Feminicídio e as medidas protetivas de urgência

18/02/2022 às 19:55
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Resumo: O presente estudo apresenta um tema de âmbito social de grande importância, o Feminicídio (definido como assassinato de mulheres em violência doméstica ou em aversão ao gênero da vítima), um estudo com objetivo de mostrar as dificultadas da sociedade e Governos sobre a violência doméstica e as medidas que podem proteger essas mulheres de forma eficaz, através das legislações vigentes, observando também sobre a historicidade do assunto, fazendo também uma análise da Lei do Feminicídio, Lei 13.104/2015 que incluiu a qualificadora de Feminicídio praticado contra a mulher. O presente trabalho busca uma análise sobre a matéria de violência de gênero e as medidas protetivas na legislação vigente que buscam o afastamento do autor, mas que ainda se mostram ineficazes devido o auto índice de feminicídios no País.

Palavras-chave: Feminicídio. Violência Doméstica. Maria da Penha. Medidas Protetivas.


INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo a análise da Lei de Feminicídio 13.104/2015, que alterou o artigo 121 do Decreto Lei nº 2848 de 1940 (Código Penal), como qualificadora de crime de homicídio e do art. 1º da Lei 8072 de 1990 que incluiu o Feminicídio nos crimes hediondos, e das medidas protetivas de Urgência previstas pela Lei Maria da Penha, Lei 11340 de 2006 e seus mecanismos para conseguir coibir e prevenir a violência doméstica e familiar que busca garantir as mulheres seus diretos fundamentais inerentes a pessoa humana e sua preservação física e mental.

Destacando-se que o segundo capítulo tenta mostrar a evolução da violência doméstica contra as mulheres, analisando em breve histórico sobre o homicídio contra mulheres especialmente em âmbito familiar e a inclusão da Lei do Feminicídio.

O terceiro capítulo tratará sobre a Lei Maria da Penha e seus elementos de coibir a violência doméstica com suas medidas protetivas que tenta erradicar a violência contra a mulher, direitos fundamentais e convenção Interamericana.

Por fim no quarto capítulo será abordado os índices de Feminicídio e o aumento de violência doméstica no País.

EVOLUÇÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES (HISTORICIDADE) E a LEI DO FEMINICÍDIO

Feminicídio é um termo de crime de ódio baseado no gênero, que mundialmente é mais conhecido como assassinato de mulheres em violência doméstica. É evidente que a violência contra as mulheres se encontra profundamente presente na sociedade ocidental, em que muitos anos foi naturalizada, ainda mais na conjugalidade. Ainda se mantendo oculta em grande parte dos casos. Situações de agressões físicas, sexuais, psicológicas são muito frequentes especialmente em âmbito privado, crimes que ainda são difíceis de prever sua amplitude.

Feminicídio ganhou espaço a partir das denúncias de assassinatos de mulheres em Ciudad Juarez no México, que desde o início do anos 90 as práticas de violência sexual, torturas e desaparecimento de mulheres tinha se repetido, com impunidade dos criminosos e omissão do Estado.

A expressão Feminicídio é atribuída a Diana Russell, que utilizou pela primeira vez em 1976 a expressão, em seu depoimento perante o Tribunal Internacional de Crimes contra mulheres, posteriormente Diana e Jill Radford escreveram o livro Femicide: the politics of woman killing, sobre o tema.

Assim, a pesquisadora mexicana Marcela LAGARDE erigiu o conceito feminicídio, referindo-se mais a genocídio do que a assassinatos individuais, de modo a explicitar as contínuas violências sofridas pelas mulheres e responsabilizar o Estado na perpetuação dessas violências com raízes na cultura sexista e misógina que leva a intimidações, ameaças, abuso verbal, físico, estupro, mutilações genitais, etc., e violências institucionais."

No Brasil o Feminicídio foi instituído por uma novatio legis in pegius, a Lei 13.104 de 2015, incorporando o crime no Código Penal no inciso VI, § 2º, do Art. 121, tipificando como feminicídio o crime de homicídio quando cometido "contra a mulher por razões da condição de sexo feminino". O §2º-A, do art. 121, do referido código, complementa o supracitado inciso ao preceituar que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:

I - violência doméstica e familiar (o art. 5º da Lei nº 11.340/06 enumera o que é considerado pela lei violência doméstica);

II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Trata-se, portanto, do feminicídio, de uma qualificadora do crime de homicídio.

Essa Lei elevou as penas desse crime, no mínimo, de 6 anos para 12 anos, tal como as demais hipóteses de homicídio qualificado. Além disso, trouxe também novas causas de aumento da pena para o crime de feminicídio, que são os praticados: durante a gestação ou até 3 meses após o parto; contra menor de 14 anos e maior de 60 anos; contra pessoa com deficiência ou portadoras de doenças degenerativas; em presença física ou virtual de ascendente ou descendente da vítima; e aqueles feitos durante descumprimento de medida protetiva.

Foi devido dos Tratados e Protocolos Internacionais, que diversos estados foram pressionados a colocar em prática as políticas públicas relacionadas a este tema, com uma atuação conjunta com a sociedade, seguindo a esfera internacional a legislação do Brasil apresentou profundas mudanças, com inclusão das devidas legislações.

A Lei 13.104 conhecida como a Lei do Feminicídio, entrou para o código penal em 2015, após um amplo debate com a sociedade e de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investigou a violência contra mulheres no País. A diferença entre feminicídio e homicídio comum é que o feminicídio se trata do crime cometido em razão do gênero da vítima.

MEDIDAS PROTETIVAS E A LEI MARIA DA PENHA

O caso de Maria da Penha Maia Fernandes, foi o caso a homenagem à lei 11.340. Maria da Penha era casada com Marco Antônio Heredia Viveros, que cometeu violência doméstica durante os 23 anos de casamento, o marido por duas vezes, tentou assassiná-la. Na primeira deixou-a paraplégica com utilização de arma de fogo, e na segunda, por eletrocussão e afogamento. Após essa tentativa de homicídio ela o denunciou, conseguiu sair de casa devido a uma ordem judicial e iniciou a batalha para que seu então marido fosse condenado. Apesar disso, o caso foi julgado duas vezes e, devido alegações da defesa de que haveria irregularidades, o processo continuou em aberto por alguns anos.

Após uma denúncia feita pela Centro pela Justiça pelo Direito Internacional e o Comitê Latino - Americano de Defesa dos Direitos da Mulher juntamente com a vítima, formalizaram uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, o País foi condenado. Assim, o governo brasileiro se viu obrigado a criar e aprovar um novo dispositivo legal que trouxesse maior eficácia na prevenção e punição da violência doméstica e familiar no Brasil.

Dentre as medidas sobre a violência contra as mulheres, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) é um grande avanço sobre esse tema, sendo um dos importantes mecanismos para coibição da violência doméstica, tal lei foi reconhecida pela ONU como umas das melhores legislações em enfrentamento contra a violência as mulheres.

A Lei Maria da Penha busca coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, levando medidas de assistência a esta quando em situação de violência doméstica e familiar, assim como medidas protetivas, aplicadas ao agressor.

Assim discorre no seu artigo 1º que:

Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Como elenca na legislação existe várias formas de violência a mulher, não somente a violência física como a princípio de sabe, tanto como violência psicológica, moral, sexual.

Conforme expressa-se:

Art 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;             (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

Outros efeitos da Lei Maria da Penha são as medidas protetivas, onde o agressor pode ser proibido de entrar em contato com a vítima, seus familiares e testemunhas por qualquer meio ou, terá a restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço militar.

A lei permite que, a depender da gravidade, o juiz possa aplicar outras medidas protetivas consideradas de urgência, como o encaminhamento da vítima e de seus dependentes para programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento, determinar a recondução da vítima e de seus dependentes ao domicílio, determinar o afastamento da vítima do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e recebimento de pensão. Sempre que se fizer necessário, o juiz pode requisitar a qualquer momento o auxílio da força policial.

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No primeiro tratado internacional legalmente vinculante que criminaliza todas as formas de violência contra a mulher, afirma que a violência contra a mulher constitui uma violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente à mulher o reconhecimento, gozo e exercício de tais direitos e liberdades; como se expõe no artigo 4º:

Toda mulher tem direito ao reconhecimento, gozo, exercício e proteção de todos os direitos humanos e às liberdades consagradas pelos instrumentos regionais e internacionais sobre direitos humanos. Estes direitos compreendem, entre outros: a. o direito a que se respeite sua vida; b. o direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral; c. o direito à liberdade e à segurança pessoais; d. o direito a não ser submetida a torturas; e. o direito a que se respeite a dignidade inerente a sua pessoa e que se proteja sua família; f. o direito à igualdade de proteção perante a lei e da lei; g. o direito a um recurso simples e rápido diante dos tribunais competentes, que a ampare contra atos que violem seus direitos; h. o direito à liberdade de associação; i. o direito à liberdade de professar a religião e as próprias crenças, de acordo com a lei; j. o direito de ter igualdade de acesso às funções públicas de seu país e a participar nos assuntos públicos, incluindo a tomada de decisões.

O Estado brasileiro ratificou a Convenção de Belém do Pará em 1995, pelo qual se obrigou a incluir em sua legislação normas específicas sobre o problema sobre violência contra as mulheres. A nova lei encontra seu fundamento na CF/88, que determina a criação de mecanismos para coibir a violência no âmbito das relações familiares. A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher Convenção de Belém do Pará, adotada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos em 1994, constitui-se no marco histórico internacional na tentativa de coibir a violência contra a mulher.

Assim, a violência contra a mulher constitui-se em um padrão de violência específico, baseado no gênero, que cause, morte dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher.

INDÍCES DO FEMINICÍDIO

Apesar da inclusão da Lei Maria da Penha, ainda existem carências em sua tutela, por disciplinar apenas lesões corporais em razão da violência doméstica, não abarcando a morte decorrente desse tipo de violência. O país é classificado como a quinta nação com mais mortes femininas, com a taxa de 4,8 homicídios de mulheres por 100 mil habitantes, dentre os quais 55,3% foram cometidos no ambiente doméstico e 33,2% dos homicidas eram parceiros ou ex-parceiros das vítimas, segundo dados de 2013 do Ministério da Saúde. O Dossiê Feminicídio destaca que no ano de 2010 se registravam 5 espancamentos a cada 2 minutos, em 2013 já se observava 1 feminicídio a cada 90 minutos e, em 2015, o serviço de denúncia Ligue 180 registrou 179 relatos de agressão por dia.

Os dados são do Atlas da Violência 2021: o número de mulheres mortas fora de casa entre 2009 e 2019 diminuiu 20,6%. Os assassinatos dentro de casa, porém, cresceram 10,6% no mesmo período. Isso é um indício de que há um aumento de feminicídios.

Os dados sobre homicídio fornecidos, em 2018, pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde. O estudo referido estudo revelou que embora a morte em função da violência predomine entre os homens, cerca de 30,4% dos homicídios contra mulheres ocorrem no domicílio da vítima. Sendo muito mais severo se analisada a questão racial. No domicílio, a taxa de mortalidade para pretas e pardas era 34,8% maior do que para mulheres brancas; fora do domicílio era 121,7% maior.

O Mapa da Violência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que o número de mulheres assassinadas aumentou no Brasil. Entre 2003 e 2013, passou de 3.937 casos para 4.762 mortes. Em 2016, uma mulher foi assassinada a cada duas horas no país.

Para Carolina Ricardo, diretora executiva do Sou da Paz, um dos motivos para esses aumentos está no machismo e na construção de uma masculinidade (distorcida) que enxerga as mulheres como propriedade.

CONCLUSÃO

Analisa-se que apesar das legislações vigentes em nosso País, ainda se encontra grande aumento da violência doméstica e feminicídio, talvez por que em algumas ocasiões tem-se em mente que a mulher, mesmo recorrendo à Polícia e ao Poder Judiciário, arrepende-se, concilia-se e perdoa quem a agrediu.

Por tanto, para dar efetividade a Lei Maria da Penha, se faz necessário uma continuidade da luta pela igualdade entre homens e mulheres, respeito e consenso. Isso é transformar a sociedade num aspecto de grande relevância.

As mortes violentas por razões de gênero são um fenômeno global e vitimizam mulheres todos os dias no mundo, como consequência da posição de discriminação estrutural e da desigualdade de poder, que inferioriza e subordinou ao longo dos tempos as mulheres aos homens.

Segundo as Nações Unidas, as motivações dos agressores envolvem sentimento de posse sobre a mulher, o controle sobre o seu corpo, desprezo e ódio por sua condição de gênero, entre outras.

Mostra-se com esse estudo que a violência doméstica vem ao longo dos anos criando patamares de mudanças consideráveis, o qual não se deve ser tratado somente em âmbito particular, tentando buscar uma mudança nos índices de feminicídios, onde os agressores sejam punidos severamente, com ações mais efetivas das medidas protetivas, em as mulheres não tenham medo de retaliações posteriores e que seus direitos sejam protegidos.

REFERÊNCIAS

LAGARDE, Marcela. ¿Fin al feminicidio? Comissión Especial para Conocer y Dar Seguimiento a las Investigaciones sobre los Feminicidios en la República Mexicana y a la Procuración de Justicia Vinculada, Cámara de Diputados, México, 2004 e LAGARDE, Marcela. Antropología, feminismo y política: violencia feminicida y derechos humanos de las mujeres. InBULLEN, Margaret; MINTEGUI, Carmen Diez (Coord.) Retos teóricos y nuevas prácticas. San Sebastián: Ankulegi, 2008, p. 214-217.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

https://mobilidade.estadao.com.br/na-perifa/registros-de-feminicidio-ainda-esbarram-em-burocracia-no-brasil/?gclid=EAIaIQobChMIne2OkJDc9QIViYWRCh0FfQQzEAAYASAAEgL8Z_D_BwE

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/d1973.htm

Antunes, Leda (27 de novembro de 2020). «Há 25 anos, Brasil ratificava convenção que abriu caminho para criação da Lei Maria da Penha»O Globo. Consultado em 7 de julho de 2021. Cópia arquivada em 9 de junho de 2021

WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2015: Homicídio de mulheres no Brasil. 1ª Edição, Brasília, DF, Flacso Brasil, 2015. Disponível em: <www.mapadaviolencia.org.br>.Acesso em: 08 jan. 2019.

https://artigo19.org/wp-content/blogs.dir/24/files/2018/03/Dados-Sobre-Feminic%C3%ADdio-no-Brasil-.pdf

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