O estado de coisas inconstitucional do sistema carcerário brasileiro no contexto da pandemia do covid-19

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Resumo: O artigo visa apresentar as condições nas quais se encontram o sistema carcerário brasileiro, visto que o próprio STF em decisão reconheceu seu atual estado de coisas inconstitucionais. Esse cenário proporciona uma reflexão acerca da falta de respeito e, também da aplicabilidade ao princípio da dignidade da pessoa humana. Uma vez que, tal princípio é considerado o máximo do estado democrático de direito e, de direito fundamental que todo indivíduo possui. Nesse sentido, é realizado um estudo doutrinário, normativo e jurisprudencial que aborda este assunto, levando em consideração o contexto da pandemia do Covid 19, já que há uma grande facilidade de transmissibilidade, causando uma rápida proliferação no número de infectados e, mortos por todo o mundo. Assim, diante das análises e, estudos há uma clara evidência da deficiência do Estado em conseguir de fato lograr êxito em proporcionar a garantia e, também a aplicabilidade de dignidade aos apenados, principalmente no cenário da pandemia, pois a superlotação ainda é uma realidade devastadora presente nos presídios brasileiros.

Palavras-chave: Estado de Coisas Inconstitucionais. Sistema Carcerário. Dignidade da Pessoa Humana. Superlotação. Ativismo Judicial. ADPF 347. COVID 19.


INTRODUÇÃO

Quando um indivíduo pratica conduta prevista em lei, como por exemplo um crime, a pena aplicável é de reclusão. Assim, este transgressor vai cumprir a pena privativa de liberdade recolhido em cárcere privado, com a finalidade de aprender com o próprio erro cometido e, por conseguinte não voltar a delinquir. Segundo Bittencourt (2017, p. 26), [...] há questionamento no que diz respeito à pena privativa de liberdade, uma vez que o problema da prisão seria a própria prisão.

Dessa forma, observa-se que a pena não vem alcançando essa finalidade, uma vez que a própria prisão deveria ser um local para fins de ressocialização, porém acontece o contrário, sendo este local considerado um violador dos direitos humanos.

Assim, constata-se que grande parte do problema vem em decorrência da falta de qualidade e quantidade dos presídios e, conforme Rudnicki (2011, p. 534), [...] quando existe a superlotação, é a primeira a maior reclamação da massa carcerária. Nesse sentido, acaba por dificultar com que esses apenados cumpram sua pena de maneira digna alcançando a ressocialização.

Destarte, quando há a presença da reincidência as penas são aplicadas de forma mais severa e elevada, fazendo com que o apenado cumpra essa pena de forma degradante e sem compensação. Vale salientar que a modificação da lei é uma falsa reparação do sistema prisional, visto que o tema prisão é muito midiático. Então, piorar situações não corrige ou minimiza o caos existente dentro do sistema prisional, ainda mais quando é aplicada a criminologia comum do povo.

Todavia, ainda que tenham dispositivos regulamentadores que tratam acerca da integridade física e moral dos apenados, na prática este quesito não vem sendo exercido da forma como deveria. Desse modo, existem duas principais situações que devem ser enfatizadas e, estas são preponderantemente deslegitimadas do sistema prisional, a saber: a superlotação e, a insalubridade em que os apenados vivem. Dessa forma, se fez necessário o ativismo judicial para declaração do estado de coisas inconstitucional do sistema carcerário brasileiro, tendo em vista que por anos este contexto continua o mesmo, piorando a cada dia.

Levando em conta esse cenário hostil do sistema carcerário a facilidade de contágio e a transmissão de qualquer doença infecciosa, ganha força e rapidez. Com a chegada da pandemia do Covid 19, não fora diferente. No Brasil, devido à emergência da chegada da pandemia foi declarado o estado de calamidade pública através do Decreto Legislativo nº 6/2020 e, em conformidade com a OMS (Organização Mundial da Saúde), foram estabelecidas medidas e orientações acerca da prevenção contra o Covid 19, e entre elas está o isolamento social, distanciamento de pelo menos 1 (um) metro de qualquer pessoa e o menor contato possível entre os indivíduos.

Mas, é complexo seguir tais orientações dentro do sistema carcerário, uma vez que as celas destinadas à ocupação de 7(sete) pessoas são preenchidas com um número muito mais elevado, facilitando a aglomeração e ocasionando a proximidade de uns com os outros.

Portanto, o estudo terá o intuito de analisar o sistema carcerário e a crise da não efetiva aplicação das penas privativas de liberdade. Igualmente, tratará das violações presentes nas prisões que afrontam os direitos humanos, frente à insalubridade em que se encontram e, por conseguinte a desproporcionalidade em sua aplicação que contribuem diretamente para o risco de vida e saúde dos apenados, quando na verdade o Estado deveria preservá-las e ajudar em sua ressocialização. Além do mais, não há como atacar esses apenados que se encontram em condição de vulnerabilidade.

Desse modo, a pesquisa irá contemplar a ADPF 347 do STF e o ativismo judicial que tratam sobre a atual situação em que se encontra o sistema carcerário, frente à pandemia do Covid 19, que também está diretamente relacionada ao princípio da dignidade da pessoa humana.


1. QUANTO ÀS CONDIÇÕES DOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS; E O RESPEITO E APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Os estabelecimentos prisionais são locais para onde a justiça conduz os indivíduos que cometeram alguma atividade considerada criminosa (entende-se crime o fato típico, ilícito e culpável). Thompson (2002, p. 18), elenca que a [...] regeneração do preso, no sentido de transformá-lo de criminoso em não criminoso, seja uma das finalidades da prisão pena. Assim, ficam encarcerados, privados de sua liberdade de locomoção, submetidos às penas e medidas de segurança cabíveis para o cumprimento de seu delito.

A origem do termo prisão teve início nos mosteiros no período da Idade Média, como forma de punir os monges e cléricos que não cumpriam as funções que lhes eram impostas. Então eram coagidos a se recolherem em celas e se dedicarem à meditação e à busca do arrependimento por suas ações, ficando mais próximo de Deus. No Brasil, o surgimento de prisões com celas individuais, se deu a partir do século XIX, com arquitetura própria para a pena de prisão. E, o código Penal de 1890, deu a possibilidade para novas modalidades de prisão, fazendo limitação as penas restritivas de liberdade, prisão cautelar, trabalho e disciplinar. (MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013, p. 2 - 3)

Neste mesmo sentido, Bitencourt (2017), salienta que por mais que a pena de prisão seja amarga, ela é imprescindível, e, que a história da prisão não é em questão da abolição e sim da sua reforma. O instituto do cárcere, surge como forma de resposta estatal tida como um mal necessário, a fim de que possa dar resposta à sociedade, na busca pela ressocialização dos indivíduos que agem de forma contrária a lei. Ele ainda complementa:

Os objetivos preventivos que Beccaria atribui à pena, assim como a importância que deu à máxima de que é melhor prevenir delitos que castigá-los, passaram a contribuir substancialmente para mitigar os efeitos do regime punitivo vigente. Tais objetivos são, indiscutivelmente, um antecedente e um complemento importante dos anseios reabilitadores que se atribuem à pena privativa de liberdade. Embora considere a prevenção geral o fim primordial da pena, não aceita que lhe atribuam caráter aflitivo. Esse postulado coincide com os objetivos da criminologia moderna, que busca, em seu fim de justiça humana, a recuperação do infrator para a sociedade. É importante levar em consideração que Beccaria não admite a vingança como fundamento do jus puniendi. Nesse sentido coincide com os objetivos ressocializadores da pena de prisão. (BITENCOURT, 2017, p. 47)

Todavia, a situação precária do sistema carcerário brasileiro não é novidade para sociedade, tampouco para o legislador. Tendo em vista, que este tema ainda é bastante complexo e, expressivo na realidade atual. O instituto da pena privativa de liberdade não vem alcançando seu objetivo final, que é punir o agente causador do dano causado e, reinseri-lo na sociedade.

Assim, muitos fatores negativos de maneira cumulativa contribuíram para esse resultado, que se tornou o sistema carcerário no decorrer dos anos. Acerca disso, é destacado que,

Os pontos mais graves são: o abandono, a falta de investimento e o descaso do poder público. Dessa forma, aquele sistema que tinha o intuito de se tornar um instrumento de substituição das penas desumanas, como as de morte e tortura, não tem desempenhado o seu papel e, muito ao contrário, tem se tornado um motivo para o aperfeiçoamento de criminosos, além de ter como principal atributo a insalubridade, já que se trata de atmosferas sujas, sem espaço suficiente para todos os detentos, sendo assim, impossível tratar da ressocialização de qualquer um deles. (MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013, p. 5)

Ademais, quando se discute sobre ressocialização e humanidade dentro do sistema carcerário, constata-se ainda um tratamento utópico ao ser explanado que,

A nossa realidade é arcaica, os estabelecimentos prisionais, na sua grande maioria, representam para os reclusos um verdadeiro inferno em vida, onde o preso se amonta a outros em celas (seria melhor dizer em jaulas) sujas, úmidas, anti-higiênicas e super lotadas, de tal forma que, em não raros exemplos, o preso deve dormir sentado, enquanto outros revezam em pé.....nada mais é do que um aparelho destruidor de sua personalidade, pelo qual não se serve para o que diz servir, neutraliza a formação ou o desenvolvimento de valores; estigmatiza o ser humano; funciona como máquina de reprodução da carreira no crime; introduz na personalidade a prisionização da nefasta cultura carcerária; estimula o processo de despersonalização; legítima o desrespeito aos direitos humanos. (COELHO, 2002, p. 01).

Assim, a superlotação é uma das principais razões para que a pena não atinja sua finalidade, pois torna o ambiente mais propício à violação de direitos humanos, levando em consideração a dignidade da pessoa humana. À medida que não se observam melhorias efetivas das condições prisionais, há elevada insegurança jurídica no Brasil, acerca dessa discussão é explanado que,

É notória que a realidade dos presídios é uma verdadeira tortura, visto que em muito dos casos, um pequeno delinquente entrando no presídio, sai como membro de facções, efetuando crimes com maiores potenciais ofensivos. Vários fatores contribuem para essa precariedade, a contar o abandono, a falta de investimento e descaso do poder público para com a realidade que se encontra o sistema prisional. Assim, o sistema que tinha como objetivo em substituir penas desumanas como a de morte e tortura acaba por contribuir para o aperfeiçoamento dos criminosos. (MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013, p. 5).

Seguindo o mesmo pensamento e, também observando a real condição do sistema carcerário, em que a superlotação é um dos principais fatores, quase não se nota a aplicabilidade de políticas públicas voltadas para esse assunto,

Com o déficit prisional ultrapassando a casa das 206 mil vagas, salta aos olhos o problema da superlotação, que pode ser a origem de todos os males, assinalando que a maior parte desses detentos está sujeita a condições como superlotação, torturas, homicídios, violência sexual, celas imundas e insalubres, proliferação de doença infectocontagiosas, comida imprestável, falta de água potável, de produtos higiênicos básicos, de acesso à assistência judiciária, à educação, à saúde e ao trabalho, bem como amplo domínio dos cárceres por organizações criminosas, insuficiência do controle quanto ao cumprimento das penas, discriminação social, racial, de gênero e de orientação sexual (Supremo Tribunal Federal, Pleno. ADPF nº 347 MC/DF. Rel.: Min. Marco Aurélio. DJ. 09/09/2015).

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A dignidade da pessoa humana e sua integridade moral e física, encontram-se amparadas na DUDH Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seu art. 5ª, elucida, [...] que ninguém será submetido à tortura, tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante [...]. A DUDH foi instituída no pós-segunda guerra mundial pela ONU (Organização das Nações Unidas), justamente para organizar os princípios no tocante à paz e a democracia, além de claro, fortalecer os direitos humanos. Igualmente a este documento, tem-se a declaração do Pacto de São José da Costa Rica, que em seu art. 5ª, expõe,

Artigo 5º - Direito à integridade pessoal: 1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. (Pacto de San José de Costa Rica, 1969).

Desse modo, no mesmo sentido a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, traz no primeiro artigo a discussão que todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança de sua pessoa. Igualmente mencionado, no art. 10 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos tem-se,

Art. 10. 1. Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa humana. 3. O regime penitenciário consistirá num tratamento cujo objetivo principal seja a reforma e a reabilitação normal dos prisioneiros. Os delinquentes juvenis deverão ser separados dos adultos e receber tratamento condizente com a sua idade e condição jurídica. (Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, 1992).

No mesmo sentindo, o art. 1º e 3º, da Lei de Execuções Penais trata acerca da finalidade da imposição da pena e, dos limites que devem ser respeitados pelo tempo em que os apenados estão cumprindo sua punição. Assim, na esfera de aplicabilidade do princípio da dignidade da pessoa humana é postulado que,

É que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver limitação do poder, enfim, onde a liberdade e a autonomia, a igualdade (em direito e dignidade) e dos direitos fundamentais não forem reconhecidos e minimamente assegurados, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana e esta (a pessoa), por sua vez poderá não passar de mero objeto de arbítrio e injustiças. Tudo, portanto, converge no sentido de que também para a ordem jurídico-constitucional a concepção do homem objeto (ou homem-instrumento), com todas as consequências que daí podem e devem ser extraídas, constitui justamente a antítese da noção de dignidade da pessoa, embora esta, à evidência, não possa ser, por sua vez, exclusivamente formulada no sentido negativo (de exclusão de atos degradantes e desumanos), já que assim se estaria a restringir demasiadamente o âmbito de proteção da dignidade (SARLET, 2010, p. 69).

Dessa forma, faz-se necessário que o Estado execute, de fato, as garantias mínimas normatizadas a amparar o direito fundamental de todo indivíduo, principalmente aqueles que estão sob seu dever de cuidado, acrescentando que o respeito e a aplicabilidade do princípio da dignidade da pessoa humana estão em processo de reconstrução, já que,

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da continuidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida. (SARLET, 2010, p. 70).

Dando continuidade e fortalecimento a esta discussão, aponta-se que,

De acordo com o art. 5º, XLIX, da Constituição Federal, é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral. A visível superlotação dos presídios demostra que está havendo ultraje por parte do sistema carcerário no que tange aos direitos fundamentais desses detentos, pois não existe respeito à integridade, tanto física quanto mortal dos mesmos (MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013, p. 6).

Dessa forma, é imprescindível maior atenção e debate em abordar o efetivo cumprimento deste princípio, pois constitui direito fundamental normatizado, tanto na Constituição Federal, quanto em declarações e tratados, fazendo com que cada indivíduo faça jus a tal direito.


2. ADPF 347 O EXERCÍCIO DO ATIVISMO JUDICIAL

O artigo tem o intuito de analisar o sistema carcerário e a crise da não efetiva aplicação das penas privativas de liberdade. Tratando das violações presentes nas prisões que afrontam os direitos humanos, frente à insalubridade e, a desproporcionalidade em sua aplicação, pontos que contribuem diretamente para o risco de vida e saúde dos apenados, quando na verdade o Estado deveria preservá-los e, ajudá-los em sua ressocialização.

Diante desse cenário, contempla-se a ADPF 347 do STF e, o ativismo judicial que tratam sobre a atual situação em que se encontra o sistema carcerário frente à pandemia do Covid 19, que também, está diretamente relacionada ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Assim, frente as inúmeras violações desumanas e degradantes dentro do sistema carcerário, o Partido Socialismo e Liberdade PSOL, impetrou Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ao citar ADPF 347, tratando sobre essas violações presentes no sistema carcerário brasileiro.

Em 2015 o STF reconheceu parcialmente o estado de coisas inconstitucional no sistema prisional, conforme a ementa:

CUSTODIADO INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL SISTEMA PENITENCIÁRIO ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL ADEQUAÇÃO. Cabível é a arguição de descumprimento de preceito fundamental considerada a situação degradante das penitenciárias no Brasil. SISTEMA PENITENCIÁRIO NACIONAL SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA CONDIÇÕES DESUMANAS DE CUSTÓDIA VIOLAÇÃO MASSIVA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS FALHAS ESTRUTURAIS ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL CONFIGURAÇÃO. Presente quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária, deve o sistema penitenciário nacional ser caraterizado como estado de coisas inconstitucional. FUNDO PENITENCIÁRIO NACIONAL VERBAS CONTINGENCIAMENTO. Ante a situação precária das penitenciárias, o interesse público direciona à liberação das verbas do Fundo Penitenciário Nacional. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA. Estão obrigados juízes e tribunais, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, a realizarem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contado do momento da prisão.

ADPF 347 MC / DF. (Supremo Tribunal Federal, Pleno. ADPF nº 347 MC/DF. Rel.: Min. Marco Aurélio. DJ. 09/09/2015).

O reconhecimento do Estado de Coisas Inconstitucionais pelo STF foi uma atuação do Judiciário, por meio do ativismo judicial. Para melhor compreensão do que vem a ser ativismo judicial, postula-se que,

Diante da dificuldade ou da ineficiência do executivo em efetivar tudo aquilo que as novas Constituições (dirigentes) prometiam, garantiam ou obrigavam, submetendo fortemente o Estado a seus comandos, o Judiciário se tornou o refúgio do cidadão desamparado por essa ineficiência e carente da prestação do Estado. Surge o Estado Democrático de Direito. A prática do ativismo judicial teve início antes mesmo de sua famosa denominação ser cunhada. Consta que ainda no século XIX, na Suprema Corte estadunidense, já aflorava a criatividade judicial. O termo ativismo judicial só surgiu, até um tanto por acaso, em 1947, quando em uma matéria para a revista Fortune o articulista Arthur Schlesinger JR, ao se referir à postura dos juízes aquela corte frente ao New Deal, classificou os mais progressistas como ativistas. A partir daí ganhou destaque e notoriedade e se consolidou. Na judicialização da política ocorre um fenômeno de ampliação da ordem hermenêutica do direito, permitindo que o Judiciário corrija eventuais defeitos dos demais poderes. O ativismo é um ato; a judicialização é um fato (PENNA, 2017, P. 5).

Nesse ínterim, Barroso (2015), em um artigo para a Revista Brasileira de Políticas Públicas, postula em linhas gerais que, por muitas décadas era recorrente o discurso acerca da crise dos parlamentos e representação política, destacando a disfuncionalidade, corrupção, e captação de interesses privados associados à atividade política. Tendo a democracia como uma insuficiência representativa.

Diante dessa insuficiência destaca-se como consequência, o fortalecimento do Poder Executivo no Brasil, notadamente através do Supremo Tribunal Federal. Assim, há a verificação de juízes e tribunais tornando-se mais representativo, amparando os anseios e, as demandas da sociedade, tendo até mais credibilidade dentre as instâncias.

Barroso (2015, p. 23), faz menção à um exemplo que primeiro potencializou a prática do ativismo judicial, a saber: Um exemplo ilustra bem a afirmação: quando o Congresso Nacional aprovou as pesquisas com células-tronco embrionárias, o tema passou despercebido. Quando a lei foi questionada no STF, assistiu-se a um debate nacional [...].

Assim, o que se entende de maneira geral por ativismo judicial é a ação do Poder Judiciário frente aos outros poderes, agindo positivamente além do que está previsto em lei, devendo analisar o caso concreto, que de fato precisa de uma resposta para a situação.

É desejável que para os problemas enfrentados no sistema carcerário hajam decisões e posicionamentos, tratando do assunto para que possíveis soluções sejam alcançadas. Logo, a atuação judiciária se faz necessária e importante.

Dessa forma, esta decisão corrobora com a ineficiente proteção que não deveria figurar ao Poder Público para com os apenados, mas, torna-se necessária, uma vez que não havia outra norma, reconhecendo tal cenário. De igual modo, há violação ao texto da Constituição Federal que em seu art. 1º, III assegura a dignidade da pessoa humana e, no art. 3ª, IV visa promover o bem para todos. Assim, os apenados ao cumprirem sua pena privativa, ficam com a liberdade restringida e não a dignidade.

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Sobre as autoras
Paloma Torres Carneiro

Professora orientadora. Mestre em Direito Universidade Católica de Brasília (UCB).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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