficácia contida, de acordo com a corrente doutrinária constitucionalista, podendo perfeitamente ser restringida pelo legislador ordinário. Segundo José Afonso da Silva, norma constitucional de eficácia contida é aquela em que "poderá haver restrição por parte do legislador infraconstitucional".

Segundo Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (Direito Administrativo Descomplicado. 23ª edição. Método, 2015, p. 58):

Em regra, as normas de eficácia contida exigem a atuação do legislador ordinário, fazendo expressa remissão a uma legislação futura. Entretanto, a atuação do legislador ordinário não será para tornar exercitável o direito nelas previsto (este já é exercitável desde a promulgação do texto constitucional), tampouco para ampliar o âmbito de sua eficácia (que já é plena, desde sua entrada em vigor), mas sim para restringir, para impor limitações ao exercício deste direito. (grifo no original).

É certo que a margem de liberalidade da banca examinadora para considerar um item como certo ou errado deve ser soberana no que diz respeito ao julgamento das assertivas. Contudo, essa liberdade deve necessariamente restringir-se à lei, à doutrina, aos princípios gerais do direito e à Constituição Federal, e não inovar o direito, criando algo que não existe. Não se trata de uma afirmação que deixe dúvidas ou que divida a doutrina ou a jurisprudência. Não há qualquer respaldo jurídico-normativo que fundamente a soberania da banca para afirmar que o estabelecimento de restrições à liberdade de locomoção e à entrada de pessoas com seus bens no território nacional é incompatível com a Constituição Federal.

O juízo de análise da banca deve restringir-se aos pontos em que a doutrina se divide quanto à interpretação de determinada norma jurídica ou entendimento, o que não é o caso da afirmação exposta. A equipe responsável pela elaboração da questão contrariou expressamente o texto da Constituição e toda a corrente doutrinária, evidenciando flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade.

Ademais, não se pode permitir que a liberdade da banca para validar um item como correto ou errado adentre no campo do acaso ou da sorte do candidato, o que caracteriza ilegalidade. Os candidatos aplicam seus conhecimentos com base no que aprenderam ao longo dos estudos preparatórios e, obviamente, todos sabemos — incluindo juízes e promotores — que nenhum direito fundamental é absoluto. Não há qualquer segurança jurídica se a avaliação se basear em uma espécie de "adivinhação" da resposta que a banca pretende que seja correta, em vez de se pautar no conhecimento efetivo sobre a matéria.

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Além disso, concurso público não é um sorteio, mas um meio de aferição de conhecimentos e preparação para o exercício do cargo. Não existe doutrina que valide o entendimento adotado pela banca. Tampouco há jurisprudência nesse sentido. Nada na Constituição proíbe tal restrição, pois, inclusive, nem mesmo a vida pode ser considerada um direito fundamental absoluto por disposição constitucional expressa. O art. 60, inciso IV, da CRFB/88 estabelece a proibição de abolição e não de restrição de direitos fundamentais, partindo do pressuposto de que esses direitos são relativos, conforme ampla doutrina constitucionalista e entendimento consolidado do STF.

Mais absurdo ainda é o fato de que existem, em nosso ordenamento jurídico, diversas restrições legais à liberdade de locomoção, provenientes do Decreto Presidencial nº 678/92, que promulgou um tratado internacional devidamente ratificado pelo Congresso Nacional, nos termos do art. 49, I, da CRFB/88. Dessa forma, esse documento é totalmente compatível com a Constituição, uma vez que a norma do art. 5º, inciso XV, da Magna Carta é de eficácia contida, admitindo, portanto, restrições impostas pelo poder constituinte derivado.

Não apenas esse decreto, mas também o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Defesa do Consumidor, o Código de Trânsito Brasileiro, o Código Tributário Nacional e tantas outras leis federais estabelecem, em conformidade com a Constituição, restrições à liberdade de locomoção por meio de normas de ordem pública.

Ocorre que o entendimento da banca examinadora, repita-se, é contrário a todo o ordenamento jurídico, sendo flagrantemente ilegal e inconstitucional. Além disso, interfere na classificação dos candidatos no concurso público por meio de manipulação, sem apresentar qualquer fundamentação jurídica que justifique a consideração do item como correto.

Isso porque a discricionariedade consiste na faculdade conferida ao aplicador do direito para escolher, entre duas ou mais opções previstas pelo legislador ou pela doutrina, aquela que melhor se adequa à realidade do caso concreto. Contudo, como não há qualquer respaldo jurídico para o entendimento adotado pela banca, não estamos diante de uma questão de discricionariedade ou livre escolha do administrador, mas sim de uma flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade.

Nesse contexto, resta evidente que o posicionamento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a anulação de questões de concurso público, pela via judicial, é possível nos casos de flagrante ilegalidade ou inconstitucionalidade, o que se verifica em diversos casos concretos.

A banca não dispõe de nenhuma legislação, corrente doutrinária, jurisprudência ou entendimento que albergue sua interpretação. Assim, não se trata de juízo discricionário da banca examinadora, mas de pura ilegalidade e flagrante inconstitucionalidade. Haveria discricionariedade caso ao menos uma corrente corroborasse a tese da banca, o que não ocorre. Discricionariedade pressupõe a existência de dois lados. Logo, se a banca adota um entendimento que inova o direito, surpreendendo o candidato por ser contrário a tudo o que ele estudou e para o que se preparou, isso não pode ser denominado discricionariedade, mas sim inconstitucionalidade, ilegalidade ou mesmo imoralidade.

Embora a banca possua discricionariedade para a formulação e análise das questões como regra, jamais poderia utilizar seu juízo de escolha para adotar um entendimento que inove o direito, ou seja, não poderia legislar ou criar jurisprudência ou entendimento doutrinário, adentrando no campo do acaso e da sorte do candidato, em vez de avaliar seus conhecimentos.

Ademais, embora seja inviável ao Judiciário adentrar ao mérito dos atos administrativos realizados pelos Poderes da República, é evidente e pacífico que essa regra não é taxativa, tampouco absoluta, pois, ao exercer o poder discricionário, qualquer dos Poderes se submete ao juízo vinculado aos princípios da proporcionalidade, legalidade, constitucionalidade, moralidade e demais normas que regulam a atividade discricionária. A escolha pode ocorrer em relação ao mérito, todavia, esse mérito administrativo jamais pode contrariar a Constituição e muito menos os entendimentos adotados pelo Colendo STF.

Assim, o cerne da questão posta consiste em demonstrar que o entendimento da banca, à margem de sua discricionariedade, exorbita os limites do poder discricionário, ferindo todo o ordenamento jurídico, a Constituição, a doutrina, a jurisprudência e os demais compêndios de direito que tratam da possibilidade de restrição à entrada e permanência de estrangeiros no país.

Aliás, ao afirmar que "... O estabelecimento de restrições, por lei, à entrada e locomoção de pessoas com seus bens no território nacional em tempo de paz seria uma medida incompatível com as normas constitucionais garantidoras de direitos e garantias fundamentais da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988...", a banca também afronta a soberania do Estado, anulando (ou rasgando) todas as leis alfandegárias, aéreas, marítimas, tributárias, comerciais, econômicas, sociais, culturais etc., que restringem a liberdade de locomoção sem qualquer ônus para que estrangeiros transitem pelo território nacional, ainda que em tempo de paz.

Além disso, a banca afronta os constitucionalistas que defendem a relativização dos direitos fundamentais e que, em suas obras e entendimentos, sustentam a possibilidade de restrição desses direitos. Mais ainda, a banca desconsidera todos os tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil que tratam da entrada e permanência de estrangeiros em nosso país.

O entendimento adotado pela banca é totalmente inconstitucional, exorbitando sua margem discricionária. É imoral porque inova o direito, legislando e criando um entendimento inexistente. É ilegal porque reduz o concurso a um jogo de sorte ou azar para o candidato, ferindo todo o ordenamento jurídico, a jurisprudência, os princípios constitucionais e a doutrina constitucionalista.

Isso ocorre porque essa tese simplesmente não existe e, sendo assim, não há dois entendimentos contrapostos, impossibilitando qualquer juízo de discricionariedade, pois este pressupõe a existência de duas ou mais alternativas viáveis para que a banca escolha uma delas. No entanto, neste caso, não há qualquer outro entendimento que valide a compatibilização da suposta violação à liberdade de locomoção com a Constituição Federal de 1988.

Repita-se: não existe, no Brasil, qualquer fundamento que respalde o entendimento da banca. Se ela elaborou a questão transgredindo todo o ordenamento jurídico, resta evidente a presença de ilegalidade e inconstitucionalidade, e não de mera discricionariedade.


3. DA VIOLAÇÃO AO CAPUT DO ART. 37 DA CARTA DA REPÚBLICA - CONCURSO PÚBLICO MERITOCRÁCIA

Nessa seara, temos que a interpretação utilizada pela banca deflagra total desrespeito aos princípios constitucionais do concurso público elencados nos incisos e parágrafos do art. 37 da Carta da República, quais sejam: moralidade, eficiência e legalidade. E, como bem sabem os eminentes leitores, a violação a esses princípios constitui inconstitucionalidade, pois estão insculpidos na Carta Maior. Vejamos cada um deles.

A violação ao princípio do concurso público (art. 37, incisos I e II, da Constituição de 1988) resta evidenciada na medida em que a interpretação utilizada, em flagrante ilegalidade, permitiu a preterição de candidatos na classificação, favorecendo outros que, teoricamente, foram escolhidos pela banca. Esse tipo de situação ocorre em diversos concursos públicos, sendo alguns deles objeto de investigação pelo Tribunal de Contas, pelo Ministério Público e até mesmo por prefeitos que tomaram posse em substituição aos anteriores.

Essa técnica de inovar o direito, lastreada na regra de que ao Judiciário não compete adentrar o mérito das questões de concurso, tem sido frequentemente utilizada para classificar candidatos nas primeiras colocações e até mesmo dentro das vagas oferecidas no edital, com o intuito de selecionar determinados candidatos. Isso fere o princípio do concurso público e, no caso de questões como esta, compromete todo o ordenamento jurídico, retirando a meritocracia e ignorando o esforço dos candidatos, que abrem mão de suas atividades diárias para se dedicarem aos estudos, muitas vezes afastando-se da família e gastando recursos que não possuem.

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Sobre o autor
Paulo Silva Lima Wu

Advogado (OAB/PE 33.544), Procurador Municipal. Especialização em Direito Constitucional; Especialização em Direito Processual Penal. Aprovado em 9 concursos públicos dentro das vagas. Consultor Jurídico para prova da segunda fase da OAB em Direito Constitucional. E-mail paul@wu3@yahoo.com.br e Telefone 081-996382475.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WU, Paulo Silva Lima. O limite discricionário de entendimento na correção de questões de concurso público e o Tema nº 485 do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 7934, 22 mar. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/94954. Acesso em: 26 mar. 2025.

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