A morte do menor João Hélio (ocorrida no Rio de Janeiro) encorajou o Congresso Nacional a aprovar mais um pacote de leis penais. Os menos avisados podem crer que isso faria reduzir os nossos endêmicos índices de criminalidade. Na verdade, quem "vende" essa idéia está fraudando a população. Mudanças legislativas pouco ou nada alteram a política de prevenção do delito. Como sempre, nenhuma medida foi aprovada para combater as causas da violência nacional (desorganização social, menores sem escola, jovens desempregados etc.). As leis penais, não se pode esquecer, são costumeiramente paliativas (simbólicas). Acalmam a momentânea ira da população (e da mídia) mas nada resolvem concretamente nem a médio nem a longo prazo.
Posse de celular pelo preso: logo após a primeira onda de ataques do PCC (maio de 2006) o Senado Federal, no dia 17.05.06, aprovou um pacote de medidas para contenção da violência ("pacote antiviolência"), destacando-se, dentre elas, o PLS 136/06, que transformava em falta grave a utilização de telefone celular pelo preso.
A Câmara dos Deputados, no dia 14.02.07, segundo a Agência Câmara, foi além: mais do que falta grave, criminalizou, com pena de três meses a um ano de detenção, o fato de o preso portar, usar ou fornecer aparelhos telefônicos, de radiocomunicação ou outro meio de comunicação eletrônico ou similar. Se o projeto se transformar em lei (depende ainda de aprovação no Senado Federal), diretores de presídios e outros agentes públicos também poderão ser condenados por omissão caso os presos sejam surpreendidos com celulares.
Na atualidade a posse de celular no presídio não constitui falta grave (o STJ, a propósito, chamou atenção para esse fato no REsp 825.507-SP). Cuida-se, portanto, de inovação legislativa necessária, porque há efetivamente uma lacuna no ordenamento jurídico brasileiro. Mas não se pode pensar que isso venha a contribuir decisivamente para o controle da criminalidade organizada.
Progressão de regime nos crimes hediondos: de acordo com o projeto aprovado pela Câmara dos Deputados, no caso de crime hediondo a progressão passa a exigir 2/5 (40%) da pena total, quando o réu for primário, e 3/5 (60%) se se trata de reincidente. É justo exigir do criminoso hediondo mais tempo de cumprimento da pena para o efeito da progressão. Mas seria bom que todos soubessem dos efeitos colaterais que isso gera: o preso fica mais tempo na cadeia (demanda mais custos), pode mais convictamente passar a compor o crime organizado etc.
Aumento de penas nos delitos que envolvem menores: outra medida aprovada diz respeito ao aumento de penas nos delitos em que um maior acaba envolvendo um menor nas empreitadas delituosas. O legislador quando aprova algo nesse sentido (aumento de pena) parte de uma premissa totalmente falha: ele supõe que o criminoso fica calculando o tempo de pena para o efeito de decidir (ou não) pela realização do delito. Ele imagina que o criminoso primeiro olha o Código Penal para depois deliberar (ou não) pelo cometimento da infração. Nada mais equivocado!
Leis desse tipo são puramente simbólicas, ou seja, o legislador tem consciência de que em nada ajuda no combate ao delito, mas mesmo assim as aprova (com o objetivo claro de acalmar a ira da população). More and more of the same!
O pacote de endurecimento da legislação penal ainda não acabou. Nos próximos dias nossos legisladores devem discutir e aprovar novas leis. De qualquer modo, sabe-se que em nada mudarão a realidade. Logo, leis e mais leis não passam de um tipo de ilusionismo, que é bastante pernicioso para a nação brasileira, visto que vai adiando (protelando) as verdadeiras decisões relacionadas com nosso cruel estado de violência generalizada. O problema do crime é um problema que deve envolver toda sociedade (ele nasce na sociedade e só pode ser resolvido pela sociedade civil e estatal).
Urgentemente temos que voltar nossa atenção para a construção de uma política preventiva séria, que implica a adoção de medidas primárias (transformação das bases da sociedade), secundárias (medidas que criem obstáculos para a realização do delito) e terciárias (recuperação do delinqüente) (cf. García-Pablos/L.F.Gomes, Criminologia, 5. ed., São Paulo: RT, 2007). Se nada for feito em termos preventivos vamos seguir pagando caro essa conta: vidas inocentes (inclusive de meninos com tenra idade) continuarão sendo ceifadas com todos os requintes de crueldade.