3. O VALOR DO DANO EXTRAPATRIMONIAL SOB A ÓTICA DA REFORMA TRABALHISTA
Neste capítulo discorre-se sobre o dano patrimonial e extrapatrimonial a partir da CRFB/88,153 do Código Civil154 e da Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,155 buscando-se apresentar sua valoração no art. 223-G deste dispositivo jurídico, com o posicionamento divergente entre doutrinadores, enaltecendo-se o Princípio da Igualdade, verificando se há quem ganha mais em relação ao valor do dano, a partir de uma discussão no tocante ao art. 5º da CRFB/88,156 o qual estabelece que todos são iguais perante a Lei.
3.1 CONCEITO DE DANO PATRIMONIAL E EXTRAPATRIMONIAL
Advindo da palavra latina damnum, significando a presença de um prejuízo ou perda real, o dano é entendido como o requisito mais relevante para se definir a responsabilidade e posterior reparação da lesão provocada, sendo que o Código Civil,157 junto a seu art. 944, preconiza que a indenização é medida pela extensão do dano, o que torna a presença deste essencial.
Cavalieri Filho158 profere que:
O dano é o grande vilão da responsabilidade civil, não havendo que se falar em indenização nem em ressarcimento se não houver o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano. Na responsabilidade objetiva, qualquer que seja a modalidade de risco que lhe sirva de fundamento – risco profissional, risco proveito, risco criado etc., o dano constitui o seu elemento preponderante e tanto é assim que, sem dano, não haverá o que reparar, ainda que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa.
O dano pode ser patrimonial ou extrapatrimonial. O patrimonial ocorre no momento em que a lesão reduz o patrimônio de um indivíduo, sendo que o extrapatrimonial acontece quando a lesão é provocada por uma transgressão aos direitos e interesses pessoais de uma pessoa, e o prejudicado busca a justiça para confirmá-lo e o ter reparado, citando Brandão.159
Entretanto, podem haver casos em que os dois tipos de dano ocorram conjuntamente, sendo que sobre esta questão, Braga160 afirma que:
Diante da premissa que há de se levantar que a reparação de dano patrimonial que tenha decorrido do mesmo fato jurídico ensejador do dano extrapatrimonial, não exclui ou substitui a indenização pelos danos extrapatrimoniais e vice-versa, já que se tratam de ofensas contra bens jurídicos diferentes. O que pode acontecer e já se admite é o pedido cumulativo entre dano patrimonial e extrapatrimonial. Entende-se que uma conduta pode desencadear vários danos e que o pedido de reparação de um dano não exclui o direito de pedir reparação pelo outro.
Desta forma, na sequência do presente estudo passa-se a uma análise conceitual referente ao dano patrimonial e extrapatrimonial, tratando-se a seguir sobre a responsabilidade civil, que se refere a obrigação e dever da reparação do dano por parte do ofensor.
3.1.1 Dano patrimonial
O dano patrimonial é aquele que ocorre junto ao patrimônio material de uma pessoa, sendo que define-se patrimônio, como sendo, de acordo com Pinto,161 o conjunto de bens, direitos e obrigações de uma pessoa ou empresa, o qual é avaliado em moeda corrente e destinado à realização de seus fins, sejam pessoais ou empresariais.
Segundo o art. 402 do Código Civil,162 o dano material pode ser classificado em: emergente – o que de fato se perdeu – e lucros cessantes – o que supostamente se deixou de ganhar – estabelecendo o instrumento jurídico ora citado que “[...] salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidos ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.
Braga163 se pronuncia afirmando que o dano que afeta somente o patrimônio do indivíduo pode também ser nomeado como dano material, acarretando lesão econômica que dispõe de tutela junto ao Direito, podendo, desta forma, o dano patrimonial ser conceituado como aquele que ofende a relação entre a pessoa e bens economicamente avaliáveis.
Expressa o Código Civil164 em seu art. 404 que “[...] as perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos”, o que abrangem juros ou custas e honorários advocatícios.
Venosa165 salienta que o dano patrimonial pode ser restaurado a partir da responsabilização civil do ofensor, promovendo equilíbrio patrimonial ao ofendido, haja vista que o dano quando não reparado, traz inquietações, denotando que a atuação do Estado para sanar os danos causados pelas pessoas uma as outras em sua convivência, promove a pacificação social.
Constata-se, portanto, que o conceito de dano patrimonial se apresenta como bastante objetivo, ou seja, entende-se como dano patrimonial àquele que impacta o patrimônio material do ofendido, podendo ser classificado como emergente ou lucros cessantes e pode ser chamado também de dano material, pois refere-se a bens economicamente avaliáveis.
A seguir tratar-se-á acerca do dano extrapatrimonial ou dano moral, trazendo-se seu conceito, visando apresentar sua distinção em relação ao dano patrimonial, pois este refere-se ao impacto a bens economicamente avaliáveis, e àquele a direitos personalíssimos, como moral, imagem, dignidade, entre outros.
3.1.2 Dano extrapatrimonial
O dano extrapatrimonial também é entendido como dano moral. Trata-se de um direito constitucional e albergado por outras áreas do Direito. É uma tarefa difícil trazer seu conceito, já que dispõe de concepção negativa e neste contexto Marin166 afirma que o extrapatrimonial não dispõe de uma esfera positiva, pois sua conceituação advém de danos não materiais, com elementos subjetivos como sofrimento e dor.
Ao apresentar seu conceito de dano extrapatrimonial, Braga167 fala que:
É aquele que não guarda relação com a esfera patrimonial. Aqui o bem afetado são os direitos personalíssimos, a moral, imagem, dignidade, autoestima, entre outros. Aqui o bem jurídico afetado é imensurável e pessoal, é o dano na essência do indivíduo, naquilo que faz parte de suas características e lhe confere autenticidade, é a dor do ser, do íntimo.
Comenta Brandão168 que o dano extrapatrimonial refere-se ao abuso do direito do indivíduo em situações trabalhistas, do consumidor ou comerciais, quando lesionados direitos subjetivos da personalidade, essenciais para a defesa do que é seu, referindo-se a dignidade, vida, imagem, sociabilidade, privacidade, autoria, liberdade, honra, integridade, entre outros, podendo afetar também a rotina, trazendo perdas de tempo útil, necessário para resolver os danos causados, mas não precisa se vincular a lesão de direitos subjetivos, bastando violar uma situação jurídica subjetiva extrapatrimonial ou interesse patrimonial que envolva a vítima que deve ser indenizada, cujo valor depende do entendimento subjetivo do juiz.
Ao discorrer sobre esta questão, Delgado169 leciona que:
O patrimônio moral não se limita a intimidade, vida privada, honra e imagem, pois outros bens e valores inerentes ao ser humano integram esse patrimônio, cujo desrespeito enseja a proporcional reparação (art. 5º, V, CRFB/88). De todo modo, a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem do ser humano são formadas por um complexo de fatores e dimensões físicos e psicológicos (autorrespeito, autoestima, sanidade física, sanidade psíquica, etc.), os quais compõem o largo universo do patrimônio moral do indivíduo que a ordem constitucional protege. As agressões dirigidas a esse complexo ou a qualquer de suas partes devem ser proporcionalmente reparadas, em conformidade com o Texto Máximo de 1988.
Neste sentido, Marin170 afirma que “[…] depreende-se que o dano extrapatrimonial é aquele que atinge a esfera subjetiva da pessoa humana, afetando, de modo geral, a parte emocional e podendo gerar prejuízos psicológicos”, sendo um direito do indivíduo ser indenizado em sua ocorrência.
Em uma das referências sobre o dano extrapatrimonial, o Código Civil,171 em seu art. 186, reza que “[...] aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”, sendo que existem várias outras referências sobre o tema neste dispositivo jurídico.
Deste modo a conceituação do dano extrapatrimonial parte do princípio que não envolve danos materiais ou patrimoniais, afetando direitos personalíssimos como moral, imagem, dignidade, autoestima, entre outros e por este motivo, pode ser chamado também de dano moral, entendido como um abuso em áreas como situações trabalhistas, do consumidor ou comerciais, devendo ser indenizada a vítima quando tais direitos são feridos pelo ofensor.
A seguir discorrer-se-á sobre a responsabilidade civil e seus elementos como a conduta humana, nexo de causalidade e dano, a qual trata-se da obrigação de um indivíduo reparar o dano levado a uma pessoa.
3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL
Brandão172 preleciona que o termo responsabilidade se origina do verbo latino spondeo, que significa obrigação, comprometimento e dever que um indivíduo apresenta junto a outrem, visando a assumir as consequências jurídicas de determinado ato.
Destaca Pereira173 que a responsabilidade civil:
[…] consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação ao sujeito passivo da relação jurídica que se forma. Reparação de sujeito passivo compõe o binômio responsabilidade civil, que então se enuncia como princípio que subordina a reparação da sua indecência na pessoa do causador do dano. Não importa se o fundamento é a culpa ou se é independente desta, pois em qualquer circunstância onde houver a subordinação de um sujeito passivo à determinação de um dever de ressarcimento, aí estará à responsabilidade civil.
O Código Civil174 refere-se a responsabilidade civil, afirmando em seu art. 927 que “[...] aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, estabelecendo logo a seguir no Parágrafo Único do referido artigo que “[...] haverá obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar risco para os direitos de outrem”, sendo que estabelecem os arts. 186 e 187 do Código Civil175 que:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Observa-se que o ato ilícito se divide em objetivo e subjetivo e para haver dano se mostra essencial que seja violado o interesse jurídico de outrem, podendo ser de forma patrimonial ou extrapatrimonial, qualificando-se o dano e havendo a necessidade de repará-lo, podendo ou não voltar ao estado anterior, a partir de indenização, sendo possível haver a responsabilidade civil por terceiros ou por fato do animal, como estabelecem os arts. 932, I ao V e 936 do Código Civil,176 como segue:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I. os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II. o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;
III. o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele;
IV. os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;
V. os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime até a concorrente quantia.
[…]
Art. 936. O dono ou detentor do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.
Ressalta-se também a teoria do risco, adotada pelo Código Civil,177 na qual qualquer pessoa que desempenhe atividade que gere risco de danos a terceiros, sendo que no momento em que o dano é provocado em qualquer das condições do art. 932 é aplicada a responsabilidade civil.
Depreende-se do que foi apresentado acima que responsabilidade civil significa obrigação ou dever de uma pessoa em relação a outra, visando assumir consequências jurídicas de certas condutas, ainda que não haja culpa, estabelecidas pelo Código Civil e o ato ilícito viola o interesse jurídico de outrem e pode ser do tipo patrimonial ou extrapatrimonial, devendo ser indenizado, sendo que a responsabilidade civil apresenta elementos específicos, sobre os quais discute-se a seguir.
3.2.1 Elementos da responsabilidade civil
Expressa Brandão178 que a responsabilidade civil dispõe de três elementos: condutas humanas, entre as quais o primeiro elemento é positivo, referente a fazer e o segundo negativo, referente a omissão, não havendo a necessidade de culpa; nexo de causalidade, que se refere a relação do dano com a conduta do indivíduo causador, que remete a responsabilidade subjetiva ou culpa e a objetiva ou conduta; e dano, que é essencial para que haja responsabilidade, podendo ser contratual ou extracontratual, sendo que o Código Civil em seu art. 186 fala sobre tais elementos.
Ao referir-se sobre as condutas humanas, Rosenvald179 refere que o Estado determina os comportamentos considerados virtuosos dos indivíduos, punindo àqueles que trazem danos a sociedade, os quais vão contra o que estabelecem as normas legais, os quais quando praticados, incidem na responsabilização civil dos envolvidos, tendo, desta forma, a responsabilidade civil, uma função relacionada a direcionar os comportamentos em relação às condutas aceitáveis na sociedade.
No tocante ao nexo de causalidade, Braga180 expõe que:
Para que seja imputada uma condenação reparatória ao agente causador do dano, antes se deve provar que o dano decorreu da conduta praticada pelo agente. A essa relação entre causa e efeito se denomina nexo causal ou nexo etiológico. Sua análise vem expressa no verbo “causar”, empregado no art. 186. do códex. Desse modo, sem a sua demonstração, não há o dever de reparar.
Sobre o dano, Braga181 afirma que:
Outro pressuposto condicionante para a incidência da responsabilidade civil é o dano. Isso porque não há razão em imputar a reparação ou compensação de algo, se não há nada para ser reparado ou compensado. Esse pressuposto está diretamente ligado com as origens fundantes desse instituto, as motivações para criação de um dever com base na ruptura de outro se fundamentam nos danos que essa desobediência gera. Nesses termos, pode se conceituar o dano, em sentido genérico, como sendo a lesão ao interesse alheio, ou seja, a lesão a outrem. O dano pode ser derivado de uma conduta ou fenômeno natural, razão pela qual existe uma diferença entre o dano e dano indenizável, ou como costuma ser dito pelos doutrinadores, dano injusto.
Conforme Teixeira,182 “[…] a responsabilidade civil também pode ser classificada levando-se em consideração a natureza da norma jurídica infringida pela conduta do agente. Surge assim, a responsabilidade civil contratual e extracontratual”, sendo que o causador do dano deve ser responsabilizado.
Ressalta Brandão183 que a responsabilidade civil contratual advém da falta de execução de cláusulas em um contrato, descumprindo-se obrigações e a responsabilidade civil extracontratual não se liga a contratos, advinda de violações de normas legais e gerando lesão de direitos subjetivos.
Pode-se verificar que os elementos da responsabilidade civil são condutas humanas, nexo de causalidade e dano, sendo que este último é o mais importante para que exista a responsabilidade, podendo ser contratual ou extracontratual, sendo que na sequência do presente estudo, discorre-se sobre o dano extrapatrimonial no Direito do Trabalho.
3.3 DANO EXTRAPATRIMONIAL NO DIREITO DO TRABALHO
Brandão184 fala que o dano extrapatrimonial envolve direitos subjetivos, como honra, dignidade, imagem, entre outros, ou seja, viola a vida privada e direitos da personalidade, sendo que este tipo de dano no direito do trabalho, ocorre em relação ao contrato de trabalho, envolvendo o empregado e o empregador.
Ensina Marin185 que:
[…] é essencial compreender o fundamento da indenização do dano extrapatrimonial, visto que é algo muito subjetivo. Dessa forma, pode-se dizer que, ao pedir uma indenização pecuniária por um dano sofrido na esfera extrapatrimonial, o que se busca é compensar a vítima pelo ocorrido, como também punir o ofensor, com um caráter educativo, a fim de impedir que o fato ocorra novamente.
Estabelece o art. 5º da CRFB/88,186 que “[...] são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”, sendo que a teoria geral dos direitos da personalidade é aplicável a relação de emprego, pois sua violação gera danos de natureza extrapatrimonial na área trabalhista.
De acordo com Marin:187
A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, incisos V e X, sempre assegurou o direito à indenização por dano extrapatrimonial. Além disso, no ano de 2004, a Emenda Constitucional n. 45 alterou e ampliou o artigo 114 da CRFB/88, adicionando o inciso VI, que dispõe que é competência da Justiça do Trabalho processar e julgar ações de indenização por dano extrapatrimonial ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho. Após a Emenda Constitucional n. 45/2004 é possível observar que o dano extrapatrimonial teve maior reconhecimento no âmbito do Direito do Trabalho, visto que, se existia alguma dúvida ou receio de julgar na Justiça do Trabalho as ações que haviam pedido de indenização por dano extrapatrimonial sofrido decorrente da relação de trabalho, estes foram sanados com o novo Texto Constitucional.
Sobre as formas de fixação do valor da indenização, Brandão188 pronuncia que existe o sistema aberto, que possibilita ao juiz fixar a indenização subjetivamente, verificando aspectos como a situação financeira do empregador, a extensão da ofensa e o grau de culpa, e o sistema fechado, no qual a fixação do valor da indenização tem como base o salário-mínimo.
Verifica-se portanto, que o dano extrapatrimonial no direito do trabalho refere-se a direitos subjetivos em relação ao contrato de trabalho, sendo que a Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017189 trouxe mudanças que alteraram a valoração deste tipo de dano quando se refere a indenização ao ofendido, tema sobre o qual discute-se a seguir.
3.3.1 Valoração do dano extrapatrimonial no direito do trabalho segundo a Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017
A Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017190 alterou a CLT,191 passando-se a aplicar a mesma reparação de danos extrapatrimoniais, ou seja, danos imateriais ou morais, são reparados por meio de tarifação.
Neste sentido, junto a CLT192 inseriram-se os arts. 223-A ao 223-G, a partir da Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,193 estabelecendo o art. 223-G, §1º, I, II, III, IV e V, valores para as indenizações, com classificação em danos leves, médios, graves e gravíssimos, sendo que tais valores devem ser fixados com variações inerentes de três a cinquenta vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, como segue:
Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:
I. a natureza do bem jurídico tutelado;
II. a intensidade do sofrimento ou da humilhação;
III. a possibilidade de superação física ou psicológica;
IV. os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;
V. a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;
VI. as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;
VII. o grau de dolo ou culpa;
VIII. a ocorrência de retratação espontânea;
IX. o esforço efetivo para minimizar a ofensa;
X. o perdão, tácito ou expresso;
XI. a situação social e econômica das partes envolvidas;
XII. o grau de publicidade da ofensa.
§ 1º. Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:
I. ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;
II. ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;
III. ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;
IV. ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.
Assim, após estudo do art. 223-G, §1º, I, II, III, IV e V da Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,194 o magistrado deverá realizar um exame do § 1º do mesmo artigo, que dispõe sobre os graus de ofensa, visando atribuir os valores indenizatórios.
Brandão195 sustenta que a Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,196 tem a prerrogativa de prejudicar o empregado que sofreu dano extrapatrimonial, pois existe a hipótese do empregador receber a condenação referente a pagar o limite máximo de cinquenta vezes o valor do teto da previdência social, mas este valor não venha a reparar o dano causado, principalmente quando envolve a morte do empregado na empresa devido a culpa do empregador, já que nenhuma indenização cobre a perda de uma vida e o sofrimento causado a família.
De acordo com Marin:197
[…] existe uma dificuldade acerca da objetividade para se fixar a indenização, uma vez que para os danos extrapatrimoniais não há como se utilizar dos mesmos critérios aplicados para estabelecer a indenização pelo dano material. Portanto, nesses casos, cabe ao julgador realizar um juízo de valor, observando certos princípios e valores que norteiam o Direito do Trabalho.
Desta forma, observa-se que o art. 223-G da Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,198 merece uma análise mais aprofundada no presente estudo, tema sobre o qual discorre-se a seguir.
3.3.2 Inconstitucionalidade do art. 223-G da CLT – Lei 13.467/2017
A Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,199 trouxe alterações a CLT,200 estando entre estas mudanças o art. 223-G, que trata da indenização por dano moral, conhecido também como dano extrapatrimonial, estabelecendo o sistema tarifário.
Teixeira201 lembra que a partir do momento em que entrou em vigor a Lei 13.437/2017,202 quando se tratar de danos extrapatrimoniais advindos de relações de trabalho, não mais o Direito Comum pôde ser aplicado, pois é expresso na referida Lei em seu art. 223-A que “apenas” serão aplicados os novos dispositivos.
Neste contexto, salienta-se que a indenização por danos extrapatrimoniais já era prevista na CRFB/88203 e pelo Código Civil,204 mas não era previsto expressamente no Direito do Trabalho, onde o art. 223-G promoveu parâmetros e critérios visando amparar o magistrado para fixar o valor da indenização do dano extrapatrimonial.
Como afirma De Melo:205
[…] não existem critérios objetivos definidos em lei, de modo que o julgador acaba por buscar supedâneo na doutrina e na jurisprudência para aferir a configuração ou não do dano moral. O que precisa haver na avaliação do dano moral é prudência e bom-senso, para que se possa, considerando o homem médio da sociedade, ver configurada ou não a lesão a um daqueles bens inerentes à dignidade humana de que a Constituição nos fala.
Ressalta-se que o sistema tarifário preconizado pelo §1º do art. 223-G 206da CLT, resultou em divergências sobre sua constitucionalidade, por não se adequar a determinados Princípios Constitucionais, como o da Isonomia ou Igualdade Material, Proporcionalidade, da Proteção, o da Norma mais favorável, o da Inviolabilidade Moral nas Relações de Trabalho, o da Dignidade humana e o da Razoabilidade.
Segundo o que relata Marin:207
[…] no que se refere à responsabilidade civil, a reparação do dano moral por intermédio da via pecuniária, pretende sancionar a violação do seu direito, tendo em vista que essa reparação terá, para a vítima, meramente a função de atenuar as consequências sofridas, mas nunca exercer uma função de equivalência.
Moraes208 explana que em relação aos danos morais, os atributos utilizados para repará-los, basicamente constam da repercussão social do dano, da reprovação da conduta realizada, da demonstração da gravidade da culpa do agressor, bem como das condições financeiras de quem ofende.
Marin209 pontua que as controvérsias em relação ao sistema tarifário, se originaram, devido ao fato de que se o cálculo da indenização é baseado no último salário do empregado, um mesmo dano pode resultar em valores diferenciados para outros trabalhadores, ou seja, trabalhadores que atuam em pequenas empresas, devido a menores salários, obterão valores de indenização menores do que os que trabalham em grandes empresas, sendo que a hierarquia presente nas empresas também afeta a questão salarial.
Assim, este atributo traz uma afronta ao que estabelece o inciso V do art. 5º da CRFB/88,210 que estabelece direito de resposta proporcional ao agravo, pois o sistema tarifário, ao ter como base o último salário do empregado, faz com que ofendidos recebam indenizações diferentes, o que contraria o art. 5º da CRFB/88,211 que estabelece que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, afrontando também o Princípio da Isonomia, pois gera discriminação de empregados, conforme os salários recebidos.
Neste contexto, Marin212 relata que:
Levando em consideração que o princípio da isonomia reconhece que as pessoas são diferentes umas das outras, e, por esse motivo, devem ser tratadas de forma desigual na medida de sua desigualdade, num primeiro momento é possível pensar que seria plausível a criação de uma tabela especificando o valor a ser pago a cada tipo de dano moral admitido no ordenamento jurídico. No entanto, ao se admitir essa forma de reparação se aceita o fato de um mesmo dano moral enseja indenizações diferentes devido ao salário recebido.
Ao proferir-se sobre esta questão, Marin213 afirma que também é ofendido o Princípio da Proporcionalidade, pois tal princípio diz que se mostram necessárias respostas proporcionais ao dano, mas o sistema tarifário não promove uma correlação entre meios e fins, contrariando também o Princípio da Proteção, que busca trazer um equilíbrio na relação entre empregador e empregado e o da Norma mais Favorável, pois entende-se que tal norma não é favorável ao empregado ofendido.
Em relação ao que estabelecem os demais artigos da Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017,214 quais sejam, 223-B, 223-C, 223-E e 223-F, que tratam da reparação do dano extrapatrimonial ligado às relações de trabalho, Teixeira215 diz que:
O artigo 223-B passa a limitar o direito de reparação somente ao ofendido. Assim, seus sucessores e dependentes não mais podem pleitear a indenização. Os artigos 223-C e 223-D passam a estabelecer, de forma taxativa, quais são os bens juridicamente tutelados por esse instituto, tanto para pessoas físicas, quanto para pessoas jurídicas. Observe-se que diversos direitos de personalidade não foram elencados nos referidos dispositivos, permanecendo, portanto, desprotegidos juridicamente. O artigo 223-E determina quem são os responsáveis pelo dano extrapatrimonial, definindo ainda a possibilidade de responsabilidade solidária e subsidiária, de forma que aqueles que lesaram outrem sejam condenados a indenizá-lo de forma equitativa e proporcional. Imperioso salientar que a responsabilidade objetiva não foi contemplada pela novel legislação. Já o artigo 223-F e seus parágrafos, definem a possibilidade de cumulação entre danos materiais e extrapatrimoniais.
Nota-se que o art. 223-B exclui a possibilidade de benefícios aos sucessores do ofendido, retirando seus direitos a indenização e os arts. 223-C e 223-D listam os bens jurídicos que podem ser tutelados pela Lei, deixando de trazer importantes direitos personalíssimos das pessoas, os quais ficaram desprotegidos, sendo que o art. 223-E determina os responsáveis pelo dano extrapatrimonial e o art. 223-F traz a possibilidade de cumular danos patrimoniais e extrapatrimoniais.
Desde a promulgação da Reforma trabalhista, o artigo 233 vem recebendo diversas críticas, com referência ao seu conteúdo. Diante de tal situação, o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região, no ano de 2019, editou a súmula 48216, veja-se:
SÚMULA Nº 48 - ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE. ART. 223-G, § 1º, I A IV, DA CLT. LIMITAÇÃO PARA O ARBITRAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO EXTRAPATRIMONIAL. INCOMPATIBILIDADE MATERIAL COM A CR/88.INCONSTITUCIONALIDADE. É inconstitucional a limitação imposta para o arbitramento dos danos extrapatrimoniais na seara trabalhista pelo § 1º, incisos I a IV, do art. 223-G da CLT por ser materialmente incompatível com os princípios constitucionais da isonomia e da dignidade da pessoa humana, acabando por malferir também os intuitos pedagógico e de Reparação integral do dano, em cristalina ofensa ao art. 5º, V e X, da CR/88.
Assim, observa-se divergências aos arts. 223-A e seguintes da Reforma Trabalhista sobre a indenização por danos extrapatrimoniais, desde a inconstitucionalidade frente ao desrespeito a Princípios Constitucionais e do Direito do Trabalho, a Carta Magna brasileira confere igualdade/isonomia aos cidadãos, brasileiros ou não.
Nesta seara, cabe um exemplo, dois trabalhadores poderiam receber indenizações semelhantes, mesmo que os danos sofridos sejam tangencialmente distintos, isso ocorreria pelo fato de o juízo não poder conferir ao trabalhador mais lesado a indenização que lhe seria correta, afastando, assim, a atividade jurisdicional do ideal de justiça.
Neste diapasão Valente217, Relator do procedimento que originou a súmula supra, argumenta que:
Um dano de natureza grave causado a um empregado cujo último salário contratual fosse de R$ 1.500,00 seria fixado em, no máximo, vinte vezes tal montante, resultando em uma indenização máxima de R$ 30.000,00. Lado outro, o mesmo dano, acaso ocorrido com um trabalhador cujo último salário contratual fosse de R$ 4.000,00, poderia acarretar a fixação de uma indenização máxima de R$ 80.000,00, sendo inegável a disparidade entre os montantes ora exemplificados.
Tem-se desta forma, concluído o presente trabalho de pesquisa, onde constatou-se ao longo do mesmo a discrepância inconstitucional em relação ao trabalhador que percebe pouca remuneração, sendo assim, passa-se as considerações finais.