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A reforma política brasileira:

primeiras aproximações

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Sumário: 1. Introdução. 2. Presidencialismo X Parlamentarismo. 3. Sistema Eleitoral. 4. Rigidez Constitucional e Separação de Poderes. 5. Conclusões


1. Introdução

A democracia brasileira, em sua crise atual, é o objeto do presente trabalho. O desafio proposto, desempenhado com simplicidade, culmina com propostas de alteração dos arranjos democráticos atuais, priorizando a simplicidade, a inclusão social e o equilíbrio.

O desafio é, a partir de nosso modelo de democracia, promover ajustes, iniciar a realização de uma ponderação que nos ajude na identificação dos arranjos mais adequados para viabilizar a nossa democracia.

Longe de destituir as instituições do mérito que possuem, por deliberada opção intelectual, faz-se o movimento inverso neste trabalho. Assim, o presente trabalho busca apresentar como resultado uma proposta concisa e inovadora, fundada, sobretudo, na realidade e na responsabilidade.

As dificuldades enfrentadas na elaboração do presente, certamente, não foram poucas.

A primeira foi superar o ranço de julgar o próprio caráter das doutrinas democráticas [01], pois como bem realça LÉON DUGUIT, esse é um erro muito vulgar e merecedor de cautela.

A segunda, reconhecer a relevância do tema. Superar a esmagadora constatação de que é muito difícil mudar o sistema posto, segundo CAFFÉ ALVES (2002, p. 99-100):

Mesmos estes "valores da comunidade" são uma construção ideológica providenciada, consciente ou inconscientemente, pelas forças hegemônicas dessa comunidade, mediante os mais variados instrumentos de propaganda, de divulgação de idéias e de formação de opinião pública.

Os membros da comunidade, neste caso, têm a impressão de que estão governando a si mesmos, auto governando, embora o façam segundo as idéias e valores de uma parcela hegemônica da comunidade.

(...) a sociedade é fragmentada em inúmeros interesses, muitos deles poderosos economicamente e que, por isso, podem se fazer representar mais do que outros na máquina político-burocrática do Estado. Põe-se aqui a questão primordial: até que ponto, num sistema como o nosso, marcado por diferenças e abismos sociais profundos, onde existem capitais imensos e de altas influências social e política na distribuição das riquezas produzidas, pode haver autêntica representação política na condução dos negócios públicos?

O referido autor, acreditando, por exemplo, na supremacia do interesse econômico, acaba por subordinar, por completo, a "vida política" aos interesses que denomina imensos, globais, segmentados e privatísticos.

Levando tal premissa a esse extremo, chegar-se-ia à infeliz conclusão de que é impossível alterar o sistema posto. Logo, irrelevante seu questionamento, porquanto o resultado evidente dessa concepção seria a desnecessidade de reflexão.

O presente trabalho busca superar tal dificuldade. Escolheu-se questionar e opinar, corajosamente, até concluir quais seriam as alternativas mais eficientes para aperfeiçoamento da democracia brasileira.

Contudo, eis que nova dificuldade veio nos assombrar: a globalização. Caso a razão esteja com certos defensores da idéia que governantes e governados não vislumbram a possibilidade de grandes mudanças, em razão da pressão externa, vinda de países poderosos e de grandes empresas que controlam grande parte da economia mundial, de que adiantaria nosso labor?

Expressão desse pensamento são os dizeres de CAFFÉ ALVES (2002: 101):

"Somente as grandes forças da mobilização democrática das comunidades serão capazes de impor obstáculos às aspirações dos grandes complexos econômico-financeiros e dos Estados a estes associados. (...) a democracia não deve ter apenas como objetivo a luta, no nível político, contra os desmandos centralizadores, contra o autoritarismo ou as ditaduras. Ela não tem apenas uma dimensão política. Seu escopo é também, e principalmente, a luta no âmbito econômico, buscando neutralizar as forças perversas e diuturnas dos mercados, através da universalização ética da ação participativa e crítica de todos, no processo permanentemente e continuado de decisão social das coisas públicas. Não basta, portanto, o retorno cíclico, em nível político, de quatro em quatro anos, para depositar de maneira solitária e ineficaz o voto nas urnas da democracia burguesa. É preciso atuar diariamente, visto que as forças do capital e do mercado são eficazes diariamente." [02]

Esses fatores políticos e econômicos não podem ser desconsiderados na nossa análise, já que o processo da globalização dos mercados e a internacionalização do sistema financeiro têm, na lição de José Eduardo Faria [03], relativizado a capacidade dos governos de gerir livremente seus instrumentos de política monetária, fiscal, trabalhista e previdenciária e comprometido o exercício, pelo Governo, de suas funções alocativas, corretivas e distributivas. Esses fatos, na constatação desse Autor, comprometem a efetividade das Constituições-dirigentes.

Todavia, se a globalização tiver tal poder, de que adiantaria alterar o sistema? E a velha pergunta novamente nos perturba: por que discutir isto se não podemos mudar?

Não obstante, os debates individuais e as posturas pareceram se alinhar em reconhecer que a própria crise brasileira pode ser vista como algo interessante: na crise, o País fica como um navio sem rumo, sem comandante.

Para José Eduardo FARIA (2003), vivemos num cenário em que as obrigações públicas tentem a ser reduzidas ao conceito geral de "mercadoria", porquanto convertidas em "negócios privados". Mas, na realidade, esses são indícios do esvaziamento dos valores públicos e do "rebaixamento" qualitativo da cidadania, acompanhado da perda de referências éticas e morais e da destruição dos laços de referência [04].

A globalização realmente influencia a nossa sociedade. Entretanto, seus efeitos podem ser minimizados. Acredita-se, portanto, na possibilidade de mudança.

Essa mudança, sem dúvida, começaria com pela solução da necessidade de melhorarmos a qualidade e o acesso à educação, em seu sentido mais amplo, pela distribuição das informações com mais critério. Como cidadãos do mundo, primeiramente, devemos ter capacidade de "ler" o mundo.

Também consoante JOSÉ EDUARDO FARIA (2003:11):

Ao propiciar o advento do tempo real, a revolução das técnicas e tecnologias da informação "diminuiu" o mundo, tornando-o mais interdependente ao romper as limitações da distância e do seu tempo na organização e na interação sociais. Com isso, se por um lado ela permitiu à comunicação converter-se em favor da expansão da consciência dos atores individuais e coletivos e de diferenciação e variedade de sistemas e mercados sob a forma de redes, favorecendo a multiplicação de contatos e informações, por outro não propiciou a expansão do que Habermas chama de um mundo intersubjetivamente compartilhado. [05]

Num outro trecho, referido autor reforça seu pensamento:

(...) a comunicação global em tempo real tende, igualmente, a desestimular a reflexão: a esvaziar iniciativa de líderes políticos e autoridades governamentais, que são naturalmente lentas e pausadas por dependerem de inúmeras consultas e negociações locais para serem levadas à frente; a enfraquecer a capacidade organizativa, agregadora e condutora das agremiações partidárias, peças fundamentais do sistema representativo incumbidas de canalizar demandas, mobilizar esforços, articular interesses, construir coalizões e expressar a diferenciação social; solapar, como conseqüência, a mediação por elas promovida entre o Estado e os cidadãos; e, por fim, a precipitar a tomada de decisões sem a devida avaliação de suas conseqüências e sem a devida apreciação de seu próprio desfecho (p. 12).

Estas ponderações trazem outra variável - a eficácia dos sistemas democráticos tradicionais frente à velocidade da tecnologia da informação [06]. Este é um assunto complexo e relevante. Suscita questionamentos que vão além do horizonte deste trabalho, cuja singeleza não admite reflexão tão ampla, porquanto o enfrentamento desta questão em poucas linhas acabaria por deformá-la.

Sendo assim, muito embora não se possa deixar de considerar o poder de influência exercido pelos grandes grupos econômicos e pela mídia, é preciso ter em conta que as sociedades contemporâneas são organizadas por meio de suas instituições, públicas e privadas. Portanto, é disciplinando-as, por meio de normas jurídicas dotadas de sanção, que podemos ao menos sonhar em obter resultados positivos.

Por conseguinte, vencidos, em termos rasos, as dificuldades do manejo do tema, passa-se a refletir a respeito de pontos essenciais que podem, de alguma maneira, produzir algum efeito no funcionamento e na eficiência de nossas principais instituições políticas, quais sejam, o Poder Executivo e Poder Legislativo, pois, conforme nos ensina Montesquieu não devemos aceitar o fatalismo, já que o homem pode, adotando certas medidas influir para que a forma de Governo evolua. Esses pontos essenciais serão: o Presidencialismo x Parlamentarismo, o Sistema Eleitoral, a Rigidez Constitucional e a Separação de Poderes.


2. Presidencialismo e Parlamentarismo

A democracia brasileira é interessante.

Levantando a história política nacional, constata-se que o Parlamentarismo foi mais extenso em número de anos, mas o Presidencialismo é "venerado" pelo povo, como se aqueles dias não houvessem existido [07].

Como bem sintetiza BONAVIDES (...): "O constitucionalismo brasileiro do século XX é tão caracterizadamente republicano quanto o do século XIX, que já examinamos, fora imperial" (p. 72).

De fato, a substancial diferença entre o eleito sistema Presidencialista parece apontar para a maior nitidez da separação de poderes [08].

No parlamentarismo, o chefe de governo pode ser forçado a renunciar por um voto legislativo de desconfiança.

No presidencialismo, por outro lado, existe a possibilidade de impeachment e, não bastasse, pode-se presumir que um péssimo presidente dificilmente terá chances de ser reeleito.

Parece, portanto, que o presidencialismo está mais em consonância com a democracia, porquanto os presidentes são eleitos pelo voto popular, por um período determinado constitucionalmente.

Interessante é que nos dois sistemas pode existir corrupção, problema crônico em nossa democracia.

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Todavia, o problema da democracia brasileira não está relacionado com a escolha entre presidencialismo e parlamentarismo. Entende-se de maior relevância o sistema de representação do legislativo.

Alguns críticos alegam que, no presidencialismo, muitos chefes são politicamente fracos e se utilizam com muita freqüência de medidas provisórias para governarem.

Isto, no entanto, não é exatamente um problema do presidencialismo, mas sim um problema de governabilidade, que recai, mais uma vez, no sistema de representação.


3. O Sistema Eleitoral Brasileiro

A doutrina indica que o sistema eleitoral brasileiro conduz a uma democracia partidária, ainda que conte com mecanismos de participação direta do povo, como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. É semi-direta - representativa partidária, devido à eleição proporcional dos representantes. Admite o voto de legenda e vincula a participação dos parlamentares eleitos a partir da inscrição partidária válida (TORRECILLAS RAMOS, 2003).

Ora, parece esse o ponto: é incoerente a mistura do sistema proporcional com o majoritário.

Proporcionalmente, vê-se que a democracia brasileira já é mais majoritária do que proporcional. Assim, melhor optar-se pelo afastamento do sistema misto, hoje presente, para acolher o sistema majoritário em sua completude.

3.1. O sistema Representativo [09]

A Constituição Federal de 1988 prevê o sistema proporcional para a Câmara Federal de representação popular. Por outro lado, o sistema majoritário para o Senado, que representa os Estados-Membros.

O presidente, aliás, também é eleito segundo o sistema majoritário.

3.1.1. Proporcional

Para analisar, é preciso conhecer. Por isso, sinteticamente passa-se a demonstrar o mecanismo de funcionamento desse sistema e o porquê dele pressupor partidos.

No sistema proporcional, dividem-se os votos expressos pelo número de mandatos, para se obter o quociente eleitoral.

Após, divide-se o número de votos recebidos pelo partido, expresso pela soma dos candidatos, ou destes mais os da legenda (sem indicação de candidatos), pelo quociente.

Tem-se o número de mandatos conquistados.

Deve haver uma correspondência entre os votos dos candidatos, ou do partido, e o número de mandatos no parlamento. Existindo sobras, critérios devem ser estabelecidos para distribuí-las.

A representação proporcional reflete, na assembléia, o seu eleitorado e "todas as tendências". Possibilita a substituição do sufrágio de homens por um sufrágio de idéias. Há, teoricamente, a escolha de um projeto ou programa pela sociedade. O eleitor vota no partido de sua preferência e não numa maioria da qual deve sair o governo. (MIRANDA: 1995).

Consoante FERREIRA FILHO, os partidos políticos são essenciais a esse modelo de democracia para a formação política do povo. Oferecem opções a serem escolhidas pelo eleitorado e os "homens adequados" com capacidade para executá-las. Referido autor arremata: "apresentam novas idéias e novos programas para a escolha popular". Pois bem. Vê-se, de pronto, que no sistema brasileiro existem as distorções.

Sustenta TORRECILLAS RAMOS que (2003:44-45):

"Em primeiro lugar, o mandato que deveria ser partidário não o é e pertence ao candidato eleito. Há uma mistura entre uma característica do sistema proporcional com outra do sistema majoritário: elege-se pelo primeiro e detém o mandato pelo segundo, como pessoal.

Em segundo lugar, os partidos devem estabelecer normas de fidelidade e disciplina, conforme o par. 1 º do artigo 17 da Constituição de 1998, mas não impedem que um candidato eleito por um partido transfira-se a outro, ou decida contra as diretrizes de seu programa. Mais uma vez fica demonstrado que o candidato elege-se pela força do partido. Conforme exemplificamos, com apenas 275 votos um candidato elege-se por um partido, enquanto outro, com 127.938 votos, não consegue um mandato. Após a eleição, com os votos do partido, vem traí-lo, decidindo contra as diretrizes do mesmo ou abandonando-o e não perde o cargo; elege-se pelo sistema proporcional e mantém-se pelo sistema majoritário. Além disso, é uma incoerência com o sistema, um desrespeito aos eleitores.

Ainda cumpre esclarecer que se esse candidato, eleito com 275 votos, transferir-se para o partido daquele não eleito com 127.938, continuará com o mandato, executando um programa e dentro de uma ideologia para a qual não foi eleito. Há uma ilegitimidade, porque neste outro partido quem obteve 127.938 votos populares, não representa os eleitores de seu partido, nem o povo, no sentido amplo, em quanto o outro, com 275 votos, o faz, como se o voto, no sistema proporcional adotado, fosse pessoal. Não há, portanto, o respeito pleno a este sistema e nem a legitimidade do voto pessoal de um sistema majoritário."

Por conseguinte, esse é o ponto a ser alterado.

3.1.2. Majoritário

LIPJHART define o sistema de representação majoritário da seguinte forma:

"Cada membro é eleito em um único distrito, segundo o método da maioria simples, que na Grã-Bretanha é chamado de sistema "first past de post": vence o candidato com mais de 50 por cento dos votos ou, caso não houver maioria, com a maior minoria" (p. 32).

Levando-se em consideração os itens pontuados por DAHL (2001,211) [10], depreende-se que o melhor sistema para o Brasil seria o majoritário, em sua plenitude.

Seguindo-se essa idéia, as casas do legislativo com sistema de representação proporcional deveriam sofrer reforma, porquanto o sistema majoritário uninominal seria o aplicado para eleger deputados, federais e estaduais [11]. Tal sistema também seria aplicável ao legislativo municipal, embora com alterações.

A proposta é a realização de uma modificação singela no sistema, mas que possibilite relevantes repercussões. Caso os distritos sejam adequadamente re-desenhados, com dimensões diminutas, os grandes blocos que dominam o poder político do país serão golpeados, por certo. Os votos dos eleitores, de norte a sul do país, terão o mesmo valor.

A atual determinação de um número de oito e o máximo de setenta deputados, para cada unidade da Federação, causa uma distorção enorme. O país é composto por unidades federativas com características essencialmente diversas. Assim, muitas delas, com pequena população, têm direito a oito deputados, enquanto outras unidades bastante populosas têm direito a setenta. São Paulo, por exemplo, com mais de 34 milhões de habitantes, tem direito a setenta deputados. O Estado de Roraima, com cerca de 240 mil, tem direito a oito. Portanto, um voto em Roraima vale mais de quinze vezes o mesmo voto em São Paulo.

TORRECILLAS RAMOS (2003:44-45), ao comparar o sistema brasileiro com o norte americano, pontua, com propriedade:

"É diferente do que ocorre nos Estados Unidos da América do Norte, onde há proporcionalidade, com o mínimo de um representante em sete Estados e delegado no Distrito Federal. Aliás, possui um total de 435 deputados para uma população de 265 milhões de habitantes e o Brasil, comparando, tem 513 deputados para uma população de 165 milhões de habitantes, com oito deputados para o Distrito Federal. Esses números podem ter sofrido alterações, de acordo com as datas, mas não alteram o significado de exposição".

A maioria do povo brasileiro seria "realmente" representada.

Com a nossa proposta, os senadores deverão continuar a representar os Estados Federados, nos moldes já existentes, mas com a seguinte peculiaridade: apenas um representante para cada Estado [12].

Esse sistema de eleições majoritário se adapta à nossa realidade, pois vivemos em uma sociedade relativamente homogênea. Temos, no Brasil, uma só língua, o povo é constituído por uma maioria de pobres, e as diferentes raças e credos não têm muita importância.

Chegamos à conclusão de que vivemos em uma sociedade relativamente homogênea, quando analisamos os ensinamentos de LIPJHART. Segundo esse autor, as sociedades pluralistas (heterogêneas) são "sociedades intensamente compartimentadas quanto a diferenças religiosas, ideológicas, lingüísticas, culturais, étnicas ou raciais..." (p. 52).

Destarte, considerando-se que o número de vinte e sete partidos registrados na Justiça Eleitoral é excessivamente elevado, acredita-se que a sua diminuição, a ser trazida pelo sistema de representação majoritário, não é prejudicial para nossa sociedade exatamente pelo fato de que não temos grandes divisões lingüísticas, religiosas, étnicas e culturais. Pelo contrário, a adoção do sistema de representação majoritário parece ser necessário à redução do excessivo número de partidos com representação no Congresso Nacional.

Ademais, democracias de consenso bem sucedidas são raras. Nesse sentido se posiciona DAHL:

"Sem dúvida, democracias consociacionais bem sucedidas são raras, porque as condições que ajudam a torná-las viáveis são raras (em Democracy in Plural Societies, Lipjhart descreve nove dessas condições favoráveis). A conveniência da solução consociacional para sociedades divididas tem sido contestada com essas fundamentações: (1) em muitos países culturalmente divididos, as condições favoráveis (e talvez necessárias) são frágeis demais ou não existem; (2) os arranjos consociacionais reduzem intensamente o importante papel da oposição no governo democrático. ..; (3) alguns críticos preocupam-se com a possibilidade de vetos mútuos e com a necessidade de consenso que levassem a exagerado impasse" (p. 214-215).

Pior ainda é a mistura entre presidencialismo e sistema de representação proporcional. Conforme nos assevera o próprio LIPJHART, não funciona, porquanto o presidente é colocado em uma posição política frágil e, sem poderes efetivos para governar, é obrigado a se utilizar de medidas provisórias. Por conseguinte, há necessidade de governabilidade.

Por fim, devemos observar que não defendemos um sistema de representação majoritário puro, pois entendemos ser importante a manutenção da constituição rígida e da revisão judicial, em face da nossa cultura.

Em alguns países, como esclarece JOSÉ AFONSO DA SILVA (2003), é possível a revogação do mandato por certo número de votos dos eleitores. É o caso do recall, nos EUA [13].

Os constituintes, quando da elaboração da Constituição de 1988, recusaram incluir a destituição de mandatos em certos casos, conforme várias propostas apresentadas. Mesmo porque isto seria incoerente, no caso do sistema brasileiro.

O sistema de recall, possibilitando que, pelo voto, o candidato eleito seja destituído do mandato, há de privilegiar a iniciativa do processo a partir das "instituições sociais", como enuncia CAFFÉ ALVES (2002, p. 101):

Essa democracia participativa deve realizar-se mediante redes organizadas de representações, onde as instituições culturais, produtivas, religiosas, profissionais, de vizinhança, de lazer, etc. (sic), tenham vínculos diretos ou indiretos com o poder político, propugnando pelas administrações transparentes e alijando a influência absoluta dos partidos políticos e dos grupos econômicos.

Neste contexto, temas inerentes à reforma política, como a fidelidade partidária, devem ser sopesados [14].

3.3. A Federação à brasileira

Consoante Lijphart, existe "uma grande variedade de definições de federalismo na literatura existente sobre o assunto, porém há um amplo acordo sobre sua característica mais básica: uma divisão de poder garantida entre governo central e governos locais" (2003, p. 214).

Por conseguinte, a existência do Estado Federal pressupõe a descentralização político-administrativa do exercício do poder, e, por conseguinte, a autonomia dos Estados componentes da Federação.

A existência de uma Constituição é importante para essa autonomia, porquanto, como ensina Lijphart ao citar Elazar, " ‘o primeiro teste da existência do federalismo é o desejo ou a vontade de ser federalista por parte dos sistemas políticos envolvidos. A adoção e a manutenção de uma constituição federal é (...) o primeiro e mais importante meio de expressar essa vontade’ " (2003, p. 216).

Ao contrário dos Estados Unidos, que nasceram da junção de Estados independentes, a federação brasileira nasceu da divisão do todo. Conseqüência disto é a menor intensidade da divisão de poder entre os membros da Federação. Assim podemos dizer que os nossos Estados, Municípios e o Distrito Federal são politicamente mais fracos que outros Estados pertencentes a outras federações, como, por exemplo, a dos Estados Unidos.

Como bem pondera BONAVIDES (2003, p. 73), "Tocante à Federação, o sistema logo manifestou na aplicação as suas fraquezas, as suas imperfeições, os seus erros, distanciando-se, por completo, do original americano, de que fora cópia servil".

O modelo de Estado Federativo "tende a ser usado em dois tipos de países: os relativamente grandes e as sociedades plurais" (2003, p. 222).

O Brasil não é uma sociedade plural, como mencionado anteriormente, o que não afeta a escolha pelo federalismo, em razão do tamanho de seu território que, diga-se, é imenso.

Poderiam, no entanto, ser melhor distribuídas, para os integrantes da Federação brasileira, as receitas arrecadas, por meio de tributos, pela União, assim como algumas competências legislativas poderiam ser transferidas aos Estados, Municípios e Distrito Federal.

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Sobre os autores
Cinthia Maria da Fonseca Espada

Juíza do Trabalho. Mestre.

Elaine Cristina Francisco

Advogada. Mestre.

Lúcia Helena Brandt

Advogada da União. Mestranda.

Paulo Cezar Fernandes

Advogado. Mestrando.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESPADA, Cinthia Maria Fonseca ; FRANCISCO, Elaine Cristina et al. A reforma política brasileira:: primeiras aproximações. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1354, 17 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9600. Acesso em: 25 abr. 2024.

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