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Direito do Trabalho, terceirização e contratos de fornecimento industrial.

Notas sobre a responsabilidade jurídica de clientes e fornecedores

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V. UM CASO PARTICULAR: CONTRATOS DE FORNECIMENTO DE SUCATA

Na indústria metalúrgica — e muito especialmente na indústria automotiva —, são recorrentes os contratos de compra e venda de sucata ferrosa, que podem ou não possuir uma cláusula de fornecimento de sucata prensada em favor do vendedor (e, nesse caso, o vendedor geralmente será a própria unidade montadora automotiva). Em relação à empresa que recebe a sucata prensada, o contrato perfaz modalidade de terceirização material. À vista do que se discutiu no tópico anterior, pode-se desde logo afirmar que não é essa a terceirização a que se reporta a Súmula 331, IV, do C.TST; tampouco há respaldo legal para o reconhecimento da responsabilidade subsidiária do vendedor que readquire sucata prensada, se o comprador-fornecedor possui autonomia gerencial e relações comerciais com terceiros (assim, e.g., quando vende sucata prensada a outras montadoras, à indústria siderúrgica ou à construção civil). Como se sabe, a responsabilidade subsidiária nada mais é que uma espécie de responsabilidade solidária abrandada pelo benefício de ordem [28]. Tal responsabilidade impõe-se ao tomador de serviços quando a empresa prestadora de serviços funciona como comitida (artigo 932, III, do NCC), oportunizando-se, da parte da empresa-cliente (comitente), a "culpa in vigilando", a "culpa in eligendo" e/ou a "culpa in omittendo" [29]. Não será o caso, porém, se o comprador-fornecedor desenvolve atividade econômica espontânea e independente [30], assumindo apenas obrigações de fim (e.g., fornecer sucata prensada), não obrigações de meio.

Com efeito, se a empresa de sucata assume todos os custos da prensa e do fornecimento da sucata semimanufaturada, sua atividade econômica pressupõe um gerenciamento autônomo. Seus trabalhadores terão de realizar atividades laborais nas dependências da unidade vendedora, já que a responsabilidade pela coleta da sucata ferrosa é do comprador; mas, nem por isso, dir-se-á que prestam serviços àquela unidade. Tampouco há, nessa etapa, terceirização pessoal. Em típicos contratos de terceirização pessoal, a empresa-cliente ("in casu", a unidade montadora) remunera a empresa prestadora de serviços pela realização de serviços pessoais indissociáveis da unidade produtiva (supra, item IV); já nos contratos de compra e venda de sucata ferrosa com cláusula de fornecimento de sucata prensada, é o comprador-fornecedor quem remunera a unidade montadora, pagando-lhe pela sucata coletada e compensando pagamentos conforme lhe forneça a sucata prensada. Ademais, quando o fornecimento efetivamente se consuma (porque a cláusula cria, para quem vende a sucata bruta, uma faculdade e não uma obrigação), a unidade montadora limita-se a incorporar,às suas linhas de produção, bens semimanufaturados produzidos por terceiro,mediante a respectiva compensação financeira. Perfaz-se, aí, modalidade de terceirização material (não de serviços), que — ressalvados os contextos de fraude — tampouco enseja responsabilidade patrimonial subsidiária da unidade. É certo que uma fase do processo produtivo (a do prensamento de sucata ferrosa bruta) estará sendo acometida à empresa compradora-fornecedora; mas seus empregados não integram a organização básica da unidade produtiva (conquanto devam ocupar algum espaço físico para fins de coleta) e não se promiscuem com as redes hierárquicas da empresa-anfitriã.

Nos contratos sinalagmáticos, há sempre dependência recíproca de obrigações, com atribuições prestacionais a todas as partes [31]. É também o que se verifica nos contratos de terceirização. O tomador de serviços, na terceirização pessoal, é quem paga o preço (daí se falar, nas fraudes, em «marchandage» de força de trabalho). Já nos contratos de compra e venda de sucata bruta com cláusula de fornecimento de sucata prensada, o preço (da sucata) é pago pelo comprador-fornecedor, ao valor de mercado, com reajustes periódicos de mercado. Em sendo assim, não há mascaramento de remuneração indireta de serviços. Esclarece-se, ademais, o eixo de interesses e o sinalagma próprio dessa relação contratual (o que sinaliza para a sua função social — artigo 421 do NCC): à empresa de sucata interessa comprar (para processar e revender), conquanto assuma compromisso anexo de fornecer sucata prensada, segundo as necessidades do vendedor; e à unidade automotiva interessa vender, beneficiando-se, em paralelo, com o fornecimento de sucata semimanufaturada em condições mais vantajosas. Essa é — deve ser — a causa objetiva do negócio jurídico; e não, à evidência, a subcontratação de mão-de-obra. A coleta de sucata bruta não pode ser considerada propriamente um "serviço" prestado à unidade produtiva (embora, de fato, possa lhe interessar do ponto de vista gerencial); do contrário, ter-se-ia de afirmar, sobre a eliminação mesma de despojos e rejeitos industriais, tratar-se de uma atividade-meio, atrelada à consecução de sua finalidade social (resultando disso uma insólita responsabilidade subsidiária das unidades produtivas pelos créditos trabalhistas de lixeiros e coletores públicos, por exemplo...). Despojamentos e dejeções não configuram atividades econômicas típicas; atipicamente, a atividade de coleta de rejeitos pode, sim, implicar em responsabilidade trabalhista subsidiária de quem a contrata, desde que o contrato tenha por objeto principal o serviço e não o próprio rejeito (que, do contrário, deixa de ser "lixo" e passa a figurar como mercadoria — «pretium» vs. «merx»).

Desfechando o raciocínio, releva evocar o magistério de PEDRO VIDAL NETO, para quem a figura da terceirização, encontradiça tanto na produção de componentes do produto final (modalidade que, neste texto, designei por terceirização material) como na execução de serviços (o que aqui designei por terceirização pessoal), somente se caracteriza

quando inserida como etapa regular no processo de produção de uma empresa, poupando-a de obtê-los com a utilização de seus próprios equipamentos e de seu próprio pessoal [32].

Como antes asseverado, a eliminação de rejeitos não é atividade econômica típica e, por não ser, não integra, como etapa regular, o processo de produção propriamente dito. Antes, é dele uma conseqüência indesejável. Mal comparando, é como a função biológica excretora: ela não "integra" a atividade energética dos organismos, conquanto seja uma "conseqüência" da função digestiva. No caso da coleta de lixo ou rejeitos, dir-se-á que houve comissão de serviços (para os efeitos do artigo 932, III, do NCC, e a conseqüente inteligência da Súmula n. 331, IV, do TST) apenas quando a unidade produtora dos rejeitos contrata uma empresa para o seu específico despojamento, sem o qual a atividade econômica final sofreria sensíveis prejuízos. Nos contratos de compra e venda de sucata ferrosa (com ou sem cláusula de fornecimento), não parece ser esse o caso.

Pode, contudo, dar-se a fraude em tais contratos?

Evidentemente que sim. Haverá fraude quando os trabalhadores da empresa de sucata inserirem-se na organização da empresa "vendedora", subordinando-se — direta ou indiretamente, formal ou informalmente — aos prepostos dessa última. Haverá fraude, quando o "pagamento" da sucata não observar os preços de mercado ou os reajustes do segmento, mas evoluir conforme o número de trabalhadores designados para a coleta (mascaramento de paga à cessão de mão-de-obra). Haverá fraude, enfim, quando o pagamento do preço da sucata for um pagamento "virtual": na prática contábil — a ser, de regra, transparecida em sede de prova pericial —, somente o "comprador-fornecedor" recebe entradas em dinheiro ou equivalente, ao argumento de que o valor de fornecimento de sucata prensada supera, sistematicamente, o preço de venda da sucata bruta (e, nesse caso, cumprirá investigar se a simulação acoberta apenas uma terceirização material ou se mascara, mesmo, uma terceirização pessoal de coleta de despojos). Em todas essas hipóteses — exceto, na última, se houver mera terceirização material —, a empresa-cliente (que, no contrato, figura como "vendedora") deve responder pelos créditos trabalhistas dos empregados da "compradora", seja como real empregadora (na contingência do binômio subordinação jurídica/pessoalidade estrita, ut artigo 3º/CLT), seja como devedora solidária (artigo 942/NCC). Dá-se, por essa via, concreção justa e oportuna ao princípio da primazia da realidade.


VI. CONCLUSÕES

A marcha da grande empresa rumo aos mecanismos de desconcentração e «downsizing» — entre os quais, por excelência, a terceirização (material e pessoal) — é uma marcha indelével e implacável. Traduz, a um tempo, o espírito "desencarcerador" da terceira onda (TOFFLER) e a coadjuvação universal do mundo plano (FRIEDMAN).

Nesse encalço, pode-se antever o incremento do volume de contratos de fornecimento industrial que, na prática, desopilam a atividade produtiva, "destacando" certas fases do processo de produção (externalizações). Quando não mascaram típicas relações de emprego com a empresa-cliente, tais contratos são lídimos e não desafiam a inteligência da Súmula 331, IV, do C.TST, porque não há, a rigor, «prestação de serviços», mas fornecimento de bens que se integram à linha de produção no estado em que se encontram.

Em casos mais complexos, as partes contratantes podem alternar posições. Assim é, p.ex., com os contratos de compra e venda de sucata ferrosa bruta com cláusula de fornecimento de sucata semimanufaturada: o comprador, a certa altura ou sob certas condições, faz as vezes de fornecedor, enquanto o vendedor faz as vezes de cliente ou tomador. Tais hipóteses demandam especial atenção, uma vez que, em tais esquemas, as fraudes — quando existem — são mais sofisticadas e demandam, de regra, maior energia na atividade processual probatória. Os contratos industriais atípicos, quando mascaram relações de emprego ou mesmo terceirizações pessoais de atividades-meio, encaminham fraudes e reclamam tratamento judicial pedagógico, à maneira da exegese vazada no item I da Súmula 331 do C.TST (formação direta de vínculo empregatício com a empresa-cliente e/ou responsabilidade solidária). Há que ver, todavia, que nem sempre a complexidade traz consigo o ardil ou a intenção de logro.

A temperança é, sempre, uma virtude. A saudável malha hermenêutica de proteção que a Justiça do Trabalho içou em derredor dos contratos de emprego, a partir de um arcabouço legislativo igualmente tuitivo, não pode infinitizar irrefletidamente os elos de responsabilidade, ignorando as tendências da sociedade pós-industrial e elegendo "pagadores" à margem dos princípios e das regras que conferem racionalidade ao Direito objetivo.

Nessa epopéia, sejamos Teseu — e não Ícaro.


VII. BIBLIOGRAFIA

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Notas

01 Sirva, como paradigma, a sentença prolatada nos autos do processo n. 201/2000-2 (1ª Vara do Trabalho de Taubaté), aos 12 dias de julho de 2000.

02 Dicionário Jurídico, Academia Brasileira de Letras Jurídicas, 4ª ed., São Paulo, Forense Universitária, 1996, p.195 (verbete «Contrato de Fornecimento»).

03 É conhecido, e.g., o caso de Franca (SP), que suscitou medidas judiciais por parte do Ministério Público do Trabalho (Procuradoria da Décima Quinta Região) na década de noventa. Mais recentemente, em sua edição de n. 63, a Revista Comércio Exterior – Informe BB noticiou os arranjos produtivos locais (APL) que têm favorecido a microempresa calçadista no Município de São João Batista (SC): "Cerca de 30% da força de trabalho concentra-se nas famílias locais. O arranjo está organizado para que os produtos passem de família em família e, a cada etapa, os calçados comecem a ganhar forma. Por exemplo, uma se encarrega de cortar as palmilhas, outra de fazer o solado e assim sucessivamente. Há grande interação ao longo do processo. [...] O aspecto familiar retrata uma realidade comum aos APLs: ser uma solução eficaz para empreendimentos de pequeno porte" (Comércio Exterior – Informe BB, Brasília, Banco do Brasil, janeiro/fevereiro de 2006, n. 63, ano 14, pp.22-23). Sobre ser uma engenhosa solução para otimizar produção e vendagem de micro e pequenas empresas, uma versão deformada desse modelo já engendrou "arranjos" similares, porém associados a uma empresa-mãe, de cujos quadros foram destacados os novos "empresários", que passam a terceirizar etapas do ciclo produtivo em suas próprias casas, valendo-se da mão-de-obra de esposas, filhos e agregados. Consubstancia-se, em tais hipóteses, perniciosa fraude, que lesa os direitos dos trabalhadores e compromete a própria formação das crianças e adolescentes envolvidos.

04 Comissão, com efeito, deriva do latim "commissio" e pode ser compreendida como o "ato de encomendar, cometer ou exercer encargo ou incumbência", enquanto comissário, comitido ou preposto é aquele que "desempenha uma comissão" — cfr. Dicionário Jurídico, pp.157-159 (verbetes «Comissão», «Comissário» e «Comitido»). Em termos gerais, a figura dispensa a existência de uma procuração ou carta de comissão formais.

05 Que, no Brasil, normalmente tem caráter temporário (artigo 10 da Lei n. 6.019/74), sob pena de se conformar vínculo empregatício diretamente com a empresa tomadora (Súmula 331, I, 1ª parte, do C.TST). Afora esse caso, há hipóteses muito particulares de autorização legal ou regulamentar de terceirização de atividades-fim por tempo indeterminado, como se dá no setor de telecomunicações (artigo 94, II, da Lei 9.472/1997) e no setor bancário (Resolução BACEN n° 2166, de 30.06.1995); são todas, porém, de constitucionalidade duvidosa (especialmente a última).

06 Alvim Toffler, The third wave, Londres, Pan Books, 1981, pp.64-68.

07 Idem, ibidem. Cfr. também, para uma leitura crítica da tese toffleriana, Raffaello Merli, "Toffler: A Terceira Onda", in A Sociedade Pós-Industrial, Domenico de Masi [org.], trad. Anna Maria Capovilla et al., 2ª ed., São Paulo, Editora SENAC, 1999, pp.183-192.

08 Na dicção de RAFFELLO MERLI, "no mundo industrial milhões de homens começam e terminam sua jornada de trabalho no mesmo momento, comem, jogam, dormem e fruem espetáculos segundo uma cadência temporal definida e sincronizada. Milhões de crianças começam e terminam seus estudos no mesmo período. Nos Estados Unidos, na União Soviética, em Cingapura e na Suécia, na França e na Dinamarca, na Alemanha e no Japão, milhões de famílias cumprem as mesmas atividades no mesmo instante e programam diariamente a sua vida de trabalho, sua vida familiar e seu tempo livre com uma sincronização que na first wave [sociedade rural] era absolutamente impensável" (Raffaello Merli, op.cit., p.186).

09 TOFFLER vai adiante e refere a concentração dos delinqüentes, detidos nas prisões; dos doentes mentais, nos manicômios; das crianças, nas escolas; e dos trabalhadores, nas fábricas. Termina por chamar o século XIX como o período do «Grande Encarceramento» (op.cit., p.67).

10 Estatui o artigo 233º que, "para efeitos deste Código, considera-se teletrabalho a prestação laboral realizada com subordinação jurídica, habitualmente fora da empresa do empregador, e através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação". Já pela definição, vê-se ser, mesmo, um fenômeno típico da terceira onda toffleriana. Tal conceito soa bizarro na perspectiva ideológica do modelo fordista (= segunda onda), em que a subordinação jurídica exsurge como um mero corolário tecnológico do binômio concentração-centralização, que determinou o paulatino «encarceramento» dos trabalhadores nas fábricas (vide nota anterior).

11 "A terceirização do trabalho é considerada por muitos como a principal estratégia da reestruturação produtiva, pois, ao mesmo tempo em que ela permite uma recomposição das taxas de lucro pelas empresas, oferece também aos capitalistas um maior controle sobre a força de trabalho. [...] Embora já existisse tanto na indústria como no setor de serviços, a terceirização ganha o patamar de estratégia fundamental do capital a partir da década de 1970, quando da expansão dos princípios toyotistas de gestão e organização do trabalho e da produção. [...] Gestado no pós Segunda Guerra no Japão, o toyotismo se amplia no ocidente em resposta à crise nas taxas de lucro e no domínio sobre os trabalhadores, marcados, respectivamente, pelo choque do petróleo de 1973 e as manifestações de maio de 1968. Para além de uma simples introdução de novas tecnologias, o toyotismo reorganiza a produção e implementa uma nova forma de relação entre capital e trabalho. Seu sucesso depende, em grande medida, de um consentimento ativo dos trabalhadores com a empresa e a produção; além de não questionar, eles também participam, sugerem, e buscam a otimização da qualidade e da produtividade. Uma das conseqüências imediatas para a organização dos trabalhadores é que o toyotismo combate o sindicalismo classista ou qualquer forma de organização e mobilização que coloque em oposição trabalhadores e patrões" (Paula Regina Pereira Marcelino, "Terceirização do Trabalho no Brasil e na França", in Anais do II Simpósio do GEPAL — Grupo de Estudos de Política da América Latina (http://www.uel.br/grupo-pesquisa/gepal/segundogepal/PAULA%20REGINA%20PEREIRA%20MARCELINO.pdf — acesso em 22.02.2007). Para uma visão completa das conexões entre terceirização e toyotismo, cfr., ainda, Maria da Graça Druck, Terceirização: (des)fordizando a fábrica, São Paulo, Boitempo Editorial, 1999, passim. Com efeito, uma das características históricas do toyotismo, na contramão do fordismo (em virtude das especificidades do mercado consumidor japonês no pós-guerra), foi a mecanização flexível voltada à produção para mercados muito segmentados (o que inviabilizava uma especialização de padrão taylorista, de funções únicas e restritas). Essa demanda segmentada determinou produções pequenas e sem estoques (sistema just-in-time), agregando empresas menores ao redor de "empresas-mãe" que externalizavam segmentos do processo produtivo para reduzir plantas e estruturas. Conseqüentemente, o modelo de produção toyotista reconhece-se hodiernamente como aquele cujos elementos distintivos clássicos são a automatização, o just-in-time (estoque zero), o trabalho em equipe, a administração por estresse, a flexibilização da mão-de-obra («shejunka»), a gestão participativa, o controle de qualidade total e a subcontratação. O toyotismo representa, por assim dizer, a ponte de transição entre o fordismo convencional da segunda onda e as células produtivas da terceira onda.

12 Op.cit., pp.267-270.

13 Idem, pp.272-273.

14 Cfr. Thomas L. Friedman, O Mundo é Plano: Uma Breve História do Século XXI, trad. Cristiana Serra, S. Duarte, Rio de Janeiro, Objetiva, 2005, pp.15-17.

15 Idem, pp.333 e 336 (negritos no original). No Brasil, infelizmente, essas "melhores" geralmente não são as maiores, nem tampouco as mais numerosas (mesmo porque se deu ênfase desmedida às terceirizações de pessoal, com elevada incidência de fraudes). Nem por isso, convirá desconhecer a terceirização como um dado socioeconômico tendencial da nossa realidade. Ignorar a direção da corrente não muda o curso dos barcos.

16 Idem, ibidem (negritos no original). Trata-se da Regra n. 7 do Programa "Como as Empresas se Ajustam" (ao mundo plano); os negritos da nota anterior correspondem à Regra n. 6. A propósito, BENEDICT ARNOLD (1741-1801) foi o mais célebre dos traidores da Guerra da Independência norte-americana a engrossar fileiras britânicas. Em julho de 1780, assumiu o comando do forte americano em West Point (New York) com o objetivo de rendê-lo às forças inglesas, tendo sido desmascarado antes de lograr seu intento.

17 Luiz Carlos Amorim Robortella, "Terceirização ¾ Tendências em Doutrina e Jurisprudência", in Direito do Trabalho: Estudos em homenagem ao Prof. Luiz de Pinho Pedreira da Silva, Lélia Guimarães Carvalho Ribeiro, Rodolfo Pamplona Filho (coord.), São Paulo, LTr, 1998, pp.312-320.

18 Nesse sentido, confira-se, por todos, Arthur Nikisch, Arbeitsrecht: Allgemeine Lehren und Arbeitsvertragsrecht, 3. Aufl., Tübingen, J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), 1961, I Band, pp.162 e ss. "Gemeinschaftsverhältnis" significa, em tradução livre, "vínculo comunitário" (tal seria a natureza da relação sociojurídica instaurada, no contrato de trabalho, entre os empregados e a empresa empregadora).

19 Robortella, op.cit., p.313.

20 Dispõe o artigo 4º da Convenção n. 158/OIT (que o Brasil ratificou no plano internacional, aprovou pelo Decreto Legislativo n. 68/92, promulgou pelo Decreto n. 1855/96 e depois denunciou pelo Decreto 2.100/96...): "Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço" (g.n.).

21 Diga-se, por oportuno, que esse caráter pessoal não induz, nem pode induzir, à pessoalidade estrita do artigo 3º, caput, da CLT (que impediria, p. ex., a substituição de trabalhadores sem o conhecimento e/ou a autorização estrita da empresa-cliente). «Natureza pessoal», aqui, significa que a prestação de serviços pressupõe a presença física das pessoas nas dependências da empresa-cliente. Caso se identifiquem, em contextos de terceirização, vínculos de pessoalidade estrita com a empresa tomadora, conformar-se-á com ela o vínculo empregatício, por aplicação dos artigos 3º e 9º da CLT e interpretação "a contrario" da Súmula 331, III, "in fine", do C.TST. É — outra vez — o que se verifica, amiúde, nas terceirizações de atividades-fim. Para a distinção entre a pessoalidade estrita do artigo 3º/CLT e a pessoalidade mínima que caracteriza os serviços delegados em terceirizações pessoais e a própria «relação de trabalho» (não-subordinado) sujeita à competência da Justiça do Trabalho (artigo 114, I, da CRFB, na redação da EC n. 45/2004), veja-se, de nossa lavra, "Justiça do Trabalho: nada mais, nada menos", in Justiça do Trabalho: Competência Ampliada, Grijalbo Fernandes Coutinho, Marcos Neves Fava (coord.), São Paulo, LTr Editora, 2005, pp. 116-147.

22 Sobre a definição do «franchising» como modalidade de terceirização, cfr., por todos, Robortella, op.cit., pp.313-314.

23 Conforme a notícia de ROBORTELLA, "a terceirização constitui um dos dados essenciais da moderna organização empresarial, estando já difundida em todo o mundo. Desde 1994, pelo menos, se realizam na Europa feiras de subcontratação; na França, diz-se que o mercado da subcontratação atingiu, em 1993, 45 bilhões de dólares; no continente europeu, 260 bilhões de dólares (Gazeta Mercantil de 9.11.94)" (op.cit., p.314).

24 Vide, supra, nota n. 3 (parte final).

25 Op.cit., p.315 (g.n.).

26 Valentim Carrion, Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, 21ª ed., São Paulo, Saraiva, 1996 (agosto), pp.293-294 (g.n.).

27 No caso da locação ou cessão de estabelecimento, todavia, pode-se — e deve-se — discutir a responsabilidade da empresa locadora/cedente em contextos de sucessão empresarial (artigo 2º, §2º, da CLT). Entendo, e tenho decidido, que "a responsabilidade do sucessor não exclui a responsabilidade do sucedido. Com efeito, não se dá, com a sucessão, a exoneração do sucedido. Firma-se, antes, a solidariedade passiva entre sucedido e sucessor, quanto a todos os créditos trabalhistas havidos em face do primeiro. Outro entendimento importaria em exegese «in pejus» de norma legal tuitiva, contra a melhor hermenêutica («odiosa restringenda, favorabilia amplianda»). Não por outra razão, «mutatis mutandi» (com relação à Rede Ferroviária Federal S/A), o Pleno do C.TST pacificou que a sucedida (RFFSA) responde subsidiariamente pelos direitos trabalhistas referentes a contratos rescindidos após o contrato de concessão, além de responder integralmente pelos contratos de trabalho rescindidos antes da entrada em vigor da concessão (e apesar dela) [O.J. n. 225 da SDI-1/TST, na redação de 18.04.2002, anterior à atual, de 20.04.2005]. Não cabe dizer, aqui, que a solidariedade "decorre da lei ou da vontade das partes", porque o enfoque há de ser outro: não há, na legislação trabalhista, qualquer cláusula de exoneração do devedor originário (sucedido) ¾ logo, sua responsabilidade (principal) remanesce incólume, convivendo com outra responsabilidade principal, dada pela lei (artigos 10 e 448 da CLT). Concomitantes duas responsabilidades principais concentradas em dois sujeitos distintos (Schuld comum, Haftung desdobrado), não há outro instituto se não a solidariedade passiva" (excerto da sentença prolatada, em 30.09.2003, nos autos do processo n. 943/2002-4 da 3ª Vara do Trabalho de Campinas; negritos no original). Em sentido semelhante, confira-se, ainda, o magistério de EDILTON MEIRELLES: "A sucessão trabalhista não isenta a empresa sucedida pelos débitos constituídos até a data do trespasse se o empregado não concorda com a cessão do débito (...) O sucedido continuaria responsável pela satisfação de seus débitos, constituídos até a data da sucessão, já que a cessão de seu débito não surte efeito em relação ao empregado, enquanto que a empresa sucessora, com o trespasse, assumiria também a posição de devedora (...) Nestes casos (...) surgiria a responsabilidade solidária por parte da empresa sucessora na hipótese desta assumir a dívida através da negociação mantida com o sucedido" (Edilton Meireles, "Sucessão trabalhista e assunção de dívida: da solidariedade empresarial", in Revista LTr, São Paulo, v.60, n.5, p.621, 05/1996 — g.n.).

28 Nesse sentido, cfr., recentemente, o Ac. TRT 9ª Reg. RO n. 00467-2005-671-09-00-0, 2ª T. (n. 30749/06), rel. Juíza MARLENE T. FUVERKI SUGUIMATSU, in DJPR 27.10.2006, p.690.

29 A subsidiariedade, "in casu", decorreu historicamente da aplicação analógica do artigo 455, caput, da CLT (subempreitada) às hipóteses de terceirização pessoal. Nesse sentido, confira-se, por todos, Francisco Antonio de Oliveira, Comentários aos Enunciados do TST, 4ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, pp.814-815.

30 O que é perfeitamente possível, mesmo em se tratando de «empresas orbitais» (supra, tópico IV). Do contrário, todo o modelo de produção toyotista — baseado em produções pequenas, estoque zero e conglomerados produtivos de unidades complementares (supra, nota n. 11) — seria uma imensa fraude.

31 Cfr., por todos, Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil, 6ª ed., São Paulo, Atlas, 2006, v. 2, p.390. Diz-se "todas", porque também são sinalagmáticos, em maioria, os contratos multilaterais (i.e., com três ou mais partes), como é o de sociedade.

32 Pedro Vidal Neto, "A terceirização perante o Direito do Trabalho", in Direito e Processo do Trabalho, Estevão Mallet, Luiz Carlos Amorim Robortella (coord.), São Paulo, LTr, 1996, pp.91-92 (g.n.).

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Sobre o autor
Guilherme Guimarães Feliciano

Professor Associado II do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Juiz Titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté/SP. Doutor pela Universidade de São Paulo e pela Universidade de Lisboa. Vice-Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FELICIANO, Guilherme Guimarães. Direito do Trabalho, terceirização e contratos de fornecimento industrial.: Notas sobre a responsabilidade jurídica de clientes e fornecedores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1336, 27 fev. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9538. Acesso em: 2 nov. 2024.

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