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Agilização e modernização da Justiça.

O fator recursos humanos

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17/03/2007 às 00:00
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O QUE FAZER

            O conjunto de medidas necessárias carece de estudo específico e à parte. Mas pontuaremos a seguir algumas das principais idéias

            I - Ações na estrutura – O reconhecimento das peculiaridades das funções que assoberbam os Juízes deveriam fazer ver que ele dificilmente terá condições plenas de ser um gestor integral no padrão tradicional, e muito menos no padrão necessário ao momento que vivemos. Para sanar essa dificuldade, sugiro:

            Centralização Administrativa – Dar unidade ao comando administrativo, centralizando a produção de modelos e rotinas de gestão, criando órgão na estrutura do Tribunal, a partir de consensos estabelecidos em grupo de trabalho formado por juízes, serventuários, e pessoal administrativo qualificado. Assim se evitaria a multiplicidade de rotinas e divergência de procedimentos, dando ao gestor ferramentas para otimizar a produção.

            Manual de serviços básico – Lembrando que se a padronização não pode ser uma camisa de força, devemos ressaltar que ela é instrumento indispensável de gestão. Porque "Se você não tem item de controle, você não gerencia" e "não existe controle sem padronização" [19] . Portanto, as rotinas acertadas conforme sugestão anterior, deveriam constituir um manual de procedimentos básico e de fácil manejo. Hoje algumas tarefas demandam consulta concomitante a portarias, ordens de serviço e comunicados em várias edições do Diário Oficial.

            Criação do Cargo – Técnico de Administração Judiciária - Tendo presentes as experiências de profissionalização da gestão pública [20], urge pensar a criação de um quadro de "técnicos em administração judiciária" com a mesma autonomia técnica dos demais técnicos que servem aos juizados. Tal cargo poderia ser estruturado em dois níveis, um básico a ser treinado em noções de Administração, O&M e Relações Humanas, sendo disponibilizado em proporção de pelo menos 01 para cada 02 Cartórios por Comarca, lotados na Direção do Fórum. Outro cargo, de nível superior, com terceiro grau em administração e com treinamento específico em Administração Judiciária, na proporção de ao menos 01 por Comarca de 01 entrância e 01 por Fórum Regional. Ambos poderiam ser providos, num primeiro momento, por seleção interna.

            Acesso ao cargo de Escrivão – O Técnico Judiciário só ascenderia à função de Escrivão quando capacitado às lides gerenciais, o que se aferiria preferencialmente por concurso interno e/ou aprovação em formação específica, prévia à investidura.

            Cultura de reuniões produtivas

            a – Diretriz sobre reuniões – estabelecer diretriz de ao menos uma reunião organizada e participativa, semanal, nos Cartórios.

            b – Salas de reunião – Reuniões devem ser feitas em ambientes próprios. A sala do juiz e o salão do júri são ambientes marcados por uma aura litúrgica que inibe a participação. Por isso, deve-se ter salas de reuniões, nas Comarcas, de preferência com mesas sem cabeceira.

            II - Ações de formação – É necessário ferramenta teórica que impulsione as ações. E a formação tem que ser massiva, amplamente disseminada nos escalões de execução. Exemplos de ações necessárias:

            Escolas de formação – Influir para que currículos dos cursos de direito, bem como da ESAJ e EMERJ tenham a matéria Administração Judiciária.

            Preparação dos juízes - Um processo de modernização gerencial participativa demandará nova consciência de todos, mas primordialmente, do Juiz. Assim, intensificar ações de esclarecimento, preparação e formação dos juízes para o novo momento.

            Cartilhas – Massificar conhecimentos rudimentares preparatórios para todo o processo de mudança, com a edição de pelo menos duas cartilhas em linguagem acessível, uma com técnicas básicas de reuniões produtivas e outra com noções básicas de administração.

            Treinamento individual em computador - Monitorado pela ESAJ e pela EMERJ, seria complementar e/ou introdutório aos cursos presenciais. Num prazo de 06 a 08 meses todos os serventuários e Juízes seriam submetidos a um treinamento simplificado, com software interativo, seguido de provas escritas.

            III - Ações de motivação - Sendo o sistema que temos autoritário e burocrático é ele desestimulador do pensamento criativo e da iniciativa. A "revolução de consciência" que se faz necessária não ocorrerá se não se massificar o desejo de mudança. Para isso são indispensáveis ações que chamem à motivação desde o mais graduado Desembargador até o auxiliar mais humilde. Exemplos de ações possíveis.

            Semana de conscientização – Eventos coordenados por comitês de serventuários, juízes e representantes da OAB, abrindo as instalações dos Fóruns para atividades lúdicas e de reflexão visando discutir a modernização do Judiciário.

            Jornal modernização – Uma imprensa interna e participativa atrairia o coletivo para o processo de modernização, disseminando conceitos e divulgando iniciativas, fazendo contraponto à grande mídia.

            Prêmio modernização – Para estimular a criação de projetos e iniciativas locais de modernização gerencial e administrativa.

            Espaço Fórum – Adequar os salões de Júri, ociosos na maior parte do tempo, de maneira barata e rápida para abrigar evento periódico que permitisse à comunidade jurídica partilhar talentos e disseminar cultura. [21]

            IV - Ações de democratização e transparência – Sem a participação de todos os interessados (juízes, serventuários, partes, advogados e população) uma verdadeira transformação do Judiciário não se efetivará. Mesmo que as ações devam começar internamente, é necessário o chamamento de todos à participação. E a democratização administrativa deveria seguir par i passu a implementação das mudanças. Sugiro:

            Comitê Diretor do Fórum – Integrado por serventuários e titulares, presididos pelo Juiz Diretor, a serem eleitos [22], por um colégio de juízes, serventuários e advogados para dinamizar a direção, permitindo ações integradas, tendo em conta a função estratégica do cargo para a melhoria da ambiência do Judiciário. Com reuniões periódicas, amplamente divulgadas e abertas onde o Comitê prestaria também as funções de ouvidoria.

            Estímulo ao associativismo – Para fortalecer o senso de coletivo, incentivar clubes, corais, grupos de teatro e demais associações de funcionários. Neste campo urge solver o ainda conflituoso trato com representações sindicais. Ao bom gestor interessa não só que elas existam mas que tenham voz.

            TV Justiça – Se for acompanhado no Estado o acerto da criação do veículo – de que o programa semanal do TJ-RJ e da AMAERJ "Direito e Avesso" é excelente embrião -, incluir na grade programas voltados para a modernização onde debatam juízes, serventuários e advogados. Além do saldo direto da discussão, o significado simbólico permitiria disseminar uma cultura de diálogo como incentivo motivacional à mudança de modelo administrativo que aqui se defende.


CONCLUSÃO

            Não pretendendo esgotar tema tão amplo, quisemos alertar que parte substancial dos problemas do Poder Judiciário se deve ao modelo de gestão que pratica. Demonstrar a influência negativa que o simbolismo da toga exerce no processo administrativo. Chamar à necessidade de despertar os recursos humanos para uma nova consciência em que todos sejam co-responsáveis pelo processo de administração. Para tanto, concluímos necessário trabalhar intensamente a motivação funcional, alterando estruturas e promovendo ações de formação, elevando ainda o grau de democratização e transparência, cientes sempre de que o engajamento efetivo da alta administração é fundamental para o sucesso almejado, que nos permita "tecer a manhã" de uma democracia sólida, sadia e integradora dos milhões de desamparados.

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BIBLIOGRAFIA

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            BOBBIO, Norberto & outros. Dicionário de Política. 2ª edição. Editora Universidade de Brasília.

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            ROCHA, Luiz Oswaldo Leal da Rocha. Organização e Métodos, uma abordagem prática. 5ª edição – Editora Atlas - 1986

            SEMLER, Ricardo. Virando a própria mesa – uma história de sucesso empresarial made in Brazil. 40ª edição - Editora Best Seller.

            SENA REBOUÇAS, Francisco de Paula. Fim de Século e Justiça. Editora Juarez de Oliveira – 2002.

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            TROTTER, Joseph A. A educação sobre administração de Tribunais nos Estados Unidos. Questões de Democracia. Em ww.usinfo.state.gov/journals/itdhr/0802/ijdp/id080206.htm. acesso em 24.out.2003

            VIANNA, Luiz Werneck Vianna & outros. Corpo e Alma da Magistratura Brasileira. 3ª edição – Editora Revan.


NOTAS

            01

Ensina Fábio Konder Comparato:"... a civilização capitalista procura tornar o Direito uma simples técnica de organização eficiente da vida econômica, em proveito da classe empresarial. (...) e a Constituição tende a tornar-se um simples regulamento econômico-administrativo, mutável ao sabor dos interesses e conveniências dos grupos dominantes". Em "O Papel do Juiz na efetivação dos Direitos Humanos", - texto de palestra colhido em www.dhnet.org.br/direitos/militantes/comparato_juiz.html

            02

RUI BARBOSA Obras completas, v. XIX, t.III, p.300, apud. "Fim de Século e Justiça", de Francisco de Paula Sena Rebouças – Ed. Juarez de Oliveira.

            03

Combinados, os Art. 2º e o Parágrafo único do Art. 1 da Constituição Federal determinam que a fonte do poder uno e indivisível, que é exercido pelos poderes da União, tem sua legitimidade emanada do sufrágio universal. É claro que o assunto é complexo e não se quer aqui defender a eleição de juízes, instituto controverso mesmo nos países que o adotam. Apenas registrar que parte da crise do Judiciário pode ter fundamento na sua forma de constituição .

            04

O Globo 25.08.03 – PÁG 06 - Nossa Opinião - Um Alerta

            05

como o nomeou Dalmo de Abreu Dallari, apud. Francisco de Paula Rebouças, op. cit., p.146.

            06

cfe. a "Missão do Judiciário: Tornar a Justiça do Estado do Rio de Janeiro cada vez mais rápida e efetiva, proporcionando o pleno exercício da cidadania" na página do TJ-RJ na Internet.

            07

Exemplos: Programas de Qualidade Total nos TRT’s das 5ª e 6ª regiões e Planejamento Estratégico no da 15ª Região conforme www.trt15.gov.br/boletim/boletim199911.pdf,.

            08

cfe. o titular da Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Fazenda, Sérgio Renault tem declarado - JB de 19.10.2003, "Reforma do Judiciário será feita em benefício de todos" p.A2. Muito do avanço verificado no Estado do do de Janeiro deve-se ao mecanismo de geração de receitas do Fundo Especial do TJ-RJ – que autoriza o desconto de um percentual sobre as custas processuais para gastos exclusivos do TJ.

            09

discurso de posse, colhido em www.tj.rj.gov - acesso em 23.10.2003

            10

Dentre os cursos da ESAJ há uma pós-gradução em Administração Judiciária. Seminários: em dezembro último o "I Seminário de Gestão Judiciária - A Reforma Silenciosa da Justiça"; e em setembro, ação conjunta do TJ-RJ com o Ministério da Justiça e a Fundação Getúlio Vargas promoveu o seminário "Modernização e Administração da Justiça – A Reforma necessária".

            11

Francisco de Paula Sena Rebouças – Fim de Século e Justiça – p. 95 – editora Juarez de Oliveira – "Não adianta reformar a Justiça sem reformar o nosso espírito"

            12

Fernando Alves – Política Pública de Recursos Humanos - na página da Prefeitura Municial de Belo Horizonte em www.belohorizonte.mg.gov.br/smad/rhpolitica.html

            13

TÚLIO DE OLIVEIRA MARTINS - ´´A função do juiz é mítica e fundante da sociedade" in Conjuntura Econômica - ´´http://conjur.uol.com.br/textos/20500/

            14

cfe. Tese da Coordenação Nacional dos Trabalhadores da Justiça ao Fórum Social Mundial/ 2001

            15

Paulo Freire – Pedagogia do Oprimido – p. 93 – Paz e Terra – 7ª ed.

            16

De Luiz Werneck Vianna e outros – Ed. Revan

            17

"O jurista que não é mais que um jurista é uma triste coisa" Stammler, apud Francisco de Paula Sena Rebouças (op. Citada p.178).

            18

cfe. consta em www.trf4.gov.br/trf4/noticias/kit_arqs/possetrf-discursovladimir-23062003.doc - acesso em 23.10.03

            19

como dizem, respectivamente Kaoru Ishikawa e J. M. Juran, dois dos mentores dos bem sucedidos programas de qualidade japoneses em "TQC - Controle de Qualidade Total no estilo japonês" de Vicente Falconi Campos, p. 29 e 41. – Ed. Fundação Christiano Otoni UFMG.

            20

Adotada desde fins da década de 1960 nos EUA a gestão profissional, por administradores selecionados pelos tribunais. Cfe., A EDUCAÇÃO SOBRE ADMINISTRAÇÃO DE TRIBUNAIS NOS ESTADOS UNIDOS – de Joseph A. Trotter, na revista eletrônica Questões de Democracia, ago/2002 em usinfo.state.gov/journals/itdhr/0802/ijdp/id080206.htm acesso em 24.10.03

            21

Como parâmetro para a sugestão, o modelo tentado em Teresópolis, que previu exposição de artes, apresentação musical, esquetes teatrais, talk-shows e/ou debates, de preferência não técnicos.

            22

como feito pelo TRF3 em 09.09.02 que promoveu eleição para os diretores dos Foros das Seções Judiciárias de São Paulo e Mato Grosso do Sul cfe. "JUÍZES FEDERAIS DISPUTAM, AMANHÃ, ELEIÇÃO HISTÓRICA." Em www.trf3.gov.br/sis/noticias/noticiastrf. - visita em 22.10.03
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Sobre o autor
Denilson Cardoso de Araújo

Serventuário de Justiça do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Escritor. Palestrante.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Denilson Cardoso. Agilização e modernização da Justiça.: O fator recursos humanos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1354, 17 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9617. Acesso em: 26 abr. 2024.

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