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Suspensão de serviços de celular e limitação do acesso à internet

08/05/2022 às 09:00
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É possível que uma empresa suspenda os serviços do plano (pré-pago ou pós-pago) de telefone celular do consumidor inadimplente, impossibilitando o seu acesso à internet?

É possível que uma empresa suspenda os serviços do plano (pré-pago ou pós-pago) de telefone celular do consumidor inadimplente, impossibilitando o seu acesso à internet?

É uma questão relevante, que pode ser analisada sob três perspectivas e normas, que dialogam entre si: o Direito do Consumidor, mais especificamente os direitos dos consumidores usuários de serviços de telecomunicações (que contém regras próprias) e o Marco Civil da Internet, sob os fundamentos e princípios do Direito Constitucional.

Além disso, o Direito Administrativo também se aplica previamente, na regulação do setor de telecomunicações.

Em primeiro lugar, é importante tratar da inclusão digital e do acesso à internet.

No Brasil, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios 2020 do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 152 milhões de brasileiros tinham acesso à internet (81% dos brasileiros com mais de 10 anos de idade).

Desses usuários, 99% acessa a internet com o uso de um telefone celular, enquanto o computador é usado por 44% (percentual que era de 80% em 2014) e a televisão é utilizada por 42% das pessoas que acessam a internet no Brasil.

A partir dessa compreensão da inclusão digital e da importância do acesso à internet em um mundo digital, nós temos que atualizar e entender os direitos e deveres dos consumidores e dos fornecedores dos produtos e serviços digitais.

Especificamente para os serviços de telefonia, deve ser observada a Resolução nº 632/2014 da ANATEL, que aprova o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC), inclui entre os direitos dos consumidores a não suspensão dos serviços, que só pode ocorrer mediante a sua solicitação ou pelo descumprimento de um dos deveres dos consumidores previstos no art. 4º, hipótese em que a prestadora de serviços deve notificá-lo previamente (art. 3º, VI, da Resolução).

Entre os deveres dos consumidores está o de cumprir as obrigações fixadas no contrato de prestação do serviço, em especial o pagamento pontual referente à prestação de serviços (art. 4º, IV, da Resolução nº 632/2014).

Trata-se de uma aplicação prática do princípio do aviso prévio a uma sanção, que já foi reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça em diversas situações.

Além disso, a Resolução nº 632/2014 define prazos que devem ser observados entre a notificação prévia e a suspensão da prestação de serviços ao consumidor, quando este for inadimplente (arts. 90/103):

(a) em 15 dias após notificação, sem o pagamento pelo consumidor, a prestadora pode suspender parcialmente a prestação do serviço, com a redução da velocidade contratada (art. 90) e a especificação das razões da suspensão, o valor do débito, as regras e prazos para a suspensão parcial e total e para a rescisão do contrato e, por fim, a possibilidade do registro da dívida e dos dados do consumidor nos cadastros de proteção ao crédito, após a rescisão contratual (art. 91);

(b) em 30 dias após o início da suspensão parcial, a prestadora pode suspender totalmente a prestação do serviço (art. 93) e, a partir dessa suspensão total, não pode mais cobrar valores de assinatura ou prestação de serviços do consumidor (art. 95);

(c) e em 30 dias após o início da suspensão total, a prestadora pode desativar definitivamente o serviço prestado ao consumidor e rescindir o contrato de prestação do serviço (art. 97).

Apenas depois da rescisão do contrato é que a prestadora poderá incluir o registro de débito em sistemas de proteção ao crédito, desde que encaminhe para o consumidor comprovante escrito da rescisão, no prazo máximo de 7 dias.

Ainda, se o consumidor efetuar o pagamento da dívida antes da rescisão do contrato, a prestadora deve providenciar o restabelecimento dos serviços no prazo de 24 horas, a partir do pagamento da dívida ou da primeira parcela do acordo eventualmente realizado entre consumidor e fornecedor (arts. 100, caput, e 101, § 1º, da Resolução nº 632/2014).

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Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Oscar Valente. Suspensão de serviços de celular e limitação do acesso à internet. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6885, 8 mai. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/97633. Acesso em: 28 mar. 2024.

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